SOCIOLOGIA DO TRABALHO: O CONCEITO DO TRABALHO DA ANTIGUIDADE AO SÉCULO XVI -/- SOCIOLOGY OF WORK: THE CONCEPT OF WORK OF ANTIQUITY FROM TO THE XVI CENTURY -/- RESUMO -/- Ao longo da história da humanidade, o trabalho figurou-se em distintas posições na sociedade. Na Grécia antiga era um assunto pouco, ou quase nada, discutido entre os cidadãos. Pensadores renomados de tal época, como Platão e Aristóteles, deixaram a discussão do trabalho para um último plano. Após várias transformações sociais entre (...) diferentes eras e povos, o trabalho foi ganhando espaço nos debates entre os povos, como os caldeus, hebreus e romanos. O trabalho conferiu-se no escopo da discussão social. Na Idade Média, com Agostinho, Santo Aquino e outros o labor foi concebido como algo benéfico e divino. O que se via como algo “escravo” ao povo, transformou-se em necessidade e benevolência divina. -/- Palavras-chave: Conceito; Trabalho; História; Definição. -/- ABSTRACT -/- Throughout the history of mankind, work has figured itself in different positions in society. In ancient Greece it was a little matter, or almost nothing, discussed among the citizens. Renowned thinkers of such a time, like Plato and Aristotle, left the discussion of the work for a last plan. After several social transformations between different eras and peoples, work was gaining space in the debates among peoples, such as the Chaldeans, Hebrews and Romans. The work has taken place within the scope of social discussion. In the Middle Ages, with Augustine, Saint Aquinas and others the work was conceived as something beneficial and divine. What was seen as something “slave” to the people, became need and divine benevolence. -/- Keywords: Concept; Work; History; Definition. -/- BASES TEMÁTICAS DESSE TRABALHO -/- ➢ O trabalho é um conceito construído socialmente; -/- ➢ A modernidade trouxe consigo mudanças significativas quanto à valorização do trabalho; -/- ➢ A origem dos mercados de trabalho, juntamente com o surgimento do capitalismo, minimizou o trabalho como um mero emprego assalariado; -/- ➢ O trabalho, no entanto, apresenta múltiplas manifestações nas nossas sociedades. -/- 1. A VISÃO GREGA DE TRABALHO -/- Comecemos pelos gregos, uma civilização excitante que, durante muitos séculos antes de Cristo, já começava a elaborar riquíssimas reflexões sobre vários aspectos da vida humana. No entanto, surpreende aqueles de nós que já ler os primeiros filósofos gregos, como entre tantas análises rigorosas e “diálogos”, um elemento tão central na vida social dos povos, como o trabalho havia tido escassa repercussão. A explicação só faz sentido, justamente, ao analisar a valorização que esses grandes pensadores tinham acerca do nosso objeto de estudo que é o trabalho. Embora, como supracitado, os gregos não tivessem uma visão unânime sobre o trabalho, não é menos certo assinalar que para esta civilização o trabalho foi considerado um fato altamente desvalorizado. O trabalho, para eles, dado a sua vinculação com a dimensão de constrangimento e necessidades, limitava a liberdade dos indivíduos, condição indispensável para integrar o mundo da “pólis” na qualidade de cidadão. O homem livre realizava atividades absolutamente desinteressadas: a atividade intelectual (que não era considerada trabalho) fazia parte do ócio e da contemplação. O trabalho, reservado apenas aos escravos, como bem sinala Hopenhayn (1955), significava uma mera função produtiva. Portanto, o escravo passou a ser unicamente uma força de trabalho. Como tal, ele não tem personalidade e pertence ao seu mestre, como uma coisa entre muitas. Como objeto de propriedade, escapa ao pensamento antropológico que domina a filosofia sofista e socrática, porque para o cidadão grego falar de escravo não implica um sujeito pensante, senão uma coisa ou, no máximo, a força. Também escapa ao pensamento platônico, porque, como uma coisa, parece totalmente desvalorizado na construção idealista-dualista da realidade (HOPENHAYN, 1988. p. 23 – Tradução própria). -/- Três termos fundamentais que devemos recordar da tradição grega: -/- 1 – Ponos: penalidade, fadiga; -/- 2 – Banausia: trabalho mecânico, e -/- 3 – Ergon: realização. -/- Vejamos como essa noção de trabalho é construída como algo servil (ponos), ao qual uma visão positiva de lazer e contemplação foram contrastadas como uma atividade puramente humana e libertadora. As raízes do supracitado são encontradas no valor eticamente supremo da autarquia socrática. Segundo essa noção alcunhada por Sócrates (469-399 a.C.), todo aquele que trabalha está submetido tanto à matéria como aos homens para quem trabalha. Nessa medida, sua vida carece de autonomia e, portanto, de valor moral. Naturalmente, não só os escravos, mas também qualquer trabalhador dedicado a todos os tipos de tarefas manuais, foram desprezados por um pensamento helênico indubitavelmente aristocrático. Para Platão (427-347 a.C.), de origem aristocrática, descendente do último rei de Atenas e discípulo de Sócrates, a autarquia continua a ser perpetrada como um valor ético supremo e, em consonância com os interesses da aristocracia fundiária, afirmava que somente a agricultura evocava autêntica autonomia. Dessa forma, o pensamento platônico restringiu a participação política a escravos, comerciantes e artesãos. Todos eles têm em comum a dependência das condições materiais em que produzem e trocam mercadorias. O plano político estará intimamente relacionado ao econômico-trabalhista: somente quem é capaz de governar a si mesmo (e como sabemos, acontece com aqueles que não trabalham ou possuem terras), pode governar os outros. Somente a liberação total da prática mundana do trabalho abre as possibilidades de dedicar-se, como fez Platão, à contemplação (σχολή), à filosofia e às ciências, e por meio disso saber distinguir o bem do mal, o justo do injusto, o verdadeiro do falso. Quem poderia dedicar-se a tais “tarefas nobres”? Evidentemente, aqueles que não precisam fazer parte da população trabalhadora, isto é, a aristocracia. Esse sistema de governo aristocrático foi defendido, obviamente, por Platão. Em sua “A República” sinala que o governo perfeito é o aristocrático, e que a este se sucedem a timocracia (governo dos guerreiros), a oligarquia (dos ricos) e a democracia (“governo daqueles que amam o prazer, a mudança e a liberdade), que perece por seus excessos nas mãos de alguns homem audaz que se coloca à frente do povo para defender a democracia e “do tronco desses protetores do povo nasce o tirano”, dando origem à tirania.(2) Em seu diálogo “Político” podemos ler: Aqueles que possuem a si mesmos através da compra, e aqueles que podem ser chamados sem nenhuma discussão de escravos, não participam da arte real [...] E todos aqueles que são livres, se dedicam espontaneamente a atividades servis como as supracitadas, transportando e trocando produtos da agricultura e de outras artes; que nos mercados, indo de cidade em cidade por mar e terra, trocando dinheiro por outras coisas ou por dinheiro, o que chamamos de banqueiros, comerciantes, marinheiros e revendedores, poderão, por acaso, reivindicar para eles algo da ciência política? [...], mas também aqueles que estão dispostos a prestar serviços a todos por salários ou por subsídios, nunca os encontramos participantes na arte de governar [...] Como os chamaremos? Como você acabou de dizer agora: servidores, mas não governantes dos estados (PLATÃO, 1983. pp. 237-8 – adaptado). Esse estado ideal que Platão projetou em seus ensinamentos estava longe, a propósito, da democracia ateniense defendida por Péricles. De certa forma, Platão só confiava em uma elite no poder constituída por uns poucos (oligarquia) que não deveriam se render às tarefas servis da produção e circulação das riquezas. Para ele, as crianças aristocráticas deveriam ser selecionadas desde a infância, recebendo uma educação suficiente tanto em filosofia quanto nas “artes da guerra”. Aos trinta anos, eles já seriam capazes de passar por um exame donde seriam selecionados os “filósofos-reis” encarregados do governo. De fato, no entanto, suas concepções de governo nunca poderiam ser executadas com pureza; ou pela chamada “contrarrevolução aristocrática”, ou pela invasão estrangeira subsequente. Essa visão do trabalho que estamos a analisar, como bem sinala Henri Arvon (1914- 1992), conduz a uma sociedade basicamente conservadora e estancada no produtivo. (3) A ideia de liberdade, ócio e contemplação como valores superiores, propõe um desprezo pelo trabalho que, como vimos, é uma atividade puramente transformadora. Há aqueles que, mediante tal contestação, arriscam fundamentar que grande parte do subdesenvolvimento tecnológico na Grécia derive justamente a essa cultura tão peculiar em relação ao trabalho. Caso contrário, se houvesse escravos, por que avançar em conhecimentos que facilitaram o trabalho? Não nos surpreende, nesse sentido, que uma civilização capaz de criar conhecimentos espetaculares em áreas particularmente complexas como a geometria (Euclides), por outro lado, não soubesse (ou não gostaria) de avançar em conhecimentos técnicos aplicáveis ao campo econômico-trabalhista. Já vimos como a cidadania era o escopo da de alguns aristocratas da civilização helênica. Hannah Arendt (1906-1975) sinalava que os gregos distinguiam entre os escravos, os inimigos vencidos (dmôes ou douloi) que estavam encarregados do trabalho doméstico, e os demiourgoi, homens livres para se deslocarem do domínio privado para o público. Somente depois do século V, sinala Arendt, a pólis começou a classificar as ocupações de acordo com os esforços que eles exigiam. Nisso, Aristóteles (384-322 a.C.) teve que desempenhar um papel preponderante que colocou aqueles cujo “corpo está mais deformado” na faixa mais baixa. Ele não admitiria, portanto, aos estrangeiros (os escravos), nem tampouco aos banausoi, antes dos demiourgoi, trabalhadores e artesãos que deviam resignar-se ao mundo dos “oikos”. Estes, não só estavam submetidos à necessidade como eram incapazes de ser livres, mas também incapazes de governar a parte “animal” do seu ser (República, 590). Serão eles, não obstante, aqueles que permitem o florescimento da chamada democracia helênica, pois, quem senão os trabalhadores (escravos ou artesãos) poderia manter com seu esforço o ócio e a contemplação dos “homens livres”, cidadãos do mundo? Como foi supracitado, será Aristóteles quem delimitará ainda mais os direitos de cidadania. Sua cidade ideal, como em Platão, diferenciaria os governantes dos governados. O primeiro, constituído pela classe militar, estadistas, magistrados e sacerdócio. O segundo, pelos agricultores, artesãos e os camponeses. Com os comerciantes há uma certa ambivalência: embora ele considerava uma ocupação antinatural, estava disposto a admiti-los até certo ponto em sua cidade ideal, cuja base seguiria sendo a escravidão. Em sua Política, ele explana: A cidade mais perfeita não fará do trabalhador manual (artesão) um cidadão. Caso o admitir como tal, a definição de virtude cívica [...] não alcança todos os cidadãos, nem apenas os homens livres, mas só os que estão isentos de trabalhos indispensáveis à sobrevivência. Destes, os que estão a serviço de um só indivíduo, são escravos; os que servem a comunidade, são trabalhadores manuais (artesãos) ou trabalhadores não qualificados (ARISTÓTELES, 1998. p. 203). Tampouco compreenderá os agricultores como reivindicava Platão: “Tampouco deverão ser agricultores os futuros cidadãos, pois para a formação de sua virtude e para a atividade política, o ócio é necessário”. Essa prolifera discussão ocorreu em uma civilização onde começaram a surgir as primeiras mudanças produtivas derivadas do crescimento econômico feito do descobrimento do ferro, e sua posterior divisão do trabalho, onde florescem os grupos de comerciantes e a aristocracia proprietária de terras começa a dominar. Os pensadores da época, mais aliados a estes últimos, contrariavam os princípios da acumulação comercial. Em sua Política, Aristóteles aconselha os cidadãos a absterem-se de qualquer profissão mecânica e de toda especulação mercantil. O primeiro, porque limita intelectualmente, e o segundo, porque degrada o ético. Somente o ócio (scholé), para esses pensadores, permite a virtuosidade e a capacidade de julgar. A Koinonia politiké (comunidade dos homens livres) era típica daqueles que não precisavam de trabalho, relegando a população trabalhadora ao mero âmbito da reprodução material (chrematistiké), o que só era possível em um contexto de alta divisão do trabalho onde um grupo minoritário (oligarquia) vivia à custa do trabalho da maioria (muitos deles escravos). O termo “ócio” provém de “scholé”, entendido entre os gregos como tempo para si mesmo, para a contemplação (sjolé) e, portanto, para a formação (scholé = escola). Desse ponto de vista, o ócio para os gregos é um fim em si mesmo. Entre os romanos, no entanto, adquire outra conotação. Em latim octium, designa o campo contraposto ao neo-octium (negócio), ou seja, é o tempo de descanso que permite dedicar-se ao negócio. Tal visão sobre o trabalho e o ócio, respectivamente, não foi, no entanto, como supracitado no início, unanimemente desenvolvida em toda a história da civilização helênica. Os textos de Homero(4) (séculos IX e VIII a.C.) são mais reservados a respeito, mas acima de tudo, na Grécia antiga encontramos autores como Hesíodo (século VIII), que postulavam outras teses. Para o autor de “Os trabalhos e os dias”, o trabalho se constituía em um justo e necessário castigo que Zeus impôs aos homens pelo pecado de Prometeu. Note a similitude com a crença bíblica que veremos adiante. Hesíodo explana: Lembre-se sempre do meu conselho e trabalhe [...] os deuses e os homens se indignam com quem ocioso vive, semelhante em caráter aos zangões sem ferrão, que consomem o esforço das abelhas [...] O trabalho não é nenhuma desonra; desonra é não trabalhar (HESÍODO, 2012. p. 93 e 95). Também entre alguns sofistas (aqueles que vendiam sua sabedoria a quem gostaria de comprá-la), como Protágoras (século V a.C.), “o primeiro e o maior deles”(5), coloca o estudo e a arte (técnica) na mesma faixa, e Antifonte (século V a.C.) disse: “[...] e as honras e preços, e toda a espécie de encorajamento que Deus incumbiu aos homens, devem necessariamente resultar de fadiga e suor”. Como conviveu a cultura grega com essas noções tão diferentes? Tenho a ideia, juntamente com Hopenhayn, que o desprezo dos pensadores gregos pelo manual foi causado pela violência dos guerreiros e dos aristocratas de plantão, que impuseram aos seja derrotados o jugo. Do trabalho árduo e difícil. Porque a aristocracia queria trabalhar nessas condições? A própria divisão do trabalho em si possibilitou o crescimento da civilização helênica, estava gerando diferentes classes com visões distintas sobre o trabalho. Por outro lado, surgiram os camponeses pobres, os derrotados e aqueles que tinham que viver do trabalho artesanal. Essas pessoas, na maioria das vezes isoladas do mundo da “polis”, gerariam suas próprias leituras dos acontecimentos, seus próprios espaços para o desenvolvimento cultural, inclusive sua própria religião, distante daquela imposta pela visão aristocrática, olímpica, contemplativa e estética dos “homens livres”. -/- 2. A VISÃO DOS CALDEUS ACERCA DO TRABALHO -/- A leitura de outros povos e civilizações sobre este tema tem sido diferente. Entre os caldeus, por exemplo, a visão pejorativa analisada entre os gregos não é registrada. Nas escrituras sagradas da religião de Zaratustra (o Avesta), lemos: “É um santo aquele que constrói uma casa, na qual mantém o fogo, o gado, sua mulher, seus filhos, os bons párias. Aquele que faz a terra produzir trigo, que cultiva os frutos do campo, cultiva corretamente a pureza” (HOPENHAYN, 1988. p. 35). Para os caldeus, como se pode observar, o trabalho implica, de uma posição diametralmente oposta à helênica, uma contribuição na ordem econômica, mas também na espiritual. Trabalhar não é só “cultivar o trigo” (dimensão das necessidades fisiológicas), mas também “cultivar a pureza”, dimensão esta, relacionada com a satisfação das necessidades espirituais. Por que apreciamos uma diferença tão acentuada entre essas culturas? Provavelmente, os diferentes graus de desenvolvimento dos povos levaram a isso. Enquanto entre os gregos primava uma divisão do trabalho, onde alguns tinham o status de “homens livres” dedicados à contemplação e ao ócio, outros não tinham escolha a não ser trabalhar, em uma situação de domínio em relação às naturezas daqueles que o empregaram. Esse não foi o caso dos caldeus, que possuía um escasso dividido trabalho, em que a todos se correspondia uma atividade laboriosa. -/- 3. A VISÃO DOS HEBREUS SOBRE O TRABALHO -/- No meio do caminho entre os caldeus e os gregos, encontramos a avaliação do trabalho feita pelos hebreus, dessa vez, tingindo de ambivalências. Tal como ponderava Hesíodo entre os gregos, para os hebreus, o trabalho se constituía de um mal necessário; em um meio para expiar os pecados; dessa vez não de Prometeu, mas de Adão e Eva. Vamos ver, no entanto, alguns aspectos mais complexos. A primeira coisa a se notar da perspectiva hebraica (compartilhada com o cristianismo) é o que se resulta da leitura do livro de Gênesis, aquela história poética e cheia de imagens para elucidar facilmente a origem da criação. Lá se estabelece a ideia de um deus criador-trabalhador: “No princípio Deus criou o céu e a terra [...] No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou [...] de toda a obra que realizara na criação”.(7) Esse Deus como primeira causa (São Tomás de Aquino (1225-1274)) denota laboriosidade seu correspondente descanso, um binômio que será fundamental para compreender a evolução do direito do trabalho e do direito ao descanso semanal contemporâneo. Digamos, em segundo lugar, que o Senhor Deus providenciou o trabalho no Éden: “O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivá-lo”.(8) Portanto, não é certa a ideia de que o trabalho é o resultado do pecado: ao contrário, é um trabalho árduo aquele que deriva do pecado segundo a tradição hebraico-cristã. Antes, na ausência do pecado, havia uma espécie de bom trabalho. Foi o pecado original, que levou Deus a condenar Adão e Eva, e por isso a toda a humanidade, a “ganhar o pão com o suor da sua testa”. “Por isso o Senhor Deus o mandou embora do jardim do Éden para cultivar o solo do qual fora tirado”. (9) O Talmude diz: “Se o homem não encontra seu alimento como animais e pássaros, precisa ganhá-los, isso se deve ao pecado”. Essa sentença, de caráter histórico, promove a ideia de trabalho como meio para expiar o pecado original, mas também como meio para produzir; isto é, legitimando a mudança inerente a todo trabalho e, portanto, legitimando também aquela vontade transformadora que caracterizou desde sempre os povos hebreus.(10) Agora, ao contrário dos caldeus, para os hebreus da antiguidade, o trabalho nunca teve um fim ético em si mesmo, mas foi constituído apenas como um meio. Essa visão esteve sempre presente, e caracteriza muito claramente a concepção que muitos integrantes de nossas sociedades contemporâneas possuem sobre o trabalho, além da religião de cada um. -/- 4. OS ROMANOS E O TRABALHO -/- Os romanos, por sua vez, deram uma importante contribuição para o desenvolvimento do conceito de trabalho. Se bem que, a grosso modo, não houvesse grandes diferenças com o pensamento dos gregos, com quem eles tinham em comum, além disso, uma maior divisão do trabalho fruto do desenvolvimento econômico e o uso massivo de mão de obra escrava(11); a maior contribuição do ponto de vista de sua originalidade histórica estava presente na tradição jurídica que inauguraria o Império Romano. O maior impacto por meios jurídicos e não filosóficos é explicado pelo fato de que os romanos, ao contrário dos gregos, não conseguiram “inspirar” a produção de grandes pensadores sociais. Com efeito, para os romanos, como o escravo não era considerado uma pessoa, o viam-no desprovido de personalidade jurídica. Isso conduziu a negação da relação de trabalho entre a pessoa encarregada de um trabalho manual (escravo) e seu dono. Tal relação correspondia, acima de tudo, ao direito de propriedade que os juristas romanos haviam garantido quase sem limites para seus cidadãos. O problema, como aponta Hopenhayn, surgiu quando o proprietário não ocupa seu escravo, mas aluga-o para terceiros. Surge assim a figura do arrendamento de serviços, que deriva do arrendamento das coisas. Porém, como na realidade o que se alugava era a força de trabalho, a qualidade jurídica desloca-se para a atividade realizada pelo escravo. Dessa forma, a atividade do trabalhador, primeiro do escravo, posteriormente do homem livre, começa a ser tratada como uma coisa, e se converte em antecedente do arrendamento de serviços do Direito Civil moderno. Ademais, na tradição romana, o trabalho manual estava desprestigiado. Cícero (106-43 a.C.) em De Officiis, estabeleceu com fria claridade “ipsa merces est auctoramentum servitius”(12) (todo trabalho assalariado é trabalho escravo). A vida era difícil para esses trabalhadores: nos territórios sob domínio romano, Augusto (63-14 a.C.) tinha imposto um tributo à todos os homens que exerciam algum tipo de trabalho manual, além do imposto à residência, às valas e outros mais particulares como o imposto para a detenção de porcos. Certamente, aqueles que levaram a pior parte no tempo da Roma Imperial foram os escravos (servi) sob domínio e propriedade de seus donos (domini). Me seus tempos de auge, a demanda de escravos em Roma era de 500.000 ao ano. Se compararmos com os 60.000 escravos negros trazidos a América nos anos de maior tráfico, teremos uma ideia mais ou menos exata da magnitude desse triste fenômeno. -/- 5. O CRISTIANISMO E O TRABALHO -/- As mensagens do cristianismo primitivo, são inseridas logo, nesse tempo histórico, onde Roma se tornava o centro das maiores mobilizações de rebeldia da antiguidade. Isaías, nesse sentido, proclamaria que o Messias viria: “[...] a pregar boas novas aos abatidos, a vendar aos quebrantados de coração, a publicar liberdade aos cativos, e aos presos a abertura do cárcere”.(13) Jesus, efetivamente, incluiu em sua missão, mensagens de libertação aos pobres e oprimidos. Porém, ao contrário do supracitado, como bem sinala Eric Roll (1907-2005), dos antigos profetas hebreus, não o faria saudando as comunidades tribais com seu espírito de grupo; mas animado por uma mensagem mais universal e permanente, proclamando uma mudança mais completa e integral na conduta do homem em sociedade, onde os valores de justiça e amor se colocariam em um primeiro plano. Evidentemente, a mensagem do cristianismo primitivo, e mais concretamente de Cristo, distava muito dos filósofos gregos. Deixemos que Roll explique: Temos visto que as doutrinas econômicas de Platão e, em certa medida, de Aristóteles, nasciam da aversão aristocrática ao desenvolvimento do comercialismo e da democracia. Seus ataques contra os males que acarreta o afã de acumular as riquezas são reacionárias: olham para trás, e o de Cristo olha para frente, pois exige uma mudança total, mas relações humanas. Aqueles sonhavam com um estado ideal destinado a proporcionar a “boa vida” para os cidadãos livres unicamente e cujas fronteiras eram as da cidade-estado daquele tempo; Cristo pretendeu falar por todos e para todos os homens. Platão e Aristóteles haviam justificado a escravidão; os ensinamentos de Cristo sobre a fraternidade entre todos os homens e o amor universal eram incompatíveis com a ideia da escravidão, apesar das opiniões expostas depois por São Tomás de Aquino. Os filósofos gregos, interessados somente pelos cidadãos, sustentaram opiniões muito rígidas sobre a diferente dignidade das classes de trabalho, e consideravam as ocupações servis, com exceção da agricultura, como próprias apenas para os escravos. Cristo, ao dirigir-se aos trabalhadores de seu tempo, proclamou pela primeira vez a dignidade de todas as classes de trabalho, assim materiais como espirituais (1942. p. 42 – Tradução própria). Não pode escapar desse estudo, o fato de que o próprio Jesus Cristo herdou o ofício de carpinteiro de seu “Pai” José; e que escolheu seus discípulos entre os pescadores e artesãos da região. Essa visão primitiva do cristianismo, no entanto, deve ser analisada no quadro das escrituras sagradas do Antigo Testamento que compartilha com a cultura (e obviamente a religião) hebraica. Nesse sentido, o trabalho não deixa de ser um meio, descartando-se como um fim em si mesmo. Mas, agora atribuindo-lhe um novo valor, sempre em tento um meio para um fim virtuoso: o trabalho será fundamental para permitir a satisfação das necessidades de cada um, mas também seus frutos, deverão ser inseridos em uma dimensão comunitária, onde o “próximo” necessitado esperará a contribuição fraterna e solidária do cristão. O trabalho, nessa perspectiva, não só possibilita o “tomar”, mas também o “dar”. Em relação a dupla perspectiva, é onde podemos entender a crítica do cristianismo a acumulação da riqueza. Como aponta o evangelista Mateus, “acumular o tesouro no céu, onde nem a traça nem a ferrugem os consomem, e onde os ladrões não perfuram nem roubam. Onde está o seu tesouro está seu coração”. (14) Com São Paulo se incorpora um novo componente valioso: a obrigatoriedade moral do trabalho. Em sua carta aos Tessalonicenses dita claramente “ao que não trabalha que não coma”. Diz São Paulo: Vocês sabem em que forma têm que nos imitar: nós trabalhamos enquanto estivemos entre vocês, não pedimos a ninguém um pão que não teríamos ganhado, senão que, de noite e dia, trabalhamos duramente até nos cansarmos, para não ser carga para nenhum de vocês [...] Além disso, quando estávamos com vocês lhes demos está regra: se alguém não quiser trabalhar, não coma. Mas agora ouvimos que há entre vocês alguns que vivem sem nenhuma disciplina e não fazem nada, muito ocupados em meter-se em tudo. A estes lhes mandamos e lhes rogamos, por Cristo Jesus, nosso Senhor, que trabalhem tranquilos para ganhar a vida (II Tes. 3:10). Essa frase, entendida somente no contexto de uma sociedade donde não existia um conceito de desemprego tal como entendemos atualmente, é curiosamente reproduzida pelo modelo soviético em pleno século XX. Com efeito, a Constituição da União Soviética estabeleceu em seu Artigo 12: “O trabalho é, na Rússia, uma questão de dever e de honra para todo cidadão fisicamente capaz. Essa obrigação é baseada no princípio: “quem não trabalha não come”. (15)(16) Para São Paulo, o trabalho deve ser o meio para ganhar a vida. Ele quis ser exemplo e enquanto pregava continuava trabalhando, presumivelmente como tecelão de tendas. A obrigatoriedade moral se aplica na medida em que a pessoa está em condições de o fazer. Para os incapacitados a fazê-lo (idosos, crianças, deficientes, doentes, acidentados etc.) existia a obrigatoriedade do socorro segundo a máxima do amor (ágape) ao próximo. Essas sentenças morais têm hoje em dia uma importante quota de explicação para com as contemporâneas políticas sociais. -/- 6. O TRABALHO NA IDADE MÉDIA -/- A Idade Média, período que ocupa desde o crepúsculo do Império Romano do Ocidente no século V pelos bárbaros, até o século XV, com a queda de Constantinopla, evidentemente mostra um conjunto importante de escolas e pensadores que marcaram pautas importantes para discernir o valor do trabalho nas diferentes culturas. A organização econômica mais visível nestes mil anos, onde operou o trabalho, consistia em extensões grandes de latifúndios errados do Império Romano (o sistema econômico denominado feudalismo), onde (mediante a falta de escravos) recorreu-se à mão de obra camponesa para o trabalho. O sistema, implicava o arrendamento de parte dessas terras a ex-escravos ou homens livres, em troca de uma renda em dinheiro e espécies, além do cultivo das próprias terras senhoriais. Por certo, a figura do servo não distava muito da do escravo se tivermos em conta as condições de funcionamento do contrato de trabalho. O comércio também teve seu lugar no sistema feudal, o mesmo adquiriu grande importância em certas regiões ou lugares, à exemplo de Constantinopla. A atividade econômica seguia seu rumo na história, e depois dos séculos IX e X, o crescimento das forças produtivas deu lugar a uma maior acumulação por parte de componentes e artesãos e, por certo, a uma maior apropriação de excedentes por parte do Senhor feudal. Essa situação foi ativante para a construção dos primeiros Burgos ou cidades, onde o comércio e a indústria artesanal teriam um marco mais adequado para o seu desenvolvimento. Essa é a etapa do nascimento dos primeiros grêmios corporativos (17). Então para o século XII, a estrutura feudal começa a desmoronar porque a produção de determinados bens começa a ser mais eficiente em cidades e não no feudo. O dinheiro, então, passou a ganhar maior peso que a terra, o que obriga os senhores feudais a aumentar seus rendimentos. Isso leva a um empobrecimento lógico dos camponeses, o que não dura muito, porque na primeira metade do século XIV, a maior parte dos servos alcança sua liberdade. Por sua vez, nessa apertada síntese da história econômica da Idade Média, devemos assinalar que pelo século XIV, e depois das Cruzadas e o posterior desenvolvimento do comércio internacional entre os impérios arábico e bizantino, inaugura-se uma etapa pré-capitalista que durará três séculos. É lá que se levanta mais energética a voz de alguns homens da Igreja contra a tendência à exaltação da riqueza já começava a avivar-se na Europa. São Tomás de Aquino, nesse sentido, não considerará ao comércio pré-capitalista bom ou natural. No entanto, ele o julgava inevitável uma vez que era o meio ao qual o comerciante tinha que manter a sua família. Dessa forma, os lucros do comércio não era outra coisa senão o fruto do trabalho. Se tratava, então, de colocar o acento na justiça da mudança efetuada, para o qual Aquino recorre a Aristóteles, cuja análise sobre o valor de mudança é figurado no seu estudo da Justiça. Muitos padres da Igreja, desde então, pretenderam formular um conceito de “preço justo”. Nesse sentido, o Cristianismo apresenta uma evolução do seu pensamento sobre o comércio que partia de uma visão absolutamente contrária ao começo da Idade Média (Santo Agostinho (354-430), São Jerônimo (347-420) etc.), a outra mais transacionável, que acompanhou, sobretudo, o pensamento de Aquino. Algo similar ocorreu com outro dos “preceitos” da Igreja em matéria econômica: a usura. Esta era considerada pela igreja como a melhor forma de obter lucro. O mesmo evangelista Lucas (século I d.C.) foi categórico ao rejeitar essa linha de operações. A lei hebraica também fez isso, e podemos encontrar no livro do Êxodo (22,25) tal proibição a respeito. Mais atrás no tempo, há antecedentes de condenação à usura entre os hindus (Rigveda, cerca de 1500 a.C.) e budistas (século VI d.C.), além do Islã mais próximo do nosso tempo (século VI d.C.). Ao princípio da Idade Média, como testemunha Roll, a proibição somente alcançava a Igreja, já que o escasso desenvolvimento mercantil não merecia outra coisa. No final da Idade Média, no entanto, que a situação é outra; e a prática secular foi orientada no sentido de promover o empréstimo de dinheiro cobrando por isso um juro. Alarmada ante esses fatos, a Igreja condena mais uma vez a usura no Terceiro Concílio de Latrão de 1179. No mesmo escreveu e ensinou São Tomé (século I d.C.) e outros discípulos da Igreja. No entanto, as práticas econômicas foram minando a autoridade eclesial e está terminou, através de sucessivas etapas, por aceitar, em certas condições e sob certas circunstâncias, a cobrança de juros sobre a concessão de um empréstimo. Em tal sentido, um dos autores mais representativos só início da Idade Média foi Santo Agostinho. Foi este um dos pilares, em seu tempo, das noções “anticapitalistas” que foram seguidas e complementadas por homens do tamanho de São João (347-407), São Ambrósio (340-397), São Clemente (150-215), São Cipriano (200-258) entre outros. (18) Santo Agostinho valoriza o trabalho recordando em tal sentido a São Paulo, a que cita com muita frequência em seus textos. Segundo o Bispo de Hipona, todo trabalho manual é bom pelas razões dadas pelo cristianismo primitivo. Concilia, além disso, seu dualismo platônico, ao sustentar que enquanto o homem trabalha tem a alma livre, de modo que é perfeitamente compatível pensar em Deus ao mesmo tempo em que se trabalha. Essa particular sintonia entre o trabalho e a oração foi perfeitamente posta a prova pelos monges beneditinos, cujo lema “Ora Et Labora” (orar e trabalhar) é paradigmático. “Trabalha e não desesperes” dizia seu fundador, São Bento de Núrsia (480-547), de seus monastérios distribuídos em um primeiro momento a Subiaco, no início do século VI. Também corresponde a São Bento uma sentença que perdura até o dia de hoje no imaginário moral sobre o trabalho: “Otiositas inimica est animae” (a ociosidade é inimiga da alma), tal qual diz uma expressão popular castelhana: “el ocio es la madre de todos los vicios” (o ócio é a mãe de todos os vícios). Tomás de Aquino, alguns séculos depois, continua a reflexão sobre o trabalho e estabelece uma hierarquia de profissões, onde localiza o trabalho agrícola e artesanal acima do comercial. Uma quota de originalidade na história do pensamento sobre o trabalho consistiu em considerá-lo como uma obrigação somente se necessário para subsistir; ou dito de outra maneira: quem não tem necessidade de trabalhar não tem que fazê-lo. Isso sim, à falta de trabalho, devia dedicar-se à oração e contemplação divina, atividades por certo mais elevadas para o autor da Suma Teológica. Logo, considerará que Deus é a causa primária, a que tudo deve a sua existência; por derivação, o homem é causa segunda, procurando atreves do trabalho “criar” em suas dimensões humanas. “Entre todas as formas com que a criatura humana tenta realizar a semelhança divina, não há outra de relevo mais destacado que a de trabalhar, isto é, ser em o mundo causa novos efeitos”, disse o Santo. (19) Aquino, além disso, utilizando categorias platônicas, hierarquiza o trabalho, considerando o intelectual acima do manual. Chama “artes servis” a estes últimos, enquanto que o trabalho intelectual corresponde ao conjunto das “artes liberais”, dignas de maior remuneração ao fazer uso da inteligência. Esta distinção própria da Escolástica, dá lugar à divisão clássica entre as 7 artes liberais: o Trívium (gramática, retórica e dialética) e quadrivium (astronomia, geometria, aritmética e música). Outras contribuições de São Aquino têm a ver com sua posição diante do trabalho agrícola ao qual o considera como o melhor meio para assegurar a subsistência de um povo; a maior importância dada à vida contemplativa sobre a ativa, embora considerando a primeira como “laboriosa”; sua posição sobre a escravidão, que não considerava como natural, no entanto, entendê-la “útil”(20); e sua interpretação sobre o contrato de trabalho: neste, o operário não vende a si mesmo, nem seu corpo, nem sua inteligência, nem sequer sua faculdade de trabalho. Isso significa que o Direito Natural proíbe considerar o trabalho como um objeto de mudança. Propõe, em vez disso, considerar o contrato como um arrendamento de serviço. Em termos gerais, a valorização que sobre o trabalho se realiza na Idade Média, rebaixando ao trabalho manual em relação a outras tarefas, fica explícita na divisão tripartida que recorre, entre outros, Adalberão Bispo de Laon (947-1030): “Triplex Dei ergo domus est quae Creditor uma nunca oran, alii pugnat, Aliique laborant” (ternária é a casa do Senhor e não uma: aqui sobre a terra uns oram, outros lutam e outros trabalham). Não gostaria de deixar passar por alto, finalmente, entre os movimentos originados na Idade Média, a contribuição que sobre o tema do trabalho teve a ordem franciscana. Essa, contra o que muitos podem crer, é uma ordem não mendicante no sentido estrito, mas sim trabalhadora e de pobreza. São Francisco de Assis (1181/82-1226), no final do século XII, marcaria como ninguém dentro do cristianismo, uma vida ascética baseada no trabalho e na pobreza. Inclui, além disso, um elemento pela primeira vez descoberto na cultura europeia: o sentido da alegria que acompanha o trabalho. “Essa condição de 'suor de sua testa' com 'a alegria de seu coração' outorga ao trabalho uma condição diferenciada”. Avançando então na história da humanidade, entramos na época moderna, caracterizada por cinco grandes eventos: -/- 1. A decadência do poder moral da Igreja e o enfraquecimento de seu poder econômico frente ao da crescente burguesia; -/- 2. O renascimento intelectual e artístico; -/- 3. As viagens paras as índias e a descoberta da América; -/- 4. A formação e a constituição dos Estados-nação; -/- 5. As reformas religiosas de Lutero (1483-1546) e Calvino (1509-1564). -/- Nesse contexto, os séculos XV e XVI mostraram como o mercantilismo ia avançando apesar dos esforços de alguns pensadores da Igreja que eventualmente perderam o pulso diante do desenrolar dos acontecimentos. Sucessivas encíclicas papais terminaram por legitimar o interesse nos empréstimos e, por meio desta, levou-se a maior acumulação de riquezas por parte dos banqueiros. Esse foi o meio ideal para o desenvolvimento da atividade do mercador, para quem, o trabalho passou a ser considerado um meio para obter sucesso. Ao dinamizar-se a atividade econômica e mercantil, a visão humanista do trabalho começa a perder valor, realçando-se ao mesmo como um simples meio para fins de enriquecimento. Talvez a exceção a essa noção estendida entre os novos atores tenha sido a proporcionada pelo humanismo renascentista. Para Campanella (1568-1639), por exemplo, sua “Cidade solar”, não existe o divórcio entre trabalho manual e intelectual, isso quando o segundo começa a ser supervalorizado por sua ação no plano das invenções e das novas técnicas.(22) Na mesma linha se situa Thomas More (1478-1535), o autor de “Utopia”, outra reação do cristianismo às projeções que estava adquirindo o cada vez mais influente mercantilismo. Embora o trabalho não seja considerado como um mau, pelo contrário, apresenta características humanizadoras, é sugestivo comprovar como em Utopia a jornada do trabalho não supera as seis horas diárias e na Cidade solar não se devia trabalhar mais que quatro horas. Indubitavelmente, essas versões de sociedades ideais terminariam por impactar sobre maneira a constituição das Missões Jesuítas na América do Sul; e as Franciscanas na Baixa Califórnia. É o Renascimento, o lugar propício, além disso, para renovar o conceito da virtuosidade, agora traduzida na figura do empresário ou financista audacioso e empreendedor. Essa linha foi reforçada logo por Calvino, para quem os negócios são um bom serviço a Deus, e a riqueza não é mais que um fruto de uma vida dedicada ao trabalho desde uma perspectiva ética que analisarei com Weber mais tarde, mas que confere ao trabalho a particularidade de ser um caminho para o sucesso. Esse puritanismo impulsionou sobremaneira a versão do “homo economicus” que mais tarde, em pleno auge do capitalismo pós-industrial, ao qual, segundo Daniel Bell (1919-2011), fora substituído pelos valores hedonistas. -/- REFERENCIAL TEÓRICO AGOSTINHO. Cidade de Deus: contra os pagãos. Trad. O. P. Leme. 2ª ed. Bragança Paulista: Editora Universitária, 2008. (Col. Pensamento humano). _____________. O livre-arbítrio. Trad. N. A. Oliveira. 1ª ed. São Paulo: Paulus, 1995. AQUINO, T. de. Suma Teológica. 2ª ed. 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-/- FILOSOFIA: CRÍTICA À METAFÍSICA -/- PHILOSOPHY: CRITICISM TO METAPHYSICS -/- Por: Emanuel Isaque Cordeiro da Silva - UFRPE Alana Thaís Mayza da Silva - CAP-UFPE RESUMO: A Metafísica (do grego: Μεταφυσική) é uma área inerente à Filosofia, dito isto, é uma esfera que compreende o mundo e os seres humanos sob uma fundamentação suprassensível da realidade, bem como goza de fundamentação ontológica e teológica para explicação dos dilemas do nosso mundo. Logo, não goza da experiência e explicação (...) científica com base na matemática, ciências, observação, análise, etc. e sim da explicação apenas teorética sem a análise empírica. Por fim, filósofos de divergentes escolas e eras da história da filosofia fundamentaram suas críticas quanto a Metafísica; e este breve trabalho tem como objetivo analisar as críticas dos filósofos e trazer uma conclusão clara e objetiva para os leitores, sejam leigos ou não. Palavras-chave: Metafísica. Crítica. Teoria. Suprassensível. Empírico. Experiência. ABSTRACT Metaphysics is an area inherent to philosophy, that is, it is a sphere that comprises the world and human beings under a supersensitive foundation of reality, as well as enjoying ontological and theological foundations for explaining the dilemmas of our world. Therefore, it does not enjoy the scientific experience and explanation based on mathematics, science, observation, analysis, etc., but only the theoretical explanation without empirical analysis. Finally, philosophers from divergent schools and eras in the history of philosophy based their criticism of Metaphysics, and this brief work aims to analyze the criticism of philosophers and bring a clear and objective conclusion to readers, whether lay or not. Keywords: Metaphysics. Criticism. Theory. Supersensitive. Empirical. Experience. INTRODUÇÃO Para uma fundamentação alicerçada na observação, análise e conclusões pragmáticas, é imprescindível aclarar o conceito de Metafísica como esfera inerente da Filosofia, bem como disciplina primordial para o currículo do Filósofo formado nas Universidades globais. Para isso, discorro acerca do conceito de Metafísica desde a alcunha aristotélica de 'Filosofia primeira', passando à análise modernista, em especial à kantiana e seu criticismo (Crítica da Metafísica é a alma desse trabalho), sob análise de autores didáticos e, por fim, sob a elucidação da esfera Metafísica mediante os dicionários de Filosofia de Japiassú e Marcondes, e de Nicola Abbagnano. No conjunto de obras aristotélicas entituladas de Metafísica, Aristóteles buscou elucidar 'o ser enquanto ser', isto é, buscar a objetividade das coisas e do mundo mediante a subjetividade e a realidade suprassensível dessas coisas. Logo, a explicação dos fenômenos que cercavam a Grécia clássica eram explicados além do alicerce das Ciências tradicionais da época (Física, Química, Biologia, etc.). Todavia, para Aristóteles, a Metafísica consiste na 'ciência primeira' no que se refere o fornecimento de um fundamento único para todas as demais ciências, ou seja, dar-lhes o objeto ao qual elas se referem e os princípios dos quais todas elas dependem. Por fim, a Metafísica implica ser uma enciclopédia das ciências um inventário completo e exaustivo de todas as ciências, em suas relações de coordenação e subordinação, nas tarefas e nos limites atribuídos a cada uma, de modo definitivo. Na modernidade, a Metafísica perde a centralidade do mundo da Filosofia, quem é o precursor de tal declínio é Immanuel Kant e seu criticismo. Tal descendência é elucidada e aclarada posteriormente no presente trabalho. A Metafísica moderna ganha uma nova interpretação, sendo alcunhada e levada por analogia à Ontologia, expressada, segundo Kant, como conceito de gnosiologia. Para Kant, Metafísica é a fonte inerente do estudo e explicação das formas alicerçadas na razão, bem como fundamento de toda realidade suprassensível que se deve basear para elucidar e aclarar o mundo moderno. Ainda segundo o filósofo, a Metafísica é a fonte de todos os princípios reais para a explicação da realidade. Sendo ela, por fim um 'sistema filosófico' alicerçado sobre uma perspectiva ontológica, teológica e/ou suprassensível da realidade. No nosso finalismo, a inerência da Metafísica à filosofia transcende a explicação de todo o universo e sua totalidade (matéria e forma como alcunha Aristóteles). Logo, na Filosofia Clássica com Platão e, especialmente em Aristóteles, o Mito passou a ser ciência e essa ciência era determinada de Metafísica. Vale salientar que a alcunha 'Metafísica' foi, primeiramente, usada por Andrônico de Rodes . Por fim, a Metafísica primordial para fundamentar as explicações necessárias para os fenômenos que se decorrera na Grécia antiga, foi perdendo centralidade ao passo da história da filosofia e, na modernidade, com Hume e Kant passa por uma grande crise, discorrida agora no trabalho. -/- DA CRÍTICA À METAFÍSICA Platão criou um sistema metafísico de explicação da realidade e do mundo que influenciou muitos pensadores e religiosos. Boa parte da história da filosofia foi composta de sistemas metafísicos. Mas, se, por um lado, o pensamento metafísico tem uma vida longa e profícua, por outro, é alvo de críticas constantes, principalmente por filósofos modernos e contemporâneos, que questionam a validade das teses metafísicas, seja porque tratam de coisas que não podem ser conhecidas, como alma, Deus e formas inteligíveis, seja porque suas conclusões são consideradas enganosas. ARISTÓTELES E A FILOSOFIA PRIMEIRA As ciências teóricas ou teoréticas são aquelas que produzem um saber universal, válido em qualquer situação, e necessário, isto é, que não pode ser de outro modo. Essas ciências estão voltadas para a contemplação da verdade. O sábio que se dedica a elas encontra um fim em si mesmo, pois o resultado de sua investigação não gera nenhum objeto exterior, como uma construção ou uma escultura, mas beneficia sua própria alma. Elas estão organizadas em Metafísica, Matemática e Física, que inclui a Psicologia ou a ciência da alma. As principais obras teoréticas escritas por Aristóteles são Física, De anima e Metafísica. Filosofia Primeira, que chegou até nós com o nome de Metafísica, também chamada muitas vezes por Aristóteles de Teologia .com a ressalva de que Teologia aqui não tem o sentido que é dado a ela contemporaneamente), é a expressão que designava a mais elevada das ciências teoréticas, diferenciando-se da chamada Filosofia Segunda, ou Física. Aristóteles abre o Livro I da Metafísica com a célebre passagem: Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer das sensações, pois, fora até da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais que todas as outras, as visuais [...l. (ARISTÓTELES, 1969). A busca pelo conhecimento encontra-se na própria natureza humana, desde o nascimento, mesmo que se manifeste em seu grau mais rudimentar. Prova disso é o conhecimento por meio das sensações ou dos sentidos, entre os quais se destaca o da visão. É o chamado conhecimento por empiria ou saber empírico, que não pode ser ensinado porque é adquirido imediata e concretamente quando percebemos as coisas sensíveis. Também há um saber que vem da técnica. O técnico é aquele que tem o conhecimento dos meios para chegar a um fim. Como ensina o historiador da Filosofia, Julián Marias, apesar de o saber técnico ser superior ao saber empírico, ambos são necessários em nossa vida: 1..l Portanto, a tékhne [técnica) é superior à empeiria; mas esta também é necessária, por exemplo, para curar, porque o médico não tem de curar o homem, e sim Sócrates, e o homem apenas de modo mediato. (MARIAS, J. 2015). O conhecimento metafísico é menos necessário em nossa vida cotidiana, mas nenhum outro lhe é superior. A Metafísica é o conhecimento pelas causas e, como vimos, o conhecimento é científico quando ele nos dá os princípios e as causas das coisas. Para Aristóteles, tudo o que existe é efeito de uma causa e ela é a responsável por esse algo ser necessariamente de um jeito e não de outro. De acordo com Aristóteles, conhecer algo é conhecer pela causa. Dessa forma, a explicação de algo ou o seu conhecimento deve sempre dizer por que algo é necessariamente de determinado modo. Sem esse tipo de explicaçào, não pode haver propriamente conhecimento. Daí se constata o caráter rigoroso da explicação científica: ela não apenas sabe que "algo é isto", mas é capaz de explicar por que algo é necessariamente isto. A definição aristotélica de Metafísica Chauí indaga em seu livro Iniciação à Filosofia a questão central do que Aristóteles entende por sua alcunha ou Metafísica. Chauí explana: Embora Aristóteles admita que para cada tipo de Ser e suas essências existe uma ciência teorética própria (física, biologia, psicologia, matemática, astronomia), ele também defende a necessidade de uma ciência geral, mais ampla, mais universal, anterior a todas essas, cujo objeto não seja esse ou aquele tipo de Ser, essa ou aquela modalidade de essência, mas o Ser em geral, a essência em geral. Essa ciência, para Aristóteles, é a Filosofia Primeira ou metafísica, que investiga o que é a essência e aquilo que faz com que haja essências particulares diferenciadas, que estuda o Ser enquanto Ser. (CHAUÍ, 2010). O objeto investigado pela Metafísica também é muito diferente do objeto conhecido pelo saber empírico ou pelo saber técnico. O saber empírico nos faz conhecer as coisas particulares, como Sócrates, o Oráculo de Delfos e a caneta esferográfica; o saber técnico nos faz conhecer as diversas técnicas, como os procedimentos médicos e a engenharia de construir templos. O que o saber metafísico, então, nos permite conhecer? Segundo Aristóteles, a Metafisica estuda o ser enquanto ser. Não considera o ser de modo particular como fazem as demais ciências — por exemplo, ao investigar Sócrates, os procedimentos médicos etc. mas busca o que é universal, o que envolve tanto Sócrates quanto os procedimentos médicos, tanto o Oráculo de Delfos quanto a arte de construir templos. Segundo Aristóteles, a Metafísica trata das causas primeiras, que são as quatro seguintes: • a causa material, que é a matéria de que é feita alguma coisa. Em uma escultura, por exemplo, a causa material pode ser o bronze ou o mármore; • a causa formal, que é a forma ou a essência das coisas. No exemplo da escultura, é a forma ou a aparência que possibilita que a reconheçamos como uma escultura (e não como um poste, por exemplo); • a causa eficiente, que é o agente que produz a coisa. Uma escultura é produzida por um artista; • a causa final, que é a razão ou a finalidade das coisas, A finalidade da escultura é o prazer estético. A Metafísica também se ocupa da substância. A substância responde pelos significados do ser. Mas o que é a substância? Trata-se de uma questão complexa no pensamento aristotélico. Aristóteles recusa-se a entender a substância como sendo a forma platónica. Ela nào é o suprassensível. Seria entao a substância o sensível individual? As coisas são matéria e forma; amatéria é o substrato da coisa (por exemplo, o mármore é a matéria da estátua). Sem sua forma, ela é apenas potencialidade, mas sem a matéria qualquer realidade sensível se desvaneceria. Assim, a matéria pode ser dita substância em sentido impróprio. A forma, por seu turno, é aquilo que determina a matéria, é a sua essência; ela é substancia em sentido próprio. Mas a matéria é também matéria enformada. As coisas sensíveis são, a um só tempo, matéria e forma. E esse composto também pode ser legitimamente chamado de substância. Aristóteles apresenta três gêneros de substâncias: • as substâncias sensíveis, que nascem, morrem e, por isso, passam por todo tipo de mudança; • as substancias sensíveis e incorruptíveis, que não passam por nenhum tipo de mudança, como os planetas e as estrelas; • a substância suprassensível, que é superior às outras duas: o Primeiro Motor Imóvel, o deus aristotélico, causa de todo movimento, mas sendo ele mesmo imóvel. (Ele precisa ser imóvel porque se ele também se movesse precisaria haver uma causa para esse movimento, o que levaria a uma espécie de regressão ao infinito). Assim como o demiurgo de Platão, o deus aristotélico nao é um deus criador. Não criou o Universo nem gerou o movimento dos corpos. Ao contrário, o deus de Aristóteles exerce uma atraçáo sobre o Universo, motivando sua existência, e sobre os corpos, gerando seu movimento, ou seja, atrai tudo para si como objeto de amor. Não é, portanto, causa eficiente do mundo e do movimento do mundo, mas causa final. O deus aristotélico nao cria o mundo do nada por um ato de vontade. Ele nao é causa eficiente do mundo, como indicamos ser o artista causa eficiente de sua escultura. A METAFÍSICA CLÁSSICA OU MODERNA Grandes revoluções no pensamento do século XVII deram estopim à uma grande crise na esfera metafísica. De modo resumido a Metafísica sofreu uma grande transformação e uma nova elaboração, sem a fundamentação embasada no pensamento platônico, aristotélico ou neoplatônico. Sendo assim a nova metafísica é caracterizada por: [...] afirmação da incompatibilidade entre fé e razão, acarretando a separação de ambas, de sorte que a religião e a filosofia possam seguir caminhos próprios, mesmo que a segunda não esteja publicamente autorizada a expor ideias que contradigam as verdades ou dogmas da fé [...] [...] redefinição do conceito de Ser ou substância. Os modernos conservam a definição tradicional da substância como o Ser que existe em si e por si mesmo, que subsiste em si e por si mesmo. Porém, em lugar de considerar que a substância se define por gênero e espécie, havendo tantos tipos de substâncias quantos gêneros e espécies houver, passa-se a definir a substância levando em consideração seus predicados essenciais ou seus atributos essenciais, isto é, aquelas propriedades ou atributos sem os quais uma substância não é o que ela é. Após o supracitado, os cartesianos e Descartes dirão que há somente três substâncias essenciais, divergindo totalmente do pensamento aristotélico, as substâncias cartesianas são a Alma, a matéria dos corpos e Deus. Para empiristas, só se é possível conhecer a substância corpórea, logo não se é possível elaborar uma metafísica, e sim uma geometria ou uma física que se ocupa do estudo dessas matérias corpóreas. Baruch Spinoza (1632-1677) explanou a primordialidade de se elaborar uma definição genérica e universal, comumente aceita por toda a comunidade de filósofos de Aristóteles a modernidade. Podemos reduzir o conceito proposto da seguinte maneira: “substância é aquilo que existe em si e por si e não depende de outros para existir”.Logo, diz Espinosa, que há apenas uma substância no Universo que não depende de outra para existir, tal substância é o próprio Deus ou a natureza. Nessa revolução do pensamento filosófico, em peculiar à metafísica, houve também a redefinição do conceito de causa e causalidade. Em Aristóteles haviam quatro tipos de causas, agora, na modernidade, se propunha apenas dois tipos: a eficiente e a final. Chauí explana que a Causa eficiente é aquela na qual uma ação anterior determina como consequência necessária a produção de um efeito, e que seu alcance é universal na natureza. Causa final é aquela que determina, para os seres pensantes, a escolha da realização ou não realização de uma ação, e que só opera na ação de Deus e nas ações humanas. Houve também, nessa revolução, uma quebra do paradigma metafísico, isto é, a metafísica não se dividia mais entre a teologia, a psicologia racional e a cosmologia racional. Agora, a metafísica ganha um novo rumo, um rumo próprio de estudo embasado em suas próprias fundamentações. Logo, a metafísica se apropria de três e apenas três ideias de substância. A substância infinita, ou o próprio Deus. A substância pensante que é a consciência como faculdade de reflexão e de representação da realidade alicerçada na razão. E, por fim, a substância extensa que é a natureza embasada nos princípios e leis regidas pela matemática e a mecânica. DAVID HUME E A CRISE DA METAFÍSICA O filósofo escocês David Hume (1711-1776) nos ajuda a entender em parte o teor das críticas ao pensamento metafísico. "Se tomarmos em nossas mãos um volume qualquer, de teologia ou metafísica escolástica, por exemplo, façamos a pergunta: contém ele qualquer raciocínio abstrato referente a números e quantidades? Não. Contém qualquer raciocínio experimental referente a questões de fato e de existência? Não. Às chamas com ele, então, pois não pode conter senão sofismas e ilusão." (HUME, 2004) Hume critica a teologia e a metafísica escolástica, que foi a metafísica praticada principalmente nas escolas cristãs durante a Idade Média, porque suas concepções não tratam nem de conceitos matemáticos, que são formais e podem levar a conclusões seguras - por exemplo, "2 + 2 = 4" -, nem de afirmações sobre fatos, que podem ser verificados empiricamente, isto é, pelos órgãos dos sentidos —como "a aceleração de um corpo em queda livre é de 9,8 metros por segundo", Assim, Hume aconselha o leitor a jogar as afirmações metafísicas na fogueira, pois são consideradas ilusões, fantasias ou produto de erros de raciocínio e nada têm a acrescentar ao conhecimento humano. A partir de Hume, a metafísica, tal como existira desde os gregos, tornara-se impossível. O CRITICISMO KANTIANO E O FIM DA METAFÍSICA CLÁSSICA Entre a Dissertação de 1770 e a Crítica da razão pura, mais de dez anos se passaram. Apesar de a obra ser volumosa, a redaçào da Crítica da razão pura não chegou a cinco meses de trabalho. De início, Kant pretendia apenas revisar sua dissertação, mas o trabalho acabou por levá-lo a figurar entre os grandes nomes do pensamento filosófico, como Aristóteles e Descartes. Kant fez um diagnóstico bastante negativo da situação da Filosofia de sua época, em particular da Metafísica, que, embora fosse considerada a Filosofia Primeira, patinava em questões impossíveis de serem resolvidas. Ao mesmo tempo, buscou inserir a Filosofia no rumo seguido pelas Ciências Naturais, pela Lógica e pela Matemática, que já tinham encontrado o caminho da Ciência. Em alguns pontos, o projeto kantiano se aproximou de algumas características do projeto cartesiano. Descartes duvidou de todo o saber conhecido, pois queria encontrar um fundamento seguro que sustentasse a edificação da Filosofia e, mais particularmente, da Ciência. Diferentemente de Descartes, contudo, Kant nào duvidou de todo o conhecimento que havia aprendido. Para ele, bastava estabelecer os limites do conhecimento racional, ou seja, o que a razão podia conhecer e o que era impossível de ser conhecido. No fim do século XVIII, de acordo com a proposta de Wolff, a Metafísica era dividida em duas partes: Metafísica geral e Metafísica especial. A primeira tratava da Ontologia (ciência do ser enquanto ser, como definido por Aristóteles), e a segunda se ocupava do ser humano (Psicologia), do mundo (Cosmologia) e de Deus (Teologia racional), Os principais temas in-vestigados eram a imortalidade da alma, a liberdade a finitude ou infinitude do mundo e a existência de Deus. No entanto, de acordo com Kant, as questões metafísicas clássicas extrapolavam as capacidades de conhecimento do ser humano, pois estavam tão afastadas da experiência que a razão só podia pensá-las, sem conhecê-las realmente. As questões postas pela Metafísica clássica extrapolavam o terreno de qualquer experiência possível e, no entanto, a razão, por sua própria natureza, apresenta questões que não pode evitar, mas que também náo pode responder por não terem nenhuma pedra de toque na experiência. Disso decorre a pergunta fundamental sobre a possibilidade de haver um conhecimento metafísico. Publicada em 1781, a Crítica da razão pura foi uma tentativa de responder a essa pergunta. A obra instituiu um "tribunal da razao" para examinar a própria razão, e não para tomar partido no conflito entre racionalistas, como Descartes e Leibniz, que elaboraram sistemas metafísicos, e empiristas, como Locke e Hume, que basearam o conhecimento unicamente nos sentidos. Criticar a razão é determinar as possibilidades, os limites e o alcance do próprio conhecimento. A transformação foi tao grande para a Filosofia que essa obra nao pôde ser ignorada. A situação da Metafísica No texto a seguir, retirado do célebre prefácio à primeira edição de Crítica da razão pura, podemos ver o diagnóstico de Kant sobre a situaçao da Metafísica no período em que vivia. A razão humana, num determinado dominio dos seus conhecimentos, possui o singular destino de se ver atormentada por questões, que náo pode evitar, pois lhe são impostas pela sua natureza, mas às quais também não pode dar resposta por ultrapassarem completamente as suas possibilidades. Não é por culpa sua que cai nessa perplexidade. Parte de princípios, cujo uso é inevitável no decorrer da experiência e, ao mesmo tempo, suficientemente garantido por esta. Ajudada por estes princípios eleva-se cada vez mais alto (como de resto lho consente a natureza) para condições mais remotas. Porém, logo se apercebe de que, desta maneira, a sua tarefa há de ficar sempre inacabada, porque as questões nunca se esgotam; vê-se obrigada, por conseguinte, a refugiar-se em princípios, que ultrapassam todo o uso possível da experiência e, não obstante, estão ao abrigo de qualquer suspeita, pois o senso comum está de acordo com eles. Assim, a razão humana cai em obscuridades e contradições, que a autorizam a concluir dever ter-se apoiado em erros, ocultos algures, sem contudo os poder descobrir. Na verdade, os princípios de que se serve, uma vez que ultrapassam os limites de toda experiência, já não reconhecem nesta qualquer pedra de toque. O teatro destas disputas infindáveis chama-se Metafísica. (KANT, I. 2010). O fim da Metafísica clássica Podemos agora retomar o questionamento sobre os motivos pelos quais a física newtoniana é possível como ciência e entender também por que a metafísica racionalista tradicional não é conhecimento científico, segundo a teoria kantiana. A física trata de regras e leis dos fenômenos, das representações conformadas pela sensibilidade e pelo entendimento, ou seja, refere-se a objetos do conhecimento humano. A metafísica clássica, por sua vez, trata de coisas que não fazem parte da experiência sensível. Deus e a alma, por exemplo, não são apreendidos pela sensibilidade, não são impressões conformadas ou fenômenos e, portanto, não podem ser conhecidos pelo ser humano. Ideias ou conceitos dessa espécie podem ser pensados pela razão, mas é impossível conhecê-los, pois estão além da capacidade humana de conhecimento. Por esse motivo, a física é possível como ciência e a metafísica tradicional não. Com base nisso, Kant provocou uma revolução na teoria do conhecimento, que ele mesmo designou como "virada copernicana na filosofia", Se Copémico mudou a forma de entender o mundo ao defender a ideia de que o Sol está no centro do sistema solar, Kant mudou a forma de o ser humano compreender o mundo e a si próprio ao estabelecer a ideia de que o ser humano, e não os objetos externos, é o centro do conhecimento, O ser humano não é um agente passivo, que só recebe informações, mas atua decisivamente na constituição do conhecimento e do que se compreende como realidade. Os elementos a priori que determinam essa constituição do conhecimento são o escopo da filosofia kantiana, também conhecida como transcendental. Logo, o pensamento kantiano alterou profundamente a Metafísica. A existência de Deus ou a imortalidade da alma, por exemplo, passaram a ser questões que já não podiam ser respondidas. Se percebemos apenas as coisas que ocorrem em um tempo específico (antes, agora, depois), como seremos capazes de perceber algo que está na eternidade (Deus)? Como afirmar que a alma é imortal se não conseguimos percebê-la com os nossos sentidos? O conhecimento a partir de Kant, então, é sempre conhecimento de objetos, isto é, de conteúdos elaborados e modificados pelo sujeito que conhece. O conhecimento passou a se ocupar, assim, de fenómenos, e não mais da própria coisa, como pretendiam os metafísicos clássicos. Com a crítica kantiana, tornou-se impossível conhecer efetivamente os temas da Metafísica clássica e emitir qualquer opinião segura sobre assuntos que não podem ser assentados na experiência. Podemos pensar sobre Deus, podemos querer que nossa a seja imortal, mas jamais teremos a possibilidade de verificar esses assuntos em nossa experiência ou mesmo ter sobre eles verdadeiro conhecimento. Nada nos impede de acreditar em Deus ou na imortalidade da alma, porém não podemos exigir que a Filosofia se pronuncie a respeito desses temas. Na verdade, a crítica kantiana não diz que Deus existe nem que não existe, mas apenas que não é capaz de saben Deus, não obstante sua importância para a Filosofia do próprio Kant, é uma questão de fé. AUGUSTE COMTE E A METAFÍSICA NO SÉCULO XIX O filósofo francês Auguste Comte (1798-1857), considerado o pai do positivismo, fundamenta sua filosofia também em oposição às concepções metafísicas. Em seu entendimento, a busca por princípios gerais ou essências, entidades que estão além do que podemos observar ou perceber pelos órgãos dos sentidos, é algo infrutífero. Comte explana: "[...] não é supérfluo assinalar agora, de modo direto, a preponderância contínua da observação sobre a imaginação, como o principal caráter lógico da sã filosofia moderna, dirigindo nossas pesquisas, não para causas essenciais, mas para leis efetivas, dos diversos fenômenos naturais. Sem ser doravante imediatamente contestado, permanece este princípio fundamental muitas vezes desconhecido nos trabalhos especiais. Embora as diferentes ordens de especulações concedam, sem dúvida, à imaginação uma alta participação, isto é, constan temente empregada para criar ou aperfeiçoar os meios da vinculação entre os fatos constatados, mas o ponto de partida e a sua direçào não lhe poderiam pertencer em nenhum caso. Ainda quando procedemos verdadeiramente a priori, é claro que as considerações gerais que nos guiam foram inicialmente fundadas, quer na ciência correspondente, quer em outra, na simples observação, única fonte de sua realidade e também de sua fecundidade. Ver para prever: tal é o caráter permanente da verdadeira ciência. Tudo prever sem ter nada visto constitui somente uma absurda utopia metafísica, ainda muito seguida." (COMTE, 1978). A observação é considerada a única fonte de realidade. Abandonando a observação e apoiando-se única e exclusivamente na imaginação, como seria característico das especulaçôes metafísicas, o pensamento pode levar não para o conhecimento das coisas, mas para a fantasia. A ciência, então, deve ter como base as coisas que podem ser observadas. Todas as especulações e as teorias científicas, em última instância, devem ter como fundamento a realidade observável. LUDWIG WITTGENSTEIN E A METAFÍSICA CONTEMPORÂNEA O filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein (1889-1951) também se opõe às afirmações metafísicas por considerar que estas tratam de problemas (ou pseudoproblemas) que não podem ser formulados claramente e, portanto, não podem ser respondidos. “O método correto da filosofia seria o seguinte: só dizer o que pode ser dito, ou seja, as proposições das ciências naturais [...] e depois, quando alguém quisesse dizer algo metafísico, mostrar-lhe que nas suas proposições existem sinais aos quais não foi dada uma denotação.” (WITTGENSTEIN, 1995). Quer dizer, as sentenças ou os termos metafísicos se referem a coisas, objetos ou seres enigmáticos ou misteriosos, que não podem ser tratados com clareza, isto é, não se sabe exatamente o que são, o que impossibilitaria a formulação de problemas e soluções reais. "Deus", "alma" ou "vida após a morte", por exemplo, são termos que se referem especificamente a quê? Os "problemas" metafísicos estariam no campo do mistério e não no da investigação racional. Por isso, como afirma Wittgenstein, "acerca daquilo de que se não pode falar, tem que se ficar em silêncio". CONCLUSÃO (ÕES) Ora, a Metafísica na Grécia antiga foi imprescindível para o entendimento dos mais variados dilemas do mundo antigo, sejam perguntas simples, ou complexas. Iniciada como um sistema filosófico platônico, passando a ser filosofia primeira em Aristóteles, a metafísica incorporou elementos teológicos, psicológicos e cosmológicos durante o mundo antigo, e ainda mais durante o período medieval e a hegemônica Igreja Católica. No mundo moderno e embasado pelo “Luz da razão”, a metafísica começa a ser refutada pelos pensadores da época em questão, dentre eles o célebre cético Hume, e o emblemático Kant, além de Descartes e seus cartesianistas. Kant e seu criticismo incorporaram à Metafísica uma nova interpretação, esta que fez a mesma entrar em declínio e sair da centralidade do mundo filosófico. Kant, graças às indagações e refutações de Hume, pôde acordar do célebre “sono dogmático”. O que fez Kant se importa com a Metafísica. Kant trouxe à luz o fim da Metafísica clássica e deu legado ao início da metafísica contemporânea alcunhada de Ontologia. No decorrer da história da filosofia, a Metafísica teve intensa ascenção e vertiginosos declives, sendo seu maior declive o crítico Kant. Por fim, muitos filósofos se apropriaram de ser heterodoxos e enfrentaram de frente o mundo metafísica e a base do catolicismo sobre a realidade. Posta realidade que hoje, com o legado de Kant, da fenomenologia de Husserl, etc., originaram a nova escola filosófica chamada de Ontologia. -/- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 5ª. ed. Trad. Ivone Castillo Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2007. ARANHA, M. 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São Paulo: Moderna, 2006. WITTGENSTEIN, L. Tratado lógico-filosófico. 2ª. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995. -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – estudante, pesquisador, professor, agropecuarista, altruísta e defensor dos direitos humanos e dos animais. -/- Alana Thaís Mayza da Silva – estudante, potterhead, pesquisadora, projetista, musicista, filantropa, defensora dos direitos humanos e dos animais, LGBT. (shrink)
This is the report on the XVI BRAZILIAN LOGIC CONFERENCE (EBL 2011) held in Petrópolis, Rio de Janeiro, Brazil between May 9–13, 2011 published in The Bulletin of Symbolic Logic Volume 18, Number 1, March 2012. -/- The 16th Brazilian Logic Conference (EBL 2011) was held in Petro ́polis, from May 9th to 13th, 2011, at the Laboratório Nacional de Computação o Científica (LNCC). It was the sixteenth in a series of conferences that started in 1977 with the aim of (...) congregating logicians from Brazil and abroad, furthering interest in logic and its applications, stimulating cooperation, and contributing to the development of this branch of science. EBL 2011 included more than one-hundred and fifty participants, all of them belonging to prominent research institutes from Brazil and abroad, especially Latin America. The conference was sponsored by the Academia Brasileira de Ciências (ABC), the As- sociation for Symbolic Logic (ASL), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Centre for Logic, Epistemology and the History of Sciences (CLE), Laboratório Nacional de Computação o Científica (LNCC), Pontif ́ıcia Universidade Cato ́lica do Rio de Janeiro (PUC- Rio), Sociedade Brasileira de Lógica (SBL), and Universidade Federal Fluminense (UFF). Funding was provided by Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient ́ıfico e Tecnolo ́ gico (CNPq), Fundac ̧a ̃o de Amparo `a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Fundação Euclides da Cunha (FEC), and Universidade Federal Fluminense (UFF). The members of the Scientific Committee were: Mário Folhadela Benevides (COPPE- UFRJ), Fa ́bio Bertato (CLE-IFCH-UNICAMP), Jean-Yves Béziau (UFRJ), Ricardo Bianconi (USP), Juliana Bueno-Soler (UFABC), Xavier Caicedo (Universidad de Los An- des), Walter Carnielli (CLE-IFCH-UNICAMP), Oswaldo Chateaubriand Filho (PUC-Rio), Marcelo Esteban Coniglio (CLE-IFCH-UNICAMP), Newton da Costa (UFSC, President), Antonio Carlos da Rocha Costa (UFRG), Alexandre Costa-Leite (UnB), I ́tala M. Loffredo D’Ottaviano (CLE-IFCH-UNICAMP), Marcelo Finger (USP), Edward Hermann Haeusler (PUC-Rio), Décio Krause (UFSC), João Marcos (UFRN), Ana Teresa de Castro Martins (UFC), Maria da Paz Nunes de Medeiros (UFRN), Francisco Miraglia (USP), Luiz Car- los Pereira (PUC-Rio and UFRJ), Elaine Pimentel (UFMG), and Samuel Gomes da Silva (UFBA). The members of the Organizing Committee were: Anderson de Araujo (UNICAMP), Walter Carnielli (CLE-IFCH-UNICAMP), Oswaldo Chateaubriand Filho (PUC-Rio, Co- chair), Marcelo Correa (UFF), Renata de Freitas (UFF), Edward Hermann Haeusler (PUC- RJ), Hugo Nobrega (COPPE-UFRJ), Luiz Carlos Pereira (PUC-Rio e IFCS/UFRJ), Leandro Suguitani (UNICAMP), Rafael Testa (UNICAMP), Leonardo Bruno Vana (UFF), and Petrucio Viana (UFF, Co-chair). (shrink)
Monografia apresentada à banca examinadora da Escola Municipal Manuel Teodoro de Arruda, anexa do Colégio Frei Cassiano de Comacchio em Belo Jardim, para a obtenção do título de concluinte do curso de Normal Médio, oferecido pela instituição. A natureza do trabalho, em suma, consiste em apresentar perspectivas de trans formação social para a comunidade de jovens e adultos, o principal programa cunho do trabalho é a Educação de Jovens e Adultos a EJA, e como esse programa intervém na sociabilidade e (...) na mudança do meio social do educando, além de tratar a educação como a principal fonte e meio de mudança de vida dessas pessoas que voltam às escolas. Orientador(a): professora Maria Angelita Pinheiro BELO JARDIM 2017 DEDICATÓRIA Dedicamos este trabalho primeiramente a todos que acreditaram em sua realização, em especial à professora de práticas pedagógicas e também orientadora, Maria Angelita Pinheiro, pelo incentivo e esforço à nossa preparação ao dia de hoje. Bem como, dedicamos este à Alana Thais da Silva, que em todo o desenvolvimento deste, esteve ao nosso lado. AGRADECIMENTOS Agradecemos primeiramente a Deus, que pôde nos proporcionar saúde e sabedoria para a conclusão deste. Agradecemos também à todos que acreditaram na realização deste trabalho, como fruto da realização de um sonho, que é tornarmos normalistas. A nossos colegas de classe que puderam nos proporcionar alegria para continuarmos. Agradecemos em especial mesmo, à Alana Thais da Silva e a Dawson de Barros Monteiro, ambos por oferecer amor e carinho quando o cansaço chegava, e também pela colaboração nas pesquisas que adentravam noites e dias. Enfim, agradecemos a todos que puderam plantar uma semente nesse nosso terreno, para que no futuro pudéssemos colher bons frutos nessa etapa decisiva em nossas vidas. À todos nosso muito obrigado. EPÍGRAFE “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo.” Paulo Freire RESUMO Este trabalho teve por objetivo abordar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como transformação social na vida daquelas pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar ou, por motivo maior, tiveram que abandonar os estudos na idade própria. Muitos vão à procura dos estudos por motivo de conquistar um emprego melhor, outros por motivos de se sociabilizar melhor, e por vários outros motivos. Também é possível afirmar que o retorno para a escola na terceira idade é possível, e que para os jovens, os estudos abrirão as portas para o mundo do trabalho, mostrando que o indivíduo alfabetizado tem valor na sociedade, e que a escola, como um ambiente de aprendizagem, tem o poder de transformar o indivíduo e torná-lo um cidadão crítico, democrático e participativo. Palavras Chaves: Educação de Jovens e Adultos. Aprendizagem. Transformação Social. ABSTRACT The purpose of this study was to approach the education of young people and adults (EJA) as a social transformation in the lives of people who did not have the opportunity to study or, for greater reason, had to drop out of school at their own age. Many go in search of their studies for the sake of gaining a better job, others for the sake of socializing better, and for many other reasons. It is also possible to state that the return to school in the third age is possible, and that for the youngest, studies will open the door to the world of work, showing that the literate individual has value in society and that the school as a learning environment, has the power to transform the individual and make him / her a critical, democratic and participatory citizen. Keywords: Education for Youth and Adults. Learning. Social transformation LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA 1 – Gráfico sobre o percentual do Analfabetismo..............................................................27 FIGURA 2 – Gráfico sobre o Analfabetismo por região do Brasil....................................................28 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................... ..................................... 10 CAPÍTULO 1 – CONTRIBUIÇÕES DA TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL E PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO........................................................................ 13 1.1 Históricos da Educação de Jovens e Adultos em seu Contexto Inicial............................ 13 1.1.1 Do Brasil Colônia ao Varguismo: Jesuítas, Pombal, Corte Imperial e Governo Vargas.............................................................................................. ................................. 13 1.2 A Educação de Jovens e Adultos Pós-Varguismo............................................................ 15 1.3 Acerca do Movimento Brasileiro de Alfabetização(Mobral)............................................ 15 1.3.1 Metodologia de Ensino no Mobral: Uma Abordagem Superficial.......................... 16 1.4 A Evolução da Educação de Jovens e Adultos: do Regime Militar ao seu Contexto Atual............................................................................................... .................................................. 17 CAPÍTULO 2 – REFLEXÕES ACERCA DA ALFABETIZAÇÃO............................................... 20 2.1 Análises Histórico-Antropológica Acerca da Escrita e a Alfabetização........................... 20 2.2 Alfabetização e Pragmatismo: Conceitos Acerca da Leitura e Escrita no Âmbito Educacional......................................................................................... ............................................. 21 2.3 O Analfabetismo como Antagonia ao Alfabetismo........................................................... 25 CAPÍTULO 3 – REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS............................................................................................. .......................................... 29 3.1 Pensamentos de Paulo Freire Sobre a Educação Popular................................................. 29 3.2 Acerca do Método Freiriano........................................................................................... .. 31 3.2.1 Etapas do Método.............................................................................................. ...... 31 3.2.2 O Método.............................................................................................. ................... 31 3.2.3 As Fases de Aplicação do Método........................................................................... 32 3.2.4 História............................................................................................ ........................ 33 3.3 O Perfil do Professor Alfabetizador.................................................................................. 33 3.4 Perfil do Estudante da Educação de Jovens e Adultos e os Motivos de Evasão............... 35 3.5 Pensando em Métodos............................................................................................. ......... 37 CONCLUSÃO........................................................................................... ...................................... 41 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................... ...... 43 10 INTODUÇÃO Este trabalho tem por objetivo abordar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como modelo, espelho ou meio de uma transformação social, na vida daquelas pessoas que não tiveram oportunidade de estudar, ou por motivos maiores, tiveram que abandonar os estudos na idade ideal, essa visão é explicada pelos motivos da evasão escolar. Foram pesquisados os motivos que levaram essas pessoas a desistirem de estudar e porque retornaram as salas de aula muito tempo depois, destacando principalmente como cunho primordial, os alunos das turmas da EJA (Educação de Jovens e Adultos), que, em suma, pode-se concluir que o principal motivo de evasão na idade adequada era as baixas condições que eram submetidos, e por isso, abandonavam a escola para trabalhar, por isso que a maioria dos estudantes da EJA, são trabalhadores e pessoas que já carregam e possuem uma experiência de vida. Educação de jovens e adultos (EJA) é uma modalidade da qual participam aqueles que não frequentaram a escola durante a infância ou na idade ideal. Os motivos apresentados pelos quais não conseguiram estudar são, na maioria das vezes, alheios a vontade de cada um, a exemplo foi-se citado: o fato de se ter que trabalhar para sobreviver, não ter acesso a escola no local onde mora e até mesmo a evasão escolar. Por isso é comum ainda haver escolas que alfabetizam jovens e adultos. Alfabetizar jovens e adultos é uma ocupação antiga que não se limita a uma tarefa meramente escolar, está intimamente ligada a sonhos, expectativas e a anseios de mudança. E com isso, a escolha do tema deste trabalho se deu com o convívio com jovens e adultos durante o estágio supervisionado na EJA. Geralmente, é depois da adolescência que o indivíduo reconhece que necessita do conhecimento escolar e passa a buscá-lo. Pois, é muito gratificante para uma pessoa leiga poder aprender a ler e a escrever, consciente da necessidade e importância de tal ato para sua vida, um mundo novo se abre, e o indivíduo é posto num contexto “como se fosse cega e de repente abrisse os olhos e enxergasse coisas que até então não via” . Alfabetizar tais pessoas é proporcionar para elas grandes mudanças, uma nova visão de mundo, a chance de ter uma vida melhor, pelo menos com mais oportunidades. Por isso remete-se, então, para além de uma alfabetização e sim de uma transformação social destes indivíduos. A EJA é um direito assegurado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN)2, é assegurado gratuitamente aos que não tiveram acesso a escola na idade própria e segundo a LDBEN o poder público deverá estimular o acesso e permanência do jovem e do adulto na escola. Porém, esse estímulo é a cada dia deixado de lado, como afirma o professor doutor em filosofia e educação do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro. “[...] as atuais políticas públicas educacionais, mostram um exemplo de problemas, pois aqui na perspectiva contemporânea, é deveras nítida a deficiência da incentivação pública a estes indivíduos.” (Monteiro 2016, PROEJA p. 185). Abordando acerca dos objetivos, destacamos a abordagem do surgimento da EJA ante o alto índice de pessoas analfabetas no Estado, que por inúmeros motivos tiveram que abandonar os estudos por um longo período de tempo, ou para muitos, que nunca sequer tinham ido à escola. É necessário também dar luz e enaltecer a primordialidade da socialização dos que ingressam em uma escola mesmo depois da idade certa; nessa linha de raciocínio é necessário abordar e enaltecer as concepções ideológicas da transformação social no espaço da EJA, bem como compreender a importância desta para a atual sociedade. Por fim, abordar, entender e compreender as questões antropológicas dos motivos de evasão escolar; enxergar a EJA e a transformação social como utopia do indivíduo que retorna ao espaço educacional. E com isso, vislumbrar que em toda a sociedade a questão do Analfabetismo é um problema público educacional e social. 12 1. CONTRIBUIÇÕES DA TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL E PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO A educação de Jovens e Adultos antecede até mesmo as datas documentadas: de forma indireta, adultos interessavam-se em aprender as primeiras letras do alfabeto, sendo considerado o alicerce para a aprendizagem, ou seja, codificar cada símbolo daquele para formular palavras; ou ao menos também, interessar-se à escrever o próprio nome. Este Capítulo abordará a trajetória da Educação de Jovens e Adultos EJA, no Brasil, e sua contribuição para a população brasileira e ao mesmo tempo os processos de alfabetização que são contribuições para que esta aconteça de maneira eficaz. 1.1 HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM SEU CONTEXTO INICIAL 1.1.1 DO BRASIL COLÔNIA AO VARGUISMO: JESUÍTAS, POMBAL, CORTE IMPERIAL E GOVERNO VARGAS Alfabetizar jovens e adultos não é um ato de ensino-aprendizagem, é a construção de uma perspectiva de mudança: no início, época da colonização do Brasil, as poucas escolas existentes era para o privilégio das classes média e a burguesia da colônia, nessas famílias os filhos possuíam acompanhamento escolar na infância; não havia a necessidade de uma alfabetização pra jovens e adultos, esse bloco etário não tinha acesso a uma instrução escolar e quando a recebiam era de forma indireta, de acordo com Ghiraldelli Jr. a educação brasileira teve seu início com o fim dos regimes das capitanias hereditárias, ele cita que: “[...] A educação escolar no período colonial, ou seja, a educação regular e mais ou menos institucional de tal época, teve três fases: a do predomínio dos jesuítas; a das reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da expulsão dos jesuítas do Brasil e de Portugal em 1759; e a do período em que Dom João VI, então rei de Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808-1821)”. (Ghiraldelli Jr. 2008, p. 24). O ensino dos jesuítas tinha como fim não apenas a transmissão de conhecimento científico escolar, mas a propagação da fé cristã. A história da EJA no Brasil no período colonial deu-se de forma assistemática, nesta época não se constatou iniciativas governamentais significativas. Os métodos jesuíticos permaneceram até o período pombalino com a expulsão dos jesuítas, neste período, Pombal organizava as escolas de acordo com os interesses do Estado, com a chegada da coroa portuguesa na colônia, a educação perdeu o seu foco que já não era amplo. Após a proclamação da Independência do Brasil foi outorgada a primeira constituição brasileira, e no artigo 179 dela constava que a “instrução primária era gratuita para todos os cidadãos”; mesmo a instrução sendo gratuita não favorecia as classes pobres, pois estes não tinham acesso à escola, ou seja, a escola era para todos, porém inacessível a quase todos. No decorrer dos séculos houve várias reformas, Soares cita que: “[...] No Brasil, o discurso em favor da Educação popular é antigo: precedeu mesmo a proclamação da República. Já em 1882, Ruy Barbosa, baseado em exaustivo diagnóstico da realidade brasileira da época, denunciava a vergonhosa precariedade do ensino para o povo do Brasil e apresentava propostas de multiplicação de escolas e de melhoria qualitativa do ensino” (SOARES, 2002, p. 8). A constituição de 1934, no governo ditatorial de Getúlio Vargas não teve êxito, sendo assim criase uma nova constituição escrita por Francisco Campos. Para a constituição de 1937 que Ghiraldelli Jr. Cita que: “[...] A constituição de 1937, fez o Estado abrir mão da responsabilidade para com a educação publica, uma vez que ela afirmava que o Estado desempenharia um papel de subsidiário, e não central, em relação ao ensino”. O ordenamento democrático alcançado em 1934, quando a letra da lei determinou a educação como direito de todos, e obrigação dos poderes públicos, foi substituído por um texto que desobrigou o Estado de manter e expandir o ensino” (GHIRALDELLI Jr., 2008, p. 78). Nessa perspectiva, o Estado passou a não ter mais o papel de bancar os educadores para levar o conhecimento para toda a nação, num plano ideológico mundial, vemos que a educação é um princípio fundamental para o crescimento do país e deixar esta ferramenta de lado, acarreta num colapso conhecido como “grande taxa de Analfabetismo”. A constituição de 1937, foi criada no intuito de estabelecer o favorecimento do Estado pois o mesmo tira sua responsabilidade; “gera nesse contexto histórico-social uma população sem educação, ou a educação para poucos, uma sociedade frágil e suscetível a aceitar tudo que lhe é imposto pelo poder coercitivo” afirma o professor doutor em filosofia do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro: logo se entende que esta constituição não tinha o interesse que o conhecimento crítico se propagasse, mas buscava favorecer o ensino profissionalizante, pois dentro do contexto histórico o Brasil precisava mais capacitar os jovens e adultos para o trabalho nas indústrias. 1.2 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS PÓS-VARGUISMO Segundo Cunha (1999), o fim do Estado Novo trouxe ao país um processo de redemocratização e a necessidade de aumento da quantidade de eleitores. Nesse sentido, o primeiro projeto lançado pelo governo foi uma campanha que previa a alfabetização do educando em três meses, além da conclusão do curso primário num prazo bem menor que o convencional. A educação era considerada unilateral e tinha o professor como transmissor de conhecimento. O educador, que era voluntário ou mal remunerado, seria o único sujeito deste processo. A campanha extinta em 1963, não rendeu bons resultados, mas ajudou a ideia preconceituosa de que o adulto não precisaria mais aprender a ler e que já havia encontrado seu lugar no mundo. Esse desprezo pela classe trabalhadora, o proletariado, ainda persistiu na década de 1990, quando o então ministro da Educação do governo Collor de Mello, o professor, físico e político José Goldemberg, afirmou que a tentativa de alfabetização de adultos não diminuiria o índice de analfabetos; ao contrário, perturbaria a ordem social. Com os resultados insatisfatórios dessa campanha, surgiram críticas a esse projeto: seria necessária a qualificação dos professores e a adequação do programa, do material didático e dos métodos de ensino à clientela atendida. No final dos anos 1950, Paulo Freire propunha uma nova pedagogia, posteriormente trabalhada neste trabalho. Apesar de ser encarregado de desenvolver o Programa Nacional de Alfabetização de Adultos, com o golpe militar de 1964, Paulo Freire foi exilado e um programa assistencialista e conservador foi criado: o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral). 1.3 ACERCA DO MOVIMENTO BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO (Mobral) Na época do regime militar (1964-1985), surge um movimento de alfabetização de jovens e adultos, na tentativa de erradicar o analfabetismo, pelo menos é o que se tinha em teoria; chamado MOBRAL, esse método tinha como foco o ato de ler e escrever, essa metodologia assemelha-se a de Paulo Freire com codificações, cartazes com famílias silábicas, quadros, fichas e etc., porém, não utilizava o diálogo como ideologia educacional de Freire e não se preocupava com a formação crítica dos educandos. A principal ideologia objetiva do Mobral era apenas a alfabetização funcional que em seu conceito é o ensino alicerce da compreensão de textos simples, capacitando os educandos a decodificação mínima de letras para a interpretação de textos, sem a apropriação da leitura e da escrita de pessoas entre 15 e 30 anos. A respeito do Mobral Bello cita que: “[...] O projeto Mobral permite compreender bem esta fase ditatorial por que passou o Brasil. A proposta de educação era toda baseada em aos interesses políticos vigentes na época. Por ter de repassar o sentimento de bom comportamento para o povo e justificar os atos da ditadura, esta instituição estendeu seus braços a uma boa parte das populações carentes, através de seus diversos programas.” (BELLO, 1993, p. 56). 1.3.1 METODOLOGIA DE ENSINO NO MOBRAL: UMA ABORDAGEM SUPERFICIAL A metodologia utilizada pelo Programa de Alfabetização Funcional baseava-se em seis objetivos: 1. Desenvolver nos alunos as habilidades de leitura, escrita e contagem 2. Desenvolver um vocabulário que permita o enriquecimento de seus alunos; 3. Desenvolver o raciocínio, visando facilitar a resolução de seus problemas e os de sua comunidade; 4. Formar hábitos e atitudes positivas, em relação ao trabalho; 5. Desenvolver a criatividade, a fim de melhorar as condições de vida, aproveitando os recursos disponíveis; 6. Levar os alunos: • A conhecerem seus direitos e deveres e as melhores formas de participação comunitária; • A se empenharem na conservação da saúde e melhoria das condições de higiene pessoal, familiar e da comunidade; • A se certificarem da responsabilidade de cada um, na manutenção e melhoria dos serviços públicos de sua comunidade e na conservação dos bens e instituições; • A participarem do desenvolvimento da comunidade, tendo em vista o bem-estar das pessoas. Os técnicos do MOBRAL defendiam que o método utilizado baseava-se no aproveitamento das experiências significativas dos alunos. Desta forma, embora divergisse ideologicamente do método de Paulo Freire utilizava-se, semelhantemente a este, de palavras geradoras e de uma série de procedimentos para o processo de alfabetização: 1. Apresentação e exploração do cartaz gerador; 2. Estudo da palavra geradora, depreendida do cartaz; 3. Decomposição silábica da palavra geradora; 4. Estudo das famílias silábicas, com base nas palavras geradoras; 5. Formação e estudos de palavras novas; 6. Formação e estudos de frases e textos A principal e essencial diferença na utilização destes procedimentos em relação ao método Paulo Freire era o fato de no Mobral haver uma uniformização do material utilizado em todo o território nacional, não traduzindo assim a linguagem e as necessidades do povo de cada região, principal característica da metodologia freiriana. 1.4 A EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: DO REGIME MILITAR AO SEU CONTEXTO ATUAL Em 1974, foi implantado o CES (Centro de Estudos Supletivos), que dava a oportunidade de uma certificação rápida, mas superficial, com um ensino tecnicista e auto instrucional. Esse ensino supletivo foi implantado em acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDBE 5592/71. Nesta lei um capítulo foi dedicado especificamente a Educação de Jovens e Adultos. Em 1974 o MEC lança o CES. A década de 1980 foi marcada pelo desenvolvimento de projetos e pesquisas na área da alfabetização de adultos. Em 1985, o Mobral foi cessado, dando lugar a Fundação EDUCAR que apoiava tecnicamente e financeiramente as iniciativas de alfabetização existentes. Nos anos 80, difundiram-se várias pesquisas acerca da língua escrita que de certa forma refletiam na EJA. Com a promulgação da constituição de 1988 o Estado passou a ampliar o seu dever ante a Educação de Jovens e Adultos. De acordo com o artigo 208 da constituição brasileira de 1988: “O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurado inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria.” A importância da Educação de Jovens e Adultos passou a ser reconhecida internacionalmente mediante as conferências organizadas pela UNESCO nos anos 1990. A partir de então, surgiu no Brasil uma mobilização nacional no sentido de diagnosticar metas e ações da EJA. A LDBE de 1996 garante igualdade de acesso e permanência na escola e ensino de qualidade, além da valorização experiência extraescolar. Ainda nos anos 1990, emergiram iniciativas em favor da EJA, onde o governo incumbiu também a municípios a engajarem-se nesta política, ocorrem parcerias com ONG’s, municípios, universidades, grupos informais, populares, fóruns estaduais e nacionais e através de fóruns a história da EJA passou a ser registrada no intitulado “Boletim da Ação Educativa”. O antigo ensino supletivo passou a se chamar Educação de Jovens e Adultos, e ganhou um sentido mais amplo: preparar e inserir ou reinserir o estudante no mercado de trabalho. Os objetivos da educação no país são revistos, cabendo agora à escola a responsabilidade de formar o adulto trabalhador. Recentemente, novas iniciativas como a EJA e o Proeja, têm surgido a fim de garantir metodologias adequadas a discentes com esse perfil. Em 2000, o Conselho Nacional de Educação estabeleceu, no parecer nº 11, (das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos), as funções e as bases legais da EJA fundamentadas na LDBE, nos Parâmetros Curriculares Nacionais e nas Diretrizes Curriculares Nacionais O decreto nº 5478/05, institui o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – Proeja, abrangendo a formação inicial e continuada de trabalhadores e a Educação Profissional Técnica de nível médio. Eventos onde são gerados debates e trocadas experiências, como os fóruns EJA, têm sido importantes e primordiais na estruturação da EJA e de seus objetivos. É notório que nesta fase da história da Educação brasileira, a EJA possui foco amplo. Para haver uma sociedade igualitária e uma Educação eficaz é necessário que todas as áreas da Educação sejam focadas e valorizadas, não é possível desvencilhar uma da outra. 2. REFLEXÕES ACERCA DA ALFABETIZAÇÃO A alfabetização é definida como o processo de aprendizagem onde se desenvolve a habilidade de ler e escrever de maneira adequada e a utilizar esta habilidade como um código de comunicação com o seu meio. É o processo onde os educadores procuram dar mais atenção durante o período de educação inicial escolar, através do desenvolvimento das atividades da alfabetização, que envolvem o aprendizado do alfabeto e dos números, a coordenação motora e a formação de palavras, sílabas e pequenas frases. Através destas tarefas, o indivíduo consegue adquirir a habilidade de leitura, de compreensão de textos e da linguagem de maneira geral, incluindo a operação de números, que são competências necessárias para avançar aos níveis escolares seguintes. A alfabetização consegue desenvolver também a capacidade de socialização do indivíduo, uma vez que possibilita novas trocas simbólicas com a sociedade, além de possibilitar o acesso a bens culturais e outras facilidades das instituições sociais. A incapacidade de adquirir a habilidade da leitura e da escrita é chamada de analfabetismo ou iliteracia. 2.1 ANÁLISE HISTÓRICO-ANTROPOLÓGICA ACERCA DA ESCRITA E A ALFABETIZAÇÃO A comunicação oral antecede a comunicação escrita. É oralmente que se expressam a maioria das pessoas desde os tempos mais remotos. A história nos mostra que até mesmo os povos humanos da pré-história utilizavam símbolos gráficos para fazer registros em cavernas, em grutas, em rochas e etc., ou seja, já havia a necessidade de expressão gráfica. Bajard diz que: “[...] A escrita surgiu na mesopotâmia por volta do ano 4000 a.C., entre os Sumérios. Era uma escrita representada por desenhos, figuras rupestres e etc. que indicavam ações cotidianas e corriqueiras desses povos como a caça ou a pesca; essa fase ficou conhecida como pictográfica, após ela veio a fase ideográfica, onde os símbolos já representavam também alguma ideia, tornou-se fonética, depois alfabética e a partir daí a escrita foi evoluindo-se, alfabetos foram surgindo de acordo com as particularidades de cada língua.”(BAJARD, 2001, p. 15). A fase alfabética determinou a necessidade da transformação de códigos alfabéticos escritos, dando início ao que hoje chamamos de alfabetização. Ferreiro cita que: “[...] A invenção da escrita foi um processo histórico de construção de um sistema de representação, não um processo de codificação. Uma vez construído, poder-se-ia pensar que o sistema de representação é aprendido pelos novos usuários, como um sistema de codificação. Entretanto, não é assim, no caso dos dois sistemas envolvidos no início da escolarização (o sistema de codificação seria dos números e o sistema de representação seria da linguagem). As dificuldades que as crianças enfrentam são dificuldades conceituais semelhantes as da construção do sistema, e por isso pode-se dizer em ambos os casos que a criança reinventa esses sistemas, no caso da Educação para Jovens e Adultos, esse processo também poderá acontecer mediante a participação ativa do estudante e o empenho do mestre que para ele leciona. Bem entendido, não se trata de que as crianças reinventem as letras nem os números, mas que para poderem se servir desses elementos como elementos de um sistema, deve compreender seu processo de construção e suas regras de produção, o que coloca o problema epistemológico fundamental: Qual é a natureza da relação entre o real e a sua representação?” (FERREIRO, 2001, p. 12). A alfabetização não é uma ação prioritária para a fase infantil da vida. Ferreiro cita que: “[...] é recente a tomada de consciência sobre a importância da alfabetização inicial como a única solução real para o problema da alfabetização remediativa (de adolescentes e adultos)”. (FERREIRO, 2001, p. 09). 2.2 ALFABETIZAÇÃO E PRAGMATISMO: CONCEITOS ACERCA DA LEITURA E ESCRITA NO ÂMBITO EDUCACIONAL Alfabetizar é um tema que está ligado ao ensino da leitura e da escrita de códigos alfabéticos, existem inúmeros significados para essa problemática atual. Larousse limita o significado de alfabetizar a ensinar a ler. “[...] Vários conceitos definem alfabetizar como o ato de ensinar a ler, aos poucos esses conceitos vem mudando, ainda que livros e dicionários definam-no assim. Hoje muitos educadores e alfabetizadores utilizam o termo “letramento”, letrar vai além de alfabetizar, se trata da compreensão da leitura e escrita, a criança, o jovem ou o adulto estão alfabetizados ao saberem ler e escrever e letrados ao compreenderem o que leram e escreveram, estão letrados quando dominam a leitura e a escrita e fazem o uso social de ambos.” (LAROUSSE, 2003, p. 21). Soares, acerca do assunto, cita ao ser questionada sobre tal definição: “Letramento é de certa forma o contrário de analfabetismo, aliás, houve um momento em que as palavras letramento e alfabetismo se alteravam para nomear o mesmo conceito. Ainda hoje há quem prefira a palavra letramento, eu mesmo acho a palavra alfabetismo mais vernácula que letramento, que é uma tentativa da palavra inglesa literary, mas curvo-me ao poder das tendências linguísticas, que estão dando preferência a letramento. Analfabetismo é definido como o estado de quem não sabe ler e escrever, seu contrário, alfabetismo ou letramento, é o estado de quem sabe ler e escrever, ou seja, letramento é o estado em que vive o indivíduo que não só sabe ler e escrever, mas que poderá exercer as práticas sociais de leitura e escrita que circulam na sociedade em que vivem.” (SOARES, 2007). . Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) da Língua Portuguesa (Brasil, 2001, p. 21) fala explicitamente sobre este termo, mas a sua proposta vai de encontro as propostas do letramento, isso é perceptível ao observar o que é citado nos PCN’s a respeito de pesquisas e investigações referentes a alfabetização nas séries escolares. A alfabetização é um processo contínuo, inicia-se desde os primeiros anos de vida, com a linguagem e a partir daí tudo que a pessoa aprende serve como base para uma aprendizagem eficaz. A alfabetização, como a educação em geral, é um direito de todos, infelizmente para muitos ela não pode acontecer na infância, a preocupação de como fazê-la com qualidade e êxito impulsiona investigações de como alfabetizar para compreender a leitura e a escrita. Ferreiro cita que: “[...] É difícil falar de alfabetização evitando as posturas dominantes neste campo, por um lado, o discurso oficial e, por outro, o discurso meramente ideologizante, que chamarei “discurso da denúncia”. O discurso oficial centra-se nas estatísticas, o outro despreza essas cifras tratando de desvelar “a face oculta” da alfabetização, onde o discurso oficial fala de quantidade de escolas inauguradas, o discurso da denúncia enfatiza a má qualidade dessas construções ou desses locais improvisados que carecem do indispensável para a realização de ações propriamente educativas.” (FERREIRO, 2005, p. 09). A Alfabetização de Jovens e Adultos não é uma ação recente, teve início desde a colonização apesar de ter sido reconhecida oficialmente somente após o ano de 1945, muitos motivos interferem o processo de alfabetização na infância de alguns jovens e adultos, outros nem sequer iniciam esse processo, logo nesta fase e ao longo dos anos sentem a necessidade de alfabetizar-se. Segundo Moll: “[...] Nesse sentido, quando falamos “em adultos em processo de alfabetização” no contexto social brasileiro, nos referimos a homens e mulheres marcados por experiências de infância na qual não puderam permanecer na escola pela necessidade de trabalhar, por concepções que as afastavam da escola como de que “mulher não precisa aprender” ou “saber os rudimentos da escrita já é suficiente”, ou ainda, pela seletividade construída internamente na rede escolar que produz ainda hoje itinerários descontínuos de aprendizagens formais. Referimo-nos a homens e mulheres que viveram e vivem situações limite nas quais os tempos de infância foi, via de regra, tempo de trabalho e de sustento das famílias.” (MOLL, 2004, p. 11). Ler e escrever são uma arte, principalmente para muitos que não aprenderam a ler e escrever na infância e consequentemente na vida adulta sentem falta desses atos, nas últimas décadas a oferta de ensino aumentou bastante, porém o acesso ainda é limitado para muitos, nem todos os brasileiros tiveram ou tem a oportunidade de alfabetizar-se na infância diversos fatores contribuem ou contribuíram para isso, como a necessidade de trabalhar nessa fase da vida, a falta de acesso a escola, ou até mesmo a falta de interesse, ao chegar na juventude ou na fase adulta a pessoa percebe o quanto a educação básica lhe faz falta e começa a persistir em busca do conhecimento. No decorrer da história da educação a alfabetização de jovens e adultos teve diferentes focos e contou com significantes projetos de alfabetização como o MOBRAL e Método Paulo Freire que será visto neste trabalho. O processo de aquisição da leitura e da escrita não é uma preocupação apenas de professores e alfabetizadores, a alfabetização é a base para uma educação eficaz, portanto para o aluno estar bem nas séries posteriores ele precisa de uma alfabetização sólida. Vivemos atualmente na sociedade do conhecimento, não só do conhecimento do senso comum como sempre foi, mas do conhecimento científico que facilita aos indivíduos uma vivência social de acordo com as imposições do meio e para tal o conhecimento transferido no ambiente escolar é fundamental. Atualmente a EJA tem objetivos maiores além da alfabetização por parte dos alunos, da necessidade de estar capacitado para o mercado de trabalho, ser atuante na sociedade e também o interesse político de reduzir o máximo a estatística de analfabetismo no país, este fator favorecerá com a pretensão de um dia o Brasil se tornar uma grande potência mundial. As primeiras formas de alcançar melhores condições de trabalho e ampliar conhecimento é que faz com que muitos jovens e adultos que não se alfabetizaram na infância ingressem em uma turma de EJA oferecida pelas escolas ou por grupos comunitários que desenvolvem projetos de alfabetização, ser alfabetizado nestas fases da vida depende de muita motivação e força de vontade, não basta apenas querer, a alfabetização de jovens e adultos ocorre de maneira intencional e consciente, segundo Pinto: “Os conceitos de “necessitar saber” vem da origem do interior do ser, considerado em sua plena realidade, enquanto o de “saber” e “não saber” (como fatos empíricos) coloca-se na superfície do ser humano, é um acidente social, além de ser impossível definir com rigor absoluto os limites entre o “saber e o não saber” (daí que não há uma fronteira exata entre o alfabetizado e o analfabeto). Porque o “necessitar” é uma coisa que ou é satisfeita (se é exigência interior) ou, se não é, não permite ao indivíduo subsistir como tal entre (por exemplo: as necessidades biológicas). O “necessitar” ao qual se referem a leitura e a escrita é de caráter social (uma vez que tem por fundamento o trabalho).” (PINTO, 2007, p. 92). É válido ressaltar que o direito a educação de Jovens e Adultos é assegurado por lei e as instituições de ensino devem realizá-la de maneira que atenda tal clientela sem ignorar suas limitações. Alfabetizar jovens e adultos é muito mais que transferir-lhes noções de leitura e escrita, o jovem ou adulto ao ingressar em uma escola ele tem um objetivo delimitado e compreende a escola como um meio para alcançar tal objetivo, o professor alfabetizador se torna então um mediador entre o aluno e o conhecimento, por isso ele precisa estar bem informado, motivado e querendo realizar um trabalho de construção. Há algumas décadas era comum grupos de pessoas adultas se reunirem para aprender escrever o nome e conhecer as letras do alfabeto, tais pessoas ficavam extremamente maravilhadas, pois dentro do contexto delas tal aprendizado era suficientemente satisfatório. Atualmente grupos ainda se reúnem, mas as expectativas são outras, só o aprendizado do próprio nome não é suficiente, o mercado de trabalho exige mais, até mesmo o simples fato de precisar identificar o itinerário do ônibus requer leitura. Segundo Libâneo: “A escola de hoje precisa não apenas conviver com outras modalidades de educação não formal, informal e profissional, mas também articular-se e integrar-se a elas, a fim de formar cidadãos mais preparados e qualificados para um novo tempo”. (LIBÂNEO, 2003, p. 53). Para isso o ensino escolar deve contribuir para: • Formar indivíduos capazes de pensar e de aprender permanentemente; • Prover formação global para atender à necessidade de maior e melhor qualificação profissional; • Desenvolver conhecimentos, capacidades e qualidades para o exercício consciente da cidadania; • Formar cidadãos éticos e solidários. A motivação é a chave para o sucesso da educação de jovens e adultos, desmotivados eles não conseguirão enfrentar as barreiras cotidianas, tudo se tornará mais difícil, cabe aos professores e a escola em geral incentivá-los para que não desistam. 2.3 O ANALFABETISMO COMO ANTAGONIA AO ALFABETISMO O analfabetismo é a qualidade de analfabeto, uma palavra de origem latina (analphabētus) que se refere àquelas pessoas que não sabem ler nem escrever. Porém, o termo costuma ter um uso mais extenso e é usado para fazer alusão aos indivíduos que são ignorantes ou que carecem de instrução elementar em alguma disciplina. O analfabetismo surge perante a falta de aprendizagem. Por isso, nos países que contam com programas de escolarização obrigatória, o analfabetismo é minoritário, mesmo para além do facto de que a compreensão de leitura das pessoas possa ser deficiente. Analfabeto é a pessoa que não sabe ler nem escrever. Segundo definição da UNESCO, “uma pessoa funcionalmente analfabeta é aquela que não pode participar de todas as atividades nas quais a alfabetização é requerida para uma atuação eficaz em seu grupo e comunidade, e que lhe permitem, também, continuar usando a leitura, a escrita e o cálculo a serviço do seu próprio desenvolvimento e do desenvolvimento de sua comunidade”. O analfabetismo no país ainda continua sendo um obstáculo para o progresso e desenvolvimento da humanidade. O importante é ressaltar que não estamos falando de ignorância. Analfabeto Funcional: sabe ler e escrever textos e frases curtas, mas não consegue interpretá-los, também não sabem realizar operações de matemática. Existem três níveis de Analfabetismo funcional: Existem três níveis distintos de alfabetização funcional, a saber: • Nível 1 - também conhecido como alfabetização rudimentar, compreende aqueles que apenas conseguem ler e compreender títulos de textos e frases curtas; e apesar de saber contar, têm dificuldades com a compreensão de números grandes e em fazer as operações aritméticas básicas; • Nível 2 - também conhecido como alfabetização básica, compreende aqueles que conseguem ler textos curtos, mas só conseguem extrair informações espessas no texto e não conseguem tirar uma conclusão a respeito do mesmo; e também conseguem entender números grandes, conseguem realizar as operações aritméticas básicas, entretanto sentem dificuldades quando é exigida uma maior quantidade de cálculos, ou em operações matemáticas mais complexas. • Nível 3 - também conhecido como alfabetização plena, compreende aqueles que detêm pleno domínio da leitura, escrita, dos números e das operações matemáticas (das mais básicas às mais complexas). Pode-se afirmar que, nos dias de hoje, a sociedade está experimentando uma nova forma de analfabetismo, chamado de analfabetismo digital. Este tipo de carência está relacionado com a falta de conhecimento necessário para utilizar computadores pessoais, celulares e agendas eletrônicas e dominar os sistemas que operam estas máquinas como, por exemplo, navegar na rede mundial de computadores. O grave problema do analfabetismo no mundo continua sendo um dos grandes temas prioritários a solucionar desde que se realizou a Conferência Mundial da Educação para Todos, ocorrida em 1990, em Jomtiem, Tailândia. Esta conferência foi assistida por representantes do mundo todo e chegou-se à conclusão de que a alfabetização é um dos fatores chave para resolver um dos problemas mais urgentes da sociedade, que a realização plena do ser humano só se dá através da educação e promovê-la é fundamental para o desenvolvimento das nações. Assim sendo, a educação é uma ferramenta extremamente útil para combater a pobreza e a desigualdade, elevar os níveis de saúde e bem estar social, criar as bases para um desenvolvimento econômico sustentável e a manutenção de uma democracia duradoura. Por este motivo a educação foi incluída na lista dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas, que fixou para o ano de 2015 a data limite para alcançar 100% de educação primária para todas as crianças do planeta. Para o plano ideológico da história da Educação de Jovens e Adultos, pode-se afirmar que tais medidas, no Estado brasileiro, refletiram na queda da taxa de analfabetismo ao longo dos anos. Segundo o professor doutor em filosofia do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro, o modelo teórico das iniciativas de alfabetização de jovens e adultos, mesmo tendo um cunho mais político no processo, este pôde remeter-se na queda do índice de habitantes analfabetos no Brasil, desde o Estado Novo ao governo Lula, esta ideologia teórica levou à pratica, uma nova visão de Brasil, uma perspectiva de habitantes mais preocupados com sua educação, ao menos ter o alicerce de poder gozar pelo menos do próprio saber a ler e a escrever, mesmo em um plano inicial. Mostra-se aí que as políticas educacionais mesmo sem o principal intuito de alfabetizar a população geraram programas que foram fomentados e mastigados pela população, que estes puderam ao menos voltar às salas de aula, a quem desistira quando jovem; ou mesmo entrar no âmbito educacional e conhecer de perto o ensino e a escola para aqueles que não puderam nem entrar nesta. A seguir o gráfico mostra como o índice de analfabetos decaiu a partir dos programas para a erradicação do analfabetismo primordialmente com a Educação de Jovens e Adultos. Figura 1. Gráfico com a queda da taxa de analfabetismo no Brasil no período de 1940 e 2010 É observado que a partir dos anos 1940, no governo Getúlio Vargas e o Estado Novo, o índice era de que em cada 100 pessoas quase 56 encontravam-se vítimas do analfabetismo no Brasil, número que ao passar dos anos vai declinando, chegando em 2010 com um índice em torno que, em cada 100 pessoas quase 10 encontravam-se analfabetas, isso é uma conquista tanto para o Estado que cresce no plano internacional, para a educação nacional que remete a ideia que os programas funcionam de forma ótima, e para o estudante que ingressa em uma sala da EJA. O próximo gráfico traz o índice por regiões brasileiras entre um plano de uma década, 2000 a 2010. Trazendo luz a queda no índice da taxa percentual. Figura 2. Gráfico com a taxa de analfabetismo por regiões do Brasil entre 2000 e 2010 Por fim, concluísse que com os programas educacionais de Educação de Jovens e Adultos, pôsse à erradicação e diminuição brusca do índice de percentual de analfabetos no país, uma vez que esses tendem ao cunho da erradicação dessas taxas que fazem com que a perspectiva do Brasil seja favorável ou desfavorável no plano internacional, já que a educação na contemporaneidade é fundamental para o crescimento do país. 3. REFEXÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Ao abordar a Educação de Jovens e Adultos como tema é fundamental conhecer e destacar o pensamento de alguns autores e educadores como Paulo Freire e outros que ao longo da vida profissional dedicaram-se a alfabetizar e que contribuem para a formação docente continuada. Este capítulo aborda tais reflexões e as particularidades do tema. 3.1 PENSAMENTO DE PAULO FREIRE SOBRE A EDUCAÇÃO POPULAR Educação popular é uma educação comprometida e participativa orientada pela perspectiva de realização de todos os direitos do povo. Quando se pensa em educação popular nos remetemos à imagem de Paulo Freire que foi o grande mentor, é uma educação que visa à formação do indivíduo com valores, conhecimento e consciência de cidadania, busca utilizar o que a pessoa já tem de conhecimento popular para transformar na matéria-prima do ensino. Esta educação popular é muito utilizada em assentamentos rurais, favelas, aldeias indígenas, pequenas comunidades, ONG’s dentre outras; por se tratar de uma educação que atende as necessidades em comum de um povo, uma educação em que tem os mesmos interesses em ampliar os seus conhecimentos e tornar cidadãos conscientes do seu papel na sociedade. Paulo Freire, o mais célebre educador brasileiro, tinha o pensamento de que a escola tinha que ensinar o aluno a “ler o mundo” para obter transformações, tendo em vista que se o aluno não saber a realidade do mundo em que vive não é possível lutar em busca de melhorias; para que haja transformação é essencial a conscientização, por isso Paulo Freire criou o seu método de ensino, pois não acreditava que uma pessoa adulta dor nordeste por exemplo que não conhecia “uva” pudesse aprender a ler e escrever apenas utilizando cartilhas com frases: EVA VIU UVA, pensou em aproximar os alunos a sua própria realidade, à sua rotina do dia a dia com as palavras geradoras. De acordo com a revista Nova Escola “Grandes Pensadores”: Freire dizia que ninguém ensina nada a ninguém, mas as pessoas também não aprendem sozinhas, os homens se educam entre si mediados pelo mundo. O pensamento de Paulo Freire é que o professor não é detentor do conhecimento e que não domina todas as áreas do conhecimento e é de fundamental importância a troca de experiências entre professor e aluno, o conhecimento de um completa o outro, todos nós somos dotados de inteligências e exercemos inteligências, porém nem todos a desenvolvem para a mesma área, muitas vezes um professor é excelente na sua profissão e não tem habilidades como pedreiro e o pedreiro constrói lindas casas e edifícios, mas não é alfabetizado e quando esse professor encontra este pedreiro podem trocar experiências distintas e ambos aprendem entre si. Para Freire um professor dedicado para a educação popular tem que acreditar em mudanças, não pode ensinar apenas a ler e escrever, é preciso haver uma mudança de paradigma, e transmitir esperanças, fazer com que o aluno se transforme em sujeito pensante, crítico e consciente do que lhe envolve no dia a dia, o professor tem que ter prazer, alegria e transmitir aos alunos. Paulo Freire diz que: “Há uma relação entre a alegria necessária à atividade educativa e a esperança. A esperança de que professor e alunos juntos podemos aprender, ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos à nossa alegria. Na verdade, do ponto de vista da natureza humana a esperança não é algo que a ela se justaponha. A esperança faz parte da natureza humana.” (FREIRE, 2002, p. 80). Para Freire é importante que o professor tenha esperança, uma vez que os jovens e adultos se espelham nos professores, e com esperança pode se acreditar em uma mudança de direção para a vida e para o mundo, para a sociedade, cita uma história popular que um passarinho viu um incêndio na floresta e correu para chamar os amigos para apagar o fogo, mas ninguém quis ir, então resolveu ir sozinho apagar o fogo, viu um rio e foi pegando água e jogando no fogo, certamente esse pássaro sabia que sozinho não poderia apagar toso o fogo, mas teve esperança que tomando a iniciativa talvez os outros pudessem acreditar que também seria capaz. Podemos comparar Paulo Freire a este passarinho, pois ele apenas deu início a essa educação e a cada dia pessoas se juntam a suas ideologias a fim de transformar a educação no nosso país e começam a mudar este paradigma. 3.2 ACERCA DO MÉTODO FREIRIANO O Método Paulo Freire consiste numa proposta para a alfabetização de adultos desenvolvidos pelo educador Paulo Freire, que em sua implementação concorreu com programas como o de Frank Laubach. Freire afirmou ter desenvolvido o método enquanto era diretor do Departamento de Extensões Culturais da Universidade do Recife, quando formou um grupo para testar o método na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. 3.2.1 ETAPAS DO MÉTODO 1. Etapa de investigação: busca conjunta entre professor e aluno das palavras e temas mais significativos da vida do aluno, dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive. 2. Etapa de tematização: momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados sociais dos temas e palavras. 3. Etapa de problematização: etapa em que o professor desafia e inspira o aluno a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada. 3.2.2 O MÉTODO • As palavras geradoras: o processo proposto por Paulo Freire inicia-se pelo levantamento do universo vocabular dos alunos. Através de conversas informais, o educador observa os vocábulos mais usados pelos alunos e a comunidade e, assim, seleciona as palavras que servirão de base para as lições. A quantidade de palavras geradoras pode variar entre 18 a 23 palavras, aproximadamente. Depois de composto o universo das palavras geradoras, elas são apresentadas em cartazes com imagens. Então, nos círculos de cultura, inicia-se uma discussão para dar-lhes significado dentro da realidade daquela turma. • A silabação: uma vez identificadas, cada palavra geradora passa a ser estudada através da divisão silábica, semelhantemente ao método tradicional. Cada sílaba se desdobra em sua respectiva família silábica, com a mudança da vogal. Por exemplo: BA-BE-BI-BO-BU. • As palavras novas: o passo seguinte é a formação de palavras novas. Usando as famílias silábicas agora conhecidas, o grupo forma palavras novas. • A conscientização: um ponto fundamental do método é a discussão sobre os diversos temas surgidos a partir das palavras geradoras. Para Paulo Freire, alfabetizar não pode se restringir aos processos de codificação e decodificação. Dessa forma, o objetivo da alfabetização de adultos é promover a conscientização acerca dos problemas cotidianos, a compreensão do mundo e o conhecimento da realidade social. 3.2.3 AS FASES DE APLICAÇÃO DO MÉTODO Freire propõe a aplicação de seu método nas cinco fases seguintes: • 1ª fase: levantamento do universo vocabular do grupo. Nessa fase, ocorrem as interações de aproximação e conhecimento mútuo, bem como a anotação das palavras da linguagem dos membros do grupo, respeitando seu linguajar típico. • 2ª fase: escolha das palavras selecionadas, seguindo os critérios de riqueza fonética, dificuldades fonéticas - numa sequência gradativa das mais simples para as mais complexas, do comprometimento pragmático da palavra na realidade social, cultural, política do grupo e/ou sua comunidade. • 3ª fase: criação de situações existenciais características do grupo. Trata-se de situações inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas para a análise crítica consciente de problemas locais, regionais e nacionais. • 4ª fase: criação das fichas-roteiro neles havia indicações de possíveis subtemas ligadas as palavras geradoras e sugestões de encaminhamentos para análise dos temas selecionados que funcionam como roteiro para os debates, as quais fossem apenas sugestões esses roteiros eram de grande valia, principalmente no inicio do trabalho quando a alfabetizador era também iniciante. • 5ª fase: criação de fichas de palavras para a decomposição das famílias fonéticas correspondentes às palavras geradoras. 3.2.4 HISTÓRIA Freire aplicou publicamente seu método pela primeira vez no Centro de Cultura Dona Olegarinha, um círculo de cultura do Movimento de Cultura Popular no Recife. Foi aplicado inicialmente a cinco alunos, dos quais três aprenderam a ler e escrever em 30 horas e outros dois desistiram antes de concluir. Baseado na experiência de Angicos, em janeiro de 1963, onde em 45 dias, alfabetizaram-se 300 trabalhadores, João Goulart, presidente do Brasil na época, chamou Paulo Freire para organizar o Plano Nacional de Alfabetização. Este plano, iniciado em janeiro de 1964, tinha como objetivo alfabetizar 2 milhões de pessoas em 20 000 círculos de cultura, e já contava com a participação da comunidade - só no estado da Guanabara, se inscreveram 6 000 pessoas. Mas, com o Golpe de Estado no Brasil em 1964, em abril, toda essa mobilização social foi reprimida e Paulo Freire foi considerado subversivo, sendo preso e, depois, exilado. Assim, esse projeto foi abortado. Em seu lugar, surgiu o Movimento Brasileiro de Alfabetização, igualmente uma iniciativa para a alfabetização, porém distinta do método freiriano. 3.3 O PERFIL DO PROFESSOR ALFABETIZADOR Alfabetizar jovens e adultos é uma ação peculiar e nem sempre se dá da mesma forma com se alfabetiza uma criança na infância o professor alfabetizador deve partir dor princípios de açãoreflexão-ação e deve estar aliado à formação continuada. A formação continuada permite refletir suas ações e repensar a sua prática, elaborando planos e/ou projetos que possam aprimorar a sua prática educativa. Alfabetizar na EJA envolve também a afetividade, o gosto e a responsabilidade. É fundamental que o professor da EJA tenha a consciência da valorização do outro, é importante valorizar o conhecimento que este aluno possui, pois durante toda a vida o aluno adquire um vasto conhecimento do senso comum e valorize também as suas experiências de vida, entretanto o diálogo tem que estar presente nas aulas, o professor tem que usar uma linguagem simples e acessível. O professor é um incentivador um meio para alcançar a motivação dos alunos e nesta fase da vida motivação é um aspecto fundamental. A prática da ação-reflexão-ação permite ao professor lançar estratégias para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem. Ao observar turmas da EJA é comum observar que os professores regentes em tais turmas são geralmente professores experientes que despertam a confiança em seus alunos e que acreditam na educação como foco de mudança. Segundo Leal: “O conhecimento na ação, ou o conhecimento tácito, seria aquele constituído na prática cotidiana do exercício profissional. Concebemos que esse é um saber que se constrói com base nos conhecimentos prévios de formação inicial, articulado com os saberes gerados na prática cotidiana, de forma assistemática e muitas vezes sem tomada de consciência acerca dos modos de construção. Para um projeto de formação numa base reflexiva, torna-se fundamental conhecer e valorizar esses conhecimentos que são constituídos pelos professores, seja através de uma reflexão teórica, seja através desses processos eminentemente assistemáticos.” (LEAL, 2005, p. 114). A aprendizagem não pode ser simplesmente transmitida, ela é um processo de construção onde professora busca oferecer meios que favoreçam tal construção, a do conhecimento: tudo o que já foi vivido pelo aluno serve como base, o professor deve utilizar também a vivência e o conhecimento prévio do aluno para ajudá-lo na construção do saber. Aquilo que é oferecido ao alfabetizando deve fazer sentido para ele, se o professor partir de um ponto desconhecido que foge à realidade do aluno ele poderá não alcançar a compreensão necessária ao letramento. A principal função do professor na EJA é mediar, interagir o aluno com o meio, usar metodologias que favoreçam o processo de construção de ensino-aprendizagem, o aluno da atualidade espera muito mais que aprender a assinar o nome, portanto exercício de mera memorização, atividades mecânicas não permitem o êxito na EJA. A interdisciplinaridade deve fazer parte também desse processo os temas transversais como, ética, valores e cidadania são temas que norteiam a construção do conhecimento nesta fase. A educação de Jovens e Adultos traz muitos desafios tanto para professores quanto para alunos e são esses desafios que constroem práticas eficazes de alfabetização. Kelly Camargo Pulice in Moll esclarece muito bem o papel do educador na EJA, ao citar: “O papel do educador é pensar formas de intervir e transformar a realidade, problematizando-a, dialogando com o educando. Em sala de aula o importante não é “depositar” conteúdos, mas despertar uma nova forma de relação com a experiência vivida. Portanto, antes de qualquer coisa, é preciso conhecer o aluno: conhecê-lo como indivíduo num contexto social, com seus problemas, seus medos, suas necessidades, valorizando seu saber, sua cultura, sua oralidade, seus desejos, seus sonhos, isto possibilita uma aprendizagem integradora, abrangente, não compartimentalizada, não fragmentada.” (MOLL, 2004, p. 11). 3.4 PERFIL DO ESTUDANTE DA EJA E OS MOTIVOS DE EVASÃO Os alunos da EJA são geralmente pessoas vindas de famílias de baixa renda, sendo que muitas vezes os pais também não são alfabetizados, isso faz com que muitas vezes se sentem discriminados pela sociedade; vivemos em uma sociedade que para toda a nossa rotina é necessário a leitura,para se tomar um ônibus é necessário conseguir identificá-lo, para fazer compras tem que conhecer os números, contudo esse aluno da EJA pode se sentir excluído da sociedade, quando pensamos em exclusão nos remetemos a pessoas com deficiência, mas a exclusão não se limita a deficiência intelectuais e mentais, para esses alunos que por alguns motivos não estudaram nos primeiros anos de vida este termo também cabe. O autor Bieler fala sobre a importância da inclusão. “[...] A perspectiva da educação inclusiva vai além da deficiência. Esta é apenas uma das áreas que seriam beneficiadas com ela (educação inclusiva) A qualidade da educação é que está em debate porque hoje não se considera (nos sistemas educacionais ) a diversidade dos alunos, os níveis de necessidade e as características individuais. A proposta da educação inclusiva melhoraria a qualidade do ensino para todos. Não se trata só de incluir deficientes nas sala de aula.” (BIELER, 2004, p. 11). O aluno da EJA possui necessidade educacional especial independente de ter ou não deficiência física. Uma vez que estes alunos vão para a escola após um longo dia de serviço, sua mente já está cansada, ao contrario de uma criança que não trabalha e nem tem preocupações com a família, como os adultos. A maioria destes alunos da EJA tem a necessidade de voltar a escola para se sentir incluído na sociedade, procuram melhores condições de vida , almeja um melhor cargo no trabalho, muitos buscam a leitura com o objetivo de ser mais participativos e críticos na sociedade e até por motivos religiosos como o sonho de aprender ler para conseguir ler a bíblia, entretanto boa parte destes alunos busca uma realização pessoal, principalmente os mais idosos que as vezes são motivos de chacotas por estarem estudando nesta fase da vida. Os alunos da EJA por se tratarem de adolescentes acima de 14 anos e adultos, já tem suas experiências de vida, muitas vezes até traumas podem ter sido criados por não ter conseguido estudar anteriormente por vários motivos, desta forma os alunos criam um bloqueio, por isto o professor deve estar seguro para tentar quebrar estes bloqueios. Às vezes estes alunos podem estar com sua autoestima muito baixa, aí entra o papel do professor para traçar práticas adequadas para incentivá-los a motivação. A autoestima é fundamental para este processo de alfabetização, pois quando há esperanças se tem forças para vencer os desafios na busca de um objetivo. As turmas da EJA funcionam geralmente a noite que é o horário disponível para pessoas que trabalham diariamente, deve haver muita força de vontade e incentivo para jovens e adultos concluírem o curso. O número de evasão na EJA é muito grande, os alunos se sentem desmotivados e cansados; a grande maioria trabalha o dia inteiro, pegam ônibus lotado, muitas mulheres não trabalham fora, porém trabalham em casa. É fundamental que os professores da EJA sejam dinâmicos, aproximem o conteúdo à realidade do aluno, procurem sempre inovar e não criem barreiras para afastar esses alunos. O professor da EJA tem que estar motivado para conseguir motivar os alunos, todavia que os alunos são reflexos dos professores. Quando se pensa em evasão na EJA é de suma importância conhecer o perfil destes alunos, para tentar entender por que se dá esta evasão. As causas evasão na EJA são muitas, podemos destacar o cansaço após um dia de serviço, a distância entre casa/escola que aumenta as possibilidades de assaltos, entre outros fatores que se dá por conta da violência urbana. Outro fator é o apoio da família que nem sempre existe, o apoio do governo, da escola, direção, professores muitas vezes não estimulam os alunos; e também o desinteresse interfere sobre esta questão. É notório que existem fatores que contribuem direta ou indiretamente na evasão escolar, isso é uma preocupação de muitos, tais como escola, gestão escolar, governo, entre outras instituições. O fracasso escolar também é uma das causas de evasão, na Proposta Curricular para o 1º segmento do ensino fundamental (1997) consta que: “No público que efetivamente frequenta os programas de educação de jovens e adultos, é cada vez mais reduzido o número daqueles que não tiveram nenhuma passagem anterior pela escola. É também cada vez mais dominante a presença de adolescentes e jovens recém saídos do ensino regular, por onde tiveram passagens acidentadas.” É fundamental que aluno e professor compreendam que erros podem ser transformados em aprendizagem, é possível aprender com eles, os erros não podem ser contribuintes para causar evasão. De acordo com Cortella (1999, p. 112): “[...] O erro não ocupa um lugar externo ao processo de conhecer, investigar é bem diferente de receber uma revelação límpida, transparente e perfeita. O erro é parte integrante do conhecer não porque “errar é humano”, mas porque nosso conhecimento sobre o mundo dá-se em uma relação viva e cambiante (sem o. (shrink)
REPRODUÇÃO ANIMAL: O CICLO ESTRAL DE BOVINOS LEITEIROS – Desenvolvimento Folicular, Corpo Lúteo e Etapas do Estro ANIMAL REPRODUCTION: THE OESTROUS CYCLE OF DAIRY BOVINES -Follicular Development, Corpus Luteum and Stages of Estrus Apoio: Emanuel Isaque Cordeiro da Silva Departamento de Zootecnia da UFRPE E-mail: [email protected] WhatsApp: (82)98143-8399 FISIOLOGIA CLÍNICA DO CICLO ESTRAL DE BOVINOS LEITEIROS 1. RESUMO A fêmea bovina apresenta ciclos estrais em intervalos de 19 a 23 dias e estes só são interrompidos durante a gestação ou (...) devido a alguma patologia. O estro é o período de aceitação da cópula e tem uma duração de 8 a 18 horas. Durante o metaestro ocorre a ovulação e se desenvolve o corpo lúteo. O diestro é o estágio mais longo do ciclo e é caracterizado pela presença de um corpo lúteo. Se a gestação não for estabelecida, o endométrio segrega prostaglandina F2α(PGF2α) o que induz a luteólise, reiniciando assim um novo ciclo. 2. EIXO HIPOTÁLAMO-HIPÓFISE-OVÁRIO As hormonas são substâncias produzidas por diferentes células do organismo que exercem funções específicas em outras células (células brancas). Algumas hormonas atuam na mesma célula que a secreta (atividade autocrina), outras nas células vizinhas (atividade parácrina) e outras são transportadas pelo sangue e exercem a sua função em células de outros órgãos (atividade endócrina). Existem outros tipos de hormônios que comunicam a diferentes indivíduos e são conhecidos como feromônios. Os feromônios regulam diferentes funções, entre as quais se destacam as reprodutivas. O hipotálamo encontra-se na base do cérebro, é formado por núcleos pares de neurônios e comunica-se com a hipófise através de um sistema circulatório especializado conhecido como sistema porta-hipotálamo-hipofisário. Os neurônios da área ventromedial e da área pré-óptica do hipotálamo secretam a hormona libertadora das gonadotropinas (GnRH), que por sua vez chega à hipófise através do sistema porta-hipotálamo-hipofisário e estimula a secreção da hormona luteinizante (LH) e da hormona folículo estimulante (FSH). A LH mantém um padrão de secreção paralelo à secreção da GnRH; ou seja, uma parcela de GnRH corresponde a uma parcela de LH, ao contrário da FSH que tem uma produção basal elevada inibida pelo estradiol e inibina, por este motivo, a sua secreção não apresenta um padrão pulsante semelhante à LH. A GnRH tem duas formas de secreção: a primeira é pulsante ou tônica, regulada por estímulos externos (fotoperíodo, bioestimulação, amamentação) e por estímulos internos (metabolitos, hormonas metabólicas, hormonas sexuais); a segunda forma é pré-ovulatória ou cíclica e é estimulada pelos estrogênios durante o estro e inibida pela progesterona. A secreção de alguns hormônios, bem como diversos processos fisiológicos, são sincronizados com a duração do dia e da noite (ritmos endógenos). A luz é percebida pelos fotorreceptores da retina e o sinal luminoso chega à glândula pineal através de conexões neuronais (trato retino-hipotalâmico). Na glândula pineal, o estímulo produzido pela luz inibe a síntese da melatonina. Desta forma, a duração do dia e da noite (fotoperíodo) é registada pelas variações nas concentrações da melatonina. Na vaca, sabe-se que o fotoperíodo influencia alguns processos reprodutivos, embora não seja, em sentido estrito, uma espécie com um padrão reprodutivo sazonal. Os feromônios sexuais são excretados através da urina, fezes e fluidos corporais; eles são percebidos pelo epitélio olfatório e órgão vomeronasal. Posteriormente, algumas vias nervosas, estimulam no hipotálamo a frequência dos pulsos de secreção da GnRH. A exposição a feromonas femininas provoca no macho um aumento na frequência de secreção do LH e isto por sua vez aumenta as concentrações de testosterona. Os feromônios masculinos induzem na fêmea um aumento da frequência de secreção do LH, estimulando o crescimento folicular e a secreção de estradiol. A estimulação sexual provocada pelo macho ou pela fêmea é denominada bioestimulação. As alterações na condição corporal estão positivamente correlacionadas com as concentrações séricas de insulina, fator de crescimento semelhante à insulina tipo I (IGF- I) e leptina. Assim, quanto maior a classificação da condição corporal, maior é a concentração sérica destas hormonas, que atuam como sinais que chegam ao hipotálamo e modificam a frequência de secreção da GnRH. Por exemplo, a transição do anestro para a ciclicidade coincide com um aumento da condição corporal e das concentrações de insulina, IGF- I e leptina (figura 1). Figura 1. A transição do anestro para a ciclicidade coincide com um aumento da condição corporal e das concentrações de insulina, IGF- I e leptina. Estas hormonas atuam como sinais que chegam ao hipotálamo e aumentam a frequência de secreção da GnRH. Fonte: GALINA, et al. 2008. Os estrogênios podem ter um feedback positivo ou negativo sobre a secreção da GnRH, o que depende da fase do ciclo reprodutivo. Em animais pré-púberes e em anestro pós-parto, os estrogênios inibem a secreção de GnRH, mas durante o período de proestro e estro há uma estimulação para a secreção de GnRH. A progesterona reduz a secreção da GnRH, bem como a resposta da hipófise à GnRH, inibindo assim a maturação folicular e a ovulação. Por esta razão, a progesterona foi utilizada com sucesso como contraceptivo em humanos e para o controle artificial da reprodução em animais domésticos (figura 2). Figura 2. Retroalimentação entre o hipotálamo, hipófise e o ovário. A GnRH estimula na hipófise a síntese e secreção de LH e FSH. Na fase pré-púbere e no anestro pós-parto, os estrogênios inibem a secreção de GnRH, enquanto no proestro e estro, estimulam-na. A progesterona inibe a secreção da GnRH e diminui a resposta da hipófise à GnRH. Os estrogênios e a inibina suprimem a secreção de FSH diretamente na hipófise. Fonte: GALINA, et al. 2008. Os neurônios secretores da GnRH não têm receptores para estrogênios nem progesterona, pelo que estas hormonas não têm forma de regular diretamente a secreção da GnRH. Existe um grupo de neurônios hipotalâmicos que exprimem o gene Kiss-1 que codifica o peptídeo kisspeptina. Os neurônios secretores da GnRH têm receptores para este peptídeo, de modo que a kisspeptina fornece a informação aos neurônios secretores da GnRH em relação às concentrações de hormônios sexuais. A kisspeptina é um potente estimulador (secretagogo) da secreção da GnRH e é muito provável que nos próximos anos venha a fazer parte dos recursos hormonais para o controle artificial da reprodução, não só nos bovinos, mas em todas as espécies domésticas. 3. DESENVOLVIMENTO FOLICULAR O ovário é responsável pela produção de ovócitos e pela síntese de hormônios sexuais, estrogênios e progesterona, que promovem e regulam a fertilização do ovócito e a manutenção da gestação. O ovócito encontra-se no interior do folículo ovárico rodeado por células granulosas que participam de forma ativa no seu crescimento e maturação. As experiências in vitro demonstram a dependência dos ovócitos das células da granulosa, assim, quando os ovócitos são induzidos a amadurecer devem estar rodeados por várias camadas de células da granulosa para que este processo seja bem sucedido, caso contrário, não adquirem o potencial para desenvolver um embrião. Embora as células da teca interna não estejam em contato direto com o ovócito, seu papel na maturação deste o exercem mediante a produção de andrógenos, mesmos que são convertidos em estrogênios pelas células da granulosa. Além disso, as células da teca favorecem o estabelecimento da rede capilar que apoia o desenvolvimento folicular. Por outro lado, os novos conhecimentos indicam que o ovócito não é um elemento passivo no desenvolvimento folicular, mas regula a função das células foliculares; o que significa que ele próprio participa na criação de um microambiente ideal para a sua maturação. Além disso, é possível que o ovócito tenha um papel na ativação do desenvolvimento dos folículos primordiais. A fêmea bovina nasce com aproximadamente 200 mil folículos, dos quais muito poucos se ativam e iniciam seu crescimento, e a maior parte deles sofre atresia em diferentes etapas de desenvolvimento. Ao nascimento, os folículos estão na fase mais elementar e são conhecidos como folículos primordiais. Posteriormente estes folículos se ativam e se transformam em folículos primários e secundários; até este momento os folículos não têm antro (etapa pré-antral) e seu desenvolvimento é independente das gonadotropinas. Quando os folículos formam o antro são conhecidos como folículos terciários e seu desenvolvimento é dependente das gonadotropinas (etapa antral). O crescimento folicular no estágio antral ocorre em forma de ondas e cada onda começa com um aumento nos níveis de FSH, o qual promove o crescimento de um grupo de cinco a seis folículos (~4 mm de diâmetro); este processo é conhecido como recrutamento. Subsequentemente, um único folículo continua a crescer (folículo dominante), o que provoca um aumento das concentrações de estrogênios e inibina, uma diminuição das concentrações de FSH e atresia dos folículos subordinados, pois eles dependem totalmente desta hormona, enquanto o folículo dominante continua o seu desenvolvimento estimulado pela LH. O folículo dominante perdura de quatro a seis dias e se não chega a ovular, sofre atresia. Após a atresia do folículo dominante, diminuem-se os níveis de estrogênio e inibina, observa-se um aumento das concentrações de FSH e inicia-se uma nova onda folicular. O folículo dominante que está presente quando o corpo lúteo sofre regressão, continua seu desenvolvimento e ovula, em resposta ao pico pré-ovulatório de LH. Além de promover a liberação do ovócito, a secreção pré-ovulatória de LH regula a formação do corpo lúteo a partir das células foliculares, processo conhecido como luteinização. Durante o ciclo estral são apresentadas de duas a três ondas foliculares. As vacas com três ondas foliculares têm uma fase lútea mais longa e, consequentemente, um ciclo estral mais longo, de 22 a 23 dias; enquanto as vacas com duas ondas apresentam um ciclo estral de 18 a 21 dias. Nas vacas leiteiras, cerca de 70% apresentam duas ondas foliculares, enquanto 30% exibem três ondas (figura 3 e 4). Nas vacas com duas ondas foliculares, o período de dominação folicular é maior do que nas de três ondas. O tempo de dominação influencia o potencial dos ovócitos para desenvolver um embrião viável; assim, a porcentagem de concepção é menor quando ovulam folículos que tiveram mais dias de dominação dos que quando ovulam folículos com menor tempo de dominação (figura 5). Figura 5. O crescimento folicular no estágio antral ocorre na forma de ondas. Cada onda começa com um aumento nas concentrações de FSH, o que promove o recrutamento de cinco a seis folículos (~4 mm de diâmetro). Posteriormente um único folículo continua crescendo (folículo dominante), enquanto seus companheiros (subordinados) sofrem atresia. O folículo dominante perdura de quatro a seis dias e se não chega a ovular, sofre atresia. Após a atresia do folículo dominante observa-se um aumento das concentrações de FSH, iniciando-se uma nova onda folicular. 3.1 Ovulação múltipla Nos últimos anos tem-se observado um aumento na proporção de vacas com ovulação múltipla (20% x 1% em novilhas), o que tem provocado um aumento da proporção de partos gêmeos (8% x 1% em novilhas). A frequência de vacas com ovulação múltipla está associada com a alta produção de leite; de modo que, as vacas que produzem menos de 40 kg mostram 6% de ovulações múltiplas e aquelas que produzem mais de 50 kg alcançam até 50%. A causa deste fenômeno ainda é obscura, contudo, observaram-se diferenças nas concentrações de FSH, de tal forma que as vacas que desenvolvem de dois a três folículos dominantes numa onda folicular, apresentam níveis de FSH mais elevados que as vacas que têm apenas um folículo dominante. Em vacas em lactação, a concentração de progesterona é baixa devido ao aumento do metabolismo hepático, o que aumenta a sua taxa de eliminação. Foi observado que as vacas que tiveram uma fase lútea com níveis de progesterona mais elevados, no ciclo anterior à inseminação, apresentam menos ovulações múltiplas em comparação com as vacas que tiveram níveis de progesterona mais baixos. Propõe-se que as baixas concentrações de progesterona permitam um aumento da frequência de secreção da GnRH e, consequentemente, da LH e da FSH, favorecendo a predominância múltipla e, eventualmente, a ovulação de mais de um folículo. Nos rebanhos leiteiros, as gestações gêmeas não são desejáveis porque aumenta o risco de perda da gestação e, se esta chegar ao término, haverá o risco de perda da gestação e, se esta for concluída, o risco de distorcia é consideravelmente mais elevado (figuras 6, 7, 8 e 9). Figura 6. As baixas concentrações de progesterona sérica nas vacas em lactação permitem um aumento da frequência de secreção da GnRH, bem como o aumento da LH e da FSH. Isto favorece a dominação múltipla e eventualmente a ovulação de mais de um folículo. Esta figura mostra a dominância de dois folículos em cada onda folicular (codominância). Figura 7. Ovários de uma vaca leiteira em diestro com três folículos dominantes. Figura 8. Ovários de uma vaca leiteira com três corpos lúteos. Figura 9. Ovários de uma vaca leiteira com dois corpos hemorrágicos. Fonte: Acervo pessoal do autor. IFPE, 2017-18. 4. DESENVOLVIMENTO E CONTROLE DA FUNÇÃO DO CORPO LÚTEO Quando o folículo dominante completa sua maturação, ele produz níveis de estrogênio suficientes para provocar a liberação máxima da GnRH, o que desencadeia o pico pré-ovulatório da LH. Esta secreção de LH provoca a ovulação e inicia as mudanças para que o folículo se transforme em um corpo lúteo, processo conhecido como luteinização. A luteinização compreende todas as mudanças morfológicas, endócrinas e enzimáticas que ocorrem no folículo ovulatório até que este se transforme num corpo lúteo. O processo de luteinização começa a partir da elevação pré-ovulatória de LH; mesmo antes da ovulação. A luteinização do folículo dominante (≥8 mm de diâmetro) pode ser induzida hormonalmente pela injeção de GnRH ou gonadotropina coriónica humana (hCG). A ovulação ocorre em média 30 horas após o pico pré-ovulatório de LH. A secreção pré-ovulatória de LH desencadeia a liberação de enzimas proteolíticas e de mediadores da inflamação na parede folicular, as quais degradam o tecido conjuntivo e ocasionam morte celular. Posteriormente, a PGF2α induz contrações da teca externa, levando à ruptura folicular e à expulsão do ovócito. Após a ovulação, as células da teca interna e da granulosa migram e distribuem-se nas paredes do folículo. As células da teca interna se diferenciam e se multiplicam em células lúteas pequenas, enquanto que as células da granulosa se hipertrofiam e dão origem às células lúteas grandes. Estas alterações são facilitadas pela ruptura da membrana basal que separa a camada celular da granulosa da teca interna. Em forma paralela começa a formação de uma ampla rede de capilares que se distribuem em todo o corpo lúteo em formação, e chegam a constituir até 20% do volume desta estrutura (figuras 10 e 11). A progesterona é o principal produto de secreção do corpo lúteo. No quinto dia do ciclo estral, as concentrações séricas desta hormona são superiores a 1 ng/ ml, indicando que o corpo lúteo adquiriu a sua plena funcionalidade. A progesterona atua basicamente sobre os órgãos genitais da fêmea, sendo responsável pela preparação do útero para o estabelecimento e manutenção da gestação. Na mucosa do oviduto e do útero, estimula a secreção de substâncias que promovem o desenvolvimento do embrião, até que este comece a nutrir-se através da placenta. A progesterona suprime a resposta imunitária do útero, o que é necessário para tolerar o embrião, já que este é um tecido estranho para a vaca. Além disso, a progesterona evita as contrações do útero, fecha o colo do útero e modifica as características do muco cervical, tornando-o mais viscoso, impedindo a passagem de agentes estranhos para o interior do útero. Na glândula mamária estimula o desenvolvimento do sistema alveolar, preparando-a para a síntese e a secreção de leite. 5. REGRESSÃO DO CORPO LÚTEO A regressão lútea é um processo ativo ocasionado pela secreção uterina da PGF2α. O mecanismo pelo qual se inicia a síntese e secreção da PGF2α depende de uma interação entre o corpo lúteo, os folículos e o útero. Os estrogênios produzidos no folículo dominante desempenham um papel importante no início da secreção de PGF2α, uma vez que promovem a síntese de receptores para oxitocina. Além disso, os estrogénios estimulam no endométrio a produção da fosfolipase A e da ciclooxigenase; enzimas indispensáveis para a síntese da PGF2α. Durante o ciclo estral, a progesterona inibe a síntese da PGF2α através da supressão da formação de receptores para o estradiol. Após um período de 12 a 14 dias de exposição à progesterona, as células endometriais tornam-se insensíveis à progesterona. Quando isso ocorre, as células endometriais sintetizam receptores para estradiol, permitindo que o estradiol produzido no folículo dominante estimule a síntese de receptores para oxitocina. Neste momento, o endométrio está pronto para sintetizar e secretar PGF2α, em resposta ao estímulo da oxitocina. A primeira secreção de oxitocina é de origem hipotalâmica, o que desencadeia o primeiro pulso de PGF2α. Os seguintes episódios de PGF2α são induzidos pela oxitocina produzida no corpo lúteo. A PGF2α é secretada em episódios (pulsos) com intervalos de seis a oito horas, sendo necessários cinco a seis episódios para a luteólise ocorrer. Se a PGF2α não seguir este padrão de secreção, a regressão do corpo lúteo falhará. Além da PGF2α de origem uterina, o corpo lúteo também produz PGF2α, que aumenta o efeito luteolítico. A falta de sensibilidade à PGF2α observada nos corpos lúteos imaturos (primeiros cinco dias após a ovulação) deve-se ao fato de, neste período, o corpo lúteo ainda não produzir PGF2α (figura 12, 13 e 14). 6. ETAPAS DO CICLO ESTRAL O ciclo estral é dividido em quatro etapas bem definidas. 6.1 Estro Neste estágio a fêmea aceita a cópula ou a monta de outra vaca. O estro é provocado pelo aumento significativo das concentrações de estradiol produzido pelo folículo pré-ovulatório e pela ausência de um corpo lúteo. A duração desta etapa é de 8 a 18 horas. 6.2 Metaestro O metaestro é a etapa posterior ao estro, tem uma duração de quatro a cinco dias. Durante esta etapa ocorre a ovulação e se desenvolve o corpo de lúteo. Após a ovulação, observa-se uma depressão no lugar ocupado pelo folículo ovulatório (depressão ovulatória) e, posteriormente, se desenvolve o corpo hemorrágico (corpo lúteo em processo de formação). Durante o metaestro, as concentrações de progesterona começam a aumentar até atingirem níveis superiores a 1 ng/ml, momento a partir da qual considera-se que o corpo lúteo atingiu a maturidade. O momento em que as concentrações de progesterona são superiores a 1 ng/ml toma-se como critério fisiológico a determinação do fim do metaestro e o início do diestro. Um evento hormonal que se destaca neste período consiste na apresentação do pico pós-ovulatório de FSH, o qual desencadeia a primeira onda de desenvolvimento folicular. Algumas vacas apresentam sangramento conhecido como sangramento metaestral (figura 15). 6.3 Diestro O diestro é o estágio de maior duração do ciclo estral, de 12 a 14 dias. Durante este estágio o corpo lúteo mantém sua plena funcionalidade, o que se reflete em concentrações sanguíneas de progesterona, maiores que 1 ng/ml. Além disso, nesta fase, pode-se encontrar folículos de tamanho diferente devido às ondas foliculares. Após 12-14 dias de exposição à progesterona, o endométrio começa a secretar PGF2α em um padrão pulsátil, ao qual termina com a vida do corpo lúteo e com o diestro. Em termos endócrinos, quando o corpo lúteo perde a sua funcionalidade, ou seja, quando as concentrações de progesterona diminuem abaixo de 1 ng/ml, finaliza-se o diestro e começa o proestro. Convém mencionar que durante esta fase, a LH é secretada com uma frequência muito baixa e a FSH tem incrementos responsáveis pelas ondas foliculares. 6.4 Proestro O proestro caracteriza-se pela ausência de um corpo lúteo funcional e pelo desenvolvimento e maturação do folículo ovulatório. O proestro na vaca dura de dois a três dias. Um evento hormonal característico desta etapa é o aumento da frequência dos pulsos de secreção de LH que levam à maturação final do folículo ovulatório e ao aumento do estradiol sérico, que desencadeia o estro. Para além da classificação do ciclo estral acima descrita, existe outra que divide o ciclo em duas fases: progestacional (lútea) e estrogênica (folicular). A fase progestacional inclui o metaestro e o diestro, e a fase estrogênica ao proestro e estro (figura 16). Figura 16. Etapas do ciclo estral. Adaptado e elaborado a partir de FERREIRA, 2010. 7. CONCLUSÕES PRÉVIAS O ciclo estral dura de 19 a 23 dias. A vaca é receptiva durante 8 a 18 horas (estro). Ao nascimento uma bezerra tem cerca de 200 mil folículos primordiais. Durante o ciclo estral se apresentam de duas a três ondas foliculares. De cinco a seis folículos são recrutados em cada onda folicular. Cerca de 70% das vacas têm duas ondas foliculares e 30% apresentam três ondas. Entre 10 e 20% das vacas têm ovulações múltiplas (dois a três folículos) e 8% têm partos gêmeos. A ovulação ocorre 30 horas após o pico pré-ovulatório de LH. A secreção pré-ovulatória de LH é de 15 a 30 ng/ml. 12 a 14 dias são necessários para que o endométrio se torne insensível à progesterona e comece a secretar PGF2α. - São necessários cinco a seis pulsos de PGF2α com um intervalo de oito horas para ocasionar a luteólise. O corpo lúteo não é sensível à PGF2α nos primeiros cinco dias do ciclo estral. Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – Departamento de Zootecnia da UFRPE Recife, 2020. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Nadja Gomes; PEREIRA, Marcos Neves; COELHO, Rodrigo Michelini. Nutrição e reprodução em vacas leiteiras. Revista Brasileira de Reprodução Animal, p. l1248-l1248, 2009. ARBOLEDA, José Leonardo Ruiz; URIBE-VELÁSQUEZ, Luis Fernando; OSORIO, José Henry. Factor de crecimiento semejante a insulina tipo 1 (IGF-1) en la reproducción de la hembra bovina. Vet. zootec, v. 5, n. 2, p. 68-81, 2011. BARUSELLI, Pietro Sampaio; GIMENES, Lindsay Unno; SALES, José Nélio de Sousa. Fisiologia reprodutiva de fêmeas taurinas e zebuínas. 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REPRODUÇÃO ANIMAL: TRANSFERÊNCIA DE EMBRIÕES EM ANIMAIS, E A INDÚSTRIA DE EMBRIÕES NO BRASIL -/- ANIMAL BREEDING: EMBRYO TRANSFER IN ANIMALS, AND THE EMBRYO INDUSTRY IN BRAZIL Apoio: Emanuel Isaque Cordeiro da Silva Departamento de Zootecnia da UFRPE E-mail: [email protected] WhatsApp: (82)98143-8399 -/- 1. INTRODUÇÃO A técnica da inseminação artificial tornou possível aumentar o impacto na descendência de touros geneticamente superiores em termos de produção láctea das filhas. Com a transferência de embriões é possível aumentar o impacto da fêmea (...) sobre a população das filhas. A transferência de embriões data de 1890, ano em que Heape obteve o nascimento de coelhos transferindo ovócitos fecundados de uma fêmea para outra. A partir de 1930, é repetida uma série de experiências para desenvolver a técnica e aplicá-la em ovinos, caprinos (1934) e bovinos (1951) como espécies mais idôneas para a reprodução. A Inglaterra e os Estados Unidos estabeleceram as bases para o comércio de embriões durante os anos sessenta e setenta. De forma resumida, a transferência de embriões implica na estimulação da produção de ovócitos mediante a aplicação de hormônios: cerca de 6-8 dias após a cobrição dessas fêmeas ou da sua inseminação artificial, os óvulos fertilizados são extraídos dos órgãos genitais da fêmea doadora por perfusão ou lavagem com soluções biológicas controladas e testadas, originando-se uma deposição dos gametas fecundados nas fêmeas receptoras que serão encarregadas de levar adiante a gestação e o parto sem influência sobre as produções do novo indivíduo. 2. MANEJO DAS FÊMEAS DOADORAS É relativamente fácil obter um embrião, uma vez que pode origina-se a partir do cio natural das vacas cíclicas. No entanto, a fim de otimizar a técnica, o normal é «superovular» a fêmea doadora e obter um número superior de gametas fecundadas após cada lavagem ou perfusão das genitais. A maioria das fêmeas doadoras são tratadas com gonadotrofinas (PMSG) ou com hormônios estimuladores da foliculogênese (FSH). Estes hormônios invertem a atresia normal de folículos permitindo uma maturação, que em condições normais não se realizaria. O mecanismo exato do funcionamento destas hormonas não é totalmente claro. A superovulação multiplica por um fator de 10 o número de ovócitos recuperados no caso das vacas, ovelhas e cabras, mas apenas por um fator 2 ou 3 no caso das porcas. Existe um acordo geral sobre a utilização das gonadotrofinas; a PMSG deve ser aplicada durante a transição da fase luteica para a folicular, ou seja, no 16º dia do ciclo. As doses de gonadotrofinas variam entre 1500 e 3000 UI em bovinos, aumentando a resposta e a variabilidade individual com o aumento da dose. A resposta ao tratamento varia de acordo em função de diversos fatores. Neste contexto, merecem especial atenção a espécie, a raça, a época e a conformação corporal do animal, bem como o lote de fabricação da preparação hormonal (quadro 7.1). Estudos demonstram que, nos bovinos, as raças de corte respondem melhor ao tratamento do que as raças leiteiras. Tabela 1: Doses de gonadotrofinas em UI -/- Espécie Dia do ciclo Crescimento folicular_ ___ PMSG FSH Ovulação _____ PMSG FSH Bovinos 8 – 10 1500 – 3000 20 – 50 1500 – 2000 75 – 200 Caprinos 16 – 17 1000 – 1500 12 – 20 1000 – 1500 50 – 75 Ovinos 12 – 14 1000 – 2000 12 – 20 1000 – 1500 50 – 75 Suínos 15 – 17 750 – 1500 10 – 20 500 – 1000 25 – 50 Coelhos — 25 – 75 2 – 3 25 – 75 2 – 3 Fonte: HAFEZ, 2004. O FSH também é utilizado para superovulação em várias espécies. Nos ovinos, injetam-se 2 mg desta hormona 12 horas antes da retirada das esponjas, aplicando-se mais três injeções, com um intervalo de 12 horas, até 24 horas após a retirada das esponjas, o que corresponde a um total de 8 mg de FSH injetados por tratamento e animal. Às vezes, e dependendo do país, existem dificuldades para a obtenção desse hormônio em condições de pureza adequada para que o tratamento proporcione o resultado esperado. Nas vacas dadoras devem ter passado mais de 50 dias após o último parto: também ser animais cíclicos, encontrar-se num nível nutricional elevado e em aumento, sem deficiências especificas alimentares. Existe uma indicação de suplementação das fêmeas doadoras com minerais essenciais antes do tratamento. 3. OBTENÇÃO DE EMBRIÕES Uma vez as fêmeas doadoras inseminadas, entre o sexto e o oitavo dia, procede-se a coleta dos embriões. Para isso, atualmente se utilizam cateteres de obtenção transcervical (tipo Foley, Rusch. etc.) munidos de uma bola insuflável na sua extremidade que permite criar um compartimento estanque na parte distal do córneo uterino e proceder ao arrasto dos embriões ali localizados. Para obter esta «lavagem» utiliza-se uma solução aquosa tamponada: o meio mais frequentemente utilizado é o tampão fosfato salino (PBS: pH = 7; PO = 280 - 290 mOsm/kg) suplementado com antibióticos e proteínas. Depois de recuperado o meio de lavagem, os embriões devem ser isolados do volume total, avaliados segundo critérios do Manual da Sociedade Internacional de Transferência de Embriões de acordo com seu estado de desenvolvimento. Código numérico para determinar o grau de desenvolvimento embrionário: N° 1: ovócito não fertilizado ou embrião de uma célula (1 dia). N° 2: Identifica embriões com 2 a 16 células (2-4 dias). N° 3: Identifica mórulas adiantadas (5-6 dias). N° 4: Identifica mórulas compactas de 6 dias de idade. N° 5: blastocisto adiantado (7 dias). N° 6: blastocisto (7-8 dias). N° 7: blastocisto expandido (8-9 dias). N° 8: blastocisto eclodido (9 dias) a partir do nono ou décimo dia o blastocisto já está fora da zona pelúcida. Além da classificação por estado de desenvolvimento, a referida Sociedade Internacional estabeleceu uma categorização dos embriões com base na qualidade dos mesmos. Assim os denomina: 1: excelente; 2: bom; 3: regular; 4: degenerado. Segundo as investigações de diversos autores especialistas no tema não devem ser transferidos embriões que não tenham sido classificados como excelentes ou bons. A obtenção dos embriões pode ser realizada em uma clínica, em unidades móveis especializadas, ou na própria fazenda. Em todo o caso, a doadora não deve apresentar quaisquer sintomas clínicos de doença, sendo esta responsabilidade direta do veterinário. O rebanho de onde provém a doadora deve estar livre de medidas cautelares sanitárias. Os técnicos devem estar adequadamente limpos e preparados para esta atuação, em um lugar tranquilo e que permita a colocação de equipamentos e material em condições limpas e seguras. 4. TÉCNICAS DE TRANSFERÊNCIA DE EMBRIÕES Recomenda-se que os embriões sejam transferidos o mais rápido possível depois da recuperação. A fêmea receptora deve apresentar um ambiente uterino o mais semelhante possível ao da fêmea doadora. Isto quer dizer que a receptora também será mantida num sistema de sincronização para que coincida o mais possível o estágio de desenvolvimento embrionário com seu correspondente estado uterino. A margem de assincronia para evitar efeitos indesejáveis é de ± 24 horas. Os métodos hormonais de sincronização são análogos aos das doadoras. As técnicas para a deposição dos embriões no seu novo habitat podem ser igualmente cirúrgicas e não cirúrgicas, mas devido aos problemas do uso de anestésicos em técnicas cirúrgicas, as transferências foram direcionadas para modelos não-cirúrgicos ou transcervicais. Este método é baseado na utilização do colo uterino de forma análoga como é realizada na inseminação artificial. Devido às relações entre o embrião e o ovário, as porcentagens de fertilidade são aumentadas ao serem depositadas no corno ipsilateral no ovário que se encontra ativo. A utilização desta técnica implica na obtenção de mais fêmeas gestantes. O uso de novilhas como fêmeas receptoras aumenta também a taxa de gestações a partir de uma maior facilidade de manejo, uniformidade na resposta hormonal e um custo mais baixo. O fator humano ou habilidade do técnico que realiza esta técnica também constitui um fator que influencia decisivamente no êxito da transferência, encontrando-se variações de 20 a 60% devidas a este fator. 5. CONTROLES SANITÁRIOS Com a utilização da inseminação artificial, verificou-se que, embora as tecnologias reprodutivas colaborativas fossem mais avançadas em termos de técnicas destinadas a aumentar a produtividade individual, da mesma forma, podem constituir um perigo de contaminação e de dispersão de doenças estrangeiras para o grupo ou rebanho para onde são transferidos os novos genes. Neste contexto, a transferência embrionária (TE) deve realizar-se tendo em conta os riscos que pode implicar uma manipulação inadequada. Uma vez mais, a Sociedade Internacional (IETS) na Reunião Regional da OIE (Oficina Internacional de Epizootias) estabeleceu as normas em 1985 para que a TE pudesse ser utilizada como meio para controle de doenças na pecuária. Para que a utilização da TE se realize sem risco para a saúde, é necessário ter em conta um certo número de regras e condições específicas que evitem os riscos de contaminação. O embrião está separado do meio externo por três barreiras de proteção: o corpo da mãe, o útero por si só e a terceira, e mais importante, pela zona pelúcida, a qual nos animais domésticos tem demonstrado ser totalmente impermeável a qualquer elemento patogênico, desde que fique intacta. Portanto, o risco de contaminação dos embriões pode vir por duas vias diferentes: a) Fatores extrínsecos - por invasão dos agentes patogênicos na cavidade uterina principalmente. Isto está relacionado com o estado sanitário médio do país, região ou rebanho de origem. b) Fatores intrínsecos - Segundo Thibier podemos considerar diferentes fontes potenciais de contaminação, que segundo o risco sanitário se classificam nas seguintes ordens: 1° Zigoto. 2° Penetração. 3° Absorção. 4° Armazenamento. 5° Exame. 6° Transferência. Os esforços para que os embriões se tornem livres de contaminação devem ser semelhantes aos que são efetuados com os animais vivos e com as doses seminais. O momento mais perigoso encontra-se entre a coleta das células fecundadas e a sua deposição, após seu exame, no trato reprodutivo da receptora. As condições em que o referido processo deve ser realizado encontram-se detalhadas no manual da Sociedade Internacional de Transferência de Embriões (IETS). 6. REGRAS DA IETS A transferência de embriões é a via mais segura para a troca de genes. No entanto, os técnicos devem esforçar-se por manter todas as regras e normas sanitárias para que a coleta e a manipulação dos embriões se realizem sob condições de absoluta garantia higiênica e sanitária. A transferência embrionária implica, pela primeira vez na história da medicina veterinária, que a vigilância sanitária não se aplica estritamente ao animal, uma vez que, na sua fase "in vitro", está inteiramente sob o controle do técnico. Por conseguinte, não haverá futuro para este tipo de biotecnologia se, paralelamente, não houver um elevado nível de garantia de que não «servirá» para não disseminar ou difundir doenças. As conclusões da Sociedade Internacional de Transferência de Embriões (IETS) na sua reunião anual de 14 de Janeiro de 1992 estabelecem, tendo em conta a revisão efetuada em 1991 pela Subdireção de Investigação e pelo Comitê de Importação e Exportação, uma classificação das doenças. Esta classificação corresponde às seguintes categorias: Categoria 1 - Doenças ou agentes de doenças para as quais foram recolhidas provas suficientes para afirmar que o risco de transmissão é negligenciável, desde que os embriões sejam corretamente manipulados entre a coleta e a transferência: a) Leucose bovina enzoótica. b) Febre aftosa (bovinos). c) Língua azul (bovinos). d) Brucelose bovina. e) Rintraqueíte infecciosa bovina. f) Doença de Aujeszky. Categoria 2 - Doenças para as quais foram recolhidas provas substanciais que indicam que o risco de transmissão é insignificante, desde que os embriões sejam corretamente manipulados entre a coleta e a transferência, mas para as quais é necessário verificar os dados existentes através de novas transferências: a) Peste suína clássica. Categoria 3 - Doenças ou agentes de doenças para as quais os resultados preliminares indicam que o risco de transmissão é insignificante, desde que os embriões sejam corretamente manipulados, entre a coleta e a transferência, mas para os quais essas verificações preliminares devem ser corroboradas por dados experimentais complementares "in vitro" e "in vivo": a) Peste bovina. b) Diarreia viral bovina. c) Língua azul (ovinos). d) Febre aftosa (suínos, ovelhas e cabras). e) Campylobacter fetus (ovinos). f) Doença vesicular do porco. g) Peste suína africana. h) Prurido lombar (ovinos). i) Haemophilus somnus. Categoria 4 - Doenças ou agentes de doenças que foram ou são objeto de trabalhos preliminares: a) Vírus Akabane (bovino). b) Estomatite vesicular (bovinos e suínos). c) Chlamydia psittaci (bovinos e suínos). d) Ureaplasma/micoplasmose (bovinos e caprinos). e) Maedi-visna (ovino). f) Adenomatosa pulmonar (ovino). g) Prurido lombar (caprinos). h) Língua azul (caprinos). i) Artrite e encefalite caprina. j) Parvovírus (suíno). k) Enterovírus (bovinos e suínos). I) Leptospirose (suíno). m) Herpesvírus 4 dos bovinos. n) Mycobacterium paratuberculose (bovinos). o) brucelose ovina. p) Doença de Border (ovinos). q) Vírus parainfluenza 3 (bovinos). r) Agente da encefalopatia espongiforme bovina. É interessante salientar que apenas seis doenças estão incluídas na categoria 1 (a mais segura). Isso não significa que as outras doenças tenham um risco maior, apenas indica que o risco de transmissão das doenças da categoria 1 é irrelevante, estatisticamente falando. É importante assinalar que as doenças mais importantes dos bovinos se situam na categoria 1. Isto significa que a incidência do embrião patogênico nos bovinos parece ser perfeitamente controlável, desde que sejam adotadas metodologias adequadas. Isto serve também como linha de defesa adicional para que o técnico centre sua atenção e cuidados entre a fase de obtenção e a de transferência. 7. SITUAÇÃO ATUAL DA TRANSFERÊNCIA DE EMBRIÕES ANIMAIS NO BRASIL O Brasil é um dos grandes responsáveis mundiais pela implantação da tecnologia na reprodução animal, sendo assim, o país conseguiu inserir-se no mercado internacional como um dos maiores produtores de embriões in vivo e in vitro. Nas últimas duas décadas, especialmente entre os anos de 1997 e 2017 o país passou por importantes transformações nesse segmento, dentre essas transformações vale destacar a posição relativa do Brasil no contexto mundial. O Brasil passou de referência regional, nos anos 1990, para se tornar o maior produtor mundial de embriões entre os anos 2012 e 2013, sendo líder no uso e na produção de embriões in vitro. Os primeiros registros da TE produzidos in vivo no Brasil datam da década de 1980, e uma década depois o país já tornara-se referência e detinha um mercado consolidado de produção e TE na espécie bovina. Não obstante, no ano de 1997 o país ainda era referência apenas no contexto regional, detendo 68,3% dos embriões transferidos na América Latina, esse percentual corresponde a 24.085 embriões de um total de 35.254 produzidos na América Latina. Esse percentual regional representa apenas 6,6% de toda a produção mundial de embriões in vivo, que produziu, em 1997, 360.656 embriões in vivo. Nos últimos anos, o mercado de embriões, principalmente o bovino, teve retração moderada de -2,5% ao ano entre 2003 e 2018, porém essa retração contrasta com o ligeiro crescimento observado a partir dos anos 2000 conforme figura 1: Figura 1: Produção de embriões bovinos no Brasil no período 1996-2018, total e por tecnologia adotada (in vivo[IVD] ou in vitro [IVP]). Em 2018, o mercado de embriões bovinos manteve-se inalterado se compararmos com os três anos anteriores, houve reduções nós segmentos de corte, leite e no total comparado ao ano de 2017. Em 2014, a produção de embriões para melhoramento do gado leiteiro teve seu ápice, porém de lá para cá esse mercado manteve-se estagnado como demonstra a tabela 2. Tabela 2: Produção de embriões bovinos no Brasil em 2018, estratificada por segmento e por tecnologia adotada (in vivo ou in vitro). 7.1 Crise, economia e mercado de embriões A indústria de embriões reflete, em maior ou menor grau, o momento da economia brasileira. Apesar do segmento agropecuário ser um setor em constante crescimento no país, ao qual, sem dúvidas, em meio a inúmeras crises mantém-se em constante crescimento. Porém vale ressaltar que esse mercado é emergente e está refletido em paralelo com os bens produzidos pelo país, como demonstra a figura 2. Figura 2: Produção de embriões bovinos e variação no produto interno bruto (PIB) no Brasil, no período 1996-2018. Cada vez mais o setor agropecuário do Brasil investe em novas tecnologias que maximizem o mercado e que melhore a produção dos animais seja no segmento corte ou leite. Segundo a OCDE, 1997, essa indústria da produção de embriões é um conjunto de novas técnicas e processos, frutos do desenvolvimento técnico-científico, que chega ao mercado e - o mais importante - o transforma. Logo, todas essas técnicas e biotecnologias visam, além da alta produção e do lucro, o melhoramento e a suplementação alimentícia da população mundial que está em crescente avanço. A evolução da tecnologia embrionária no país, seja para o melhoramento dos equinos para os esportes como as vaquejadas, hipismo, corridas, etc., onde são investidos tempo, dedicação e dinheiro para formar um novo animal que apresente força, conformação, conversão alimentar e que custa milhões, em muitos casos, não só dos equinos, mas também dos caprinos, ovinos, suínos e até mesmo os bovinos onde o mercado da TE é mais presente e aquecida, venceu os estigmas do “modismo” e o chamado “elitismo”, porém deve enfrentar novos desafios, em especial num contexto de forte concentração do mercado de genética e de concorrência globalizada. Mesmo com todos esses avanços e retrocessos, essa relativização dos números demonstra que um percentual bastante reduzido das fêmeas bovinas que estão em idade reprodutiva é utilizado para a técnica da transferência de embriões, e que o mercado brasileiro ainda tem um grande potencial de crescimento no setor de produção in vivo e in vitro. 8. RESUMO E PRIMEIRAS CONCLUSÕES Ao longo deste trabalho pretendi realizar uma revisão sumária sobre um tema de grande importância presente, e sobretudo futura; referir-me à transferência embrionária. Atualmente, esta técnica atingiu um grau notável de penetração, a nível prático, no gado leiteiro. No entanto, num futuro mais ou menos longínquo, não temos dúvidas quanto a esta técnica, pelas vantagens indubitáveis que apresenta a nível de avanço genético, que será aplicada em outras espécies úteis ao homem. Na minha exposição, tentei dar especial ênfase a dois aspectos: as técnicas de transferência, incluindo as normas IETS e os controles sanitários a serem efetuados. Por fim, a indústria brasileira de embriões mostrou-se em retrocessos e avanços, porém o mercado ainda têm grandes desafios a serem enfrentados ao longo dos anos, mas que serão sanados mediante as técnicas desenvolvidas pelos inúmeros centros de pesquisa embrionárias e seus especialistas. -/- Realização -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – Departamento de Zootecnia da UFRPE. Recife, 2020. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -/- BALL, Peter JH; PETERS, Andy R. Reproduction in cattle. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2008. BARUSELLI, Pietro Sampaio et al. Sêmen sexado: inseminação artificial e transferência de embriões. Revista Brasileira de Reprodução Animal, v. 31, n. 3, p. 374-381, 2007. BRACKELL, B. G.; JR SEIDEL, G. E.; SEIDEL, S. Avances en zootecnia nuevas técnicas de reproducción animal. Zaragoza: Acribia, 1988. COLE, H. H.; CUPPS, P. T. Reproduction in domestic animals. 1ª ed. Londres: Academic Press, 1977. CURTIS, John L. et al. Cattle embryo transfer procedure. 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DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO E DIFERENCIAÇÃO SEXUAL -/- E. I. C. da Silva Departamento de Agropecuária – IFPE Campus Belo Jardim Departamento de Zootecnia – UFRPE sede -/- 1.1 INTRODUÇÃO O sexo foi definido como a soma das diferenças morfológicas, fisiológicas e psicológicas que distinguem o macho da fêmea permitindo a reprodução sexual e assegurando a continuidade das espécies. Os processos de diferenciação sexual são realizados durante o desenvolvimento embrionário, onde ocorre a proliferação, diferenciação e maturação das células germinativas e primordiais, (...) precursoras de ovócitos e espermatozoides em fêmeas e machos, respectivamente. Assim, os embriões machos e fêmeas iniciam o seu desenvolvimento de forma semelhante, de modo que em ambos os sexos se estabelecem em estruturas idênticas a partir das quais se formarão os órgãos reprodutores correspondentes a cada sexo. O conhecimento da origem e do desenvolvimento do aparelho genital é indispensável para entender sua função e as alterações que produzem infertilidade ou esterilidade. 1.2 DETERMINAÇÃO DO SEXO CROMOSSÔMICO Nos mamíferos, o sexo cromossômico é determinado no momento da fertilização, quando um óvulo, que contém um cromossomo X, é fecundado por um espermatozoide portador de um cromossomo X ou um cromossomo Y. No primeiro caso, o complemento cromossômico seria XX, o que originaria uma fêmea (sexo homogamético), e no segundo daria como resultado um macho com a fórmula cromossômica XY (sexo heterogâmico). 1.3 A GÔNADA INDIFERENCIADA A primeira manifestação das gônadas se aprecia no embrião em forma de um par de eminências longitudinais chamadas cristas ou dobras gonodais, situadas em ambos os lados da linha média entre os mesonefros (rins em desenvolvimento) e do mesentério dorsal. Nos embriões dos mamíferos, as células germinativas primordiais (CGP) manifestam-se em estágios precoces do desenvolvimento, podendo ser detectadas pela primeira vez na metade da gastrulação. As CGP são células grandes, de citoplasma claro e núcleo grande e redondo, localizadas na parede do saco vitelino, perto do alantoide. Essas células possuem grande capacidade de proliferação e vão migrar desde o endoderma do intestino e o epitélio do saco vitelino, através do mesentério, até as cristas gonodais. Isso ocorre por volta do 26° dia da gestação no bovino. Sua migração realiza-se graças aos movimentos de translocação passiva e deslocamento ameboide ativo. Desconhece-se o mecanismo pelo qual estas células são dirigidas para as cristas gonodais, porém foram estudadas algumas moléculas que se expressam durante sua migração e que poderiam desempenhar um papel importante na diferenciação deste tipo celular. A fosfatase alcalina é uma enzima que tem sido usada como marcador de CGP para determinar a sua origem e migração. Num estudo recente, foi inserido um marcador fluorescente que se exprime unicamente nas células germinativas primordiais de embriões transgênicos, e utilizando este marcador e a fosfatase alcalina determinou-se a origem e o padrão de migração destas células. O primeiro sinal de diferenciação das células germinativas primordiais é a expressão de fosfatase alcalina, e esta apareceu pela primeira vez na parte mais posterior da linha primitiva. No sétimo dia de desenvolvimento no embrião do camundongo, o endoderma visceral (AF+) é substituído pelo endoderma definitivo (AF-) originado na parte anterior da linha primitiva. O fator de transcrição Oct-4 é expresso nas CGP de ambos os sexos, pelo que acredita-se estar envolvido na mantença a totipotêncialidade das células. O receptor tirosina quinase, cujo ligante é o fator de Steel, é outra das moléculas que expressam as CGP. Tem sido demonstrado que este receptor possui um papel muito importante na sobrevivência deste tipo celular. Existem outros fatores que promovem a sobrevivência e/ou proliferação de CGP in vitro. Em experiências realizadas com o fator de transformação beta I (TGFβ-I), observou-se que este tem um efeito negativo sobre a proliferação das CGP. Outra atividade que tem sido postulada a este fator é o de um agente quimioatraente que possivelmente possa direcionar a migração destas células para a gônada. a) Um formado pelas células germinativas primordiais (precursoras dos gametas masculinos ou femininos), rodeadas de células somáticas das quais posteriormente se derivarão as células de Sertoli no macho e as células da granulosa na fêmea. b) O tecido que formará o estroma da gônada: tecido conjuntivo, vasos sanguíneos e as células intersticiais com atividade esteroidogênica (células de Leydig no testículo e a teca interna do ovário). As células somáticas do primórdio gonodal originam-se do mesoderma. Inicialmente são de três tipos: mesenquimáticas, mesoteliais e endoteliais. As células mesenquimáticas e mesoteliais iniciam grande atividade proliferativa ao chegar as CGP. Observa-se então uma condensação de células de origem mesotelial e mesenquimatoso que forma um agregado compacto denominado "blastema gonodal". A partir deste primórdio embrionário, diferenciam-se dois tecidos gonodais: os cordões sexuais e o estroma. Os cordões sexuais são arranjos epiteliais que se encontram delimitados por uma folha basal, e dentro deles encontramos as CGP. Por sua vez, no estroma encontram-se células do tipo mesenquimático e vasos sanguíneos. Neste momento, as gônadas são indiferenciadas e bipotencialmente sexuais, sendo impossível diferenciar, morfologicamente, uma gônada masculina de uma feminina, mas no caso dos machos genéticos já existe uma diferenciação da gônada a nível molecular. Nesta fase já se encontram presentes as estruturas das quais se desenvolvem os dutos mesonéfricos ou de Wolff precursores do aparelho genital masculino e os dutos paramesonéfricos ou de Müller que darão origem ao aparelho reprodutor feminino. Há uma série de fatores envolvidos no desenvolvimento precoce da gônada, entre os quais o fator esteroidogênico I (SFI: Steroidogenic fator l), que é um membro da subfamília de receptores nucleares, receptores órfãos. Este fator de transcrição tem um local de ligação ao DNA composto por dois dedos-de-Zinc. O SFI foi identificado como um ativador de genes envolvidos na biossíntese de esteroides em diferentes células. O SFI está presente durante o desenvolvimento embrionário em regiões associadas com funções endócrinas como gônadas, adrenais, pituitárias e hipotálamos. Os animais homozigotos para o gene SFI defeituoso, necessitam de gônadas e adrenais e têm a função gonadotrófica alterada. Os ratos sem SFI carecem de gonadotrofos e têm um desenvolvimento anormal do núcleo ventro-medial do hipotálamo; em particular as gônadas deixam de se desenvolver entre os dias 11 a 15 e degeneram-se por apoptose. No entanto, a crista genital forma-se e é colonizada pelas células germinativas, o que indica que estas continuam a receber o sinal adequado para a sua migração. Portanto, o SFI não está envolvido no desenvolvimento precoce da gônada e do sistema urogenital, mas parece estar envolvido na manutenção do crescimento das células somáticas presentes na gônada indiferenciada. O gene associado ao tumor de Wilms (WTI: Wilm's tumor Associated) está envolvido no desenvolvimento da gônada e do rim. Durante o desenvolvimento embrionário, WTI se expressa em todo o mesoderma intermediário e posteriormente na gônada indiferenciada, bem como no rim em formação. WTI regula o sinal indutivo do mesênquima para o epitélio celômico dos mesonefros. Se este for o caso, então WTI é responsável pelo crescimento da crista genital ao dirigir a entrada do epitélio celômico. Dado que estas células darão origem às células de Sertoli, a carência de WTI pode causar o desenvolvimento de embriões XY como fêmeas simplesmente porque não se formam as células de Sertoli. Em geral, todos os genes importantes na diferenciação do mesoderma intermediário e do sistema urogenital intervêm no desenvolvimento da gônada precoce. 1.4 DIFERENCIAÇÃO GONODAL O desenvolvimento das gônadas e ductos genitais descritos até o momento, é o mesmo para ambos os sexos. Igualmente, os genes descritos, que estão envolvidos no desenvolvimento das gônadas, ductos genitais e migração das células germinativas, afetam igualmente os embriões com genótipo XX ou XY. A gônada primitiva consiste anatomicamente de uma medula (interna) e uma crosta (externa), e de acordo com o local onde ocorre a colonização das células germinativas, diferenciara em testículo ou um ovário, respectivamente. Nos mamíferos, a primeira manifestação estrutural de diferenciação sexual é detectada na gônada dos machos, onde as células germinativas estão localizadas na medula. A diferenciação do testículo inicia-se quando os cordões sexuais se separam do epitélio celômico como consequência dos arranjos produzidos por uma invasão do mesênquima e vasos sanguíneos que provoca a compactação dos cordões, agora denominados cordões testiculares. As células que rodeiam os cordões se achatam e formam as células mioides, que são responsáveis pela formação das membranas basais. As células do epitélio interno, ou seja, as células de Sertoli, têm duas funções principais: o suporte das CGP e a síntese da hormona antimulleriana, responsável pela regressão dos ductos de Müller e secretada durante o período de diferenciação sexual. As células do estroma que rodeiam os cordões testiculares diferenciam-se para formar vários tipos de células: células mioides, fibroblastos, endotélio e células de Leydig, que são as mais importantes pela sua atividade endócrina. Posteriormente, os cordões testiculares dão origem aos túbulos seminíferos, que contêm o epitélio que produzirá os espermatozoides ao chegar à puberdade. Na fêmea, durante os estágios iniciais de diferenciação gonodal, não se observam mudanças em relação à gônada indiferenciada, só pode-se observar um certo crescimento devido à proliferação de células somáticas e germinativas. As células germinativas iniciam um período de proliferação, que termina com o início da meiose. Iniciada a meiose, dá-se o processo de foliculogênese; neste momento os cordões epiteliais se fragmentam, de tal maneira que cada ovócito fica rodeado de células epiteliais cobertas por uma folha basal fina (figura 1). Para que a gônada primitiva se desenvolva em testículo é indispensável a presença do cromossoma Y, independentemente do número de cromossomas X que contenha o genoma de um indivíduo. O gene determinante do testículo encontra-se localizado no cromossoma Y, denominado sry em ratos e SRY em humanos. O gene sry se expressa durante o desenvolvimento embrionário na crista genital de embriões de camundongos. A expressão é detectável no dia 10,5, pouco depois do aparecimento das cristas genitais, atinge o seu máximo durante o dia 11,5 e mantém-se até pouco depois de ocorrerem os primeiros sinais morfológicos de diferenciação testicular no dia 12,5. Este padrão de expressão é compatível com a teoria de que sry atua induzindo a ativação dos genes (figura 2) que conduzem ao desenvolvimento testicular, sem que exista a necessidade da expressão contínua de sry para manter a diferenciação do testículo após o dia 12,5. Como mencionado anteriormente, a gônada primitiva é composta por vários tipos de células. No entanto, as células germinativas primordiais não são o local de expressão do sry, já que os embriões que necessitam de células germinativas mantêm a expressão de sry e desenvolvem o sexo gonodal normalmente. As células somáticas na gônada em desenvolvimento incluem também as células de suporte. Sabe-se que é nestas células que o sry é expresso para que se diferenciem em células de Sertoli, e a expressão transitória de sry indica que deve ativar a outros genes para a manutenção das células de Sertoli. Uma vez diferenciadas as células de Sertoli, elas se encarregarão da diferenciação do resto das células na gônada. -/- Figura 1: Representação da diferenciação dos órgãos genitais internos. Adaptado de BRONSON, 1989. Figura 2: Cascada de genes envolvidos na diferenciação sexual, adaptado de KOOPMAN, 1999. O fator sry é necessário para a diferenciação do testículo. Embora não se conheçam os genes que provavelmente regulam esse gene, estudos realizados em camundongos demonstram que este gene parece coordenar-se com certos genes autossômicos. Entre estes genes autossômicos, o sox9, que é produzido pelas células de Sertoli uma vez que são estimuladas por sry, de modo que sox9 é um dos genes relacionados estruturalmente com sry. O Sox9 funciona como um fator de transcrição, mas não se sabe se a proteína tem qualquer outra função estrutural; este gene exprime-se abundantemente nos condrócitos e está relacionado com defeitos do aparelho ósseo chamados displasia campomélica. Curiosamente, os pacientes XY com esta condição sofrem frequentemente de reversão do sexo. O Sox9 é um dos poucos genes, além do SRY, do qual as mutações demonstraram interferir com a determinação sexual masculina. No entanto, apenas 75% dos pacientes com anomalias esqueléticas de tipo displasia campomélica têm reversão sexual e não foram encontrados casos de reversão sexual devido a um defeito de Sox9 que não seja acompanhado de defeitos esqueléticos. Isso indica que o Sox9 é apenas um membro da rede de genes que são ativados para determinar a diferenciação sexual, enquanto a rota que rege a condrogênese é mais sensível a perturbações deste. O momento em que se detecta a expressão do gene Sox9 (11dpc em ratos) coincide com a máxima expressão de sry, o que poderia indicar a possibilidade de que sry regule positivamente a Sox9. De fato, na região do promotor de Sox9 há um local de união ao que potencialmente se pode unir o sry. A expressão de Sox9 durante a diferenciação sexual sugere um papel abaixo de sry na diferenciação das células de Sertoli. O cromossoma X também é importante na diferenciação gonodal. O gene DAX-I foi isolado do lócus DSS (Dosage sensitive sex reversal) do cromossoma X. DAX-I é parte da cascata de determinação sexual, mas não é necessário para a formação do testículo. DAX-I é um membro dos receptores nucleares conhecidos como receptores órfãos. Este gene demonstrou ser um poderoso repressor da transcrição de SFI e de vários genes. Os padrões de expressão de DAX-I são complementares daqueles de SFI, ambos expressos nas cristas genitais. Em resumo, dada a evidência exposta, desenvolveu-se a hipótese de que DAX-I é um antagonista de sry; esse antagonismo é dependente dos níveis relativos de DAX-I e sry e de um limiar que varia de espécie para espécie. A DAX-I foi classificada como o gene antitestículo. Na fêmea (cariótipo XX) é importante que ocorra a inativação de um dos cromossomas sexuais X para que se mantenha o equilíbrio genético ao igualar o conteúdo de DNA dos cromossomas. Esse cromossoma inativado constitui o chamado corpúsculo de Barr. No entanto, para que a meiose se realize, é necessário dos dois cromossomas X ativos nos ovócitos para assegurar a diferenciação ovárica e a fertilidade. 1.5 DIFERENCIAÇÃO DOS DUCTOS SEXUAIS O embrião possui, além das gônadas indiferenciadas, dois sistemas de ductos: os de potencialidade masculina denominam-se ductos de Wolff ou mesonéfricos, e os de potencialidade feminina se chamam ductos de Müller ou paramesonéfricos (figura 1). Se a diferenciação gonodal levou à formação de um testículo, a partir do ducto mesonéfrico ou de Wolff se desenvolverão os ductos eferentes, o epidídimo, os ductos deferentes e as vesículas seminais. As hormonas importantes no desenvolvimento do aparelho genital masculino são a testosterona, produzida pelas células de Leydig, e sua forma 5α reduzida, a 5α di-hidrotestosterona. Acredita-se que a testosterona é responsável pela virilização dos ductos de Wolff, e a di-hidrotestosterona dos órgãos genitais externos. No macho, os canais de Müller atrofiam-se devido à ação de uma hormona fetal de origem testicular denominada hormona inibidora das estruturas de Müller (HIM) ou hormona antimulleriana. Este processo começa assim que os cordões espermáticos se formam e se diferenciam as células de Sertoli. A existência de HIM foi proposta baseada em estudos realizados em bezerras freemartin, devido à existência de uma hormona responsável pela atresia dos ductos de Müller que na fêmea dá origem ao útero e aos ovidutos. Essa hormona provoca a involução do aparelho genital do bovino nas gestações gemelares nas quais os produtos de diferente sexo têm comunicação sanguínea por ter ocorrido a anastomose dos vasos de ambas as placentas (figura 3). A HIM é uma glicoproteína pertencente à subfamília de TGFβ, é expressa pelas células que darão origem às células de Sertoli e é um dos primeiros marcadores de diferenciação nestas células. A HIM é secretada na vida adulta pelas células de Sertoli no testículo e por células da granulosa no ovário. No rato a HIM é expressa-se no 12° dia em um teste padrão que segue muito de perto o aumento na expressão de sry. No macho, esta secreção de HIM continua durante a vida fetal e adulta, contudo os níveis de HIM declinam na puberdade devido a um aumento na secreção de testosterona. Vários fatores intervêm na regulação do gene de HIM, incluindo os acima descritos SFI e Sox9. O gene HIM contém segmentos de DNA que são conservados em várias espécies de vertebrados. Existe um nexo de ligação para SFI, que ativa a transcrição de HIM. A mutação no local de ligação de SFI resulta em reversão do sexo em indivíduos XY incluindo genitais femininos normais, presença de um útero formado enfatizando a importância de SFI na determinação sexual e na expressão de HIM. Embora SFI seja um bom candidato como regulador de HIM, é expresso em outras células, como as de Leydig e adrenais, que não expressam HIM. Em contrapartida, Sox9 é expresso unicamente nas células de Sertoli que são as produtoras de HIM. O gene HIM também tem um nexo de ligação para Sox9. Além disso, Sox9 pode atuar sinergicamente com SFI para promover a secreção de HIM. Ao contrário destes dois fatores de transcrição, DAX-I antagoniza a ação de Sox9 e provavelmente SFI sobre o promotor de HIM. Assim, para que as células de Sertoli secretem HIM, a transcrição de DAX-I deve diminuir. Figura 3: Representação da diferenciação dos órgãos genitais externos. Adaptado de BRONSON, 1989. Os ductos de Wolff tornam-se o sistema de ejaculação do macho. A porção mais próxima dos testículos dá origem ao epidídimo, a parte central ao ducto deferente e a porção mais distal às vesículas seminais. A próstata e a parte membranosa da uretra do macho desenvolvem-se a partir da porção pélvica do seio urogenital. A virilização e diferenciação dos ductos de Wolff dependem da produção de testosterona pelo testículo. Quanto aos órgãos genitais externos do macho, o tubérculo genital é ampliado e as dobras uretrais se fundem para formar a uretra peniana. A fusão das dobras uretrais aproxima os tubérculos genitais para formar o escroto (figura 4). Figura 4: Diferenciação do aparelho genital da fêmea e do macho. Adaptado de KOOPMAN, 1989. A diferenciação dos órgãos genitais da fêmea ocorre de forma passiva, já que a ausência de testículos e por isso da hormona inibidora dos ductos de Müller (HIM), assim como dos andrógenos virilizantes, favorece o desenvolvimento dos ductos de Müller, enquanto os de Wolff sofrem atrofia. A porção cefálica dos ductos de Müller dá origem aos ovidutos, que na sua terminação caudal se fundem com o útero. O contato dos ductos de Müller com o seio urogenital induz uma intensa proliferação celular que resulta na formação da área uterovaginal localizado entre o seio urogenital e os ductos de Müller. As células do prato uterovaginal proliferam e aumentam a distância entre as duas estruturas criando o espaço que formará a vagina quando o prato é canalizado e forma um lúmen. Em contraste com o que ocorre no macho, na fêmea a maior parte do seio urogenital se mantém exposta na superfície da abertura onde desembocam a vagina e a uretra. O tubérculo urogenital da fêmea tem um crescimento limitado e forma o clitóris. A sequência de passos da diferenciação sexual do aparelho genital é resumida na tabela 1. Tabela 1: Destino em desenvolvimento dos rudimentos sexuais dos fetos macho e fêmea dos mamíferos -/- Rudimento sexual Macho Fêmea Gônada Testículo Ovário Ductos de Müller (Paramesonéfricos) Vestígios Útero, parte da vagina, ovidutos Ductos de Wolff (Mesonéfricos) Ductos eferentes deferentes, epidídimo, vesículas seminais Vestígios Seio urogenital Uretra, próstata, glândulas bulbouretrais Parte da vagina, uretra, vestíbulo, glândulas vestibulares Tubérculo genital Pênis Clitóris Pregas vestibulares Escroto Lábios vulvares Fonte: HAFEZ, 2004. 1.6 DIFERENCIAÇÃO SEXUAL DO HIPOTÁLAMO Os processos de diferenciação sexual não se limitam apenas às células somáticas do organismo do feto, mas incluem também os centros nervosos superiores do cérebro. Assim, da mesma maneira que a gônada e os ductos sexuais se desenvolvem para o tipo feminino ou masculino, propôs-se que o cérebro pode ser "masculinizado" ou permanecer "Feminizado". A diferenciação do hipotálamo vai depender do ambiente esteroidal do neonato e ocorre na fase perinatal. Estes eventos serão de grande transcendência na vida reprodutiva do indivíduo. Tanto a fêmea como o macho nascem com a capacidade de secreção de gonadotropinas de acordo com um padrão cíclico; contudo, no macho, a exposição do hipotálamo à ação dos andrógenos testiculares durante os primeiros dias da vida extrauterina provoca a masculinização, com o qual o hipotálamo do macho é programado para que a secreção de gonadotropinas se realize a um ritmo relativamente constante por parte da hipófise (secreção tônica). Na fêmea, tanto a secreção tônica como a cíclica se conservam. No entanto, observou-se que a injeção de testosterona ou o transplante de testículo na rata fêmea durante os primeiros dias de vida, suprime a sua futura atividade estral (secreção cíclica). Por outro lado, se os ovários forem transplantados para o rato macho normal castrado na idade adulta, o animal não desenvolve qualquer atividade cíclica, mas se os machos transplantados forem castrados ao nascer, o ovário é capaz de efetuar mudanças cíclicas e ovulações. Isto foi demonstrado em roedores, mas não em animais domésticos ou na espécie humana. Portanto, o padrão de secreção de gonadotropinas, seja cíclico ou tônico, não depende da hipófise, mas do hipotálamo e sua correta diferenciação. 1.7 CONCLUSÕES A maioria dos conhecimentos no campo da biologia do desenvolvimento e, muito especificamente, dos processos de diferenciação sexual têm sido originados de estudos relacionados com desordens congênitas, que na sua maioria devem-se a defeitos de genes específicos. A análise detalhada destas desordens permitiu entender alguns mecanismos endócrinos, moleculares e genéticos envolvidos na diferenciação sexual. A identificação do gene sry como determinante do testículo foi uma contribuição crucial e abriu as portas à compreensão dos mecanismos moleculares e celulares relacionados com o desenvolvimento do testículo. Se este gene não estiver presente, é criado um programa genético alternativo para levar a cabo a diferenciação gonodal para o ovário. Finalmente, devemos ter presente que é necessária uma correlação entre mudanças morfológicas e expressão de genes durante o desenvolvimento para entender os mecanismos relacionados com a diferenciação. -/- Apoio -/- Realização -/- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, Robert et al. The onset of germ cell migration in the mouse embryo. Mechanisms of development, v. 91, n. 1-2, p. 61-68, 2000. AUSTIN, Colin Russell; SHORT, R. V. Reproduction in Mammals: Volume 1, Germ Cells and Fertilization. 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This article discusses the notion of rationality and agency in Fernando Broncano's Racionalidad, Acción y Opacidad (2017). In this book, contradicting the apriorist normative theses or simple naturalistic descriptivism, Broncano argues that rationality is something that is directly associated with our ordinary practices of evaluating the judgments, actions and decisions of others. “Rationality” should be considered as a term we use as an intellectual qualifier or as a virtue we bestow on people who can make theoretical and practical decisions autonomously. (...) Thus, rationality would not be an a priori condition for someone to become a person or a capacity to eliminate the turbulence of human cognitive and moral precariousness, but a form of involvement in the world that positively qualifies the organism that relates thought and action, judgment and choice in the search for lucidity in an uncertain world. With this, rationality and agency would be products of the social interdependence that one has in relation to the other, since we learn it and teach it in the context of natural life. This article is organized in three sections: in the first section I make a very brief presentation of one of the aspects of the problem that has motivated the philosophical discussion on rationality and agency; in the second section, I present my understanding of the themes developed in Racionalidad, Acción y Opacidad, their internal structure and, of course, their central thesis; in the third section, I specifically discuss the theme that the normativity of rationality arises from our dialectical encounter with other people and make personal considerations on the value and scope of the arguments constructed in this book. (shrink)
BAIXE O PDF COMPLETO COM 58 FIGURAS E 50 PÁGINAS!!! -/- INTRODUÇÃO Conhecer a anatomia de um aparelho representa a base para seu estudo amplo e profundo, além de facilitar a compreensão de seu funcionamento. Por isso é importante o conhecimento da anatomia funcional do aparelho reprodutor, já que sua análise permite fixar sólidas bases para o estudo do fenômeno pelo qual se perpetuam as espécies: a reprodução. Nos subtemas compreendidos referentes ao macho e a fêmea, descreve-se cada um dos (...) órgãos que formam o aparelho reprodutor e as suas diferenças entre espécies, assinalando-se em cada um deles a sua função. Obviamente, a parte que trata do funcionamento não é abordada de uma forma muito ampla. Para facilitar o estudo do aparelho reprodutor do macho, seus órgãos podem ser classificados de acordo com sua localização anatômica, em órgãos genitais internos (que compreendem os ductos deferentes, as glândulas acessórias e a uretra pélvica) e órgãos genitais externos (testículos com seu epidídimo). O testículo também foi considerado como órgão sexual primário, enquanto os ductos excretores, glândulas acessórias, pênis e prepúcio são considerados órgãos sexuais secundários. O aparelho reprodutor da fêmea é dividido em ovários e órgãos tubulares (útero, oviduto, cérvix, vagina e vulva). 2.2 APARELHO REPRODUTOR DO MACHO Para avaliar a capacidade reprodutiva dos machos, é primordial conhecer a anatomia e a fisiologia do aparelho reprodutor. Os órgãos genitais incluem testículos, epidídimos, canais deferentes, ampolas deferentes, uretra, glândulas acessórias (próstata, glândulas seminais e glândulas bulbouretrais), pênis e prepúcio, que apresentam diferenças entre as espécies domésticas (tabela 1). Sabe-se que o sistema genital masculino compreende os órgãos envolvidos no desenvolvimento, no amadurecimento, no transporte e no armazenamento dos gametas masculinos (espermatozoides). Ele consiste em um par de testículos, o ducto contorcido do epidídimo, o ducto deferente, a uretra e as glândulas genitais acessórias. Os testículos produzem esperma e hormônios. O epidídimo armazena espermatozoides durante seu amadurecimento antes de passarem para o ducto deferente e pela uretra. As glândulas acessórias também liberam suas secreções na uretra e contribuem para o volume do sêmen. A parte distal da uretra forma o caminho combinado para a passagem tanto da urina como do sêmen. O pênis é o órgão copulador masculino e deposita sêmen no trato reprodutor feminino. As figuras 1-5 apresentam as diferenciações quanto ao sistema genital das espécies domésticas. Conhecer a anatomia dos órgãos reprodutivos é essencial para poder identificar as patologias que possam afetar a capacidade reprodutiva, bem como para entender as diferenças de manejo ao empregar algumas biotecnologias reprodutivas aplicadas aos animais domésticos. Ao longo do texto, a espécie bovina será utilizada como modelo e serão feitas as observações correspondentes às diferenças com as outras espécies. Os órgãos genitais da fêmea incluem os órgãos genitais internos (ovários, ovidutos, útero, cérvix, vestíbulo e vagina) e os órgãos genitais externos (lábios vulvares e clitóris) (tabela 3). Os ovários produzem tanto gametas femininos quanto hormônios. As tubas uterinas pares capturam os oócitos liberados pelos ovários e os transportam para o útero, onde o ovo fertilizado é mantido. A vagina serve como órgão copulatório e, juntamente com sua continuação, o vestíbulo, como canal de parto e passagem para excreção urinária. -/- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOETA, M. et al. Fisiología reproductiva de los animales domésticos. México: FMVZ – UNAM, 2018. DERIVAUX, Jules; BARNABÉ, Renato Campanarut. Reprodução dos animais domésticos. Zaragoza: Acribia, 1980. DUKES, Henry Hugh; SWENSON, Melvin J.; REECE, William O. Dukes fisiologia dos animais domésticos. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1996. DYCE, Keith M.; WENSING, Cornelius JG; SACK, Wolfganf O. Tratado de anatomia veterinária. Elsevier Brasil, 2004. HAFEZ, Elsayed Saad Eldin; HAFEZ, B. Reprodução animal. São Paulo: Manole, 2004. HOLY, Lubos; MARTÍNEZ JÚSTIZ, G. Colab. Biología de la reproducción bovina. Havana: Revolucionária, 1975. KÖNIG, Horst Erich; LIEBICH, Hans-Georg. Anatomia dos Animais Domésticos-: Texto e Atlas Colorido. Porto Alegre: Artmed Editora, 2016. MIES FILHO, Antonio. Reprodução dos animais. Porto Alegre: Sulina, 1987. (shrink)
INTRODUÇÃO A maioria dos alimentos que os bovinos de corte e leite consomem são os alimentos volumosos (forragens, gramíneas ou leguminosas) que é um alimento que possui teor de fibra detergente neutra (FDN) ≥ 25% da matéria seca (MS), ou teor de fibra ≥ 18% da MS. Por possuir grande quantidade de fibra em sua composição é um alimento que possui menor concentração de proteínas, carboidratos não estruturais (CNE) e lipídios. Para que um animal possa manter-se com alimentação volumosa, é (...) necessário a ingestão de grande quantidade desse material. Quando os bovinos recebem apenas forragens, não conseguem ingerir o suficiente para obter a energia, proteínas, minerais e vitaminas necessárias para converter os nutrientes em produtos (carne, leite etc.). Assim, faz-se necessário a inclusão de uma fonte alimentar concentrada em nutrientes na dieta dos bovinos. O alimento concentrado é aquele que contém menor teor de FDN < 25% ou teor de fibra bruta (FB) < 18%. Logo, pelo baixo teor de fibras é um alimento rico em energia e/ou proteínas. Divide-se em concentrados proteicos, os que possuem um teor de proteína bruta (PB) > 20% da MS e em concentrados energéticos, os que possuem < 20% de PB da MS. Para suprir todas as necessidades de mantença, crescimento, reprodução e produção, os bovinos devem receber alimentos suficientes e que forneçam a quantidade necessária dos nutrientes exigidos pelos animais em função da aptidão, estado fisiológico, categoria etc. Nutrientes fornecidos pela dieta (kg/dia) = necessidades dos bovinos (kg/dia) A formulação de rações consiste em combinar, nas quantidades necessárias, os alimentos que serão oferecidos para suprir as necessidades diárias do animal. Uma ração balanceada é aquela que fornece ao animal as proporções e quantidades corretas de todos os nutrientes necessários por um período de 24 horas. Às vezes, o criador possui controle total sobre os tipos e proporções de vários alimentos que compõem a ração. É o caso dos animais em sistema de confinamento, onde se conhece todo e qualquer alimento que o animal ingere e sua respectiva exigência, o que torna a formulação fácil. No entanto, balancear a ração, às vezes, é uma tarefa difícil. Normalmente, os animais em pastejo podem escolher não apenas a quantidade de pasto que consomem, mas também a sua composição. Os animais podem selecionar várias partes da planta e rejeitar outras. Para elaborar um programa alimentar, utilizando os métodos de formulação e balanceamento de rações é necessário, inicialmente, da explanação de alguns conceitos-chave da nutrição e, sem dúvidas, do entendimento e conhecimento das exigências nutricionais dos animais em função da idade, da raça, do estado fisiológico etc., além da composição bromatológica dos alimentos disponíveis para os animais. Sendo assim, a finalidade desse trabalho, em suma, é a explanação de conceitos-chave da nutrição, bem como da elaboração de tabelas dos requerimentos nutricionais diários dos animais, além da elaboração, alicerçado pela literatura disponível, da composição bromatológica dos alimentos, em especial do conteúdo proteico e energético dos mesmos. Por fim, conhecendo a composição dos alimentos e as exigências dos animais de acordo com a categoria, é realizado o balanço para saber, finalmente, se os alimentos suprem os requisitos dos animais e, se não atender os requerimentos, seja necessária uma adição suplementar para suprir todos os requerimentos para que os animais possam se manter e produzir, sempre visando uma elaboração alimentar econômica e viável tanto para os grandes pecuaristas quanto aos pequenos criadores. 1. GENERALIDADES 1.1 Balanceamento de rações Consiste na preparação de alimentos suficientemente nutritivos que cumpram com os requerimentos proteicos, energéticos, vitamínicos e minerais dos animais. Sendo assim, nos deparamos com alguns questionamentos, dentre eles a importância do balanceamento. Quando uma ração não está equilibrada há um excesso e/ou deficiência de determinados nutrientes. Alguns desequilíbrios possuem consequências drásticas e se não forem corrigidos podem causar até a morte do animal (por exemplo, um desequilíbrio de Ca próximo ao parto pode causar a febre do leite e morte do animal se não for tratado imediatamente). Alguns sintomas observados no animal podem auxiliar na identificação dos desequilíbrios, principalmente sintomas relacionados à carência de vitaminas e minerais. No entanto, outros desequilíbrios são difíceis de identificar, uma vez que resultam de algum grau de perda de desempenho. Os bovinos não têm um desempenho tão bom quanto seu potencial genético permitiria quando há algum desequilíbrio na ração. Os desequilíbrios tendem a afetar os animais com alto potencial genético. Nem todos os desequilíbrios alimentares possuem consequências devastadoras, mas todo desequilíbrio nutricional é economicamente inaceitável, uma vez que produz uma perda de produção e perda de nutrientes que poderiam ser utilizados efetivamente pelos animais para suas funções básicas. 1.2 Consumo de MS Matéria seca é a razão do alimento desprovido de umidade. Por exemplo, quando corta-se o capim e expõe-se o mesmo ao sol, irá murchar e logo sua cor mudará de verde para um café ou amarelo escuro em consequência da maior perda de água presente na composição. Quanto mais exposta ao calor mais seca a forragem ficará e esse conteúdo é o que se denomina de matéria seca. Por exemplo, quando o grão de milho perde toda água contida nele sua matéria seca é de 88%, aproximadamente. Cada pasto possui uma porcentagem diferente de umidade e varia em função da idade. Logo, podemos concluir que pastagens jovens possuem mais suculência (maior quantidade de água) e os pastos mais velhos possuem menor suculência, fazendo com que os bovinos prefiram ingerir os pastos mais jovens por possuírem melhor palatabilidade e degustação ao animal. A B Em A podemos observar um pasto velho com uma característica mais seca, ou seja, com uma menor quantidade de água. Por outo lado, em B podemos observar um pasto mais jovem, com maior porcentagem de água em sua composição. Agora, vamos conhecer o consumo de MS pelos bovinos. Na teoria, e recomendável, para cada 100 kg de peso vivo (PV), o bovino deve consumir o equivalente de MS entre 1,8 e 3,5 kg, ou seja, é o mesmo que dizer de 1,8 a 3,5% do PV. Esses valores nos indicam que um animal jovem consome menor matéria seca e vice-versa, e animais adultos consomem maior quantidade de MS. O consumo de MS varia em função do peso do animal, do estado fisiológico e da porcentagem de digestibilidade do alimento, por exemplo, bovinos de até 600 kg podem consumir até 10,5 kg/dia de MS sob um pasto com digestibilidade de 80%. Como regra geral, para saber com que ponto de escala se considera 1,8 e 3,5% usa-se: Para: Vaca em produção leiteira = 3,2% (vaca com 500 kg, 3,2% equivale a 16 kg de MS/dia) Vaca adulta e grande = 3,3 ou 3,4% Novilhas (os) com 300 kg = 2,8% (2,8% de 300 kg equivale a 8,4 kg de MS/dia) Exemplos: Uma bezerra pesa 120 kg. Qual a quantidade de MS que ela deverá consumir? 120 kg bezerra ----------- 100% (correspondente) X kg de MS ------------- 2,7%¹ ¹ - a maioria das pastagens possuem essa porcentagem de MS Pelos cálculos vamos obter: "X=" "120 x 2,7" /"100" "= 3,24 kg de MS" Sendo assim, a bezerra deverá consumir 3,24 kg de MS/dia. Temos uma umidade média de 80% o que indica que o restante é de material seco. 3,24 kg ------------- 20% correspondente X -------------- 80% umidade "X=" "3,24 x 80" /"20" "= 12,96 kg de água" Agora água + material seco: 3,24 kg de MS + 12,96 kg de água = 16,2 kg de forragem verde para a bezerra de 120 kg de PV. As forragens nunca se encontram em forma de material seco e sim de material verde, indicando-nos a presença de água entre 65 e 85% de sua composição. Mas, como conhecer com exatidão a umidade ou a presença de água de um produto? Para se conhecer com exatidão o teor de umidade de um determinado alimento, pode-se seguir os seguintes passos: 1. Separar 1 kg de forragem 2. Pôr no sol ou em um forno para desidratar até que esteja seco o bastante como para moer 3. Pesar e o peso que diminuiu será o conteúdo de água que continha Exemplo: 1000 g de forragem verde ---------- 100% 200 g de forragem seca ---------- X% X = "200 x 100" /"1000" "= 20%" Logo, a matéria seca é 20% e o conteúdo de água é de 100% - 20% = 80%. O esquema abaixo representa a secagem anterior, seja por sol ou em forno. 1.3 Necessidades de água Resumidamente, a água é necessária para o metabolismo, para a produção (leite e carne) e para as necessidades ambientais. A água é o nutriente que as vacas de leite requerem em maior quantidade. A água é um nutriente primordial na manutenção da produção leiteira e cárnea dos bovinos. A produção de leite, por exemplo, reduzirá no mesmo dia em que a água não estiver disponível para as vacas. Muitas vezes, a água é considerada aparte dos outros nutrientes como as proteínas, no entanto, é um nutriente de suma importância para a produção pecuária; pode-se administrar poucas quantidades de alimentos aos animais, mas se faltar água em excesso os animais padecem rapidamente. Os alimentos possuem quantidades variáveis de água (umidade) em sua composição, uma gramínea verde inteira no solo pode conter de 80 a 85% de água e, portanto, conter apenas de 15 a 20% de MS. Em contrapartida, o teor de água da maioria dos alimentos concentrados é de 10%, ou seja, 90% é de MS. Embora a quantidade de água na dieta possa variar consideravelmente, normalmente é pouco significativo, já que os animais devem regular o consumo de água por conta própria, ou seja, o acesso à água de boa qualidade deverá ser de livre escolha dos animais. Entretanto, quando grandes quantidades de alimentos úmidos forem oferecidas (como polpa de beterraba ou grãos de cevada) a ingestão de energia, proteínas, minerais e vitaminas encontradas na MS da ração pode ser reduzida. Para administrar água para os bovinos deve ter em conta que: A quantidade de água para a manutenção do metabolismo está descrita na tabela 1. Tabela 1: água utilizada no metabolismo Para cada kg de MS rústica 2,5 litros Para cada kg de MS suculenta 2 litros Para cada litro de leite 4 litros Para cada kg de carne 1 litro Os principais fatores que limitam a ingestão de água são: A ingestão de MS Produção de leite A temperatura ambiente Ingestão de sódio Na Como citado supra, a temperatura é um dos fatores que influenciam na ingestão de água. Logo, sob clima quente, os animais estabulados devem receber +15% de água dos valores mencionados, os animais sob pastejo devem receber +20%. Sob clima frio, os animais estabulados devem ingerir +10% e os sob pastejo +15%. De forma geral, uma vaca em lactação deverá ingerir de 3,5 a 5,5 litros de água por kg de MS. Por exemplo, uma vaca que produz 10 kg de leite e come 12 kg de MS consumirá 12 x 4,5 = 54 kg ou litros de água/dia. Para bovinos de corte, por exemplo, considerando um animal de dois anos em condições de manejo adequado, o consumo deverá ser de 45 litros/animal/dia ou de 8 a 9 litros/100 kg de PV. 2. REQUERIMENTOS NUTRICIONAIS DOS BOVINOS Antes de explanar os requerimentos nutricionais dos bovinos em produção, faz-se necessário a explanação de alguns conceitos importantes: 2.1 Proteína e energia A proteína é o componente mais importante para o tecido animal e se encontra em concentração no tecido muscular. É essencial para o crescimento e a quantidade requerida vai diminuindo à medida que o animal se desenvolve. O corpo necessita de proteínas para a manutenção e renovação dos tecidos. Também é requerida para a realização de funções produtivas tais como a gestação e a lactação. As rações para os bovinos deverão conter a seguinte concentração de proteína: Tabela 2: porcentagem de proteína em rações para bovinos Etapa produtiva % de proteína na ração Bezerros (as) até os 4 meses 18 – 19% Bezerros (as) em crescimento 4-12 meses 17 – 18% Novilhos (as) em engorda 12-20 meses 14 – 17% Novilhas gestantes (+ de 16 meses) 19 – 20% Vacas gestantes 20% Vacas em produção leiteira 16 – 17% Reprodutores (adultos) 14 – 15% Fonte: adaptação de TEIXEIRA, 1997 e BERCHIELLI et al., 2006. A energia é o componente que o animal necessita para a realização de algumas funções, tais como a movimentação, metabolismo, temperatura corporal, respiração, produção, reprodução, crescimento e muitas outras. O valor energético pode ser expressado de duas formas, em nutrientes digestíveis totais (NDT), mais conhecido no Brasil e em unidades de amido (UA). O NDT é o sistema que calcula a energia total (proteína digestível, fibra crua digestível, extrato não-nitrogenado digestível e gordura digestível), mas levando em consideração as perdas de energia pela digestão do alimento no animal. É notório que os alimentos ricos em fibra crua necessitarão de um maior trabalho digestivo, logo, o gasto energético será maior. Por sua vez, a medida de energia líquida é conhecida como unidades de amido. 2.1.1 Fontes de energia e proteína na ração Os carboidratos fibrosos (CF), presentes nos volumosos, têm baixo teor de energia, mas são necessários para manter a ruminação, a produção de saliva e o pH ruminal para a atividade bacteriana normal. Os carboidratos não fibrosos (CFN) também são nutrientes importantes porque são fontes importantes de energia. Portanto, uma boa porção deve conter os dois. No entanto, a proporção ideal de cada tipo de carboidrato mudará dependendo do nível de produção. Com o aumento da produção de leite, a vaca necessita de mais energia e, portanto, mais concentrada na ração. As fontes de energia e proteína são críticas na formulação de uma boa mistura A porção da proteína bruta na ração que está na forma de nitrogênio não proteico (NNP) é a principal fonte de nitrogênio para o crescimento bacteriano. A deficiência de NNP pode reduzir o crescimento de bactérias e o fornecimento de aminoácidos bacterianos à vaca. O excesso de NNP na ração não é apenas um desperdício, porque não é utilizado pelas bactérias, mas também pode ser tóxico e é necessária energia para desintoxicá-lo e eliminá-lo na urina. Uma porção da proteína bruta na ração também pode ser necessária na forma de proteína resistente à degradação microbiana no rúmen. Vacas de alta produção requerem proteínas resistentes à degradação por bactérias para fornecer aminoácidos adicionais (além daqueles que podem fornecer proteína bacteriana) para absorção no intestino delgado. Assim, em boa parte, tanto a quantidade de proteína quanto a natureza da proteína devem ser cuidadosamente controladas. 2.2 Requerimentos nutricionais dos bovinos de corte. 3. COMPOSIÇÃO DOS ALIMENTOS PARA OS BOVINOS Os alimentos usados na alimentação de bovinos, como de demais espécies de interesse zootécnico, são classificados de acordo com o teor de fibra bruta e de outros nutrientes. Sendo assim, podemos dizer que basicamente são classificados em: 1) Alimentos volumosos: possuem baixo teor energético em sua composição, decorrente do alto teor em fibra ou em água. Possuem menos de 60% de NDT e/ou mais de 18% de fibra bruta (FB) na MS e englobam as forrageiras secas e grosseiras (fenos e palhas), pastagens cultivadas, pastos nativos, forrageiras verdes e silagens. São os de menor custo na propriedade. Para os bovinos os mais utilizados estão as pastagens naturais ou cultivadas (braquiárias e panicuns), capineiras (capim-elefante), silagens (capim, milho, sorgo etc.), cana-de-açúcar e o bagaço de cana hidrolisado. Entre os menos utilizados estão o milheto, feno de gramíneas, silagem de girassol, palhadas de culturas etc. 2) Alimentos concentrados: em função do baixo teor de FB (< 18%), são alimentos com alto teor energético, com mais de 60% de NDT e podem ser divididos em: a) Concentrados energéticos: aqueles com menos de 20% de PB em sua composição, 25% de FDN (fibra em detergente neutro) e em torno de 18% de FB. São exemplos de alimentos concentrados energéticos o milho, sorgo, trigo, aveia, cevada, frutas, nozes e algumas raízes (mandioca, batata etc.). b) Concentrados proteicos: alimentos com mais de 20% de PB, 50% de FDN e 60% de NDT. Como exemplo temos os farelos de soja, de amendoim, de girassol, de algodão, glúten de milho e alguns subprodutos de origem animal como a farinha de peixe, de sangue, de carne e ossos etc. Ainda assim, existem os suplementos minerais e vitamínicos e os aditivos que entram em pequenas quantidades nas rações e são antibióticos, corantes, probióticos, antioxidantes etc. Dentro da nutrição e da alimentação animal, podem ocorrer variações nas composições bromatológicas dos alimentos em função de alguns fatores, tais como as cultivares (variedades) como a planta de sorgo que apresenta variedades com e sem tanino, o armazenamento como as misturas minerais expostas ao sol podem sofrer alterações pelas reações químicas, as condições do solo, teor de água e condições de processamento. Por fim, para a formulação de dietas equilibradas, deve-se fazer uma análise, sempre que possível e viável, dos alimentos que serão utilizados no balanceamento. Sendo assim, as dietas se apresentarão o mais próximo possível das necessidades dos animais e refletirão em desempenhos satisfatórios. A tabela 14, trata da composição de alguns alimentos comumente usados na alimentação dos bovinos de corte e leite e que servirá de base para a posterior formulação de dietas para os mesmos. Após a análise bromatológica dos principais valores dos alimentos para a formulação de rações, faz-se necessário o conhecimento das quantidades dos ingredientes na dieta dos bovinos. Para tanto, a tabela 15 traz os principais alimentos e a quantidade recomendável de cada um sobre a dieta e/ou a ração total dos animais. Tabela 15: níveis recomendados dos principais ingredientes para rações de bovinos INGREDIENTE NÍVEL DE USO Milho grãos Até 70% Farelo de soja 30 a 40% Sorgo grãos Substituto 100% do milho Farelo de trigo 10 a 40% Farelo arroz desengordurado 10 a 30% Farelo amendoim 30 a 40% Farelo de algodão 30 a 40% Torta de girassol 30 a 40% Torta de colza Até 20% Torta de linhaça 5 a 10% Torta de mamona 5 a 10% Torta de gergelim 30 a 40% Farinha de peixe Até 10% Farinha de sangue 1,5 kg Polpa cítrica 20% Caroço de algodão 25% Farinha de penas 0,5 kg Farinha carne e ossos 1,5 kg Farelo de arroz 15% Soja grãos 25% Farelo de girassol 30% Gorduras 5% Resíduos de padaria 20% Grãos de destilaria 60% Grãos de cervejaria 30% Melaços 20% Subprodutos do trigo 30% Feijão 25% Glúten de milho 10% Ureia 1% Casca de algodão 40% Casca de arroz 15% Cama de galinha 15% Fontes: TEIXEIRA, A. S., 1997 e TEIXEIRA, J. C., 1997. 4. SELEÇÃO ECONÔMICA DE INGREDIENTES PARA RAÇÕES Uma das preocupações dos técnicos em nutrição animal é a minimização do custo das fórmulas de rações. Existem alguns métodos utilizados para minimizar os custos, dentre eles o método com auxílio do computador para cálculo de fórmulas e o método do valor nutricional parcial, isto é, o método onde os alimentos são selecionados de acordo com seus custos por kg em relação a outros ingredientes básicos da ração. 4.1 Uso do computador Através de programas específicos, os computadores selecionam os ingredientes com relação ao custo, construindo e fornecendo a ração mais barata dentro da finalidade de minimização do custo. Para que seja evitado que a ração escolhida pelo computador (mais barata), seja a pior dentro do aspecto nutricional, deve-se tomar as seguintes medidas: Estabelecer um controle de limite máximo para os ingredientes selecionados de forma econômica, para evitar que os mesmos ultrapassem os limites recomendados pelas técnicas nutricionais. Estabelecer nesse controle um limite mínimo para os ingredientes, que não foram selecionados, mas que a pesquisa aconselha serem incluídos à ração. Mesmo essas medidas sendo tomadas, a resposta final provém dos animais através de provas biológicas, como a conversão alimentar, custo para produzir 1 kg de carne etc. 4.2 Valor nutricional parcial Esse método é baseado em alguns critérios, dos quais: Existência de dois ingredientes padrões como o milho e a soja, que servirão de base na determinação do custo de 1 kg de proteína e de 1 Mcal de energia metabolizável, de energia digestível, de energia líquida (energia produtiva) ou 1 kg de nutrientes digestíveis totais (NDT). No nosso caso, como constituem a base de 60 a 80% das rações, os ingredientes aconselháveis para servirem de padrões são o milho, o farelo de soja ou o farelo de algodão. Este método também parte da premissa de que, quando se compra 1 kg de milho por um dado preço Vm, na verdade está se comprando 93 g de proteína e 3,52 Mcal de ED. Quando se compra 1 kg de farelo de soja por um preço Vs, está se comprando 450 g de proteína e 3,21 Mcal de ED. Alicerçados por esses dados e no fato de que proteína e energia não possuem cotação comercial, pode-se determinar os valores relativos de 1 kg de proteína (a) e de 1 Mcal de ED (b) através das equações: Equação do milho: 0,093 + 3,52 a = Vm Equação da soja: 0,450 + 3,21 b = Vs Para que se obtenha o valor nutricional parcial, multiplica-se a composição de proteína do ingrediente a ser selecionado de forma econômica pelo custo relativo de 1 kg de proteína, procedendo-se da mesma forma para a energia e somando-se os dois é obtido o valor nutricional parcial que era esperado. Pode-se incluir, também, o valor da composição mineral e vitamínica do ingrediente cotado a preço comercial desses nutrientes. Pode-se, portanto, calcular o valor nutritivo parcial levando-se em consideração mais nutrientes, como os minerais, como é o caso do Ca e P. Para tanto, deve-se tomar, como padrões, para calcular o custo de 1 kg de Ca e de 1 kg de P, isto é, o calcário calcítico e o fosfato bicálcico, respectivamente. 4.3 Relação valor nutricional parcial/preço comercial Através da divisão do valor nutritivo parcial encontrado nos cálculos pelo preço comercial do ingrediente é obtida a relação (R) valor nutritivo parcial/preço comercial de ingredientes. Alicerçados por essa premissa, podemos obter as seguintes conclusões: R = 0 o ingrediente incluído na fórmula, não reduz e nem aumenta os custos; R > 1 o ingrediente incluído na fórmula reduz o custo da ração. Ela será maior quanto maior for a relação; R < 1 a inclusão do ingrediente à fórmula aumenta o custo e será maior quanto menor for o valor da relação. 4.4 Seleção econômica do farelo de trigo Vamos selecionar o farelo de trigo que possui 16% de PB e 2,77 Mcal de ED e custa R$ 1,80 (dados de jan. 2021). O farelo de soja custa R$ 2,85 o kg e contém 45% de PB e 3,21% Mcal de ED. O milho, por sua vez, custa R$ 0,71 o kg e contém 9,3% de PB e cerca de 3,52 Mcal de ED. Para calcular o custo relativo de 1 kg de PB e de 1 Mcal de ED, usa-se os dados do milho e do farelo de soja, montando-se o seguinte sistema de equação: Equação do milho: 0,093x + 3,52y = 0,71 Equação do farelo de soja: 0,450x + 3,21y = 2,85 Resolvendo esse sistema, obtemos: x = R$ 6,00/kg de proteína y = R$ 0,04/Mcal de ED Para calcular o valor nutritivo parcial do farelo de trigo, juntamos os dados do FT com os resultados obtidos da resolução supra, assim obtemos: Valor nutritivo parcial = 0,16 x 6,00 + 2,77 x 0,04 = 1,06 Cálculo da relação valor nutritivo parcial e preço comercial, obtemos: R = "1,06" /"1,80" = 0,59 Com base no valor da relação supra 0,59, podemos dizer que em cada real pago pelo farelo de trigo será pago 0,59 centavos de real em valor nutritivo parcial em relação ao milho e ao farelo de soja tomados como padrões. Portanto, quando se incluir o farelo de trigo na ração ocorrerá o aumento do custo da mesma. Também, no caso do valor nutritivo parcial, são realizadas as mesmas restrições de controle para o uso de computadores, com o objetivo de que a ração mais econômica não seja a pior com relação a disponibilidade e carga nutricional. 5. MÉTODOS DE FORMULAÇÃO DE RAÇÕES Para a formulação de dietas para os bovinos, é necessário o conhecimento de alguns conceitos para a tomada de decisões quanto a dieta dos animais. Um dos passos-chave para a tomada de decisões é o conhecimento dos alimentos que irão compor a mistura de concentrados. A quantidade de proteína é o primeiro nutriente a ser calculado e computado, visando a determinação do nível de proteína desejável na mistura dos concentrados (tabela 2). As regras de manuseio descritas a seguir podem auxiliar na tomada de decisões para formulação de rações. Quando as vacas leiteiras recebem um alimento com elevado teor proteico, tal como as farinhas de origem animal, os farelos como o de soja, girassol etc. ou as pastagens consorciadas, os concentrados deverão ter 10% de proteína digestível (PD) ou 13% de PB; Para a suplementação da mistura diária dos alimentos, tais como o feno de alfafa e silagem de milho, os concentrados deverão conter ao redor de 12% de PD ou, aproximadamente, 16% de PB; Com uma dieta com baixo teor proteico, como baseada em silagem de milho e feno de aveia, os concentrados a serem fornecidos deverão conter, aproximadamente, de 13,5 a 16% de PD, ou seja, de 18 a 21% de PB. Os alimentos disponíveis nem sempre se encaixam nessas três regras citadas. Por exemplo, a proporção do feno de alfafa para a silagem de milho poderá variar muito afetando a necessidade de proteína exigida à adequada suplementação, através dos concentrados. Existem outros fatores que podem influenciar na tomada de decisões. A checagem das entradas e saídas ou consumo-produção pode fornecer meios de ajuste a essas variações. O fornecimento de proteínas em excesso não é prejudicial à saúde do animal, mas também não é aconselhável, dado que os suplementos proteicos são mais caros que os mais pobres em proteínas. Sendo assim, evitar o excesso de consumo de nutrientes torna-se um problema fundamentalmente econômico. Se a diferença de preços entre o suplemento proteico e um alimento energético for pequena, a importância do problema desaparece. 5.1 Procedimentos para o balanceamento de rações a) caracterização dos animais Caracterizar bem os animais a serem alimentados, em termos de categoria, idade, peso vivo, produção estimada (ganho de peso, produção de leite, teor de gordura do leite) etc. b) obtenção das exigências nutricionais Verificar os requerimentos nutricionais dos animais no que tange a energia, proteína bruta, cálcio, fósforo, aminoácidos etc., de acordo com a caracterização do animal, mencionado no item a). c) levantamento e quantificação dos alimentos disponíveis Levantar e quantificar os alimentos que estão disponíveis para o programa alimentar. Nesse momento, faz-se necessário mencionar o preço dos alimentos por kg. d) levantamento da composição bromatológica Relacionar a composição química dos alimentos a serem utilizados. Considerar na relação os nutrientes de maior interesse ou aqueles levantados nas exigências nutricionais. e) Balanceamento da ração Balancear os nutrientes levantados nas tabelas usando qualquer dos métodos descritos no item 5.2. f) ajuste final Ajustar a ração e outros nutrientes, se houver interesse, e verificar se todas as exigências foram atendidas e não haja excessos e se a combinação de alimentos é mais econômica, mediante o custo da ração por kg ou custo da ração por animal por dia. g) programa de alimentação Elaborar um programa para uso dos alimentos ou da ração incluindo as recomendações práticas. 5.2 Métodos usados no balanceamento O balanceamento de rações é a preparação equilibrada de uma porção alimentar onde se misturam vários produtos com o objetivo de suprir a necessidade nutricional dos animais. Existem muitos métodos para o balanceamento de rações, no entanto, vamos discorrer sobre os principais. A finalidade deste tópico é a abordagem dos vários métodos, e seus tratamentos matemáticos, usados no preparo de fórmulas de ração. Vamos preconizar apenas a metodologia matemática do cálculo, sem preocupar-se com a viabilidade das rações calculadas, que constituirão apenas sob exemplos hipotéticos. Todavia, outros exemplos já resolvidos serão dados conforme a viabilidade econômica e nutricional da ração para os bovinos. Após a compreensão e entendimento dos métodos aplicados e explicados nesse trabalho, será tratado a formulação de rações específicas e práticas para a alimentação racional dos bovinos. 5.2.1 Método da tentativa Aqui nenhum esquema é utilizado. O cálculo é feito através de tentativa, aumentando ou diminuindo as quantidades dos alimentos, até que as exigências do animal sejam atendidas. Dentro desse método temos a tentativa e erro e tentativa e técnica da substituição. A técnica das tentativas é trabalhosa e exige alguma experiência do formulador. 1. Como exemplo, será balanceada uma ração para uma vaca leiteira com uma exigência de 1,1 kg de PB e 6,41 NDT. Os alimentos disponíveis e sua composição bromatológica são: Alimentos Nutrientes MS (%) PB (%) NDT (%) Capim Napier 25 1,6 12 Fubá de Milho 88 9,3 80 Farelo de Algodão 90 30,0 63 Farelo de Trigo 89 15,0 63 Baseando-se nas exigências da vaca e na composição dos alimentos disponíveis, calculamos a ração por tentativa, ajustando as quantidades de alimentos até que as exigências sejam supridas. Desse modo, obtemos a dieta balanceada: Alimentos Kg MS (kg) PB (kg) NDT (kg) Capim Napier 25 6,25 0,4 3,0 Fubá de Milho 2,7 2,38 0,25 2,16 Farelo de Algodão 1,0 0,9 0,3 0,63 Farelo de Trigo 1,0 0,89 0,15 0,63 TOTAL 29,7 10,42 1,1 6,42 EXIGÊNCIAS 10,0 1,1 6,41 Transformando as quantidades dos alimentos concentrados para uma mistura percentual, obtemos: Alimentos Consumo/vaca/dia (kg) % Fubá de Milho 2,7 57,4 Farelo de Algodão 1,0 21,3 Farelo de Trigo 1,0 21,3 TOTAL 4,7 100 2. Em uma segunda tentativa, vamos determinar uma ração de 100 kg para um lote de vacas com uma exigência de 18% de PB, os alimentos disponíveis são o milho com 9% de PB e Farinha de Peixe com 53% de PB. (9% de PB = 90 g PB/kg). 1ª tentativa: usando 50% de milho + 50% de farinha de peixe, obtemos: PB da mistura: (90 x 0,5) + (530 x 0,5) = 310 g/kg A mistura acima possui muito mais proteína do que o desejado (180 g/kg). Faz-se necessário o aumento da incorporação do milho (matéria-prima menos proteica) e a diminuição da incorporação da farinha de peixe (matéria-prima mais proteica). Em uma segunda tentativa, obtemos: 2ª tentativa: 90% de milho + 10% de farinha de peixe PB da mistura: (90 x 0,9) + (530 x 0,1) = 134 g/kg A mistura possui menos proteína que o desejado, sendo assim, é necessário aumentar a incorporação da farinha de peixe (mais proteica) e diminuir a de milho (menos proteico), logo obtemos: 3ª tentativa: 79,5% de milho + 20,5% de farinha de peixe, teremos: PB da mistura: (90 x 0,795) + (530 x 0,205) = 180,2 g/kg Por fim, em 100 kg de ração com 18% de PB a mistura deverá ser composta por 79,5% de milho e 20,5% de farinha de peixe. 3. Empregando a técnica da tentativa e substituição para o exemplo supra, vamos obter: Deseja-se encontrar as porcentagens em que milho (9% PB) e farinha de peixe (53% PB) devem ser misturados de forma a obter uma mistura de 100 kg com 18% de PB. (Como sabemos 1% de PB equivale a 10 g PB/kg). 1ª tentativa: 50% milho + 50% farinha de peixe PB da mistura: (90 x 0,5) + (530 x 0,5) = 310 g/kg A mistura possui 310 g de PB/kg, sendo o teor desejado de 180 g, ou seja, teremos que diminuir o teor proteico em 130 g (310 – 180). Para diminuir o teor proteico da mistura é necessário diminuir a % de farinha de peixe e aumentar a % de milho. A % que se retira a farinha de peixe é igual a % de aumento do milho. Desse modo, obtemos o cálculo do fator de substituição: A farinha de peixe possui 530 g PB/kg O milho possui 90 g PB/kg A diferença do teor proteico entre a farinha de peixe e o milho (fator de substituição) = 440 g PB. Dessa forma, partiremos para o cálculo da quantidade a ser substituída, dada por: A substituição de 100% (FP → M) ---------- 440 g PB X ---------- 130 g PB Pelo princípio da regra de três, obtemos: 100 x 130 = 1300/440, então X = 29,5%. Temos que diminuir 29,5% da farinha de peixe e aumentar 29,5% o milho. Cálculo da nova fórmula: Milho = 50 + 29,5 = 79,5% Farinha de peixe = 50 – 29,5 = 20,5% Por fim, a mistura deverá ser composta por 79,5% de milho e 20,5% de farinha de peixe. 4. Deseja-se calcular 100 kg de ração utilizando o farelo de trigo, farinha de carne, fubá de milho e farelo de soja, observando as seguintes condições: PB deve ser igual a 17,89% e EM igual a 2.900 Kcal/kg. A recomendação é usar o farelo de trigo até 20% da ração total; farinha de carne até 10% da ração total; farelo de soja até 40% da ração total; sal 0,8% e pré-mistura de vitaminas e minerais 0,2%. A composição bromatológica dos alimentos mencionados é disposta na tabela: Alimentos PB (%) EM (Kcal/kg) Farelo de trigo 16 1.526 Farinha de carne 50 1.835 Fubá de milho 9 3.416 Farelo de soja 45 2.283 A fórmula para a energia metabolizável é: "EM" ("kcal/kg" )"=" "Quantidade do ingrediente x EM kcal/kg" /"100" " " 1ª tentativa: observando as recomendações citadas, fixa-se as quantidades de farelo de trigo, farinha de carne, fubá de milho e farelo de soja de modo a equilibrar a PB e EM da ração. Assim, tomamos 63 kg de fubá de milho, logo a quantidade do farelo de soja será: Fubá de milho + farelo de soja = 84 kg Farelo de soja = 84 – 63 = 21 kg Composição da ração em 1ª tentativa Alimentos Quantidade (kg) PB (kg) EM (kcal/kg) Farelo de trigo 10 1,6 152,6 Farinha de carne 5 2,5 91,75 Fubá de milho 63 5,67 2152,08 Farelo de soja 21 9,45 479,43 Sal 0,8 Vitaminas e minerais 0,2 TOTAL 100 19,22 2875,86 EXIGÊNCIAS 100 17,89 2900 DÉFICE 24,14 Como houve um défice de 24,14 kcal/kg de energia metabolizável, aumentamos a quantidade de fubá de milho para 66 kg e diminuímos a quantidade de farelo de soja para 18 kg. Sendo assim, faz-se uma nova tentativa com a finalidade do equilíbrio da PB e EM da ração. Composição final da ração Alimentos Quantidade (kg) PB (kg) EM (kcal/kg) Farelo de trigo 10 1,6 152,6 Farinha de carne 5 2,5 91,75 Fubá de milho 66 5,94 2254,56 Farelo de soja 18 8,1 410,94 Sal 0,8 Vitaminas e minerais 0,2 TOTAL 100 18,14 2909,85 EXIGÊNCIAS 100 17,89 2900 Por fim, a ração calculada apresenta 18,14% de PB e 2909,85 kcal/kg de EM o que satisfaz plenamente as exigências nutricionais de proteína e energia metabolizável desejadas. Formulação na prática I: Pelo método da tentativa, descrito supra, formular uma mistura para uma vaca de 450 kg de PV, com uma produção de 15 kg de leite/dia com 4,0% de gordura. 1º passo: Estabelecer as exigências: Para um animal com essas características as exigências estabelecidas são: Exigências de uma vaca de 450 kg de PV em energia, PB, Ca e P Discriminação NDT (kg) PB (g) Ca (g) P (g) Mantença 3,44 403 17 14 Lactação 4,89 1305 40 27 TOTAL 8,33 1708 57 41 2º passo: Alimentos disponíveis e sua composição Os alimentos disponíveis são silagem de milho, capim elefante napier, milho triturado, farelo de soja, farelo de trigo e pedra calcária em pó. É necessário estabelecer a composição bromatológica dos alimentos disponíveis, colocando as porcentagens de NDT, PB, Ca e P. Composição bromatológica dos alimentos disponíveis Alimentos NDT (%) PB (%) Ca (%) P (%) Silagem de milho 18,1 2,2 0,1 0,06 Capim elefante N. 13,4 1,2 0,12 0,07 Milho triturado 80 9,3 0,02 0,33 Farelo de soja 73 45 0,32 0,67 Farelo de trigo 63 16 0,14 1,24 Pedra calcária em pó - - 38 - 3º passo: Ração de volumosos diários A proporção entre volumosos e concentrados depende de alguns fatores entre os quais está a qualidade e a disponibilidade das forragens, o custo dos concentrados, o preço do leite etc. Na prática, recomenda-se as seguintes normas de fornecimento: Limites de alimentos volumosos diários sobre o PV do animal Alimentos Limite aconselhável sobre PV (%) Feno de boa qualidade 2 a 3 Silagem 4 a 6 Raízes e tubérculos 2 a 3 Capim tenro 6 a 8 A associação entre dois ou mais destes volumosos seria feito pelo critério da proporcionalidade. Quando as vacas dispõem de bom pasto, admite-se que os requerimentos de mantença e produção de até 5 kg de leite/dia, sejam supridos por meio do pastoreio. Todavia, faz-se necessário enfatizar que a qualidade das pastagens é variável conforme diversos fatores, sendo os principais a adubação, clima e idade da planta. Para esse cálculo, suponhamos a seguinte ração de volumosos: Silagem de milho ---------- 18 kg Capim elefante ------------- 9 kg 4º passo: Dedução da composição bromatológica dos alimentos volumosos Nutrientes contidos em 18 kg de silagem de milho e 9 kg de capim elefante, exigências totais e défice ou excesso Discriminação NDT (kg) PB (kg) Ca (g) P (g) 18 kg de silagem 3,26 0,396 18 10 9 kg de capim elefante 1,206 0,108 10 6 Total (1) 4,466 0,504 28 16 Exigências totais (2) 8,33 1,708 57 41 Défice (1-2) - 3,864 - 1,204 - 29 - 25 5º passo: Formular a ração dos alimentos concentrados corretivos do défice Como ocorre défice de proteína, torna-se necessária uma dosagem bastante alta de farelo de soja (matéria-prima com maior teor proteico). Quantidade de nutrientes fornecidos por 39 kg de milho triturado, 35 kg de farelo de soja, 25 kg de farelo de trigo e 1 kg de pedra calcária Discriminação NDT (kg) PB (kg) Ca (g) P (g) 39 kg de milho triturado 31,2 3,63 7,8 128,7 35 kg de farelo de soja 25,55 15,75 112 234,5 25 kg de farelo de trigo 15,75 4,0 35 310 1 kg de pedra calcária - - 380 - TOTAL 72,5 23,38 534,8 679,2 Agora, é necessário verificar a quantidade diária que deve ser fornecida. Para tal, é verificado primeiro a quantidade necessária para completar as exigências em energia (NDT). Na fórmula obtém-se através de uma regra de três, a quantidade de mistura que fornece 3,864 kg de NDT: 100 kg de mistura fornece 72,5 kg de NDT X kg fornecerão 3,864 kg que é o défice da ração volumosa, então: 100 ---------- 72,5 X ---------- 3,864 X = 100 x 3,864/72,5 X = 5,33 kg Resta verificar se os 5,33 kg de mistura cobrem o défice de proteína que é de -1,204. Novamente, aplicamos a regra: 100 ---------- 23,38 5,33 --------- X X = 5,33 x 23,38/100 X = 1,246, portanto, satisfaz plenamente o défice da dieta de volumosos fornecida. Deficiência em NDT, PB, Ca e P que são atendidas com 5,3 kg da mistura Discriminação NDT (kg) PB (kg) Ca (g) P (g) Deficiências 3,864 1,204 29 25 5,3 kg de mistura 3,864 1,246 29 36 Diferença 0 0,042 0 +11 Ração completa para a produção de 15 litros de leite/dia/vaca Dieta Ração (kg) Silagem de milho 18 Capim elefante 9 Mistura de concentrados 5,3 Essa mistura satisfaz plenamente os requisitos. O pequeno excesso de proteína seria usado pelo organismo como fonte energética, caso houvesse uma mistura de concentrados. Os níveis de Ca e P mostram-se dentro dos limites aceitáveis. O sal iodado poderá ser fornecido separado e à vontade, ou ser incorporado à ração dos concentrados na base de 0,5%. Formulação na prática II: Deseja-se formular 100 kg de ração balanceada com 14% de PB para novilhos em etapa final de engorda. Depois de formulada e equilibrada faz-se necessário calcular a quantidade necessária para cada animal segundo o PV. Planejamento inicial Alimentos PB (%) % disponível na fazenda Pasto 10 50 Cevada 10 45 Farinha semente de algodão 41 5 1º passo: Calcular a proteína total dos alimentos disponíveis. A – Pasto: 50 kg ---------- 100% do produto disponível X ----------- 10% de proteína X = 50 x 10/100 X = 5 kg de proteína no pasto B – Cevada: 45 ---------- 100% X ---------- 10% X = 45 x 10/100 X = 4,5 kg de proteína C – Farinha de semente de algodão: 5 ---------- 100% X ---------- 41% X = 5 x 41/100 X = 2,05 kg de proteína Somando-se a quantidade total de proteína disponível nos alimentos obtemos: 5 + 4,5 + 2,05 = 11,55 kg de proteína em 100 kg de mistura Isso significa que a mistura possui 11,55% de PB em sua composição. A % desejada é de 14% e a mistura possui 11,55%, ou seja, há um défice de 2,45%. Logo, faz-se necessário a incorporação de um alimento rico em PB, nesse caso, aumentar a quantidade de FSA e diminuir a de cevada. A % de PB da FSA é de 41% e a de cevada é de 10%, logo há uma diferença de 31%, que denominamos de fator de substituição e o transformamos em 0,31. Logo, temos o valor de substituição (0,31) e a quantidade de proteína a ser adicionada, então faz-se necessário a divisão da proteína faltante pelo valor de substituição: 2,45/0,31 = 7,9 A porcentagem a ser substituída é de 7,9%, aproximando para 8%. Logo, devemos diminuir 8% a incorporação da cevada e aumentar 8% a quantidade de FSA. Vejamos o planejamento: Revisando a fórmula inicial e incluindo os novos valores, obtemos: Alimentos Quantidade (kg) Nova quantidade (kg) Proteínas (%) Proteínas aportadas (%) Pasto 50 50 10 5,0 Cevada 45 – 8 = 37 10 3,7 FSA 5 + 8 = 13 41 5,33 TOTAL 100 100 - 14,03 Logo, achamos a porcentagem de proteína desejada na mistura que é de 14%, o que satisfaz plenamente as exigências dos novilhos em engorda a pasto com a suplementação concentrada de cevada e FSA no cocho. Conclui-se, então, que para balancear uma ração de 100 kg com 14% de PB para novilhos em engorda é necessário 50 kg de forragem com 10% de PB, 37 kg de cevada com 10% de PB e 13 kg de farinha de semente de algodão com 41% de PB. 5.2.2 Método do quadrado de Pearson É a técnica mais utilizada para cálculo de rações em função de sua simplicidade. A ração é calculada levando-se em consideração o valor relativo ou percentual de um dado nutriente, que é a proteína. Esse método estabelece as proporções entre dois alimentos, ou entre duas misturas de alimentos, de forma a obter um valor real para a proteína em relação ao teor proteico dos dois alimentos misturados. Para esse método é necessário o conhecimento prévio de alguns conceitos, tais como: Usar de preferência um alimento proteico e outro energético; O teor de proteína escolhido para a mistura deve estar compreendido entre o teor proteico dos alimentos escolhidos; Os dados à esquerda e no centro do quadrado devem estar expressos em porcentagem ou na mesma unidade para a facilitação do cálculo. Se desejarmos, por exemplo, fazer 78 kg de mistura com 14% de PB, para usarmos esse método temos que transformar os 14 kg de PB para % e o resultado será 18% (14 x 100/78); Os dados à esquerda referem-se aos alimentos e ao teor proteico dos mesmos, o dado no centro refere-se ao teor de proteína final da ração, ou seja, ao objetivo do cálculo, os dados à direita se referem as partes em que cada alimento irá compor a ração; A diferença efetuada diagonalmente deverá ser expressa em valor absoluto, isto é, subtraindo o menor valor do maior. Para elucidar melhor esse método vamos calcular exemplos. Cálculo de ração com dois alimentos 1. Deseja-se uma mistura com 18% de PB utilizando-se o fubá de milho 9% de PB e farelo de soja 45% de PB. Para solucionarmos o problema devemos realizar o seguinte: 1º desenhar um quadrado e colocar no seu centro a % de proteína desejada na mistura que é -/- 18%. 2º colocar em cada ângulo do lado esquerdo do quadrado, a % de proteína de cada alimento que irá compor a mistura. Nesse caso, será 9% de PB para o fubá de milho (FM) e 45% de PB para o farelo de soja (FS). FM 9% FS 45% 3º fazer a diferença entre os números, diagonalmente, colocando os resultados nos ângulos do lado direito, em valor real e absoluto, isto é, subtrair os maiores valores dos menores. Assim obtemos a subtração entre 45 – 18 = 27 e 18 – 9 = 9. Dessa forma: FM 9% 27 partes de FM FS 45% 9 partes de FS 4º os resultados são expressos em partes de cada alimento que temos que incluir para compor uma mistura com 18% de PB. Logo, temos que juntar as partes, ou seja, 27 partes do FS e 9 partes do FM, totalizando 36 partes totais. 5º as quantidades de cada alimento devem ser expressas em % do total. Sendo assim, se para 36 partes de mistura tem-se que incluir 27 partes de FM, então, para 100 partes teremos 75 de FM (27 x 100/36). O restante será de FS, ou seja, 25 partes (100 – 75). Pelo princípio da regra de três obtemos esses resultados. Para 100 partes ou 100 kg de mistura, teremos: 36 partes de mistura ---------- 27 partes de FM 100 partes de mistura ---------- X partes X = 100 x 27/36 X = 75 partes ou 75% de FM que, para 100 kg de mistura, corresponde a 75 kg. O restante corresponde ao FS, onde temos: 100 partes de mistura – 75 partes de FM = 25 partes ou 25% de FS que, para 100 kg de mistura, -/- corresponde a 25 kg. -/- Resumindo os resultados em um quadro, teremos: Alimento Kg PB (kg) Cálculo para achar a PB (kg) Fubá de Milho 75 6,75 Se 9% é 100 em x é 75, logo 9 x 75/100 = 6,75 Farelo de soja 25 11,25 Se 45% é 100 em x é 25, logo 45 x 25/100 = 11,25 TOTAL 100 18,0 A quantidade de FM e FS na mistura satisfaz plenamente os requisitos de 18% de PB na mistura. 2. Usando o exercício 2 do item 5.2.1 – Determinar a % em que o milho 9% PB e farinha de peixe 53% PB devem ser misturados de forma a obter uma ração de 100 kg com 18% de PB. M 9% 35 partes de M FP 53% 9 partes de FP Somando as partes de milho e farinha de peixe, obtemos: 35 + 9 = 44 partes totais. Agora calculamos a incorporação dos alimentos, mediante uma regra de três simples: A - Farinha de peixe: 100% da mistura ---------- 44 partes X -------------------- 9 partes X = 100 x 9/44 X = 20,5% de FP ou 20,5 kg. B - Milho: 100% da mistura ---------- 44 partes X -------------------- 35 partes X = 100 x 35/44 X = 79,5% ou kg de milho Ou, de outra forma: 100% – 20,5% da FP = 79,5% ou kg de milho. Verificando os resultados, vamos transformar as % PB de milho e farinha de peixe em g/kg, dessa forma vamos obter 9% PB milho é igual a 90 g PB/kg e 53% PB da farinha de peixe é igual a 530 g PB/kg, obtemos: REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRIGUETTO, J. M. et al. 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In this paper, I will assert that reflective performance produces something that is epistemically valuable. My argument depends on us stepping back from the scenario in which the dispute about internalism and externalism about knowledge and justification have developed over recent decades, in order to begin to consider certain, so far little explored, skeptical dialectic challenges. These are skeptical challenges in which individuals are challenged to evaluate and judge whether or not their beliefs are justified. As a rule, a person (...) is presented with reasons to suspect the limitations of their subjective perspective about the evidence and reasons that dispose them to believe. In dialectical challenges between epistemic peers, both recognize that they are not in a better position than their interlocutor to believe. In this context, to continue the dialogue requires a critical reflective examination of their initial beliefs (with their evidence and reasons) and, in the end, the achievement of epistemic change: the person must improve, expand, deepen, better understand, guarantee, confirm, renounce, or suspend their judgment etc. In this sense, reflection is understood as a performance, an activity in which the person examines the evidence, content and reliability of their own beliefs. This performance may lead to different results, but if someone is capable of critically reflecting on their own beliefs in skeptical-dialectic contexts, this is a positive thing, whatever the result – contrary to people who, in the face of skeptical challenges, simply decide to remain intellectually immobile, maintaining a cowardly, arrogant or dogmatic position. (shrink)
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO GADO BOVINO -/- GENERAL CHARACTERISTICS OF CATTLE BOVINE -/- CARACTERÍSTICAS GENERALES DEL GANADO BOVINO -/- 1 TAXONOMIA DOS BOVINOS -/- Consideramos, nesse primeiro tópico, a taxonomia (ordenação e classificação das espécies animais e vegetais, onde também pode-se encontrar a relação de familiaridade entre organismos distintos e/ou iguais, bem como sua evolução em diversos aspectos: físico, motor, locomoção, anatomia, etc.) dos bovinos. É levado em consideração os itens mais relevantes e mais estudados em Zootecnia, Biologia, Medicina Veterinária, etc. (...) Observe o quadro a seguir: -/- Phylum -/- Chordata/Cordados (com espinha dorsal) -/- Subphylum -/- Vertebrata/Vertebrados -/- Classe -/- Mammalia/Mamíferos (pelos na pele e glândulas mamárias desenvolvidas) -/- Subclasse -/- Theria -/- Infraclasse -/- Eutheria -/- Ordem -/- Artrioctyla/Artiodátilos (dois dedos; 3 e 4 falanges) -/- Subordem -/- Ruminantia/Ruminantes (sem incisivos superiores e quatro compartimentos) -/- Infraordem -/- Pecora -/- Família -/- Bovidae -/- Gênero -/- Bos -/- Espécie -/- Taurus -/- Subespécie -/- Taurus ou Indicus -/- 2 CARACTERÍSTICAS ANATÔMICAS, BIOLÓGICAS E ZOOTÉCNICAS -/- Apresento as principais características quanto ao regime alimentar, à anatomia estomacal que faz com que o animal seja denominado de ruminante e a dentição dos bovinos. Observe o quadro que se segue: -/- Estômago -/- Composto por quatro compartimentos, em ordem: Rúmen, Retículo, Omaso e Abomaso -/- Regime alimentício -/- Herbívoros (alimentam-se de gramíneas e forrageiras) -/- Dentição -/- Incompleta; ausência de pinças superiores e caninos -/- 3 PARÂMETROS PRODUTIVOS E REPRODUTIVOS IDEAIS -/- Na bovinocultura é comum trabalhar com parâmetros de produção e reprodução que devem ser respeitados e atingidos em uma propriedade, tanto para o produtor obtiver lucros e investir em seu plantel quanto visando à saúde e o bem-estar dos animais. Observe alguns padrões mais relevantes no quadro: -/- Lactância -/- 305 dias (10 meses, segundo a raça trabalhada) -/- Intervalo entre partos (IEP) -/- 11.5 – 12.5 meses e até 18 meses -/- Idade ao primeiro parto -/- 24 – 25 meses (raças europeias) -/- Dias abertos2 (período de serviço) -/- 50 – 150 dias -/- Serviços por concepção -/- 1 – 2 -/- % de concepção ao primeiro serviço -/- 60% -/- % de concepção ao segundo serviço -/- 80% -/- % de concepção ao terceiro serviço -/- 90% -/- % de vacas paridas por ano -/- 90% -/- Substituições -/- 18 – 30% -/- % máxima de mortalidade fetal -/- < 5% -/- % máxima de mortalidade em vacas -/- 2% -/- % de resíduos não-genéticos -/- Até 10% -/- 4 CARACTERÍSTICAS REPRODUTIVAS FISIOLÓGICAS DO MACHO (BOI) -/- Na bovinocultura, seja de corte ou leiteira, é necessário entender os animais quanto as suas principais características reprodutivas para que o produtor possa tomar as devidas providências na hora da estação de monta, no período de concepção, de gestação e pós-gestação visando uma melhor eficiência reprodutiva, bem como aos lucros provindos do rebanho. Observe o quadro abaixo: -/- Volume por ejaculação -/- 4 ml (variando entre 2 – 10 ml) -/- Número de espermatozoides -/- 4000 – 5000 milhões -/- Local da inseminação -/- Vagina da vaca -/- Tempo de chegada do sêmen ao oviduto -/- 2 – 13 minutos -/- Número de espermatozoides que chegam ao oviduto -/- 4200 - 27500 -/- Vida fértil do espermatozoide -/- 30 – 48 horas -/- Tempo da ejaculação -/- 1 segundo -/- Porcentagem ideal de motilidade -/- 75% -/- Porcentagem ideal de células normais -/- 95% -/- pH do sêmen -/- 6,7 – 6,9 (6,8 de média) -/- Idade à puberdade -/- 10 meses (podendo haver variações entre 6 – 10 meses) -/- Idade à primeira monta/uso do sêmen (inseminação artificial) -/- 18 – 24 meses -/- 5 CARACTERÍSTICAS REPRODUTIVAS FISIOLÓGICAS DA FÊMEA (VACA) -/- Se é importante atentar-se as informações acerca do sistema reprodutivo e andrológico do macho, com a fêmea esse cuidado e atenção deve ser ainda maior, uma vez que é ela que gerará o futuro do rebanho do produtor. É necessário atentar-se e dar ênfase à uma série de procedimentos pré e pós-parto. Observe o quadro a seguir: -/- Tipo de reprodução -/- Poliéstrico contínuo -/- Idade à puberdade -/- 7 – 18 meses (11 meses no gado europeu) -/- Maturidade sexual -/- 14 – 18 meses no gado europeu -/- Peso à puberdade -/- 300 kg (200 – 450 kg para a classe de grandes raças) -/- Duração do ciclo estral -/- 21 dias (18 – 24 de variação) -/- Momento da ovulação -/- 12 horas após a finalização do estro -/- Vida fértil do óvulo -/- 20 – 24 horas -/- Óvulos liberados -/- 1 – 2 (a poliovulação é possível) -/- Implantação3 do embrião -/- 40 dias -/- 6 ALTERAÇÕES OCORRIDAS DURANTE O PERÍODO DE GESTAÇÃO -/- É necessário dar ênfase à alguns aspectos relevantes na bovinocultura como a duração da gestação de uma vaca, em média, o total de crias que ela favorece ao produtor, etc. todos esses apontamentos deverão ser colocados em um documento para que se possa manter a qualidade e a boa produção e produtividade do plantel. Os aspectos no quadro abaixo são os mais primordiais para o conhecimento de leigos e até mesmo de trabalhadores da área veterinária e/ou zootécnica. Todos os dados obtidos são uma média, que foi obtida por meio de pesquisas e práticas com os animais. -/- Duração da gestação -/- 283 dias -/- Número de crias ao parto -/- 1 – 2 (sendo que 2 são em raras ocasiões) -/- Tipo de placenta -/- Epiteliocorial/Cotiledonária -/- Tempo de implantação -/- 30 – 40 dias após a cópula -/- Início do período seco4 -/- Aos 10 meses de lactação e aos 7 meses de gestação -/- Duração do período seco -/- 2 meses -/- 7 SINAIS PRÉVIOS AO PARTO -/- Antes do parto das vacas, é necessário que a atenção seja redobrada, temos que observar a anatomia exterior de certas compartições como a vagina, a mudança comportamental também deve ser observada, todos esses cuidados visam a sanidade tanto da vaca quanto do neonato. Por isso, é viável que todo e qualquer parto seja observado à distância seja pelo criador ou o trabalhador da propriedade, visando a possível ajuda no parto do animal caso o neonato passe por complicações na hora do nascimento. Um dos grandes vilões que aumentam o percentual de mortalidade de neonatos é as possíveis complicações na hora do nascimento, o animal pode ficar preso e morrer, como denomina-se de distorcia. Observe os fatores a serem levados em consideração no quadro abaixo. -/- Edema vulvar -/- Acúmulo anormal de muco na vagina -/- Distensão de ligamentos -/- O primeiro compartimento a se distender é a vagina para a facilitação da passagem do neonato -/- Edema abdominal e mamário -/- Acumulação de líquidos anormal no abdômen e no úbere -/- Gotejamento do colostro -/- 12 – 24 horas antes do parto -/- Inquietações -/- As vacas prontas pra parir ficam inquietas, hiperativas -/- Inapetência -/- As vacas cortam a alimentação por conta própria -/- Isolamento -/- As vacas que, normalmente andam em rebanho, se isolam em um determinado lugar para que possa parir -/- 8 CONSTANTES FISIOLÓGICAS -/- Essas constantes de temperatura, frequência cardíaca e respiratória além dos movimentos ruminais, servem de base para que o produtor mantenha seu rebanho sob controle veterinário e que, mediante quaisquer alterações nos dados apresentados, o produtor deverá comunicar ao médico veterinário da propriedade para que possam ser tomadas as devidas providências. Observe o quadro: -/- Temperatura -/- 37,5 – 38,5 °C (adultos) -/- 38,5 – 39,5 °C (jovens) -/- Frequência cardíaca -/- 40 – 80 batimentos/minuto (adultos) -/- 80 – 110 batimentos/minuto (jovens) -/- Frequência respiratória -/- 10 – 30 respirações/minuto (adultos) -/- 15 – 45 respirações/minuto (jovens) -/- Movimentos ruminais -/- 2 – 3 movimentos/2 minutos -/- 9 pH (POTENCIAL HIDROGENIÔNICO) DE ALGUMAS SECREÇÕES CORPORAIS -/- Fator importante para discernir os líquidos dos bovinos e dividi-los em ácidos ou básicos, isto é, se são ácidos ou alcalinos. O pH varia entre 0 – 14 e sua média é 7 (neutro), pHs acima de 7 são considerados alcalinos, porventura, pHs abaixo de 7 são considerados ácidos. Observe o quadro: -/- Leite -/- 6,5 – 7 (neutro) -/- Urina -/- 7,4 – 8,4 (alcalina) -/- Sangue -/- 7,3 – 7,5 (neutro) -/- Líquido ruminal -/- 5,5 – 7 (ácido) -/- Líquido abomasal -/- 2 – 3 (ácido) -/- Saliva -/- 7,9 – 8,5 (alcalina) -/- 10 VALORES SANGUÍNEOS NORMAIS DOS BOVINOS -/- Esses valores são utilizados como padrão principalmente para pesquisas no ramo da Ciência Animal. Todavia, são imprescindíveis para atentar-se à saúde e ao bem-estar dos animais, uma vez que, possíveis alterações anormais, ocasionam complicações futuras que, por sua vez, implicará em gastos ao produtor com assistência veterinária constante e medicamentos. Observe o padrão dos valores no quadro seus valores e, em notas de rodapé, as significações biológicas e médicas dos mesmos. -/- Hemoglobinas5 -/- 8,15 gramas/decilitro (g/dl) -/- Hematócritos6 -/- 24,5% (precisamente 24,46%) -/- Eritrócitos/hemácias/glóbulos vermelhos7 -/- 5 – 10 milhões/milímetro cúbico (mm3) -/- Reticulócitos8 -/- 0 -/- Plaquetas9 -/- 100 mm3 -/- Leucócitos/glóbulos brancos10 -/- 4000 – 12000 mm3 -/- Neutrófilos segmentados11 -/- 15 – 45% -/- Neutrófilos banda -/- 0 – 2% -/- Linfócitos12 -/- 45 – 75% -/- Monócitos13 -/- 2 – 7% -/- Eosinófilos14 -/- 2 – 20% -/- Basófilos15 -/- 0,2 -/- 11 QUÍMICA SANGUÍNEA DOS BOVINOS -/- Quantidade de micro e macronutrientes existentes no sangue, pode não parecer importante, mas esses padrões quando, porventura, esses números alterem-se implicará em patologias interiores e exteriores necessitando-se, assim, de mão de obra especializada, ou seja, um médico veterinário. Observe o quadro a seguir: -/- pH sanguíneo (venoso) -/- 7,4 (precisamente 7,38) -/- Proteínas plasmáticas -/- 6,8 g/dl -/- Cálcio (Ca) -/- 9 – 11 miligramas/decilitro (mg/dl) -/- Fósforo (P) -/- 5 – 9 mg/dl -/- Magnésio (Mg) -/- 2 – 3 mg/dl -/- Sódio (Na) -/- 132 – 245 miliequivalentes/litro (mEq/L) -/- Potássio (K) -/- 4,1 – 5,1 mEq/L -/- Glicose -/- 50 – 70 mg/dl -/- Nitrogênio (N) urético no sangue -/- 5 – 20% -/- Creatinina16 -/- 1,5 mg/dl -/- Cobre (Cu) -/- 0,7 – 1,3 partes por milhão (ppm) -/- Chumbo (Pb) -/- 0 – 0,15 ppm -/- Fibrinogênio17 -/- 300 – 800 mg/dl -/- Bilirrubina18 total -/- 0,1 – 1,6 mg/dl -/- Bilirrubina livre -/- 0 – 1 mg/dl -/- Bilirrubina conjugada -/- 0,6 mg/dl -/- Ferro (Fe) -/- 100 – 200 mg/dl -/- TGO (transaminase glutâmico oxalacética)19 -/- 100 – 50 UI -/- TGP (transaminase glutâmico pirúvica) -/- 3 – 15 UI -/- FA (fosfatase alcalina) -/- 30 – 50 UI -/- CPK (creatinofosfoquinase)20 -/- 30 – 50 UI -/- LDH (lactato desidrogenase)21 -/- 300 – 600 UI -/- GGT (gama glutamil transferase) -/- 4,9 – 26 UI -/- HCO (bicarbonato) -/- 28 mEq/L -/- Nota: Atualmente, a medicação da TGO está caindo em desuso, em seu lugar mede-se AST (aspartato aminotransferase). Da mesma forma, utiliza-se a ALT (alanina aminotransferase) no lugar da TGP. -/- 12 CONSTANTES FISIOLÓGICAS DO APARELHO DIGESTIVO -/- Esses padrões servem para que o produtor possa ter um alicerce da quantidade de água e de alimentos (feno, silagem, palhas, etc.) que o animal deverá consumir para que possa produzir de forma eficiente e gerar lucros futuros para a propriedade. Observe o quadro abaixo: -/- Consumo de alimentos à livre acesso -/- 3% do peso vivo (PV) – (feno de ótima qualidade) -/- 2,2% do PV – (silagem) -/- 1% do PV – (palhas) -/- Consumo de água -/- 10% do PV dividido em 4 períodos: -/- 3,6 – 4,3 litros de água/kg de matéria seca (MS) -/- 50 – 80 litros de água/dia (alimentos secos) -/- 24 – 40 litros de água/dia (alimentos verdes) -/- 14 – 16 % do PV (mais de 5 litros/L de leite) -/- pH ideal da água deverá estar entre 6 – 9. -/- 13 CARACTERÍSTICAS DA RUMINAÇÃO -/- Os bovinos são animais de produção peculiares, isto é, é um dos animais com uma capacidade completamente enorme para um criador, estamos falando do fato de digerir alimentos fibrosos, especialmente os volumosos, e transformá-los em carne, leite, etc. Isso ocorre porque nos bovinos, como em caprinos, ovinos, etc. há a presença do rúmen em seu aparelho estomaco-digestivo. A ruminação consiste, basicamente, na regurgitação do alimento semi-digerido, o alimento primeiramente é consumido e vai para o primeiro compartimento, o rúmen, lá às bactérias e os protozoários começam a desagregação das fibras existentes no alimento, depois o alimento volta a boca do animal em que o mesmo agrega saliva e o mastiga novamente para ir ao retículo. Observe as características peculiares da ruminação no quadro: -/- Início e regularização (1° arroto) -/- 2 – 3 semanas de idade -/- Início (depois do alimento ingerido) -/- 5 – 15 horas após a ingestão -/- Número de períodos da ruminação -/- 4 – 24 períodos/dia (segundo a quantidade da frequência cardíaca (FC) e do tamanho das partículas -/- Total de regurgitações -/- 15 – 20 -/- Volume ruminado -/- 40 – 60 kg ao dia -/- Duração por período de ruminação -/- 10 – 60 minutos cada uma -/- Número dos bolos alimentares regurgitados -/- 360 - 790 -/- Peso dos bolos alimentares ruminados -/- 80 – 120 g -/- Movimentos mastigatórios e tempo de mastigação por bolo alimentar -/- 40 – 70 movimentos e o tempo de 45 – 60 segundos -/- Tempo da ruminação -/- 7 horas (variação conforme raça: 3 – 8 horas) -/- 14 COR NORMAL DAS FEZES -/- Na bovinocultura, de corte ou leite, é sumamente imprescindível atentar-se à todos os tipos de detalhes no animal, por exemplo, se está associado ao grupo, se está alimentando-se regularmente e normalmente, se está ruminando de forma normal e, até mesmo, a cor e a consistência das fezes exoneradas. Esse fator de coloração e consistência implica na sanidade do animal. Observe o quadro elaborado, segundo quantidades de clorofila, bílis, tipo de alimentação, etc. -/- Bezerro (período de amamentação) -/- Cor amarelada para o cinza -/- Bovino adulto (ruminante) -/- Verde escuro (pastagens) -/- Amarronzado (estábulo) -/- Amarelo pardo (engorda com concentrado/grãos) -/- Consistência: pastosa -/- Odor: ligeiramente desagradável -/- 15 CARACTERÍSTICAS DAS ESTRUTURAS DIGESTIVAS/COMPARTIMENTOS -/- Nos bovinos há a presença de 4 aparelhos estomacais, sendo o último, o abomaso, o estômago verdadeiro, isto é, o estômago químico do animal, antes disso, há a presença do rúmen que é o compartimento que faz dos animais ruminantes peculiares na pecuária, o retículo e o omaso. Observe o quadro abaixo: -/- Rúmen (Pança) -/- Proporção ocupada ante os compartimentos -/- 80% do lado esquerdo da cavidade abdominal -/- Capacidade -/- 200 – 250 litros ou 135 kg de material alimentício (adultos de raças pesadas) -/- pH do líquido -/- 5,5 – 7 -/- Movimentos ruminais -/- 2 – 3 movimentos/2 min. -/- Cor normal do líquido ruminal -/- Geralmente verde acinzentado -/- Consistência -/- Ligeiramente viscosa -/- Odor -/- Aromático e pouco repulsivo -/- Proporção bacteriana -/- 1 x 109 a 1 x 1010 /ml -/- Proporção protozoária -/- 1 x 102 a 1 x 106 /ml -/- Função -/- Digestão de celulose, hemicelulose e amido. -/- Fermentação de açúcar a acetato, propionato e butirato. Oxidação e absorção de acetato, propionato e butirato. -/- Assimilação de açúcares, minerais e nitrogênio no corpo microbiano. Bem como a absorção de outros íons. Produção de gases, ácidos graxos voláteis e massa microbiana -/- Retículo (bonete, coifa, barrete, crespina) -/- Tamanho -/- 5% de todo compartimento estomacal -/- Projeção -/- 6° à 8° costelas esquerdas -/- Função -/- Regurgitação na -/- ruminação e eructação. Também participa na fermentação -/- Omaso (saltério, filho, folhoso) -/- Tamanho -/- 7% de todo o compartimento -/- Projeção -/- 7° à 9° costelas esquerdas -/- Função -/- O omaso permite a reciclagem da água e de alguns minerais como o fósforo e o sódio que retornam ao rúmen pela saliva. Serve como objeto de transição entre as distintas fermentações do rúmen e do retículo. Grande capacidade de absorção de água, sódio, fósforo e ácidos graxos residuais e voláteis -/- Abomaso (coagulador, coalheira, estômago verdadeiro) -/- Tamanho -/- 7 – 9% de todo o compartimento -/- Projeção -/- Sobre o piso da cavidade ligeiramente à direita da linha média, desde o apêndice xifoide até o umbigo -/- Função -/- Digestão ácida. Secreção de enzimas digestivas e do ácido clorídrico (HCl) que mata os microrganismos. Digere alimentos não fermentados no rúmen (algumas proteínas e lipídeos). Digestão peptídica de microrganismos. -/- REFERENCIAL TEÓRICO -/- JARDIM, V. R. Bovinocultura. 1ª ed. Campinas: Instituto Campineiro de Ensino Agrícola, 1973. -/- _____________.; JARDIM, L. M. B. F.; TORRES, A. di P. Manual de Zootecnia: raças que interessam ao Brasil. 1ª ed. São Paulo: Agronômica Ceres, 1982. -/- ROSENBERGER, G. et al. Exame clínico dos bovinos. 1ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1993. (shrink)
PREMISSA No século XIX, ocorreram transformações impulsionadas pela emergência de novas fontes energéticas (água e petróleo), por novos ramos industriais e pela alteração profunda nos processos produtivos, com a introdução de novas máquinas e equipamentos. Depois de 300 anos de exploração por parte das nações europeias, iniciou -se, principalmente nas colônias latino-americanas, um processo intenso de lutas pela independência. É no século XIX, já com a consolidação do sistema capitalista na Europa, que se encontra a herança intelectual mais próxima da (...) qual surgirá a Sociologia como ciência particular. No início desse século, as ideias do Conde de Saint-Simon (1760-1825), de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), de David Ricardo (1772-1823) e de Charles Darwin (1809-1882), entre outros, foram o elo para que Alexis de Tocqueville (1805-1859), Auguste Comte (1798-1857), Karl Marx (1818 -1883) e Herbert Spencer (1820-1903), entre outros, desenvolvessem reflexões sobre a sociedade de seu tempo. Auguste Comte e Karl Marx foram os pensadores que lançaram as bases do pensamento sociológico e de duas grandes tradições – a positivista e a socialista – que muito influenciaram o desenvolvimento da Sociologia no Brasil. 1 AUGUSTE COMTE E A TRADIÇÃO POSITIVISTA Isidore Auguste Marie François Xavier Comte nasceu em Montpellier, na França, em 19 de janeiro de 1798. Com 16 anos de idade, ingressou na Escola Politécnica de Paris, fato que teria significativa influência na orientação posterior de seu pensamento. De 1817 a 1824, foi secretário do Conde de Saint-Simon. Comte declarou que, com Saint -Simon, aprendeu muitas coisas que jamais encontraria nos livros e que, no pouco tempo em que conviveu com o conde, fez mais progressos do que faria em muitos anos, se estivesse sozinho. Toda a obra de Comte está permeada pelos acontecimentos que ocorreram após a Revolução Francesa de 1789. Ele defendeu parte dos princípios revolucionários e criticou a restauração da monarquia, preocupando-se fundamentalmente em reorganizar a sociedade, que, no seu entender, estava em ebulição e mergulhada no caos. Para Comte, a desordem e a anarquia imperavam em virtude da confusão de princípios (metafísicos e teológicos), que não se adequavam à sociedade industrial em expansão. Era, portanto, necessário superar esse estado de coisas, usando a razão como fundamento da nova sociedade. Propôs, então, a mudança da sociedade por meio da reforma intelectual plena das pessoas. De acordo com o pensador, com a modificação do pensamento humano, por meio do método científico, que ele chamava de “filosofia positiva”, haveria uma reforma das instituições. Com a proposta do estudo da sociedade por meio da análise de seus processos e estruturas, e da reforma prática das instituições, Comte criou uma nova ciência, à qual deu o nome de “física social”, passando a chamá-la posteriormente de Sociologia. A Sociologia representava, para Comte, o coroamento da evolução do conhecimento, mediante o emprego de métodos utilizados por outras ciências, que buscavam conhecer os fenômenos constantes e repetitivos da natureza: a observação, a experimentação, a comparação e a classificação. De acordo com esse pensador, a Sociologia, como as ciências naturais, deve sempre procurar a reconciliação entre os aspectos estáticos e os dinâmicos do mundo natural ou, no caso da sociedade humana, entre a ordem e o progresso. O lema da “filosofia positiva” proposta por Comte era “conhecer para prever, prever para prover”, ou seja, o conhecimento é necessário para fazer previsões e também para solucionar possíveis problemas. A influência de Comte no desenvolvimento da Sociologia foi marcante, sobretudo, na escola francesa, evidenciando-se em Émile Durkheim e seus contemporâneos e seguidores. Seu pensamento esteve presente em muitas das tentativas de criar tipologias para explicar a sociedade. Suas principais obras são: Curso de filosofia positiva (1830-1842), Discurso sobre o espírito positivo (1848), Catecismo positivista (1852) e Sistema de política positiva (1854). Para concluirmos, Comte explanava que para a superação da anarquia reinante na nova sociedade industrial, a filosofia positivista defendia a subordinação do progresso à ordem. O mesmo era contra o retorno de Luís XVIII ao trono: em sua concepção, a sociedade industrial que emergia requeria um governo fundado na razão. 2 A TRADIÇÃO SOCIALISTA: KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS Karl Heinrich Marx nasceu em Tréveris, na antiga Prússia, hoje Alemanha, em 1818 e, em 1830, ingressou no Liceu Friedrich Wilhelm, nessa mesma cidade. Anos depois, foi cursar Direito na Universidade de Bonn, transferindo-se para Berlim em seguida. Pouco a pouco, entretanto, seus interesses migraram para a Filosofia, área na qual defendeu, em 1841, a tese de doutorado A diferença da filosofia da natureza em Demócrito e Epicuro. Sua vida universitária foi marcada pelo debate político e intelectual influenciado pelo pensamento de Ludwig Feuerbach (1804-1872) e, principalmente, pelo de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770- 1831). Friedrich Engels (1820-1895) nasceu em Barmen (Renânia), na antiga Prússia, hoje Alemanha, filho mais velho de um rico industrial do ramo têxtil. Terminou sua formação secundária em 1837 e a partir de então sua formação intelectual foi por conta própria (autodidata), com alguns cursos universitários esparsos e de curta duração. Desde cedo começou a trabalhar nas empresas de seu pai e foi nessa condição que se deslocou para Bremen por três anos e depois foi enviado pelos pais a Manchester, na Inglaterra, onde trabalhou nas fábricas da família. Engels ficou impressionado com a miséria na qual viviam os trabalhadores das fábricas inglesas. Os dois, Marx e Engels, se encontraram em 1842, quando Marx passou a escrever para A Gazeta Renana, jornal da província de Colônia, do qual Engels era colaborador e mais tarde editor-chefe. O jornal, que criticava o poder prussiano, foi fechado em 1843, e Marx se viu desempregado. Ao perder o emprego, mudou-se para Paris, na França. Ali escreveu, em 1844, os Manuscritos econômico-filosóficos (só publicados em 1932) e, junto com F. Engels, o livro A sagrada família. Por sua vez, F. Engels, em 1844, decidiu voltar para a Alemanha, onde publicou, em 1845, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. Entre 1845 e 1847, Marx exilou-se em Bruxelas, na Bélgica, onde escreveu A ideologia alemã (em parceria com Friedrich Engels) e Miséria da filosofia (1847), obra na qual criticou o filósofo Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Em 1848, ainda na Bélgica, a parceria com Engels se solidificou ao escreverem juntos o livreto O Manifesto Comunista. Em 1848, Marx foi expulso da Bélgica e retornou a Colônia, na Alemanha (Prússia), sempre pensando na possibilidade de uma mudança estrutural em sua terra natal. Isso, entretanto, não aconteceu e Marx foi expulso da Alemanha em 1849, ano em que migrou para Londres, na Inglaterra, onde permaneceu até o fim da vida. Lá escreveu O 18 Brumário de Luís Bonaparte (1852), sua mais importante obra de reflexão sobre a vida política europeia do século XIX, desenvolveu pesquisas e concluiu seu maior trabalho: O capital: crítica da economia política. O primeiro volume dessa obra foi publicado em 1867; os outros três, em 1885, 1894 e 1905, após a morte de Marx, revisados por F. Engels. 2.1 O contexto histórico e a obra de Marx e Engels Para situar a obra de Marx e Engels, é necessário conhecer um pouco do que acontecia em meados do século XIX. Com as transformações que ocorriam no mundo ocidental, principalmente na esfera da produção industrial, houve um crescimento expressivo no número de trabalhadores industriais urbanos, com uma consequência evidente: precariedade da vida dos operários nas cidades. As condições de trabalho no interior das fábricas eram péssimas. Os empregados eram superexplorados, alimentavam-se mal e trabalhavam em ambientes insalubres. Para enfrentar essa situação e tentar modificá-la, os trabalhadores passaram a se organizar em associações e sindicatos e a promover movimentos de reivindicação. Desenvolveu-se, então, uma discussão das condições sociais, políticas e econômicas para se definirem as possibilidades de intervenção nessa realidade. Desde o início do século XIX, muitos pensadores discutiram essas questões, nas perspectivas socialista e anarquista. Na Inglaterra podem ser citados, entre outros: William Godwin (1756-1836), Thomas Spence (1750-1814), Thomas Paine (1737-1809), Robert Owen (1771-1858) e Thomas Hodgkin (1787-1866). Na França, destacaram-se Étienne Cabet (1788- 1856), Flora Tristan (1803-1844), Charles Fourier (1772-1837) e Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Marx e Engels levaram em conta esses pensadores, debatendo com alguns contemporâneos e criticando-os. Além disso, incorporaram a tradição da economia clássica inglesa, presente principalmente nas obras de Adam Smith e de David Ricardo. Pode-se dizer, portanto, que Marx e Engels desenvolveram seu trabalho com base na análise crítica da economia política inglesa, do socialismo utópico francês e da filosofia alemã. Esses dois autores não buscavam definir uma ciência específica para estudar a sociedade (como a Sociologia, para Auguste Comte) ou situar seu trabalho em um campo científico particular. Em alguns escritos, Marx afirmou que a História seria a ciência que mais se aproximava de suas preocupações, por abarcar as múltiplas dimensões da sociedade, a qual deveria ser analisada na totalidade, não havendo uma separação rígida entre os aspectos sociais, econômicos, políticos, ideológicos, religiosos, culturais etc. O objetivo de Marx e Engels era estudar criticamente a sociedade capitalista com base em seus princípios constitutivos e em seu desenvolvimento, visando dotar a classe trabalhadora de uma análise política da sociedade de seu tempo. Assim, a tradição socialista nascida da luta dos trabalhadores, muitos anos antes e em situações diferentes, tem como expressão intelectual o pensamento de Karl Marx e Friedrich Engels. Para entender as concepções fundamentais de Marx e Engels é necessário fazer a conexão entre as lutas da classe trabalhadora, suas aspirações e as ideias revolucionárias que estavam presentes no século XIX na Europa. Para eles, o conhecimento científico da realidade só tem sentido quando visa à transformação dessa mesma realidade. A separação entre teoria e prática não é discutida, pois a “verdade histórica” não é algo abstrato e que se define teoricamente; sua verificação está na prática. Apesar de haver algumas diferenças em seus escritos, os elementos essenciais do pensamento de Marx e Engels podem ser assim sintetizados: • historicidade das ações humanas – crítica ao idealismo alemão; • divisão social do trabalho e o surgimento das classes sociais – a luta de classes; • o fetichismo da mercadoria e o processo de alienação; • crítica à economia política e ao capitalismo; • transformação social e revolução; • utopia – sociedade comunista. A obra desses dois autores é muito vasta e não ficou vinculada estritamente aos movimentos sociais dos trabalhadores. Pouco a pouco foi introduzida nas universidades como parte do estudo em diferentes áreas do conhecimento. Estudiosos de Filosofia, Sociologia, Ciência Política, Economia, História e Geografia, entre outras áreas, foram influenciados por ela. Na Sociologia, como afirma Irving M. Zeitlin, no livro Ideología y teoría sociológica, tanto Max Weber quanto Émile Durkheim fizeram, em suas obras, um debate com as ideias de Karl Marx. Pelas análises da sociedade capitalista de seu tempo e a repercussão que tiveram em todo o mundo, principalmente no século XX, nos movimentos sociais e nas universidades, Marx e Engels são considerados autores clássicos da Sociologia. No campo dessa disciplina, porém, o pensamento deles ficou um pouco restrito, pois perdeu aquela relação entre teoria e prática (práxis), ou seja, entre a análise crítica e a prática revolucionária. Essa relação esteve presente, por exemplo, na vida e na obra dos russos Vladimir Ilitch Ulianov, conhecido como Lênin (1870-1924), e Leon D. Bronstein, conhecido como Trotsky (1879-1940), da alemã Rosa Luxemburgo (1871-1919) e do italiano Antonio Gramsci (1891- 1937), que tiveram significativa influência no movimento operário do século XX. Com base no trabalho de Marx e Engels, muitos autores desenvolveram estudos acadêmicos em vários campos do conhecimento. Podemos citar, por exemplo, Georg Lukács (1885-1971), Theodor Adorno (1903-1969), Walter Benjamin (1892-1940), Henri Lefebvre (1901-1991), Lucien Goldmanm (1913 -1970), Louis Althusser (1918 -1990), Nikos Poulantzas (1936-1979), Edward P. Thompson (1924-1993) e Eric Hobsbawm (1917 -2012). O pensamento de Marx e Engels continua, assim, presente em todo o mundo, com múltiplas tendências e variações, sempre gerando controvérsias. REFERENCIAL TEÓRICO GEMKOW, H.; PSUA, I. M. L. Marx e Engels: Vida e Obra. São Paulo: Alfa e Ômega, 1984. 232 pp. GIANOTTI, J. A. Comte. São Paulo: Abril Cultural, 1978. 318 pp. (Col. Os Pensadores) KONDER, L. Marx: vida e obra. 7ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007. 154 pp. (Col. Vida e Obra). (shrink)
O ensino de filosofia seguiu uma rota tortuosa desde a colônia até os tempos atuais. O breve histórico desse percurso tem o objetivo de reafirmar a necessidade dessa disciplina no currículo escolar, sobretudo porque sempre há aqueles que a consideram de pouca importância. No entanto, em um mundo cada vez mais pragmático, a formação exclusivamente técnica de nossos jovens dificulta o processo de conscientização crítica, além de desprezar a herança de uma sabedoria milenar. Os primeiros tempos No Brasil, desde o (...) século XVI, o ensino de filosofia fazia parte do chamado curso de artes oferecido pelos jesuítas aos filhos de colonos que concluíam o primeiro nível de letras humanas. É bem verdade que apenas alguns colégios dispunham desse curso, voltado exclusivamente para a elite colonial portuguesa. A base do ensino de filosofia era a tradição escolástica, e, mesmo durante os séculos seguintes, não houve interesse em abordar as conquistas das ciências modernas, já vigentes desde o século XVII, na perspectiva de Francis Bacon e das descobertas de Galileu Galilei. Do mesmo modo, não eram ensinadas as teorias de René Descartes e John Locke. Inspirado nos ideais da Contrarreforma, o ensino jesuítico reafirmava a autoridade da Igreja e dos clássicos, com o controle sobre as informações a que os alunos teriam acesso. No século XVIII, os fundamentos aristotélico-tomistas perduraram, com raras exceções, apesar de o marquês de Pombal ter expulsado os jesuítas. O próprio Pombal permitiu a divulgação de algumas dessas obras "esclarecidas", mas cuidou de elencar uma lista das proibidas. Contrariando o controle, as novas ideias circulavam no Brasil por meio de estudantes formados pela Universidade de Coimbra e também pela venda clandestina de panfletos e cópias manuscritas. Desse modo, nas aulas régias, instituídas por Pombal para substituir as escolas dos jesuítas, no geral foi mantida a educação elitista, livresca, desfocada da realidade brasileira durante o império e a república. Apesar do controle, havia exceções, nas poucas vezes em que intelectuais, professores e conhecedores de bibliografia atualizada ensinavam disciplinas como ciências modernas, filosofia e matemática. Algumas congregações religiosas, como a dos franciscanos, também se interessavam pelas contribuições científicas e filosóficas de seu tempo. Ensino de filosofia: entre facultativa e obrigatória A partir do século XIX, predominou um vaivém entre a filosofia como disciplina obrigatória ou facultativa. Com a criação de cursos jurídicos no Brasil, na década de 1820 - em São Paulo e Recife -, a filosofia tornou-se disciplina obrigatória do ensino médio, como pré- requisito para o ingresso ao curso superior, reforçando o caráter propedêutico daquele curso. Em 1915, uma reforma de ensino tornou a filosofia disciplina facultativa, mas o ministro Francisco Campos tentou reverter esse quadro em 1932, tornando-a novamente obrigatória. Conhecido pela atuação no movimento da Escola Nova, Campos aliou seus esforços aos de figuras importantes da pedagogia brasileira, como o sociólogo Fernando de Azevedo e o filósofo e educador Anísio Teixeira. A tendência escolanovista era renovadora e se fazia necessária diante da situação econômica do Brasil. Com o início da industrialização, surgia a necessidade de melhorar a escolarização, sobretudo para os segmentos urbanos. Francisco Campos introduziu as disciplinas de lógica, sociologia e história da filosofia no currículo escolar. Com a Reforma Capanema, em 19142, o ensino secundário dividiu-se em ginasial e colegial. Este último foi subdividido em científico, com ênfase no estudo de ciências, e clássico, que privilegiava a formação em humanidades. Nesse contexto, a filosofia se constituiu como disciplina obrigatória em um dos três anos do científico e em dois anos do curso clássico, com proposta de programa bastante extenso. No entanto, uma sequência de portarias reduziu gradativamente o número de horas-aula da disciplina, por fim, restrita ao último ano do colegial. Em 1961, foi promulgada a nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDBJ, a Lei n. 4.024, ocasião em que o ensino de filosofia perdeu a obrigatoriedade. Período da ditadura militar Durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985), as aulas de filosofia foram extintas pela Lei n. 5.692, de 1971. Essa lei reformou o então chamado ensino de 1º e 2º graus e introduziu o ensino profissionalizante, de acordo com a tendência tecnicista proposta pelos acordos entre militares e tecnocratas. Um dos objetivos era adequar a educação às exigências da sociedade industrial e tecnológica, com economia de tempo, esforços e custos. A educação tecnicista encontrava-se imbuída dos ideais de racionalidade, organização, objetividade, eficiência e produtividade, como se fosse uma empresa: esperava-se que, ao terminar cada um dos níveis, o aluno estivesse capacitado para ingressar no mercado como força de trabalho, caso necessário. Para implantar o projeto de educação proposto, o governo militar não revogou a LDB de 1961, mas introduziu alterações e fez atualizações. Enquanto a aprovação da LDB resultara de amplo debate na sociedade civil, o governo autoritário regulamentou as leis do ensino universitário (Lei n. 5.540/1968) e do ensino de 1º e 2º graus (Lei n. 5.692/1971) de maneira impositiva. Diversos acordos, conhecidos como MEC-Usaid (Ministério da Educação e Cultura e United States Agency for International Development), ofereceram assistência técnica e cooperação financeira para implantar a reforma. A habilitação profissional constituiu-se em um emaranhado de "ofertas" que chegavam a 130 habilitações profissionais distribuídas conforme os cursos e as regiões do país. Algumas disciplinas desapareceram, como a de filosofia, e outras foram aglutinadas. Por sua vez, a inclusão de Moral e Cívica no primeiro nível e de Organização Social e Política no segundo exerceu a clara intenção de doutrinamento político. Há controvérsias em torno da extinção da filosofia do currículo escolar. Para alguns, a extinção revelava a intenção explícita dos governos militares de evitarem o desenvolvimento do pensamento crítico. Outros analisam de modo diferente, alegando que, com raríssimas exceções, o ensino da filosofia reduzia-se à história da filosofia, com ênfase na memorização, não representando, portanto, nenhuma ameaça ao regime de exceção, por desempenhar papel submisso e nada subversivo. Além disso, de acordo com o viés tecnicista da reforma, havia necessidade de mais espaço para incluir disciplinas voltadas para a habilitação profissional. Já nas universidades, era possível notar o crescente desprestígio da filosofia, tendo ocorrido perseguição a professores, muitos deles exilados. Todavia, o propósito de formar profissionais, conforme propunha a nova lei, não se concretizou. A escola pública se fragilizou ainda mais, enquanto algumas boas escolas da rede particular encontraram meios de contornar a lei e oferecer um ensino de qualidade com os mesmos conteúdos que visavam desenvolver o espírito crítico e, portanto, a capacidade de seus alunos pensarem por si mesmos. Em 1982, no clima da abertura democrática, a Lei n. 7.01-114 permitiu a reinserção da filosofia no currículo como optativa, a critério do estabelecimento de ensino. Nada foi conseguido sem esforço, mas com trabalho intenso e pressão da sociedade civil. Associações especialmente criadas para esse fim aglutinaram professores de cursos secundários e superiores para promoverem encontros, movimentos de protesto e contatos com autoridades governamentais, no esforço conjunto para alcançar aquele objetivo. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n. 9.394/1996 Após a aprovação da Constituição brasileira de 1988, restava elaborar a lei complementar para tratar das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A primeira LDB, de 1961, levara muito tempo para ser aprovada e ofereceu no final um texto já envelhecido. Devido a esse fato, havia interesse em acelerar a regulamentação da nova LDB, o que ocorreu em dezembro de 1996, com a publicação da Lei n. 9.394. O primeiro projeto da nova LDB baseou-se em amplo debate, não só na Câmara, mas também na sociedade civil, além de várias entidades sindicais, científicas, estudantis e segmentos organizados da educação. O projeto original exigiu do relator Jorge Hage importante trabalho de finalização, já que a nova lei não resultaria de exclusiva iniciativa do Executivo, e sim do debate democrático da comunidade educacional. No entanto, com apoio do governo e do ministro da Educação, o senador Darcy Ribeiro apresentou outro projeto que começara a ser discutido paralelamente e que terminou por ser aprovado. Como ficou a situação do ensino de filosofia? Apesar do movimento consistente que continuava defendendo o retorno da filosofia ao ensino médio, foi grande a decepção. Vejamos por quê. Ao estabelecer as finalidades da educação básica e as diretrizes dos conteúdos curriculares, essa lei destacava a importância da formação para o exercício da cidadania, a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos e de respeito ao bem comum e à ordem democrática. Foi recomendado também o aprimoramento do educando como pessoa humana, por meio de formação ética e desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico. Conforme a LDB sob Lei 9.394/98: Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes: I – a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática; II – consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento; III – orientação para o trabalho; IV – promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não- formais. Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades: I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. Por fim, ficou claro no artigo 36, parágrafo 1º, inciso III (revogado pela Lei n. 11.684, de 2008), que os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação deveriam ser organizados de tal maneira que ao final do ensino médio o educando demonstrasse "domínio dos conhecimentos de filosofia e de sociologia necessários ao exercício da cidadania". Embora a educação para a cidadania constituísse um objetivo visado por qualquer disciplina, com mais razão o professor de filosofia teria condições de abordá-la explicitamente, não só por tomá-la como um de seus conteúdos, mas principalmente pelo seu caráter problematizador e argumentativo, próprio da filosofia. Portanto, seria válido supor que o artigo 36 definisse a reinserção da filosofia no currículo, ministrada por profissional formado na área, o que de fato não se concretizou, e o ensino de filosofia permaneceu como não obrigatório. Posteriormente, conforme a Resolução CEB n. 3/1998, "as propostas pedagógicas das escolas deverão assegurar o tratamento interdisciplinar e contextualizado para os conhecimentos de filosofia e de sociologia necessários ao exercício da cidadania" (artigo 10, parágrafo 2º, alínea b]. Ou seja, professores de outras disciplinas seriam responsáveis por esses "temas transversais", orientação que prevaleceu nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Um pouco antes, em 1997, dando continuidade a anseios de educadores, o deputado federal Padre Roque Zimmermann apresentara projeto de lei para tornar obrigatório o ensino de filosofia e sociologia no currículo do ensino médio. Após sua aprovação no Senado, em 2001, o projeto foi vetado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Finalmente, em 2008, o artigo 36 da LDB sofreu alteração, tornando obrigatório o ensino de filosofia e de sociologia no currículo do ensino médio, por meio da Lei n. 11.684/2008. Na sequência da aprovação, continua em andamento a implantação desse projeto de ensino. Esperamos que o espaço conquistado não venha a sofrer mais tarde nova retração. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, H. P. Filosofando: Introdução à Filosofia. 6ª ed. São Paulo: Moderna, 2016. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Ciências humanas e suas tecnologias. In: Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação; Secretaria de Educação Básica, 2006. ______________________________________. LDB - Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996. Disponível em: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Biblioteca do Senado. Acesso em: 11 Jun. 2019. ______________________________________. Parâmetros Curriculares Nacionais. Ensino Médio: Bases Legais. Brasília: MEC, 1999. ______________________________________. Resolução CEB n° 3 de 1998. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: MEC, 1998. Disponível em: Resolução CEB n° 3 de 1998. Acesso em: 11 Jun. 2019. KOHAN, W. O. (Org.). Políticas do ensino de filosofia. Rio de Janeiro: DP6A, 2014. (shrink)
Antes de entrar cuidadosamente no estudo de cada filósofo, em suas respectivas ordens cronológicas, é necessário dar um panorama geral sobre eles, permitindo, de relance, a localização deles em tempos históricos e a associação de seus nomes com sua teoria ou tema central. l. OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS - No sétimo século antes de Jesus Cristo, nasce o primeiro filósofo grego: Tales de Mileto2 . Ele e os seguintes filósofos jônicos (Anaximandro: Ἀναξίμανδρος: 3 610-546 a.C.) e Anaxímenes: (Άναξιμένης: 586-524 a.C.) tentaram (...) expressar/elucidar o que é a arché, ou constitutivo fundamental do Universo. 4 Também sobressaem as teorias de Pitágoras (Ὁ Πυθαγόρας: 570 a.C.- 495 a.C.), completas de misticismo e Matemática; a de Heráclito (Ἡράκλειτος ὁ Ἐφέσιος: 540-470 a.C.), o filósofo do devir e o de seu oponente, Parmênides (Παρμενίδης: 530-460 a.C.), que elucida a primeira teoria do ser, e para qual é alcunhado como o iniciador da Metafísica. Anaxágoras (Ἀναξαγόρας: 500 a.C.- 428 a.C.) esboça uma teoria sobre o Nous, o espírito divino. Por outro lado, Demócrito (Δημόκριτος: Grécia: 460-370 a.C.) e Empédocles (Ἐμπεδοκλῆς: 490 a.C.-430 a.C.) insistem no materialismo. Em contrapartida, os sofistas (Parmênides, Cálicles (Καλλικλῆς: personagem platônico cuja existência é duvidosa) e Górgias (Γοργίας: 485 a.C.-380 a.C.)) gozam das suas aptidões à dialética, e colocam o relativismo como uma posição filosófica. Sócrates será o inimigo mais temível dessa posição. Este é o começo do movimento filosófico de Atenas, que culmina nos séculos quinto e quarto, tal qual, posteriormente, veremos. 2. O APOGEU GREGO – Sócrates (Σωκράτης: 469 a.C.-399 a.C.), Platão (Πλάτων: 428/427- 348/347 a.C.) e Aristóteles (Ἀριστοτέλης: 384 a.C.-322 a.C.) formam o triunvirato dos grandes filósofos gregos. O primeiro (Sócrates), com seu método "maiêutico" e sua teoria do conceito; o segundo (Platão), com sua teoria das ideias e seu estilo literário (dialogista); e o terceiro (Aristóteles), com a estruturação dos principais ramos filosóficos, como a Lógica, a Metafísica, a Ética, a Psicologia racional e a Política; todos eles elevaram a Filosofia para um posto de primeira ordem. Doravante, todos os filósofos tornam-se credores das contribuições desses gênios. Em certos autores, é clara a influência de Platão ou de Aristóteles. Sendo que, ambos os filósofos, tiveram influência absoluta de Sócrates, uma vez que Platão fora seu discípulo, e Aristóteles discípulo de Platão. A Idade Média, por exemplo, foi toda ela, em sua gênese e desenvolvimento, alicerçada no pensamento e nas ideias platônicas; tal era histórica é caracterizada pela luta em favor de um ou de outro autor; o platonismo tomou precedência nos primeiros séculos do cristianismo; somente após o décimo século Aristóteles foi redescoberto. 3. A FILOSOFIA CRISTÃ MEDIEVAL - Santo Agostinho (354 a.C.-430 a.C.) se destaca, no quinto século, com sua teoria da iluminação e a aplicação da teoria platônica ao Cristianismo. No século XIII, São Tomás de Aquino (1225-1274), sintetiza Aristóteles com o Cristianismo. Os dois autores formam o núcleo da filosofia cristã em seus respectivos séculos. A escolástica teve seu tempo de decadência. Se mencionam, principalmente, dois autores: João Duns Escoto (1266-1308) e Guilherme de Ockham (1285-1347). O primeiro é o "Doutor Sutil ", e o segundo cai em um fideísmo e um nominalismo, para todos os conceitos criticáveis. Em uma segunda parte, tentaremos explicar os respectivos pensamentos dos autores mencionados, e outros que pertencem ao mesmo tempo, antigos e medievais. Naquela época, a Filosofia era puramente realista, aplicada ao mundo e ao homem. Somente na Idade Moderna, a Filosofia assumirá o problema do conhecimento como a base e o começo de todo filosofar. 4. A FILOSOFIA RACIONALISTA (MODERNA) - Na Idade Moderna, sobressai o racionalismo de Descartes (1596-1650) prolongado, então, com Malebranche (1638-1715) (ocasionalismo), Espinosa (1632 -1677) (panteísmo) e Leibniz (1646-1716) (teoria das mônadas). Estamos nos séculos XVII e XVIII. A atenção será focada nas disputas filosóficas da corrente empirista contra a racionalista. 5. A FILOSOFIA EMPIRISTA – O empirismo é florescido, principalmente, na Inglaterra. Francis Bacon (1561-1626), primeiro, e depois Locke (1632-1704) com sua rejeição de ideias inatas, Berkeley (1685-1753) com postura e ideias paradoxais, também idealistas e Hume (1711-1776), com suas famosas críticas contra o princípio da causalidade e o conceito de substância, são os principais autores. 6. KANT E OS IDEALISTAS ALEMÃES - Como a tentativa de sintetizar o racionalismo e empirismo, está a teoria de Kant (1724-1804), no século XVIII. Para o seu gênio seguido pelos três idealistas alemães mais importantes: Fichte (1762-1814) (idealismo subjetivo), Schelling (1775-1854) (idealismo objetivo) e Hegel (1770-1831) (idealismo absoluto). Esses Autores representam o ápice da especulação filosófica. A análise, a profundidade, a complexidade da expressão e o espírito sistemático são as características do gênio alemão idealista. 7. OS FILÓSOFOS DO SÉCULO XIX - Antes de tudo, é necessário mencionar, no século dezenove, aos dois grandes críticos de Hegel, que são Kierkegaard (1813-1855) (precursor do existencialismo) e Marx (1818-1883) (com seu materialismo dialético). O próximo é outro casal: Nietzsche (1844-1900) (teoria do Super-homem) e Schopenhauer (1788-1860) (com seu absoluto pessimismo). Comte (1798-1857) com sua doutrina positivista, completará o quadro desses filósofos. Numa outra oportunidade, vamos desmembrar sobre o pensamento e principais ideias acerca desses autores. 8. OS FILÓSOFOS DO SÉCULO XX - Antes de tudo, há um autor que iluminou a filosofia do século XX: Edmund Husserl (1859-1938), fundador do método fenomenológico. Em seguida, existem dois fluxos que são derivados diretamente de Husserl, a saber, o existencialismo e a axiologia. Dentro da corrente axiológica, estudaremos Scheler (1874-2928). Por outro lado, o existencialismo tem quatro autores principais; dois são alemães: Heidegger (1889-1976) e Jaspers (1883-1969); e os demais são franceses: Sartre (1905-1980) e Marcel (1889-1973). Heidegger insiste em que seu tema tratado em sua filosofia não é a unicidade do homem, mas o ser em geral. Jaspers é famoso por seu conceito de transcendência (Deus). Sartre é um antiteísta sincero, e seu existencialismo é definido como um pensamento que assume todas as consequências da negação de Deus. Em contraste, Gabriel Marcel é um filósofo Católico, que conseguiu uma análise profunda das situações humanas, que aparecem em íntima concordância com as verdades cristãs. Vamos terminar com Russell (1872-1970), autor básico do positivismo lógico. Cronologia de filósofos e suas escolas até nossos dias ➢ Filosofia Antiga - Escola naturalista da Jônia: Tales, Anaximandro e Anaxímenes; - Escola matemática da Itália: Pitágoras e os pitagóricos; - Escola idealista de Eléia: Xenófanes (570-475 a.C.), Parmênides, Zenão (490/85-420 a.C.) e Meliso (h.443); - Escola empirista: Heráclito, Empédocles e Anaxágoras; - Escola atomista de Abdera: Leucipo (h.437) e Demócrito; - Escolas de Atenas: - Sofistas: Protágoras (480-410), Górgias (484-375?); Sócrates, Platão e Aristóteles; - Pirronismo: Pirro (h.365-h.275); - Estoicismo: Zenão de Cítio (359/33-262) e Crisipo (281/77-208); - Epicurismo: Epicuro (341-270); - Nova Academia: Arcesilau (315-241) e Carnéades (214-129); Romanos: Sêneca (4 a.C.-65 d.C.), Marco Aurélio (121-180) e Cícero (106-43). - Escola greco-judia: Fílon de Alexandria (25 a.C.-50 d.C.); - Neoplatonismo: Plotino (204/5-270), Porfirio (h.233-304), Jâmblico (h.250-330) e Proclo (h.411-485). ➢ Filosofia patrística - Apologistas: São Justino (100/10-165), Ireneu de Lyon (h.140-h.l 77) e Atenágoras (fines s. II); - Alexandrinos: São Clemente (h.145/50-215) e Orígenes (h.185-255); - Africanos: Tertuliano (h.160-230), Arnóbio (h.260-h.327) e Lactâncio (nascido h. 250); - Gregos: São Basílio (h.330-379), São Gregório de Nazianzo (330-390), São Gregório de Níssa (330-390) e Pseudo-Dionísio (h.500); - Latinos: São Hilário (h.315-367), Santo Ambrósio (333-397) e Santo Agostinho; - Outros: Claudiano (+h.473), Boécio (480-524), São Isidoro (h.560-633) e Beda (672/3-735). ➢ Filosofia Medieval/Escolástica - Judeus: Isaac Israeli (+h.940), Salomão Ibn Gabirol (h.l020-p.l058) e Maimônides (1135- 1204); - Árabes: Alquindi (h. 796-874), Al-Farabi (870-950), Avicena (980-1037), Algazali (1058- 1111) e Averróis (1126-1198); - Escola palatina: Alcuíno de Iorque (730/5-804), Rábano Mauro (h.784-856), Escoto Erígena (h.810-h.870) e Papa Silvestre II (+1003); - Dialéticos: Santo Anselmo (1033/4-1109) e Pedro Abelardo (1079-1142); - Tradutores: Domingo Gundisalvo (meados s. XII), Gerardo de Cremona (h. 1114-1187); - Enciclopedistas: Teodorico de Chartres (+1155), Hugo de São Vitor (+1141) e Vicente de Beauvais (+1264); - Universidades: Guilherme de Auvergne (1180- 1249) e Sigerio de Brabante (+h.l284); - Dominicanos: São Alberto Magno (1206-1280) e Santo Tomás de Aquino; - Franciscanos: Alexandre de Hales (1170/80-1245), São Boaventura (1217-1274), Roger Bacon (h.1210/14-1292), João Duns Escoto, Raimundo Lulio (1235-1315) e Guilherme de Ockham (h.1285-1349). ➢ Filosofia Moderna - Humanistas Renascentistas: Ficino (1433-1499), Erasmo (1467-1536), Maquiavel (1469- 1527), Thomas More (1480-1535), Juan Luis Vives (1492-1540) e Giordano Bruno (1548- 1600); - Racionalismo: Descartes, Malebranche, Espinosa e Leibniz; - Empiristas: Francis Bacon, Thomas Hobbes (1588-1679), Locke, Berkeley e Hume; - Escola escocesa: Thomas Reid (1710-1796); Iluministas: Voltaire (1694-1778), Condillac (1715-1757), Diderot (1713-1784) e J. J. Rousseau (1712-1778). - Idealismo transcendental: Kant; - Idealismo subjetivo: Fichte; - Idealismo objetivo: Schelling; - Idealismo absoluto: Hegel; - Pessimismo: Schopenhauer; - Ecletismo: Cousin (1792-1867); - Positivismo: A. Comte, J. S. Mill (1806-1873) e H. Spencer (1820-1900); - Socialismo: H. Saint-Simon (1760-1825), Ch. Fourier (1772-1837) e K. Marx; - Vitalismo: Nietzsche e W. Dilthey (1833-1912). ➢ Filosofia Contemporânea - Intucionismo: H. Bergson (1859-1941); - Pragmatismo: Ch. S. Peirce (1839-1914), W. James (1842-1910) e J. Dewey (1859-1952); - Fenomenologia: Husserl, Scheler, N. Hartmann (1882-1950) e M. Merleau-Ponty (1908- 1961); - Existencialismo: Jaspers, Heidegger, Marcel e Sartre; - Atomismo lógico: B. Russell (1872-1970) e L. Wittgenstein (1889-1951); - Positivismo lógico: M. Schlick (1882-1936), R. Carnap (1891-1970 ) e A. J. Ayer (1910- 1990). - Filosofia analítica: J. L. Austin (1911-1960), G. Ryle (1900-1976), W.V.O. Quine (1908- 2000), P. F. Strawson (1919-2003) e H. Putnam (1926-); - Hermenêutica: H. G. Gadamer (1900-2002), P. Ricoeur (1913-2007) e J. Habermas (1929-). - Estruturalismo e pós-estruturalismo: F. de Saussure (1857-1913), C. Lévi-Strauss (1908- 2009) e M. Foucault (1926-1984). - Filosofia pós-moderna: J. F. Lyotard (1924-1999), G. Deleuze (1925-1995), J. Derrida (1930- 2004), R. Rorty (1931-2007) e G. Vattimo (1936-). - Comunitaristas: A. Maclntyre (1929-), Ch. Taylor (1931-). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHAUÍ, M. Iniciação à Filosofia. Vol. Único. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2013. 460 p. SANTOS, R. dos. Filosofia: Uma breve introdução. 1ª ed. Pelotas: Dissertativo Incipiens, 2014. 108 p. . Rua do Riachuelo, 303, Centro, Rio de Janeiro, RJ Casa Histórica de Osório CEP: 20230-011 E-mail: [email protected] (shrink)
Se vivemos juntos apenas porque temos direitos e para termos mais direitos, então não temos nenhum motivo para imaginar uma salvação comum: a salvação não está no comum, mas no próprio. Por oposição ao Direito (em inglês, Law) que, impondo-se a todos de cima para baixo, normatiza objetivamente as relações entre cidadãos, há agora o império crescente dos direitos subjetivos (em inglês, rights) reivindicações particulares que tentam impor-se a todos de baixo para cima. Esses direitos costumam ser descritos como sendo (...) de dois tipos ou duas gerações. De um lado, há, ou houve em um primeiro momento depois da Revolução Francesa, o reconhecimento dos direitos-liberdades (direitos de fazer alguma coisa: ir e vir, associar-se, reunir-se, manifestar opiniões, praticar uma religião etc.); de outro lado, há, ou houve em um segundo momento depois da Segunda Guerra Mundial, os direitos sociais, os chamados direitos-créditos, os direitos ao beneficio de certa prestação da parte de um poder público (direitos a alguma coisa: educação, saúde, trabalho etc.). Eles se fundamentam em dois sentidos opostos da ideia de direitos. Os direitos-liberdades definem um território de igual independência de todos e cada um com relação às ingerências do poder público; os direitos-créditos definem um horizonte de expectativa de todos e cada um com relação às ações desse mesmo poder público. De um lado, impedem o Estado de agir em certas esferas de ação dos indivíduos; de outro, obrigam o Estado a agir em certas esferas a favor dos indivíduos. No entanto, do ponto de vista da perda do ideal de uma salvação comum, estes e aqueles vão no mesmo sentido. Tornamo-nos duplamente liberais. Liberais porque apreciamos viver em uma sociedade de liberdade igual, assegurando por direitos negativos a esfera de autonomia de cada um de nós. Liberais porque, gostando ou não, vivemos em uma sociedade de mercado e esperamos ações do Estado que corrijam os efeitos das desigualdades econômica e social gerados por esse sistema. Queremos um Estado que nos faça menos desiguais e ao mesmo tempo garanta nossa independência dele e dos outros. A demanda preocupada de menos injustiça substituiu mais uma vez a vontade do Bem. Em todos os lugares do mundo onde essas duas condições da autonomia individual (liberdades fundamentais e prestações sociais) não são satisfeitas, os povos aspiram a elas. Em muitos casos, a Cidade ideal desses povos é semelhante à nossa pobre Cidade real, que, no entanto, não nos satisfaz. Não tentamos mais nos realizar por e na comunidade política e não aspiramos mais a nos fundir nela. O que esperamos do Estado é que nos permita viver sem ele. É pelo fato de não acreditarmos mais no político que nossos sonhos tomam a forma lúcida e prosaica de demanda sem fim de novos direitos individuais. E pelo fato de não acreditarmos mais na Cidade justa, na Cidade e na Justiça, que multiplicamos os focos de reivindicação. Queremos não só mais direitos de (fazer) e mais direitos a (serviços), como queremos esses direitos a outros seres além de nós. Assim, há dois movimentos paralelos: de um lado, uma multiplicação de tipos de direitos (liberdades, mas sobretudo créditos); de outro, uma proliferação de detentores de direitos; em última instância, todo grupo de interesses real ou supostamente real é considerado um detentor de direitos. Em vez de ser outro nome para a igualdade de todos — o que eram originalmente —, os direitos se tornaram sinônimo de interesses particulares. Contra as desigualdades entre homens e mulheres, reivindicamos paradoxalmente os "direitos das mulheres"; contra os maus-tratos e a carência de educação, apelamos aos "direitos da criança"; contra as discriminações, defendemos os "direitos dos homossexuais"; contra a medicina invasiva, exigimos respeito aos "direitos dos doentes"; contra as falhas dos transportes públicos, reivindicamos o reconhecimento dos "direitos dos usuários" etc. O "direito ao trabalho" é invocado tanto pelo desempregado que exige do poder público que lhe dê emprego quanto pelo não grevista que exige acesso ao seu posto de trabalho, contrapondo-se aos piquetes. Exigimos do Estado que reconheça o direito dos fumantes de fumar e o dos não fumantes de não ser expostos à fumaça, o dos não crentes de blasfemar e o dos crentes de não ser ofendidos; queremos que o Estado conceda aos solteiros o direito aos filhos, e às crianças, o direito "a um papai e a uma mamãe". E, finalmente, onde antes se impunham deveres morais ou normas jurídicas, hoje surgem inesperados beneficiários putativos de novos direitos: as culturas autóctones, os animais, os robôs, a Natureza, a biosfera, a Terra- mãe etc. — de tal forma a palavra "direito" se tornou mobilizadora e coligadora de energias em torno de uma causa, graças à sua extraordinária ambiguidade (Vantagem? Habilitação? Permissão? Privilégio? Não ingerência? Poder? Reivindicação? Imunidade?). Tudo isso, no fundo, é prazeroso e marca a vitória (para nossa infelicidade, geograficamente parcial e socialmente frágil) da autonomia individual sobre a onipotência dos Estados, as sociedades fechadas, as culturas fusionais ou os integrismos religiosos. Mas incita muito pouco a utopia e, menos ainda, a revolução. Cópia de: FRANCIS WOLFF. Três Utopias Contemporâneas. São Paulo: Unesp, 2018. (shrink)
This essay aims to motivate an epistemic non-individualistic conception of reflection. The proposal is non-individualistic because (a) it addresses more than individual metacognitive performance and (b) it refers to a situation in which two or more people are in dialogical disagreement about the same subject matter or target proposition; (c) their dispute is based on conversational space and they are entitled to expect one another to be engaged in attempts at truth, avoidance of error, and understanding. I call this proposal (...) a Dialectical account of Reflection (DaR). According to (DaR), reflection is a conscious and intentional intellectual operation through which an individual becomes aware of the contents of disputed beliefs in a dialogical or interpersonal exchange, involving both her own beliefs and the beliefs of her interlocutors. In (DaR), reflection produces the epistemic good of avoiding epistemic vices and promoting epistemic moderation. (shrink)
Livro com 230 páginas de referência para a Formulação de Dietas e Fabricação de Rações para bovinos de corte, bovinos leiteiros, bubalinos, caprinos e ovinos. A visualização é parcial. Referências Bibliográficas: ANDRIGUETTO, J. M. et al. Nutrição Animal–Alimentação Animal Aplicada. São Paulo: Nobel, 3ª edição, v. 2, 1988. ARAÚJO, L. F.; ZANETTI, M. A. (Eds.). Nutrição Animal. 1ª ed. Barueri: Manole, 2019. BELLUZO, C. E. C. et al. Curso de atualização em ovinocultura. Araçatuba: UNESP, 2001. BORGES, Iran; GONÇALVES, Lúcio (...) Carlos. Manual prático de caprino e ovinocultura. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2002. CAMPOS, J. Tabelas para o cálculo de rações. Universidade Federal de Viçosa, 1972. Métodos de Formulação e Balanceamento de Rações para Bovinos. GONÇALVES, J. N. Manual do produtor de leite. Viçosa, MG: Aprenda Fácil, 2012. GONÇALVES, L. C.; BORGES, Iran; FERREIRA, Pedro Dias Sales. Alimentação de gado de leite. Belo Horizonte: FEPMVZ, 2009. GONÇALVES, Lúcio Carlos et al. Alimentos para gado de leite. Belo Horizonte: FEPMVZ, 2009. HYND, Philip. Animal Nutrition: From Theory to Practice. CSIRO PUBLISHING, 2019. ISLABAO, Narciso; RUTZ, F. Manual de cálculo de rações. Pelotense, sd, 1978. KESSLER, J. Mineral nutrition of goats. Goat nutrition, v. 46, p. 104-119, 1991. LANA, R. de P. Sistema Viçosa de formulação de rações. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa, 2007. NASCIMENTO, Cristo; CARVALHO, Luiz Octavio Moura. Criação de búfalos: alimentação, manejo, melhoramento e instalações. Brasília: EMBRAPA-SPI, 1993. NATIONAL RESEARCH COUNCIL et al. Nutrient requirements of dairy cattle: 2001. National Academies Press, 2001. National Research Council. NRC. 2007. Nutrient requirements of small ruminants: sheep, goats, cervids, and new world camelids. National Academy of Science, Washintgton, DC 347p. NATIONAL ACADEMIES OF SCIENCES, ENGINEERING, AND MEDICINE et al. Nutrient requirements of beef cattle. 2016. NEIVA, Rogério Santoro. Produção de bovinos leiteiros. Lavras: UFLA, 1998. NEVES, André Luis Alves et al. Tabelas nordestinas de composição de alimentos para bovinos leiteiros. Brasília, DF: Embrapa, 2014., 2014. PAUL, Shyam Sunder; LAL, Dalip. Nutrient requirements of buffaloes. Azadpur, Dellhi: Satish Serial Publishing House, 2010. POND, Wilson G. et al. Basic animal nutrition and feeding. John Wiley & Sons, 2004. RIBEIRO, SD de A. Caprinocultura: criação racional de caprinos. São Paulo: Nobel, v. 35, 1997. SALGADO, EMILIANO ARAUJO. Tabelas regionais de composição de alimentos para gado de leite no estado do Rio Grande do Sul. 2018. SALMAN, A. K.; OSMARI, E. K.; DOS SANTOS, M. G. R. Manual prático para formulação de ração para vacas leiteiras. Embrapa Rondônia-Documentos (INFOTECA-E), 2011. SUSIN, I.; BATISTA, A. M.; SIQUEIRA, E. R. Exigências nutricionais de ovinos e estratégias de alimentação. Nutrição de ovinos. Jaboticabal: FUNEP, p. 119-141, 1996. TEIXEIRA, A. S. Alimentos e alimentação dos animais. Vol. I, v. 5, 1997. TEIXEIRA, J. C.; TEIXEIRA, LFAC. Alimentação de bovinos leiteiros. FAEPE, Lavras, 1997. VALADARES FILHO, S. de C. et al. CQBAL 3.0. Tabelas Brasileiras de Composição de Alimentos para Bovinos. Disponível em: www. ufv. br/cqbal. Acesso em, v. 19, n. 03, 2015. (shrink)
This article intends to show that the defense of “understanding” as one of the major goals of science education can be grounded on an anti-reductionist perspective on testimony as a source of knowledge. To do so, we critically revisit the discussion between Harvey Siegel and Alvin Goldman about the goals of science education, especially where it involves arguments based on the epistemology of testimony. Subsequently, we come back to a discussion between Charbel N. El-Hani and Eduardo Mortimer, on the one (...) hand, and Michael Hoffmann, on the other, striving to strengthen the claim that rather than students’ belief change, understanding should have epistemic priority as a goal of science education. Based on these two lines of discussion, we conclude that the reliance on testimony as a source of knowledge is necessary to the development of a more large and comprehensive scientific understanding by science students. (shrink)
This article intends to show that the defense of ‘‘understanding’’ as one of the major goals of science education can be grounded on an anti-reductionist perspective on testimony as a source of knowledge. To do so, we critically revisit the discussion between Harvey Siegel and Alvin Goldman about the goals of science education, especially where it involves arguments based on the epistemology of testimony. Subsequently, we come back to a discussion between Charbel N. El-Hani and Eduardo Mortimer, on the one (...) hand, and Michael Hoffmann, on the other, striving to strengthen the claim that rather than students’ belief change, understanding should have epistemic priority as a goal of science education. Based on these two lines of discussion, we conclude that the reliance on testimony as a source of knowledge is necessary to the development of a more large and comprehensive scientific understanding by science students. (shrink)
In contemporary analytic philosophy, while some epistemologists claim that reflection—understood as a critical self-examination of belief—is a necessary condition for the attribution of valuable epistemic states, others reject this claim and maintain that philosophers tend to overestimate the value of reflection in their reports of epistemological phenomena. In this essay, we present a brief overview of this debate and outline the elements that constitute disagreement between epistemologists. Our diagnosis is that, despite radical disagreement, these positions converge, because they deal with (...) reflection from an individualistic point of view, defining it as an agent’s private metacognitive performance of her own epistemic states. As well as being a reason for disagreement, this conception of reflection may be the reason that epistemologists misunderstand its place and value. (shrink)
Since the famous passage in which Socrates (Plato 38a5-6) says that the unexamined, and therefore non-reflected, life is not worth living, “reflection” has been a diffuse and iterant term in ethics, moral philosophy, epistemology, political philosophy (Tiberius 2008; Skorupski 2010), but also in psychology (Marsico, Andrisano Ruggieri & Salvatore 2015). This chapter outlines the discussion of reflection and presents the book "Thinking about Onself", a volume that opens a new perspective on the topic of reflection, considering the most recent approaches (...) in both philosophy (namely in epistemology ) and cultural psychology. (shrink)
This article deals with two questions: why would the way in which the neopyrronicle conducts his philosophical activity be more virtuous than his dogmatic, non-pyrrhic colleague does? And why would the result he achieves be more valuable? That said, my answer to the first question is that the way the neo-Pyrrhonian investigates is more virtuous because it seeks to deliberately avoid the vices of precipitation, arrogance and mental closure. Regarding the second question, I suggest that the outcome of the neopyronic (...) investigation, whatever it may be (even if it is not the truth) is more valuable because of the way he conducts his investigation. (shrink)
In this paper, we discuss two recurring themes in Sosa’s work, reexamined in Judgment and Agency (SOSA, 2015) from a new angle, i.e. the place and importance of reflection in the cognitive economy of the epistemic agent, and epistemic value. Regarding the latter, Sosa suggests that knowing full well, which necessarily involves reflection, has value because it contributes to human flourishing. Although Sosa’s “new virtue epistemology” appears very promising in explaining different intuitions regarding epistemology and demonstrating that it is possible (...) to join reliabilist and responsibilist accounts of virtue epistemology, we believe that solving the value problem requires further clarification in order to truly explain the value of knowledge. (shrink)
The main aim of this paper is to propose that reflection is a performance that has epistemic value. This idea contains two parts: the first asserts that reflection has instrumental value. The second that reflective performance promotes an epistemic virtue that has final value. The first part is not controversial and most epistemologists would accept it. The second, however, asserts that there is a kind of epistemic good which can only be achieved through reflection. There is much controversy in this. (...) Reflection is understood here as a performance, an activity in which the person examines the evidence, content and reliability of their own beliefs. This performance may lead to different results, but if someone is capable of critically reflecting on their own beliefs in skeptical-dialectic contexts, whatever the results, this performance will produce positive epistemic states – contrary to people who, in the face of skeptical challenges, simply decide to remain intellectually immobile, maintaining a cowardly, arrogant or dogmatic position. The critical spirit with which someone discusses opinions in the context of dialectical disagreement, submitting them to the scrutiny of reason (that is, to the arguments for or against), is virtuous and has epistemic value. The consequence of this performance, the epistemic preference, has a final value, since deliberations based on free judgment have final value. (shrink)
This essay is about the conception of second person in Donald Davidson. For Davidson, what characterizes a significant act and the possibility of the content of an attitude is the interaction between two agents driven by a primary intention: the speaker has the intention that his utterances be understood by another person. The essay is organized in three sections: in the first section, I present the specific meaning of the second person as a creature with whom the speaker currently interacts, (...) regardless of whether they share a rule or linguistic convention beforehand. In the second section I present Davidson’s thesis of triangulation, which is that the individualization of beliefs and thoughts is established from systematic causal connections in triangulation between the individual, another speaker with whom he interacts, and objects or events in the world. Finally, in the third section, I present the idea of the “norm of conversation” as a theoretical tool to address epistemological issues: in conversation, when interlocutors intend to understand each other, speakers engage in a kind of investigation about the meaning and content of the sentences, beliefs, and intentions in dispute. (shrink)
Besides the general agreement about the human capability of reflection, there is a large area of disagreement and debate about the nature and value of “reflective scrutiny” and the role of “second-order states” in everyday life. This problem has been discussed in a vast and heterogeneous literature about topics such as epistemic injustice, epistemic norms, agency, understanding, meta-cognition etc. However, there is not yet any extensive and interdisciplinary work, specifically focused on the topic of the epistemic value of reflection. This (...) volume is one of the first attempts aimed at providing an innovative contribution, an exchange between philosophy, epistemology and psychology about the place and value of reflection in everyday life. -/- Our goal in the next sections is not to offer an exhaustive overview of recent work on epistemic reflection, nor to mimic all of the contributions made by the chapters in this volume. We will try to highlight some topics that have motivated a new resumption of this field and, with that, drawing on chapters from this volume where relevant. -/- Two elements defined the scope and content of this volume, on the one hand, the crucial contribution of Ernest Sosa, whose works provide original and thought-provoking contributions to contemporary epistemology in setting a new direction for old dilemmas about the nature and value of knowledge, giving a central place to reflection. On the other hand, the recent developments of cultural psychology, in the version of the “Aalborg approach”, reconsider the object and scope of psychological sciences, stressing that “[h]uman conduct is purposeful”. (shrink)
This article is about self-knowledge on one's own mental states. Considering human as rational beings, this study aims to problematize the position of subject in process of self-knowledge, as well as to realize the state of knowledge about self-knowledge. In this way, Richard Moran constitutes the method of transparency about the knowledge of one's own mental states. Such a method receives some criticism from the philosopher Quassim Cassam and the philosopher Brie-Gertler. In the same extent, both authors problematize some characteristics (...) of self-knowledge, in which criticism reaches some points studied by Brazilian philosophers, namely Paulo Farias, Waldomiro SilvaFilho and André Abath. The latter two authors are based on Moran's methodology and thus constitute his reflections on conditions of daily life as well as the incomplete understanding of human beings. (shrink)
The subject of this book came up in several different places and dates, scattered in my experience in the countless times I was asked to think, discuss or pronounce myself on the idea that we have (or should have) an ability to judge that is part of our human nature, that we have the power to weigh our own opinions and, with this, conduct our lives and carry out the valuable tasks of properly knowing the world and properly deciding what (...) to do. The fact is that at a certain moment, between readings, conferences, and the anomalies of everyday life, a question occurred to me about the possibility and value of reflection - understood as the act of examining one's own mental states. And I gave myself the task of investigating this. -/- SUMMARY -/- Preface -/- Introduction -/- Chap. 01 - How to get lost in one's own house -/- Chap. 02 - It is still necessary to be neopironic -/- Chap. 03 - The vicissitudes of rationality -/- Chap. 04 - Understanding and the arena of reasons -/- Chap. 05 - For a conversation, two -/- References . (shrink)
Realizar uma discussão teórica decorrente da perspectiva ninfomanía em um cenário da pandemia do covid-19, possibilitando o resumo de informações como facilitador do tratamento de pacientes. Trata-se de uma revisão narrativa de aspecto critico discursivo, onde a construção da pesquisa e a formulação foram baseadas em publicações relevantes sobre o tema proposto, conceituando a doença e os fatores que influenciam seu diagnóstico e tratamento. Questionável nos aspectos sociais, religiosos e na perda do controle sexual ao deparar mos em situação de (...) isolamento social, necessitando de tratamento adequado. O aumento da exposição na mídia de pessoas que sofrem de distúrbios ninfomaníacos pode ser negativo, seja refletido no sentimento de preconceitos e incertezas perante a expansão de uma pandemia, onde consultas medicas e informações fornecidas por profissionais habilitados são todas por video chamadas, seguindo o protocolo do distanciamento, resultando na exposição de informações. Ressaltam se que são poucas as publicações sobre o assunto, principalmente em novas perspectivas diante da pandemia do covid-19 dificultando a compreensão. -/- REFERÊNCIAS 1. BARBOSA JPS. A produção de significados em pôsteres de filmes quer: diálogos entre a Análise Crítica do Discurso, os Estudos da Tradução e a Identidade de Gênero. Revista do Centro de Estudos da Linguagem da Universidade Federal de Rondônia,2018; 5(1):197-217. 2. CANTO JAM, PAULA PLD. Ninfomaníaca: Um filme sob a lente da psicanálise. Revista Brasileira de Ciências da Vida, 2017; 6(1): 2525-359X. 3. CZAPLA P. Sexualidade e governo: a produção do perverso pelos discursos médicos. Aedos, Porto Alegre, v. 12, n. 26, ago. 2020. 4. FERREIRA IT, et al. Avaliação da qualidade da consulta de enfermagem em infecções sexualmente transmissíveis. Enfermagem Foco, 2018; 9(3): 42-47. 5. FERREIRA MJP, et al. Preconceito no futebol feminino no Brasil. Revista Diálogos em SaúdeISSN: 2596-206X. 6. GIGLIOTTI A, GUIMARÃES A. Dependência, compulsão e impulsividade. Rio de Janeiro: Rubio, 2007;65-67p. 7. PEREIRA GSM, et al. HIV/aids, hepatites virais e outras IST no Brasil: tendências epidemiológicas. REV BRAS EPIDEMIOL 2019; 22(SUPPL 1): E190001. supl.1. 8. ROQUE MV. Ninfa distante: as estrelas intermitentes de Manuel Bandeira. AfluAfluente, UFMA/CCEL, v.5, n.15, p. 96-121, jan./jun. 2020 ISSN 2525-3441. 9. SANTOS MIDA, PINHEIRO CVQ. Representações da loucura feminina no cinema – Augustine e nimphomaniac. Revista Humanidades, 2016; 31(2): 395-414. 10. SANTOS MACM, SALLES VLR. O fenômeno da histeria e a visão da sexualidade feminina na literatura: realismo/naturalismo europeu. Revista Interdisciplinar em Cultura e Sociedade, São Luís, 2016; 2(1):109-126. 11. SILVA EIC. Relação e efeitos bioquímico-nutricionais sobre o cio ou estro permanente em vacas. Revista AGROPE IFPEBJ – Vol. 1 n° 1. pp. 27-34. 12. SILVA CRO. A escola como lugar de prevenção: educação para a saúde para a paz. Revista Educação, 2018; 13(1):151-161. 13. SILVA VL, et al. Análise da motivação de pessoas: um estudo baseado em princípios da Hierarquia de Necessidades de Maslow. Revista Foco, 2017;10(2):148-166. 14. SOARES FR, et al. Satiríase: o gozo incontrolável e seus desprazeres psíquicos. Faculdade Estácio de Sá de Goiás, 2018; 1(1): 62-66. (shrink)
The history of Christianity was a prevalent subject among 18th century philosophers. This article presents a historical perspective of the relationship between Christianity and power based on a comparative analysis of the ideas of Voltaire and Rousseau. Bibliographic research was undertaken using a philosophical approach to their works. This study examines Voltaire’s inquiry into Jesus Christ as a historical figure and a“genealogy” of Christianity in three of his works: Tumbeau du fanatisme(1736), Traité sur la tolérance(1763), and Catéchisme de l'honnête homme (...) (1763). Regarding Rousseau, this study interprets his historical approach to the connections between Christianity and politics based on the following works: Sur la Réponse qui a été faite à son Discours(1751), the chapter entitled “Civil Religion” in Du Contract social(1762), and Lettres écrites de la montagne(1764). Not only do the findings of this inquiry reveal the similarities and differences between the thoughts of Voltaire and Rousseau and the historical tensions between Christianity and power, the findings also point toward a fundamental defense of a secular state. (shrink)
The article aims to discuss the suicide conceptions in the following works: Karl Marx’s Peuchet: vom Selbstmord (with “co-author” Jacques Peuchet), Émile Durkheim’s Le suicide and Sigmund Freud’s Trauer und melancolie. We can say that throughout the history of philosophy the theme was worked in two ways: as a moral and as an existential question. Discussions about suicide intensified between the late eighteenth and early nineteenth century. While many studies have focused on the moral consequences of suicidal act, other researchers (...) questioned about the nature of the forces that cross the individual to the point of self-extermination. In their conceptions, Marx, Durkheim and Freud avoided determinism and refused to associate suicide to the sin notion advocated by the Christian moral philosophy. However, this article supports the thesis that these three authors continued operating in the “morality axis” and presented suicide as a moral problem: it is precisely the moral that allows a theoretical enunciation about suicide and what sets them apart is, much more, a differentiated position in relation to moral than a radical innovation of the approach. (shrink)
Since the “last day” of 2019, a new virus emerged in Asia, which in Feb./2020 was called by the World Health Organization (WHO, 2020) as Coronavirus disease (Covid-19). Due to its fast transmission, after eight months since the first global official case, at 23:59 (GMT) on August 31, 2020, the world has accounted for about 25,620,737 new confirmed cases with 854,222 deaths and 17,921,063 recovered cases (WORLDOMETERS, 2020). The pandemic is the newest challenge for all nations, most of them eager (...) to learn from countries that are successful against the virus. However, until now, no methodology was developed to identify them by taking into account a holistic approach with international rankings concerned to health, innovation, sustainability, image, and competitiveness, as well as the estimated real number of fatal cases by one million population during the first 180 days of facing the pandemic. Thus, the main objective is to develop a holistic methodology to identify twenty benchmark countries that are saving people's lives against Covid-19. The research is applied, as its results and recommendations are useful for academy, government policymakers and authorities. It is descriptive, with a qualitative and quantitative approach, based on bibliographic and documentary research, involving the study of official sites, articles, reports, manuals, and other technical documents related to 13 international rankings. As a result, the fifteen phases of the methodology, far from perfect, shows that among 108 well-evaluated countries, the top six benchmark countries are from Asia (1) Vietnam; 2) Taiwan; 3) Thailand; 4) China; 5) Malaysia; 6) Singapore), which suffered from fatal cases from first SARS-CoV in 2002/2003, followed by 7) South Korea; 8) New Zealand; 9) Australia; 10) Japan; 11) Hong Kong; 12) Cyprus; 13) Greece; 14) Latvia; 15) Iceland; 16) the United Arab Emirates; 17) Czech; 18) Lithuania; 19) Norway, and 20) Estonia. (shrink)
The recent social crisis in Brazil has given political players of a certain leaning the excuse they needed to make political maneuvers of a suspicious nature. Backed by corporations, the mainstream media and agribusiness, such measures, which have also been called “reforms,” have been hastened by members of the legislature in collusion with the highest-ranking government leaders. Their scheme was hatched at the height of the crisis of President Dilma’s government and culminated with her impeachment. Shortly after the usurpation of (...) the executive branch, much of the Brazilian public began to perceive it as a farce created by the privileged classes with the ideological support of the mass media. In light of this context, the goal of this paper is to reflect critically on the Brazilian scenario, endorsing alternative interpretations to those espoused by the mainstream media. The paper begins with the problematization of the concept of crisis in Bobbio (2004) and Santos (2007) in order to gain insight into the reasons behind of the offensive waged by the privileged classes in command of Brazil. Next the paper examines the concept of conscientization found in Gramsci (2011) and Freire (2006), which interprets knowledge as a means to resist oppression via political engagement. The paper concludes by recovering the concept of politics from the outworn view of it as an art to the understanding of politics, per Arendt (2002), as an instrument of humanization and social inclusion. (shrink)
In 2020 the world philosophical community on all continents joined with his close friends and family to celebrate Ernie's 80th birthday. Dozens of publications, books, journals, and webinars were held, even amidst the humanitarian devastation of the pandemic. TRANS/FORM/AÇÃO joins this celebration and makes the present tribute to Ernest Sosa. We do this in recognition of the great influence of his work on philosophical culture in Brazil and Latin America.
Clinical evidence has shown that physical exercise during pregnancy may alter brain devel- opment and improve cognitive function of offspring. However, the mechanisms through which maternal exercise might promote such effects are not well understood. The present study examined levels of brain-derived neurotrophic factor (BDNF) and absolute cell num- bers in the hippocampal formation and cerebral cortex of rat pups born from mothers exer- cised during pregnancy. Additionally, we evaluated the cognitive abilities of adult offspring in different behavioral paradigms (exploratory (...) activity and habituation in open field tests, spatial memory in a water maze test, and aversive memory in a step-down inhibitory avoid- ance task). Results showed that maternal exercise during pregnancy increased BDNF lev- els and absolute numbers of neuronal and non-neuronal cells in the hippocampal formation of offspring. No differences in BDNF levels or cell numbers were detected in the cerebral cortex. It was also observed that offspring from exercised mothers exhibited better cognitive performance in nonassociative (habituation) and associative (spatial learning) mnemonic tasks than did offspring from sedentary mothers. Our findings indicate that maternal exer- cise during pregnancy enhances offspring cognitive function (habituation behavior and spa- tial learning) and increases BDNF levels and cell numbers in the hippocampal formation of offspring. (shrink)
Livro-texto de introdução à lógica, com (mais do que) pitadas de filosofia da lógica, produzido como uma versão revista e ampliada do livro Forallx: Calgary. Trata-se da versão de 13 de outubro de 2022. Comentários, críticas, correções e sugestões são muito bem-vindos.
O artigo apresenta uma análise das formas literárias de Mt 20,20-28, que narra o pedido da mãe dos filhos de Zebedeu e a resposta de Jesus a respeito do servir. Será aplicado o referencial teórico proposto por Klaus Berger, em As formas literárias do Novo Testamento. Com a aplicação da análise formal a perícope é classificada com um gênero abrangente que contém características de texto simbulêutico, epidíctico e dicânico. Mediante um diagrama são identificados os subgêneros, que são categorias menores em (...) níveis diferentes e que aparecem combinados na perícope. A teoria comunicativa dos gêneros prioriza a relação autor/leitor e releva a importância do ambiente vital como sustentava a tese clássica dos gêneros literários de M. Dibelius e R. Bultmann. Assim os sinais e formas usados no texto produzem o efeito nos ouvintes/leitores. Eles permanecem no modelo dos dominadores do mundo ou vão aderir ao modelo de Jesus? Vão reproduzir a racionalidade da dominação ou a do serviço? A argumentação classificada como simbulêutica em Mt 20,26 visa modificar os pressupostos usados pelos ouvintes para julgar e tomar decisões. O critério não será o poder dominação, mas o serviço, o que resulta em relações igualitárias na comunidade de Mateus. Quem quiser tornar-se grande, deve ser servidor, não o primeiro, mas o último. (shrink)
Em meados do século XVI, surgiu a ideia de autonomia do indivíduo, que deu origem ao individualismo e ao liberalismo político. A concepção de democracia que se desenvolveu com base nesses princípios assumiu um perfil bastante diferente daquele utilizado na Grécia antiga. Se antes a democracia estava diretamente ligada à ideia de igualdade, em sua nova versão passou a ser relacionar primordialmente com a ideia de liberdade. Em decorrência dos ideais desenvolvidos naquele momento histórico, o principal dilema político fundamentava-se na (...) limitação de poder do soberano (que às vezes se confundia com o próprio Estado) e na ampliação das liberdades individuais, como o direito a dispor da propriedade material e a defender-se judicialmente. Até hoje, grande parte do debate político tem como tema a defesa dos ideias liberais ou a crítica a eles. Na perspectiva do filósofo inglês Thomas Hobbes, a constituição e o funcionamento de uma sociedade pressupõem que os indivíduos cedam, por transferência, seus direitos naturais (mantendo somente o direito de conservarem sua vida) ao soberano. O autor entendia que os seres humanos, em estado de natureza (isto é, compartilhando do direito a tudo o que existe, em razão de não haver limitação legal), tendem a agir pela força e pela violência para conseguir o que desejam, o que acabaria provocando uma guerra contínua entre todos. Para Hobbes, a justificativa para o poder absoluto dos reis residia na compreensão de que os homens em estado de natureza se encontrariam em constante conflito. Na foto, palácio na Arábia Saudita, em 2012, uma das poucas monarquias absolutas da atualidade. Por isso, para disciplinarem a si mesmos e garantirem o bem-estar físico e material, seria necessário que os indivíduos firmassem um contrato social regulado por uma autoridade soberana. Hobbes manifestou preferência pela monarquia absolutista, pois acreditava que as assembleias e os Parlamentos estimulam os conflitos graças às disputas entre diferentes facções e partidos. O poder absoluto defendido por Hobbes se justificava pela transferência dos direitos dos indivíduos ao soberano. É um nome desse contrato social que o poder deve ser exercido, e não para a realização da vontade pessoal do soberano. Por conta dessa perspectiva, Hobbes não pode ser considerado defensor da democracia. Entretanto, seu pensamento é importante, pois serve de parâmetro para as reflexões sobre a organização do poder construídas posteriormente. No século XVII, John Locke, também filósofo inglês, propôs uma reflexão bem diferente das de Hobbes. Para ele, o poder soberano deve permanecer nas mãos dos cidadãos, que são os melhores juízes dos próprios interesses. Cabe ao governante retribuir a delegação de poderes ao garantir as prerrogativas individuais: segurança jurídica e propriedade privada. Assim, o contrato social teve como função garantir os direitos naturais para todos. Esse pensamento é uma das bases do liberalismo político. Entretanto, deve ser ressaltado que sua implantação não permitiu a construção da igualdade propagada por Locke, mas foi uma das estruturas de consolidação do poder da burguesia. As ideias de Locke são uma das referências para o desenvolvimento da democracia representativa. Na imagem, vemos o palácio de Westminster, em Londres, onde estão situadas as casas do Parlamento e ocorrem as principais decisões políticas do Reino Unido. Para Locke, o princípio da maioria é fundamental para o funcionamento das instituições políticas democráticas, assim como as leis, que devem valer para todos. Por isso, segundo o filósofo, a elaboração das leis precisa estar a cargo de representantes escolhidos pelo povo, que exerceriam o papel de legisladores no interesse da maioria: o regime político proposto por Locke é, portanto, uma democracia representativa. O escritor e filósofo político suíço Jean-Jacques Rousseau se preocupou com o problema da legitimidade da ordem política. Para ele, a desigualdade ocasionada pelo advento da propriedade privada é a causa de todos os sentimentos de ruins do ser humano. No contrato social, é preciso definir a questão da igualdade e do comprometimento de todos com o bem comum. Se a vontade individual é particular, a do cidadão, que vive em sociedade e tem consciência disso, deve ser coletiva e voltada para o bem comum. A participação política é, portanto, ato de deliberação pública que organiza a vontade geral, ou seja, traduz os elementos comuns a todas as vontades individuais. Esse seria, portanto, o núcleo do conceito de democracia. Em seu livro Do Contrato Social2 , Rousseau afirma que a democracia só pode existir se for diretamente exercida pelos cidadãos, sem representação política, pois a vontade geral não poderia ser representada, apenas exercida diretamente. Para Rousseau, a democracia direta é o único sistema legítimo de autoridade e de ato político.3 Em O espírito das leis, o filósofo e político Montesquieu, afirmou que igualdade na democracia é algo muito difícil de garantir plenamente. Partindo do princípio de que é necessário um controle externo para que os sistemas políticos funcionem bem, esse pensador defende a criação de regras que estabeleçam limites aos detentores do poder a fim de manter a liberdade dos indivíduos. Por isso, propôs a divisão da esfera administrativa em três poderes ou funções independentes entre si: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. De maneira resumida, cabem ao poder Legislativo as funções de fiscalizar o poder Executivo, votar leis de interesse público nas instâncias relativas (municipal, estadual e federal) e, em situações específicas, julgar autoridades como o presidente da República ou os próprios membros do Parlamento. O Executivo é o poder do Estado que, nos moldes da Constituição de um país, tem por atribuição governar a nação e administrar os interesses públicos, colocando em prática políticas públicas e leis, e garantindo o acesso aos direitos. Por fim, o poder Judiciário é exercido pelos juízes, que têm a capacidade e a prerrogativa de julgar com base nas regras constitucionais e nas leis criadas pelo poder legislativo. Para Montesquieu, a democracia não pode prescindir da divisão entre os poderes. Na imagem, foto da Praça dos Três Poderes, em Brasília (DF), 2013. A democracia, na perspectiva de Montesquieu, seria garantida pelo equilíbrio entre os três poderes, assegurando assim maior liberdade aos indivíduos. A liberdade, porém, só existiria com moderação, o que equivaleria a fazer tudo o que as leis permitissem (pois, se um cidadão pudesse fazer tudo o que as leis proibissem, não teria mais liberdade, por que todos poderiam fazer o mesmo). Karl Marx e Friedrich Engels acreditavam que um governo democrático seria inviável numa sociedade capitalista, pois a regulação democrática da vida não poderia se realizar com as limitações impostas pelas relações capitalistas de produção. Seria necessário, portanto, mudar as bases da sociedade para criar possibilidade de uma política democrática. Para entender a posição desses autores com relação à democracia, é necessário entender como eles percebem a função do Estado na sociedade capitalista. Para Marx e Engels, os princípios que protegem a liberdade dos indivíduos e defendem o direito à propriedade tratam as pessoas como iguais apenas formalmente. O movimento em favor do sufrágio universal e de igualdade política é reconhecido por Marx como um passo importante, mas, segundo esse autor, seu potencial emancipador está limitado pelas desigualdades de classe. Desse modo, as democracias liberais seriam cerceadas pelo capital privado, que restringiria sistematicamente as opções políticas. De acordo com esse olhar, a liberdade nas democracias capitalistas é, portanto, puramente formal, pois a desigualdade de classe prevalece. Nas palavras de Marx: “Na democracia liberal, o capital governa”. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS HOBBES, T. Leviatã. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Coleção Os Pensadores). LOCKE, J. Segundo tratado sobre o governo civil. São Paulo: Martin Claret, 2002. MARX, K. O capital: crítica a economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1974. (Coleção Os Pensadores). MARX, K.; ENGELS, F. O manifesto do partido comunista. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. ROUSSEAU, J. J. O contrato social e outros escritos. São Paulo: Cultrix, 1971. SILVA, A. et al. Sociologia em movimento. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2016. (shrink)
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