Abstract
Autogestão, autoempreendedorismo, infotrabalho, trabalho intermitente, criptomoeda, uberização, proletariado de serviços e servidão digital delineiam uma série de designações indicativas das mudanças das condições de (re)produção do Capital nas suas formas contemporâneas. Grandes corporações como Google, Facebook e Amazon participam desse processo tanto no eixo da infraestrutura econômica, quanto na produção discursiva que sustenta ideologicamente as relações de trabalho determinadas pelo Aparelho Digital. Essa pesquisa elege como material específico de análise uma sequência de cursos oferecidos pelo “YouTube Academy” para a criação, gerenciamento e divulgação de uma empresa associada à plataforma de vídeos do YouTube. O objetivo é investigar os modos de imbricação e/ou separação entre o sujeito e a empresa. Para construir os procedimentos analíticos, delimitamos as seguintes perguntas: Como as formas imaginárias do sujeito (o “eu”, a identidade e a individualidade) estão relacionadas com a criação e o funcionamento de uma empresa no YouTube? Como o trabalho e as relações de trabalho são significados nessa discursividade? O olhar discursivo é ainda guiado por compreensões de pesquisas anteriores: o modo como o “eu” é discursivizado em produto, o funcionamento da “empresa de si” como modelo de identificação e a empresarialidade. As referências passam por Michel Pêcheux, Eni Orlandi, Suzy Lagazzi, Luciana Nogueira, Guilherme Adorno, Joel Bombardelli, Pierre Dardot, Christian Laval e Ricardo Antunes. O conceito de político, compreendido discursivamente como conflito e disputa pelos sentidos - e seus efeitos de deslocamento, assim como o apagamento do político do lugar que lhe seria próprio - e o conceito de exterioridade discursiva são mais enfaticamente mobilizados na pesquisa, além das discussões em torno do discurso neoliberal e da psicologização do sujeito pelos efeitos discursivos de liberdade e autonomia. Um trabalho de análise da constituição da discursividade que tem o “sentido (já) lá” como resultado do efeito de exterioridade. Esperamos mostrar, assim, como, nas condições de produção sócio-históricas de um “Imperialismo Digital”, uma mudança da “economia política do poder-dizer” afeta os modos de circulação não só dos discursos, mas do próprio Capital.