SOCIOLOGIA DO TRABALHO: O CONCEITO DO TRABALHO DA ANTIGUIDADE AO SÉCULO XVI -/- SOCIOLOGY OF WORK: THE CONCEPT OF WORK OF ANTIQUITY FROM TO THE XVI CENTURY -/- RESUMO -/- Ao longo da história da humanidade, o trabalho figurou-se em distintas posições na sociedade. Na Grécia antiga era um assunto pouco, ou quase nada, discutido entre os cidadãos. Pensadores renomados de tal época, como Platão e Aristóteles, deixaram a discussão do trabalho para um último plano. Após várias transformações sociais entre (...) diferentes eras e povos, o trabalho foi ganhando espaço nos debates entre os povos, como os caldeus, hebreus e romanos. O trabalho conferiu-se no escopo da discussão social. Na Idade Média, com Agostinho, Santo Aquino e outros o labor foi concebido como algo benéfico e divino. O que se via como algo “escravo” ao povo, transformou-se em necessidade e benevolência divina. -/- Palavras-chave: Conceito; Trabalho; História; Definição. -/- ABSTRACT -/- Throughout the history of mankind, work has figured itself in different positions in society. In ancient Greece it was a little matter, or almost nothing, discussed among the citizens. Renowned thinkers of such a time, like Plato and Aristotle, left the discussion of the work for a last plan. After several social transformations between different eras and peoples, work was gaining space in the debates among peoples, such as the Chaldeans, Hebrews and Romans. The work has taken place within the scope of social discussion. In the Middle Ages, with Augustine, Saint Aquinas and others the work was conceived as something beneficial and divine. What was seen as something “slave” to the people, became need and divine benevolence. -/- Keywords: Concept; Work; History; Definition. -/- BASES TEMÁTICAS DESSE TRABALHO -/- ➢ O trabalho é um conceito construído socialmente; -/- ➢ A modernidade trouxe consigo mudanças significativas quanto à valorização do trabalho; -/- ➢ A origem dos mercados de trabalho, juntamente com o surgimento do capitalismo, minimizou o trabalho como um mero emprego assalariado; -/- ➢ O trabalho, no entanto, apresenta múltiplas manifestações nas nossas sociedades. -/- 1. A VISÃO GREGA DE TRABALHO -/- Comecemos pelos gregos, uma civilização excitante que, durante muitos séculos antes de Cristo, já começava a elaborar riquíssimas reflexões sobre vários aspectos da vida humana. No entanto, surpreende aqueles de nós que já ler os primeiros filósofos gregos, como entre tantas análises rigorosas e “diálogos”, um elemento tão central na vida social dos povos, como o trabalho havia tido escassa repercussão. A explicação só faz sentido, justamente, ao analisar a valorização que esses grandes pensadores tinham acerca do nosso objeto de estudo que é o trabalho. Embora, como supracitado, os gregos não tivessem uma visão unânime sobre o trabalho, não é menos certo assinalar que para esta civilização o trabalho foi considerado um fato altamente desvalorizado. O trabalho, para eles, dado a sua vinculação com a dimensão de constrangimento e necessidades, limitava a liberdade dos indivíduos, condição indispensável para integrar o mundo da “pólis” na qualidade de cidadão. O homem livre realizava atividades absolutamente desinteressadas: a atividade intelectual (que não era considerada trabalho) fazia parte do ócio e da contemplação. O trabalho, reservado apenas aos escravos, como bem sinala Hopenhayn (1955), significava uma mera função produtiva. Portanto, o escravo passou a ser unicamente uma força de trabalho. Como tal, ele não tem personalidade e pertence ao seu mestre, como uma coisa entre muitas. Como objeto de propriedade, escapa ao pensamento antropológico que domina a filosofia sofista e socrática, porque para o cidadão grego falar de escravo não implica um sujeito pensante, senão uma coisa ou, no máximo, a força. Também escapa ao pensamento platônico, porque, como uma coisa, parece totalmente desvalorizado na construção idealista-dualista da realidade (HOPENHAYN, 1988. p. 23 – Tradução própria). -/- Três termos fundamentais que devemos recordar da tradição grega: -/- 1 – Ponos: penalidade, fadiga; -/- 2 – Banausia: trabalho mecânico, e -/- 3 – Ergon: realização. -/- Vejamos como essa noção de trabalho é construída como algo servil (ponos), ao qual uma visão positiva de lazer e contemplação foram contrastadas como uma atividade puramente humana e libertadora. As raízes do supracitado são encontradas no valor eticamente supremo da autarquia socrática. Segundo essa noção alcunhada por Sócrates (469-399 a.C.), todo aquele que trabalha está submetido tanto à matéria como aos homens para quem trabalha. Nessa medida, sua vida carece de autonomia e, portanto, de valor moral. Naturalmente, não só os escravos, mas também qualquer trabalhador dedicado a todos os tipos de tarefas manuais, foram desprezados por um pensamento helênico indubitavelmente aristocrático. Para Platão (427-347 a.C.), de origem aristocrática, descendente do último rei de Atenas e discípulo de Sócrates, a autarquia continua a ser perpetrada como um valor ético supremo e, em consonância com os interesses da aristocracia fundiária, afirmava que somente a agricultura evocava autêntica autonomia. Dessa forma, o pensamento platônico restringiu a participação política a escravos, comerciantes e artesãos. Todos eles têm em comum a dependência das condições materiais em que produzem e trocam mercadorias. O plano político estará intimamente relacionado ao econômico-trabalhista: somente quem é capaz de governar a si mesmo (e como sabemos, acontece com aqueles que não trabalham ou possuem terras), pode governar os outros. Somente a liberação total da prática mundana do trabalho abre as possibilidades de dedicar-se, como fez Platão, à contemplação (σχολή), à filosofia e às ciências, e por meio disso saber distinguir o bem do mal, o justo do injusto, o verdadeiro do falso. Quem poderia dedicar-se a tais “tarefas nobres”? Evidentemente, aqueles que não precisam fazer parte da população trabalhadora, isto é, a aristocracia. Esse sistema de governo aristocrático foi defendido, obviamente, por Platão. Em sua “A República” sinala que o governo perfeito é o aristocrático, e que a este se sucedem a timocracia (governo dos guerreiros), a oligarquia (dos ricos) e a democracia (“governo daqueles que amam o prazer, a mudança e a liberdade), que perece por seus excessos nas mãos de alguns homem audaz que se coloca à frente do povo para defender a democracia e “do tronco desses protetores do povo nasce o tirano”, dando origem à tirania.(2) Em seu diálogo “Político” podemos ler: Aqueles que possuem a si mesmos através da compra, e aqueles que podem ser chamados sem nenhuma discussão de escravos, não participam da arte real [...] E todos aqueles que são livres, se dedicam espontaneamente a atividades servis como as supracitadas, transportando e trocando produtos da agricultura e de outras artes; que nos mercados, indo de cidade em cidade por mar e terra, trocando dinheiro por outras coisas ou por dinheiro, o que chamamos de banqueiros, comerciantes, marinheiros e revendedores, poderão, por acaso, reivindicar para eles algo da ciência política? [...], mas também aqueles que estão dispostos a prestar serviços a todos por salários ou por subsídios, nunca os encontramos participantes na arte de governar [...] Como os chamaremos? Como você acabou de dizer agora: servidores, mas não governantes dos estados (PLATÃO, 1983. pp. 237-8 – adaptado). Esse estado ideal que Platão projetou em seus ensinamentos estava longe, a propósito, da democracia ateniense defendida por Péricles. De certa forma, Platão só confiava em uma elite no poder constituída por uns poucos (oligarquia) que não deveriam se render às tarefas servis da produção e circulação das riquezas. Para ele, as crianças aristocráticas deveriam ser selecionadas desde a infância, recebendo uma educação suficiente tanto em filosofia quanto nas “artes da guerra”. Aos trinta anos, eles já seriam capazes de passar por um exame donde seriam selecionados os “filósofos-reis” encarregados do governo. De fato, no entanto, suas concepções de governo nunca poderiam ser executadas com pureza; ou pela chamada “contrarrevolução aristocrática”, ou pela invasão estrangeira subsequente. Essa visão do trabalho que estamos a analisar, como bem sinala Henri Arvon (1914- 1992), conduz a uma sociedade basicamente conservadora e estancada no produtivo. (3) A ideia de liberdade, ócio e contemplação como valores superiores, propõe um desprezo pelo trabalho que, como vimos, é uma atividade puramente transformadora. Há aqueles que, mediante tal contestação, arriscam fundamentar que grande parte do subdesenvolvimento tecnológico na Grécia derive justamente a essa cultura tão peculiar em relação ao trabalho. Caso contrário, se houvesse escravos, por que avançar em conhecimentos que facilitaram o trabalho? Não nos surpreende, nesse sentido, que uma civilização capaz de criar conhecimentos espetaculares em áreas particularmente complexas como a geometria (Euclides), por outro lado, não soubesse (ou não gostaria) de avançar em conhecimentos técnicos aplicáveis ao campo econômico-trabalhista. Já vimos como a cidadania era o escopo da de alguns aristocratas da civilização helênica. Hannah Arendt (1906-1975) sinalava que os gregos distinguiam entre os escravos, os inimigos vencidos (dmôes ou douloi) que estavam encarregados do trabalho doméstico, e os demiourgoi, homens livres para se deslocarem do domínio privado para o público. Somente depois do século V, sinala Arendt, a pólis começou a classificar as ocupações de acordo com os esforços que eles exigiam. Nisso, Aristóteles (384-322 a.C.) teve que desempenhar um papel preponderante que colocou aqueles cujo “corpo está mais deformado” na faixa mais baixa. Ele não admitiria, portanto, aos estrangeiros (os escravos), nem tampouco aos banausoi, antes dos demiourgoi, trabalhadores e artesãos que deviam resignar-se ao mundo dos “oikos”. Estes, não só estavam submetidos à necessidade como eram incapazes de ser livres, mas também incapazes de governar a parte “animal” do seu ser (República, 590). Serão eles, não obstante, aqueles que permitem o florescimento da chamada democracia helênica, pois, quem senão os trabalhadores (escravos ou artesãos) poderia manter com seu esforço o ócio e a contemplação dos “homens livres”, cidadãos do mundo? Como foi supracitado, será Aristóteles quem delimitará ainda mais os direitos de cidadania. Sua cidade ideal, como em Platão, diferenciaria os governantes dos governados. O primeiro, constituído pela classe militar, estadistas, magistrados e sacerdócio. O segundo, pelos agricultores, artesãos e os camponeses. Com os comerciantes há uma certa ambivalência: embora ele considerava uma ocupação antinatural, estava disposto a admiti-los até certo ponto em sua cidade ideal, cuja base seguiria sendo a escravidão. Em sua Política, ele explana: A cidade mais perfeita não fará do trabalhador manual (artesão) um cidadão. Caso o admitir como tal, a definição de virtude cívica [...] não alcança todos os cidadãos, nem apenas os homens livres, mas só os que estão isentos de trabalhos indispensáveis à sobrevivência. Destes, os que estão a serviço de um só indivíduo, são escravos; os que servem a comunidade, são trabalhadores manuais (artesãos) ou trabalhadores não qualificados (ARISTÓTELES, 1998. p. 203). Tampouco compreenderá os agricultores como reivindicava Platão: “Tampouco deverão ser agricultores os futuros cidadãos, pois para a formação de sua virtude e para a atividade política, o ócio é necessário”. Essa prolifera discussão ocorreu em uma civilização onde começaram a surgir as primeiras mudanças produtivas derivadas do crescimento econômico feito do descobrimento do ferro, e sua posterior divisão do trabalho, onde florescem os grupos de comerciantes e a aristocracia proprietária de terras começa a dominar. Os pensadores da época, mais aliados a estes últimos, contrariavam os princípios da acumulação comercial. Em sua Política, Aristóteles aconselha os cidadãos a absterem-se de qualquer profissão mecânica e de toda especulação mercantil. O primeiro, porque limita intelectualmente, e o segundo, porque degrada o ético. Somente o ócio (scholé), para esses pensadores, permite a virtuosidade e a capacidade de julgar. A Koinonia politiké (comunidade dos homens livres) era típica daqueles que não precisavam de trabalho, relegando a população trabalhadora ao mero âmbito da reprodução material (chrematistiké), o que só era possível em um contexto de alta divisão do trabalho onde um grupo minoritário (oligarquia) vivia à custa do trabalho da maioria (muitos deles escravos). O termo “ócio” provém de “scholé”, entendido entre os gregos como tempo para si mesmo, para a contemplação (sjolé) e, portanto, para a formação (scholé = escola). Desse ponto de vista, o ócio para os gregos é um fim em si mesmo. Entre os romanos, no entanto, adquire outra conotação. Em latim octium, designa o campo contraposto ao neo-octium (negócio), ou seja, é o tempo de descanso que permite dedicar-se ao negócio. Tal visão sobre o trabalho e o ócio, respectivamente, não foi, no entanto, como supracitado no início, unanimemente desenvolvida em toda a história da civilização helênica. Os textos de Homero(4) (séculos IX e VIII a.C.) são mais reservados a respeito, mas acima de tudo, na Grécia antiga encontramos autores como Hesíodo (século VIII), que postulavam outras teses. Para o autor de “Os trabalhos e os dias”, o trabalho se constituía em um justo e necessário castigo que Zeus impôs aos homens pelo pecado de Prometeu. Note a similitude com a crença bíblica que veremos adiante. Hesíodo explana: Lembre-se sempre do meu conselho e trabalhe [...] os deuses e os homens se indignam com quem ocioso vive, semelhante em caráter aos zangões sem ferrão, que consomem o esforço das abelhas [...] O trabalho não é nenhuma desonra; desonra é não trabalhar (HESÍODO, 2012. p. 93 e 95). Também entre alguns sofistas (aqueles que vendiam sua sabedoria a quem gostaria de comprá-la), como Protágoras (século V a.C.), “o primeiro e o maior deles”(5), coloca o estudo e a arte (técnica) na mesma faixa, e Antifonte (século V a.C.) disse: “[...] e as honras e preços, e toda a espécie de encorajamento que Deus incumbiu aos homens, devem necessariamente resultar de fadiga e suor”. Como conviveu a cultura grega com essas noções tão diferentes? Tenho a ideia, juntamente com Hopenhayn, que o desprezo dos pensadores gregos pelo manual foi causado pela violência dos guerreiros e dos aristocratas de plantão, que impuseram aos seja derrotados o jugo. Do trabalho árduo e difícil. Porque a aristocracia queria trabalhar nessas condições? A própria divisão do trabalho em si possibilitou o crescimento da civilização helênica, estava gerando diferentes classes com visões distintas sobre o trabalho. Por outro lado, surgiram os camponeses pobres, os derrotados e aqueles que tinham que viver do trabalho artesanal. Essas pessoas, na maioria das vezes isoladas do mundo da “polis”, gerariam suas próprias leituras dos acontecimentos, seus próprios espaços para o desenvolvimento cultural, inclusive sua própria religião, distante daquela imposta pela visão aristocrática, olímpica, contemplativa e estética dos “homens livres”. -/- 2. A VISÃO DOS CALDEUS ACERCA DO TRABALHO -/- A leitura de outros povos e civilizações sobre este tema tem sido diferente. Entre os caldeus, por exemplo, a visão pejorativa analisada entre os gregos não é registrada. Nas escrituras sagradas da religião de Zaratustra (o Avesta), lemos: “É um santo aquele que constrói uma casa, na qual mantém o fogo, o gado, sua mulher, seus filhos, os bons párias. Aquele que faz a terra produzir trigo, que cultiva os frutos do campo, cultiva corretamente a pureza” (HOPENHAYN, 1988. p. 35). Para os caldeus, como se pode observar, o trabalho implica, de uma posição diametralmente oposta à helênica, uma contribuição na ordem econômica, mas também na espiritual. Trabalhar não é só “cultivar o trigo” (dimensão das necessidades fisiológicas), mas também “cultivar a pureza”, dimensão esta, relacionada com a satisfação das necessidades espirituais. Por que apreciamos uma diferença tão acentuada entre essas culturas? Provavelmente, os diferentes graus de desenvolvimento dos povos levaram a isso. Enquanto entre os gregos primava uma divisão do trabalho, onde alguns tinham o status de “homens livres” dedicados à contemplação e ao ócio, outros não tinham escolha a não ser trabalhar, em uma situação de domínio em relação às naturezas daqueles que o empregaram. Esse não foi o caso dos caldeus, que possuía um escasso dividido trabalho, em que a todos se correspondia uma atividade laboriosa. -/- 3. A VISÃO DOS HEBREUS SOBRE O TRABALHO -/- No meio do caminho entre os caldeus e os gregos, encontramos a avaliação do trabalho feita pelos hebreus, dessa vez, tingindo de ambivalências. Tal como ponderava Hesíodo entre os gregos, para os hebreus, o trabalho se constituía de um mal necessário; em um meio para expiar os pecados; dessa vez não de Prometeu, mas de Adão e Eva. Vamos ver, no entanto, alguns aspectos mais complexos. A primeira coisa a se notar da perspectiva hebraica (compartilhada com o cristianismo) é o que se resulta da leitura do livro de Gênesis, aquela história poética e cheia de imagens para elucidar facilmente a origem da criação. Lá se estabelece a ideia de um deus criador-trabalhador: “No princípio Deus criou o céu e a terra [...] No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou [...] de toda a obra que realizara na criação”.(7) Esse Deus como primeira causa (São Tomás de Aquino (1225-1274)) denota laboriosidade seu correspondente descanso, um binômio que será fundamental para compreender a evolução do direito do trabalho e do direito ao descanso semanal contemporâneo. Digamos, em segundo lugar, que o Senhor Deus providenciou o trabalho no Éden: “O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivá-lo”.(8) Portanto, não é certa a ideia de que o trabalho é o resultado do pecado: ao contrário, é um trabalho árduo aquele que deriva do pecado segundo a tradição hebraico-cristã. Antes, na ausência do pecado, havia uma espécie de bom trabalho. Foi o pecado original, que levou Deus a condenar Adão e Eva, e por isso a toda a humanidade, a “ganhar o pão com o suor da sua testa”. “Por isso o Senhor Deus o mandou embora do jardim do Éden para cultivar o solo do qual fora tirado”. (9) O Talmude diz: “Se o homem não encontra seu alimento como animais e pássaros, precisa ganhá-los, isso se deve ao pecado”. Essa sentença, de caráter histórico, promove a ideia de trabalho como meio para expiar o pecado original, mas também como meio para produzir; isto é, legitimando a mudança inerente a todo trabalho e, portanto, legitimando também aquela vontade transformadora que caracterizou desde sempre os povos hebreus.(10) Agora, ao contrário dos caldeus, para os hebreus da antiguidade, o trabalho nunca teve um fim ético em si mesmo, mas foi constituído apenas como um meio. Essa visão esteve sempre presente, e caracteriza muito claramente a concepção que muitos integrantes de nossas sociedades contemporâneas possuem sobre o trabalho, além da religião de cada um. -/- 4. OS ROMANOS E O TRABALHO -/- Os romanos, por sua vez, deram uma importante contribuição para o desenvolvimento do conceito de trabalho. Se bem que, a grosso modo, não houvesse grandes diferenças com o pensamento dos gregos, com quem eles tinham em comum, além disso, uma maior divisão do trabalho fruto do desenvolvimento econômico e o uso massivo de mão de obra escrava(11); a maior contribuição do ponto de vista de sua originalidade histórica estava presente na tradição jurídica que inauguraria o Império Romano. O maior impacto por meios jurídicos e não filosóficos é explicado pelo fato de que os romanos, ao contrário dos gregos, não conseguiram “inspirar” a produção de grandes pensadores sociais. Com efeito, para os romanos, como o escravo não era considerado uma pessoa, o viam-no desprovido de personalidade jurídica. Isso conduziu a negação da relação de trabalho entre a pessoa encarregada de um trabalho manual (escravo) e seu dono. Tal relação correspondia, acima de tudo, ao direito de propriedade que os juristas romanos haviam garantido quase sem limites para seus cidadãos. O problema, como aponta Hopenhayn, surgiu quando o proprietário não ocupa seu escravo, mas aluga-o para terceiros. Surge assim a figura do arrendamento de serviços, que deriva do arrendamento das coisas. Porém, como na realidade o que se alugava era a força de trabalho, a qualidade jurídica desloca-se para a atividade realizada pelo escravo. Dessa forma, a atividade do trabalhador, primeiro do escravo, posteriormente do homem livre, começa a ser tratada como uma coisa, e se converte em antecedente do arrendamento de serviços do Direito Civil moderno. Ademais, na tradição romana, o trabalho manual estava desprestigiado. Cícero (106-43 a.C.) em De Officiis, estabeleceu com fria claridade “ipsa merces est auctoramentum servitius”(12) (todo trabalho assalariado é trabalho escravo). A vida era difícil para esses trabalhadores: nos territórios sob domínio romano, Augusto (63-14 a.C.) tinha imposto um tributo à todos os homens que exerciam algum tipo de trabalho manual, além do imposto à residência, às valas e outros mais particulares como o imposto para a detenção de porcos. Certamente, aqueles que levaram a pior parte no tempo da Roma Imperial foram os escravos (servi) sob domínio e propriedade de seus donos (domini). Me seus tempos de auge, a demanda de escravos em Roma era de 500.000 ao ano. Se compararmos com os 60.000 escravos negros trazidos a América nos anos de maior tráfico, teremos uma ideia mais ou menos exata da magnitude desse triste fenômeno. -/- 5. O CRISTIANISMO E O TRABALHO -/- As mensagens do cristianismo primitivo, são inseridas logo, nesse tempo histórico, onde Roma se tornava o centro das maiores mobilizações de rebeldia da antiguidade. Isaías, nesse sentido, proclamaria que o Messias viria: “[...] a pregar boas novas aos abatidos, a vendar aos quebrantados de coração, a publicar liberdade aos cativos, e aos presos a abertura do cárcere”.(13) Jesus, efetivamente, incluiu em sua missão, mensagens de libertação aos pobres e oprimidos. Porém, ao contrário do supracitado, como bem sinala Eric Roll (1907-2005), dos antigos profetas hebreus, não o faria saudando as comunidades tribais com seu espírito de grupo; mas animado por uma mensagem mais universal e permanente, proclamando uma mudança mais completa e integral na conduta do homem em sociedade, onde os valores de justiça e amor se colocariam em um primeiro plano. Evidentemente, a mensagem do cristianismo primitivo, e mais concretamente de Cristo, distava muito dos filósofos gregos. Deixemos que Roll explique: Temos visto que as doutrinas econômicas de Platão e, em certa medida, de Aristóteles, nasciam da aversão aristocrática ao desenvolvimento do comercialismo e da democracia. Seus ataques contra os males que acarreta o afã de acumular as riquezas são reacionárias: olham para trás, e o de Cristo olha para frente, pois exige uma mudança total, mas relações humanas. Aqueles sonhavam com um estado ideal destinado a proporcionar a “boa vida” para os cidadãos livres unicamente e cujas fronteiras eram as da cidade-estado daquele tempo; Cristo pretendeu falar por todos e para todos os homens. Platão e Aristóteles haviam justificado a escravidão; os ensinamentos de Cristo sobre a fraternidade entre todos os homens e o amor universal eram incompatíveis com a ideia da escravidão, apesar das opiniões expostas depois por São Tomás de Aquino. Os filósofos gregos, interessados somente pelos cidadãos, sustentaram opiniões muito rígidas sobre a diferente dignidade das classes de trabalho, e consideravam as ocupações servis, com exceção da agricultura, como próprias apenas para os escravos. Cristo, ao dirigir-se aos trabalhadores de seu tempo, proclamou pela primeira vez a dignidade de todas as classes de trabalho, assim materiais como espirituais (1942. p. 42 – Tradução própria). Não pode escapar desse estudo, o fato de que o próprio Jesus Cristo herdou o ofício de carpinteiro de seu “Pai” José; e que escolheu seus discípulos entre os pescadores e artesãos da região. Essa visão primitiva do cristianismo, no entanto, deve ser analisada no quadro das escrituras sagradas do Antigo Testamento que compartilha com a cultura (e obviamente a religião) hebraica. Nesse sentido, o trabalho não deixa de ser um meio, descartando-se como um fim em si mesmo. Mas, agora atribuindo-lhe um novo valor, sempre em tento um meio para um fim virtuoso: o trabalho será fundamental para permitir a satisfação das necessidades de cada um, mas também seus frutos, deverão ser inseridos em uma dimensão comunitária, onde o “próximo” necessitado esperará a contribuição fraterna e solidária do cristão. O trabalho, nessa perspectiva, não só possibilita o “tomar”, mas também o “dar”. Em relação a dupla perspectiva, é onde podemos entender a crítica do cristianismo a acumulação da riqueza. Como aponta o evangelista Mateus, “acumular o tesouro no céu, onde nem a traça nem a ferrugem os consomem, e onde os ladrões não perfuram nem roubam. Onde está o seu tesouro está seu coração”. (14) Com São Paulo se incorpora um novo componente valioso: a obrigatoriedade moral do trabalho. Em sua carta aos Tessalonicenses dita claramente “ao que não trabalha que não coma”. Diz São Paulo: Vocês sabem em que forma têm que nos imitar: nós trabalhamos enquanto estivemos entre vocês, não pedimos a ninguém um pão que não teríamos ganhado, senão que, de noite e dia, trabalhamos duramente até nos cansarmos, para não ser carga para nenhum de vocês [...] Além disso, quando estávamos com vocês lhes demos está regra: se alguém não quiser trabalhar, não coma. Mas agora ouvimos que há entre vocês alguns que vivem sem nenhuma disciplina e não fazem nada, muito ocupados em meter-se em tudo. A estes lhes mandamos e lhes rogamos, por Cristo Jesus, nosso Senhor, que trabalhem tranquilos para ganhar a vida (II Tes. 3:10). Essa frase, entendida somente no contexto de uma sociedade donde não existia um conceito de desemprego tal como entendemos atualmente, é curiosamente reproduzida pelo modelo soviético em pleno século XX. Com efeito, a Constituição da União Soviética estabeleceu em seu Artigo 12: “O trabalho é, na Rússia, uma questão de dever e de honra para todo cidadão fisicamente capaz. Essa obrigação é baseada no princípio: “quem não trabalha não come”. (15)(16) Para São Paulo, o trabalho deve ser o meio para ganhar a vida. Ele quis ser exemplo e enquanto pregava continuava trabalhando, presumivelmente como tecelão de tendas. A obrigatoriedade moral se aplica na medida em que a pessoa está em condições de o fazer. Para os incapacitados a fazê-lo (idosos, crianças, deficientes, doentes, acidentados etc.) existia a obrigatoriedade do socorro segundo a máxima do amor (ágape) ao próximo. Essas sentenças morais têm hoje em dia uma importante quota de explicação para com as contemporâneas políticas sociais. -/- 6. O TRABALHO NA IDADE MÉDIA -/- A Idade Média, período que ocupa desde o crepúsculo do Império Romano do Ocidente no século V pelos bárbaros, até o século XV, com a queda de Constantinopla, evidentemente mostra um conjunto importante de escolas e pensadores que marcaram pautas importantes para discernir o valor do trabalho nas diferentes culturas. A organização econômica mais visível nestes mil anos, onde operou o trabalho, consistia em extensões grandes de latifúndios errados do Império Romano (o sistema econômico denominado feudalismo), onde (mediante a falta de escravos) recorreu-se à mão de obra camponesa para o trabalho. O sistema, implicava o arrendamento de parte dessas terras a ex-escravos ou homens livres, em troca de uma renda em dinheiro e espécies, além do cultivo das próprias terras senhoriais. Por certo, a figura do servo não distava muito da do escravo se tivermos em conta as condições de funcionamento do contrato de trabalho. O comércio também teve seu lugar no sistema feudal, o mesmo adquiriu grande importância em certas regiões ou lugares, à exemplo de Constantinopla. A atividade econômica seguia seu rumo na história, e depois dos séculos IX e X, o crescimento das forças produtivas deu lugar a uma maior acumulação por parte de componentes e artesãos e, por certo, a uma maior apropriação de excedentes por parte do Senhor feudal. Essa situação foi ativante para a construção dos primeiros Burgos ou cidades, onde o comércio e a indústria artesanal teriam um marco mais adequado para o seu desenvolvimento. Essa é a etapa do nascimento dos primeiros grêmios corporativos (17). Então para o século XII, a estrutura feudal começa a desmoronar porque a produção de determinados bens começa a ser mais eficiente em cidades e não no feudo. O dinheiro, então, passou a ganhar maior peso que a terra, o que obriga os senhores feudais a aumentar seus rendimentos. Isso leva a um empobrecimento lógico dos camponeses, o que não dura muito, porque na primeira metade do século XIV, a maior parte dos servos alcança sua liberdade. Por sua vez, nessa apertada síntese da história econômica da Idade Média, devemos assinalar que pelo século XIV, e depois das Cruzadas e o posterior desenvolvimento do comércio internacional entre os impérios arábico e bizantino, inaugura-se uma etapa pré-capitalista que durará três séculos. É lá que se levanta mais energética a voz de alguns homens da Igreja contra a tendência à exaltação da riqueza já começava a avivar-se na Europa. São Tomás de Aquino, nesse sentido, não considerará ao comércio pré-capitalista bom ou natural. No entanto, ele o julgava inevitável uma vez que era o meio ao qual o comerciante tinha que manter a sua família. Dessa forma, os lucros do comércio não era outra coisa senão o fruto do trabalho. Se tratava, então, de colocar o acento na justiça da mudança efetuada, para o qual Aquino recorre a Aristóteles, cuja análise sobre o valor de mudança é figurado no seu estudo da Justiça. Muitos padres da Igreja, desde então, pretenderam formular um conceito de “preço justo”. Nesse sentido, o Cristianismo apresenta uma evolução do seu pensamento sobre o comércio que partia de uma visão absolutamente contrária ao começo da Idade Média (Santo Agostinho (354-430), São Jerônimo (347-420) etc.), a outra mais transacionável, que acompanhou, sobretudo, o pensamento de Aquino. Algo similar ocorreu com outro dos “preceitos” da Igreja em matéria econômica: a usura. Esta era considerada pela igreja como a melhor forma de obter lucro. O mesmo evangelista Lucas (século I d.C.) foi categórico ao rejeitar essa linha de operações. A lei hebraica também fez isso, e podemos encontrar no livro do Êxodo (22,25) tal proibição a respeito. Mais atrás no tempo, há antecedentes de condenação à usura entre os hindus (Rigveda, cerca de 1500 a.C.) e budistas (século VI d.C.), além do Islã mais próximo do nosso tempo (século VI d.C.). Ao princípio da Idade Média, como testemunha Roll, a proibição somente alcançava a Igreja, já que o escasso desenvolvimento mercantil não merecia outra coisa. No final da Idade Média, no entanto, que a situação é outra; e a prática secular foi orientada no sentido de promover o empréstimo de dinheiro cobrando por isso um juro. Alarmada ante esses fatos, a Igreja condena mais uma vez a usura no Terceiro Concílio de Latrão de 1179. No mesmo escreveu e ensinou São Tomé (século I d.C.) e outros discípulos da Igreja. No entanto, as práticas econômicas foram minando a autoridade eclesial e está terminou, através de sucessivas etapas, por aceitar, em certas condições e sob certas circunstâncias, a cobrança de juros sobre a concessão de um empréstimo. Em tal sentido, um dos autores mais representativos só início da Idade Média foi Santo Agostinho. Foi este um dos pilares, em seu tempo, das noções “anticapitalistas” que foram seguidas e complementadas por homens do tamanho de São João (347-407), São Ambrósio (340-397), São Clemente (150-215), São Cipriano (200-258) entre outros. (18) Santo Agostinho valoriza o trabalho recordando em tal sentido a São Paulo, a que cita com muita frequência em seus textos. Segundo o Bispo de Hipona, todo trabalho manual é bom pelas razões dadas pelo cristianismo primitivo. Concilia, além disso, seu dualismo platônico, ao sustentar que enquanto o homem trabalha tem a alma livre, de modo que é perfeitamente compatível pensar em Deus ao mesmo tempo em que se trabalha. Essa particular sintonia entre o trabalho e a oração foi perfeitamente posta a prova pelos monges beneditinos, cujo lema “Ora Et Labora” (orar e trabalhar) é paradigmático. “Trabalha e não desesperes” dizia seu fundador, São Bento de Núrsia (480-547), de seus monastérios distribuídos em um primeiro momento a Subiaco, no início do século VI. Também corresponde a São Bento uma sentença que perdura até o dia de hoje no imaginário moral sobre o trabalho: “Otiositas inimica est animae” (a ociosidade é inimiga da alma), tal qual diz uma expressão popular castelhana: “el ocio es la madre de todos los vicios” (o ócio é a mãe de todos os vícios). Tomás de Aquino, alguns séculos depois, continua a reflexão sobre o trabalho e estabelece uma hierarquia de profissões, onde localiza o trabalho agrícola e artesanal acima do comercial. Uma quota de originalidade na história do pensamento sobre o trabalho consistiu em considerá-lo como uma obrigação somente se necessário para subsistir; ou dito de outra maneira: quem não tem necessidade de trabalhar não tem que fazê-lo. Isso sim, à falta de trabalho, devia dedicar-se à oração e contemplação divina, atividades por certo mais elevadas para o autor da Suma Teológica. Logo, considerará que Deus é a causa primária, a que tudo deve a sua existência; por derivação, o homem é causa segunda, procurando atreves do trabalho “criar” em suas dimensões humanas. “Entre todas as formas com que a criatura humana tenta realizar a semelhança divina, não há outra de relevo mais destacado que a de trabalhar, isto é, ser em o mundo causa novos efeitos”, disse o Santo. (19) Aquino, além disso, utilizando categorias platônicas, hierarquiza o trabalho, considerando o intelectual acima do manual. Chama “artes servis” a estes últimos, enquanto que o trabalho intelectual corresponde ao conjunto das “artes liberais”, dignas de maior remuneração ao fazer uso da inteligência. Esta distinção própria da Escolástica, dá lugar à divisão clássica entre as 7 artes liberais: o Trívium (gramática, retórica e dialética) e quadrivium (astronomia, geometria, aritmética e música). Outras contribuições de São Aquino têm a ver com sua posição diante do trabalho agrícola ao qual o considera como o melhor meio para assegurar a subsistência de um povo; a maior importância dada à vida contemplativa sobre a ativa, embora considerando a primeira como “laboriosa”; sua posição sobre a escravidão, que não considerava como natural, no entanto, entendê-la “útil”(20); e sua interpretação sobre o contrato de trabalho: neste, o operário não vende a si mesmo, nem seu corpo, nem sua inteligência, nem sequer sua faculdade de trabalho. Isso significa que o Direito Natural proíbe considerar o trabalho como um objeto de mudança. Propõe, em vez disso, considerar o contrato como um arrendamento de serviço. Em termos gerais, a valorização que sobre o trabalho se realiza na Idade Média, rebaixando ao trabalho manual em relação a outras tarefas, fica explícita na divisão tripartida que recorre, entre outros, Adalberão Bispo de Laon (947-1030): “Triplex Dei ergo domus est quae Creditor uma nunca oran, alii pugnat, Aliique laborant” (ternária é a casa do Senhor e não uma: aqui sobre a terra uns oram, outros lutam e outros trabalham). Não gostaria de deixar passar por alto, finalmente, entre os movimentos originados na Idade Média, a contribuição que sobre o tema do trabalho teve a ordem franciscana. Essa, contra o que muitos podem crer, é uma ordem não mendicante no sentido estrito, mas sim trabalhadora e de pobreza. São Francisco de Assis (1181/82-1226), no final do século XII, marcaria como ninguém dentro do cristianismo, uma vida ascética baseada no trabalho e na pobreza. Inclui, além disso, um elemento pela primeira vez descoberto na cultura europeia: o sentido da alegria que acompanha o trabalho. “Essa condição de 'suor de sua testa' com 'a alegria de seu coração' outorga ao trabalho uma condição diferenciada”. Avançando então na história da humanidade, entramos na época moderna, caracterizada por cinco grandes eventos: -/- 1. A decadência do poder moral da Igreja e o enfraquecimento de seu poder econômico frente ao da crescente burguesia; -/- 2. O renascimento intelectual e artístico; -/- 3. As viagens paras as índias e a descoberta da América; -/- 4. A formação e a constituição dos Estados-nação; -/- 5. As reformas religiosas de Lutero (1483-1546) e Calvino (1509-1564). -/- Nesse contexto, os séculos XV e XVI mostraram como o mercantilismo ia avançando apesar dos esforços de alguns pensadores da Igreja que eventualmente perderam o pulso diante do desenrolar dos acontecimentos. Sucessivas encíclicas papais terminaram por legitimar o interesse nos empréstimos e, por meio desta, levou-se a maior acumulação de riquezas por parte dos banqueiros. Esse foi o meio ideal para o desenvolvimento da atividade do mercador, para quem, o trabalho passou a ser considerado um meio para obter sucesso. Ao dinamizar-se a atividade econômica e mercantil, a visão humanista do trabalho começa a perder valor, realçando-se ao mesmo como um simples meio para fins de enriquecimento. Talvez a exceção a essa noção estendida entre os novos atores tenha sido a proporcionada pelo humanismo renascentista. Para Campanella (1568-1639), por exemplo, sua “Cidade solar”, não existe o divórcio entre trabalho manual e intelectual, isso quando o segundo começa a ser supervalorizado por sua ação no plano das invenções e das novas técnicas.(22) Na mesma linha se situa Thomas More (1478-1535), o autor de “Utopia”, outra reação do cristianismo às projeções que estava adquirindo o cada vez mais influente mercantilismo. Embora o trabalho não seja considerado como um mau, pelo contrário, apresenta características humanizadoras, é sugestivo comprovar como em Utopia a jornada do trabalho não supera as seis horas diárias e na Cidade solar não se devia trabalhar mais que quatro horas. Indubitavelmente, essas versões de sociedades ideais terminariam por impactar sobre maneira a constituição das Missões Jesuítas na América do Sul; e as Franciscanas na Baixa Califórnia. É o Renascimento, o lugar propício, além disso, para renovar o conceito da virtuosidade, agora traduzida na figura do empresário ou financista audacioso e empreendedor. Essa linha foi reforçada logo por Calvino, para quem os negócios são um bom serviço a Deus, e a riqueza não é mais que um fruto de uma vida dedicada ao trabalho desde uma perspectiva ética que analisarei com Weber mais tarde, mas que confere ao trabalho a particularidade de ser um caminho para o sucesso. Esse puritanismo impulsionou sobremaneira a versão do “homo economicus” que mais tarde, em pleno auge do capitalismo pós-industrial, ao qual, segundo Daniel Bell (1919-2011), fora substituído pelos valores hedonistas. -/- REFERENCIAL TEÓRICO AGOSTINHO. Cidade de Deus: contra os pagãos. Trad. O. P. Leme. 2ª ed. Bragança Paulista: Editora Universitária, 2008. (Col. Pensamento humano). _____________. O livre-arbítrio. Trad. N. A. Oliveira. 1ª ed. São Paulo: Paulus, 1995. AQUINO, T. de. Suma Teológica. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2001. ARENDT, H. A condição humana. Trad. Roberto Raposo. Posfácio de Celso Lafer. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007. ARISTÓTELES. Política. Trad. A. C. Amaral e Carlos Gomes. 1ª ed. Lisboa: Vega, 1998. ARVON, H. A filosofia do trabalho. Trad. João Carlos Cunha. 1ª ed. Lisboa: Socicultur, 1961. AUGUSTI, J. C. W. Corpus Librorum symbolicorum. 1ª ed. Elberfeldi, 1827. BAVA, A. C. Introdução a sociologia do trabalho. 1ª ed. São Paulo: Ática, 1990. BÍBLIA SAGRADA. Trad. J. F. Almeida. Rio de Janeiro: King Cross, 2008. BOMENY, H. et al. Tempos modernos, tempos de sociologia. 2ª ed. São Paulo: Editora do Brasil, 2013. CAMUS, A. O mito de Sísifo. In: FALABRETTI, E.; OLIVEIRA, J. Filosofia: o livro das perguntas. 1ª ed. Curitiba: IESDE, 2011. ELDERS, L. J. O Pensamento de Santo Tomás de Aquino sobre o Trabalho. Trad. D. N. Pêcego. Aquinat, n° 9, (2009), 2-12. ISBN 1808-5733. FOSSIER, R. O trabalho na Idade Média. Trad. Marcelo Barreiro. 1ª ed. Petrópolis: Vozes, 2019. FRIEDMANN, G.; NAVILLE, P. Tratado de Sociologia do Trabalho. 1ª ed. São Paulo: Cultrix, 1973. HERZOG, J. S. Historia del pensamiento económico-social: de la antigüedad al siglo XVI. 4ª ed. México: FCE, 1939. HOPENHAYN, M. El Trabajo, itinerario de um concepto. 1ª ed. Santiago: PET, 1988. _________________. Repensar el trabajo – Historia, profusión y perspectivas de un concepto. 1ª ed. Buenos Aires: Norma, 2001. LUDWIG, E. Stalin. 1ª ed. Rio de Janeiro: Calvino, 1943. MACHADO, I. J. de R.; AMORIM, H. J. D.; BARROS, C. R. de. Sociologia hoje. 1ª ed. São Paulo: Ática, 2013. MERCURE, D.; SPURK, J. (Orgs.). O Trabalho na história do pensamento Ocidental. Petrópolis: Vozes, 2005. NOGUERA, J. A. El concepto de trabajo y la teoría social crítica. Barcelona: Papers, 2002. O'CONNOR, D. J. Historia crítica de la filosofía occidental. Tomo I – La filosofía en la antigüidad. 1ª ed. Buenos Aires: Paidós, 1967. OLIVEIRA, P. S. de. Introdução a sociologia. 24ª ed. 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La cobertura universal de salud está en el centro de la acción actual para fortalecer los sistemas de salud y mejorar el nivel y la distribución de la salud y los servicios de salud. Este documento es el informe fi nal del Grupo Consultivo de la OMS sobre la Equidad y Cobertura Universal de Salud. Aquí se abordan los temas clave de la justicia (fairness) y la equidad que surgen en el camino hacia la cobertura universal de salud. Por lo (...) tanto, el informe es pertinente para cada agente que infl uye en ese camino y en particular para los gobiernos, ya que se encargan de supervisar y guiar el progreso hacia la cobertura universal de salud. (shrink)
This book deals with an internal theme of metaphysics, which is the metaphysics of the laws of nature. The author presents traditional contemporary theories, as well as his own original theory, and evaluates each one at a time. He also addresses the problem of the modality of the laws of nature and makes some criticism of the standard view of necessity as truth in all possible worlds, and shows an application of his discussion to the metaphysics of physics. / Este (...) livro trata de um tema interno à metafísica, que é a metafísica das leis da natureza. O autor apresenta as teorias tradicionais contemporâneas, tal como também a sua própria teoria original, e avalia cada uma delas por vez. Ele também aborda o problema da modalidade das leis da natureza e apresenta uma certa crítica à visão padrão da necessidade como verdade em todos os mundos possíveis, e mostra uma aplicação da sua discussão à metafísica da Física. (shrink)
This book talks about the city's reception of philosophy. The purpose of this chapter is to show that philosophy is essential for the maintenance of human security in our cities. The importance of this apology for philosophy is precisely to undo a common but erroneous conception of the nature and disadvantages of this discipline and to politically base its existence. To do this, we will present a characterization of philosophy and some of the most important criticisms of its development within (...) the city, and show that they are not sustainable. Subsequently, we will approach the concept of human security, constructed by Amartya Sen and Obuchi Keizo, and indicate how philosophy is fundamental to its preservation. /// Este livro fala sobre a recepção da filosofia pela cidade. O objetivo deste capítulo é mostrar que a filosofia é essencial para a manutenção da segurança humana de nossas cidades. A importância dessa apologia da filosofia é justamente desfazer uma concepção comum, porém errônea, da natureza e das desvantagens dessa disciplina e fundamentar politicamente sua existência. Para fazermos isso, apresentaremos uma caracterização de filosofia e algumas das mais importantes críticas ao seu desenvolvimento no seio da cidade, e mostraremos que elas não se sustentam. Posteriormente, abordaremos o conceito de segurança humana, construído por Amartya Sen e Obuchi Keizo, e indicaremos como a filosofia é fundamental para a sua preservação. (shrink)
O objetivo deste livro é propor uma reflexão sobre o ideário de centro, se perguntando se ele seria possível e como. Preferi chamar de “Uma Ideologia de Centro” em vez de “Ideário”, pois o termo “Ideologia” é instigante para um título. Entretanto tenho a noção de que essa palavra é bastante carregada de significados teóricos. No modelo marxista, grosso modo, a ideologia é um conjunto de crenças, construído pela parcela dominante da sociedade, para naturalizar a dominação. Não é nesse sentido (...) que utilizo o termo “ideologia”. Gostaria de um significado mais neutro para ele, tal como um conjunto de crenças, valores e/ou ações que respeita um conjunto de princípios. Nesse sentido, podemos pensar em uma ideologia para a direita política, para a esquerda política e para o centro político. Normalmente dividimos o espectro político de acordo com esses princípios; entretanto outras divisões são possíveis, ou ainda pode ser o caso que nenhuma divisão seja realmente objetiva. Como devemos, então, pensar essa divisão? Quais princípios subjazem as ações de diferentes atores políticos? Numa época de polarização política entre esquerda e direita, faz sentido refletirmos sobre posições mais moderadas? Qual conjunto de crenças, valores e ações poderia constituir moderação no cenário atual? Nosso livro tenta trazer uma reflexão sobre o ideário de centro, apresentando pensadores que refletem sobre a possibilidade de estabelecermos um centro, sobre a relação entre a ciência e o centro, sobre reformas centristas, entre outras coisas. Nossa intenção é que este livro promova uma reflexão inicial estimulante, e não a palavra final sobre as ideias apresentadas. Nesse sentido, este livro é ensaístico e tenta produzir algo original, ainda que incompleto. Nosso livro não têm uma unidade de visão; e acreditamos que isso é um mérito, pois não tenta estabelecer, em definitivo, se há e o que é o centro, mas nos leva a pensar sobre o conceito. A reflexão filosófica tem a característica de nos aprofundar nas questões investigadas. Podemos não chegar numa resposta final, mas nosso conhecimento sobre o problema e sobre as respostas para ele aprimoram nossa capacidade reflexiva. Pode-se acabar não concordando com nada do que aqui foi escrito. Maravilha! Se esse é o caso, o mais importante é saber por que não concordamos e construirmos nossa própria crítica argumentativa. Mas não paremos na crítica; construamos também uma teoria positiva, uma visão de mundo. É a partir do processo de criação, crítica, destruição e reconstrução, que tornamos mais fortes as nossas visões de mundo. Parafraseando a maior celebridade filosófica de todos os tempos, Sócrates: a vida só vale realmente a pena, se refletida. (shrink)
Apresentamos neste artigo explicitações histórico-conceituais sobre o surgimento da predicação lógica contemporânea. Quando se trata de predicação, remete-se de imediato à obra de Aristóteles, mas, com as transformações trazidas pela Lógica Contemporânea, o estudo da predicação deixa o plano do estudo lógico-gramatical para o estudo do plano da análise lógicomatemática. Veremos, nesse sentido, a importância dos trabalhos de Peirce, Frege e Russell para o surgimento da predicação lógica contemporânea. Embora Peirce tenha sido o precursor da introdução do conceito de função (...) proposicional na História da Lógica, ganha destaque, contemporaneamente, o modelo de interpretação da predicação inicialmente proposto por Frege. (shrink)
The analysis of logical predication has long philosophical tradition in which one of the central subjects of study is the analysis of the logical form of the proposition. We contemporaneously can say that the way more well-finished of logic predication is propositional function. Historically, the propositional function arises as a logical analysis of the proposition scheme resulting from the convergence of mathematics and logic between the XIX and XX centuries. Two of the main responsible for this convergence were Gottlob Frege (...) (1848 - 1925) and Bertrand Russell (1872-1970). Influenced by Frege's ideas and direct heir of Russell, having been a disciple of this in Cambridge, Ludwig Wittgenstein (1889 - 1951) has become, in view of the originality of his thought, one of the most discussed and commented thinkers of the twentieth century, especially with the publication of his work entitled "Tractatus Logico-Philosophicus" (1921). It's in this work that Wittgenstein more considers himself debtor from Frege and Russell, having left explicit mention to them. Then the question that guides the development of this thesis is: what is the meaning of the propositional function of Frege and Russell in the Wittgenstein's Tractatus (1921)? Our goal is, in this sense, to investigate the meaning of the concept of propositional function in the Tractatus (1921). Our starting point is to understand the meaning of the propositional function in Frege and Russell to understand its meaning in the Tractatus (1921). We will focus our analysis on what Wittgenstein calls "propositional variable" (Satzvariable), term that best approximates, in our view, of the propositional function of Frege and Russell. In this sense, our interpretative question was formulated as: what is the meaning of the concept of propositional variable in the Tractatus (1921)? We defend the thesis that the role of the propositional function in Frege and Russell corresponds to the role of the propositional variable in Wittgenstein. (shrink)
This classic collection of essays, first published in 1968, represents H.L.A. Hart's landmark contribution to the philosophy of criminal responsibility and punishment. Unavailable for ten years, this new edition reproduces the original text, adding a new critical introduction by John Gardner, a leading contemporary criminal law theorist.
This report from the WHO Consultative Group on Equity and Universal Health Coverage offers advice on how to make progress fairly towards universal health coverage.
Benchmarking automated theorem proving (ATP) systems using standardized problem sets is a well-established method for measuring their performance. However, the availability of such libraries for non-classical logics is very limited. In this work we propose a library for benchmarking Girard's (propositional) intuitionistic linear logic. For a quick bootstrapping of the collection of problems, and for discussing the selection of relevant problems and understanding their meaning as linear logic theorems, we use translations of the collection of Kleene's intuitionistic theorems in the (...) traditional monograph "Introduction to Metamathematics". We analyze four different translations of intuitionistic logic into linear logic and compare their proofs using a linear logic based prover with focusing. In order to enhance the set of problems in our library, we apply the three provability-preserving translations to the propositional benchmarks in the ILTP Library. Finally, we generate a comprehensive set of reachability problems for Petri nets and encode such problems as linear logic sequents, thus enlarging our collection of problems. (shrink)
This study aims to make for a better understanding of the term 'Aspects' in linguistic theory. Its most current application is found in studies on Slavonic languages. In the abundant literature on the contrast between the Durative (or Imperfective) Aspect and the Nondurative (or Perfective) Aspect, their occurrence has been taken to be restricted to Slavonic and some other languages, generally speaking to languages whose Verbal systems are morphologically characte.rized with regard to this opposition. The central hypothesis of transformational-generative theory (...) that a dis- tinction should be made between the deep structure and the surface structure of a language, entails the possibility for morphological systematicity to be nothing more than a manifestation of a general or even universal re- gularity expressed, for example, in the syntactic component of grammers of other languages. It will be shown in this study that the opposition between the two Aspects is present in Dutch, and as can be seen from the translated material, also in English, and that it should be described as the expression of regularities of a primarily syntactic-semantic nature. (shrink)
Jordan agreed to extensive liberalization undertakings under the General Agreement on Trade in Services (“GATS”) that would open some sectors that were previously closed or restricted to foreign suppliers and investors. It undertook horizontal commitments in cross-border movement of individuals and commercial presence covering all types of services.
It has recently been argued that indeterminacy and indeterminism make most ordinary counterfactuals false. I argue that a plausible way to avoid such counterfactual skepticism is to postulate the existence of primitive modal facts that serve as truth-makers for counterfactual claims. Moreover, I defend a new theory of ‘might’ counterfactuals, and develop assertability and knowledge criteria to suit such unobservable ‘counterfacts’.
A moderately risk averse person may turn down a 50/50 gamble that either results in her winning $200 or losing $100. Such behaviour seems rational if, for instance, the pain of losing $100 is felt more strongly than the joy of winning $200. The aim of this paper is to examine an influential argument that some have interpreted as showing that such moderate risk aversion is irrational. After presenting an axiomatic argument that I take to be the strongest case for (...) the claim that moderate risk aversion is irrational, I show that it essentially depends on an assumption that those who think that risk aversion can be rational should be skeptical of. Hence, I conclude that risk aversion need not be irrational. (shrink)
In a recent essay, Donald Dripps advanced what he calls a “commodification theory” of rape, offered as an alternative to understanding rape in terms of lack of consent. Under the “commodification theory,” rape is understood as the expropriation of sexual services, i.e., obtaining sex through “illegitimate” means. One aim of Dripps's effort was to show the inadequacy of consent approaches to understanding rape. Robin West, while accepting Dripps's critique of consent theories, criticizes Dripps's commodification approach. In its place, West suggests (...) a more phenomenological approach. The author argues that neither Dripps nor West offers convincing critiques of consent-based theories; the alternatives they offer presuppose the vitality of a consent-based approach to understanding rape; and that both Dripps and West consistently conflate more general moral and political issues with that of the nature of rape. (shrink)
Philosophers have long been interested in a series of interrelated questions about natural kinds. What are they? What role do they play in science and metaphysics? How do they contribute to our epistemic projects? What categories count as natural kinds? And so on. Owing, perhaps, to different starting points and emphases, we now have at hand a variety of conceptions of natural kinds—some apparently better suited than others to accommodate a particular sort of inquiry. Even if coherent, this situation isn’t (...) ideal. My goal in this article is to begin to articulate a more general account of ‘natural kind phenomena’. While I do not claim that this account should satisfy everyone—it is built around a certain conception of the epistemic role of kinds and has an obvious pragmatic flavour—I believe that it has the resources to go further than extant alternatives, in particular the homeostatic property cluster view of kinds. (shrink)
This book is a translation of W.V. Quine's Kant Lectures, given as a series at Stanford University in 1980. It provide a short and useful summary of Quine's philosophy. There are four lectures altogether: I. Prolegomena: Mind and its Place in Nature; II. Endolegomena: From Ostension to Quantification; III. Endolegomena loipa: The forked animal; and IV. Epilegomena: What's It all About? The Kant Lectures have been published to date only in Italian and German translation. The present book is filled out (...) with the translator's critical Introduction, "The esoteric Quine?" a bibliography based on Quine's sources, and an Index for the volume. (shrink)
In this paper, I will reread the history of molecular genetics from a psychoanalytical angle, analysing it as a case history. Building on the developmental theories of Freud and his followers, I will distinguish four stages, namely: (1) oedipal childhood, notably the epoch of model building (1943–1953); (2) the latency period, with a focus on the development of basic skills (1953–1989); (3) adolescence, exemplified by the Human Genome Project, with its fierce conflicts, great expectations and grandiose claims (1989–2003) and (4) (...) adulthood (2003–present) during which revolutionary research areas such as molecular biology and genomics have achieved a certain level of normalcy—have evolved into a normal science. I will indicate how a psychoanalytical assessment conducted in this manner may help us to interpret and address some of the key normative issues that have been raised with regard to molecular genetics over the years, such as ‘relevance’, ‘responsible innovation’ and ‘promise management’. (shrink)
Accounts of the concepts of function and dysfunction have not adequately explained what factors determine the line between low‐normal function and dysfunction. I call the challenge of doing so the line‐drawing problem. Previous approaches emphasize facts involving the action of natural selection (Wakefield 1992a, 1999a, 1999b) or the statistical distribution of levels of functioning in the current population (Boorse 1977, 1997). I point out limitations of these two approaches and present a solution to the line‐drawing problem that builds on the (...) second one. (shrink)
If I were asked to put forward an ethical principle which I considered to be especially certain, it would be that no one can be responsible, in the properly ethical sense, for the conduct of another. Responsibility belongs essentially to the individual. The implications of this principle are much more far-reaching than is evident at first, and reflection upon them may lead many to withdraw the assent which they might otherwise be very ready to accord to this view of responsibility. (...) But if the difficulties do appear to be insurmountable, and that, very certainly, does not seem to me to be the case, then the proper procedure will be, not to revert to the barbarous notion of collective or group responsibility, but to give up altogether the view that we are accountable in any distinctively moral sense. (shrink)
The Bayesian maxim for rational learning could be described as conservative change from one probabilistic belief or credence function to another in response to newinformation. Roughly: ‘Hold fixed any credences that are not directly affected by the learning experience.’ This is precisely articulated for the case when we learn that some proposition that we had previously entertained is indeed true (the rule of conditionalisation). But can this conservative-change maxim be extended to revising one’s credences in response to entertaining propositions or (...) concepts of which one was previously unaware? The economists Karni and Vierø (2013, 2015) make a proposal in this spirit. Philosophers have adopted effectively the same rule: revision in response to growing awareness should not affect the relative probabilities of propositions in one’s ‘old’ epistemic state. The rule is compelling, but only under the assumptions that its advocates introduce. It is not a general requirement of rationality, or so we argue. We provide informal counterexamples. And we show that, when awareness grows, the boundary between one’s ‘old’ and ‘new’ epistemic commitments is blurred. Accordingly, there is no general notion of conservative change in this setting. (shrink)
I argue, first, that the deprived individuals whose predicaments Nussbaum cites as examples of "adaptive preference" do not in fact prefer the conditions of their lives to what we should regard as more desirable alternatives, indeed that we believe they are badly off precisely because they are not living the lives they would prefer to live if they had other options and were aware of them. Secondly, I argue that even where individuals in deprived circumstances acquire tastes for conditions that (...) we regard as bad, they are typically better off having their acquired preferences satisfied. If they are badly off it is because they cannot get what we and they, would regard as more desirable alternatives. Preference utilitarianism explains why individuals in such circumstances are badly off whether they have adapted to their deprived circumstances or not. Even if they prefer the conditions of their lives to all other available alternatives, most would prefer alternatives that are not available to them which would, on the preferentist account, make them better off. And that, on the preferentist account, is the basis for a radical critique of unjust institutions that limit people's options and prevent them from getting what they want. (shrink)
This paper aims at showing that the generative-semantic framework is not essential to the proposal in H.J. Verkuyl On the Compositional Nature of the Aspects Reidel:Dordrecht 1972. Compositionality can be shown to be neutral as to the then-difference between generative-semantic and the interpretive-semantic branch of transformational grammar.
This book examines the legal and moral theory behind the law of evidence and proof, arguing that only by exploring the nature of responsibility in fact-finding can the role and purpose of much of the law be fully understood. Ho argues that the court must not only find the truth to do justice, it must do justice in finding the truth.
Population axiology concerns how to evaluate populations in terms of their moral goodness, that is, how to order populations by the relations “is better than” and “is as good as”. The task has been to find an adequate theory about the moral value of states of affairs where the number of people, the quality of their lives, and their identities may vary. So far, this field has largely ignored issues about uncertainty and the conditions that have been discussed mostly pertain (...) to the ranking of risk-free outcomes. Most public policy choices, however, are decisions under uncertainty, including policy choices that affect the size of a population. Here, we shall address the question of how to rank population prospects—that is, alternatives that contain uncertainty as to which population they will bring about—by the relations “is better than” and “is as good as”. We start by illustrating how well-known population axiologies can be extended to population prospect axiologies. And we show that new problems arise when extending population axiologies to prospects. In particular, traditional population axiologies lead to prospect-versions of the problems that they praised for avoiding in the risk-free settings. Finally, we identify an intuitive adequacy condition that, we contend, should be satisfied by any population prospect axiology, and show how given this condition, the impossibility theorems in population axiology can be extended to (non-trivial) impossibility theorems for population prospect axiology. (shrink)
Similarly to other accounts of disease, Christopher Boorse’s Biostatistical Theory (BST) is generally presented and considered as conceptual analysis, that is, as making claims about the meaning of currently used concepts. But conceptual analysis has been convincingly critiqued as relying on problematic assumptions about the existence, meaning, and use of concepts. Because of these problems, accounts of disease and health should be evaluated not as claims about current meaning, I argue, but instead as proposals about how to define and use (...) these terms in the future, a methodology suggested by Quine and Carnap. I begin this article by describing problems with conceptual analysis and advantages of “philosophical explication,” my favored approach. I then describe two attacks on the BST that also question the entire project of defining “disease.” Finally, I defend the BST as a philosophical explication by showing how it could define useful terms for medical science and ethics. (shrink)
The scientific community, we hold, often provides society with knowledge—that the HIV virus causes AIDS, that anthropogenic climate change is underway, that the MMR vaccine is safe. Some deny that we have this knowledge, however, and work to undermine it in others. It has been common to refer to such agents as “denialists”. At first glance, then, denialism appears to be a form of skepticism. But while we know that various denialist strategies for suppressing belief are generally effective, little is (...) known about which strategies are most effective. We see this as an important first step toward their remediation. This paper leverages the approximate comparison to various forms of philosophical skepticism to design an experimental test of the efficacy of four broad strategies of denial at suppressing belief in specific scientific claims. Our results suggest that assertive strategies are more effective at suppressing belief than questioning strategies. (shrink)
Many existing biomedical vocabulary standards rest on incomplete, inconsistent or confused accounts of basic terms pertaining to diseases, diagnoses, and clinical phenotypes. Here we outline what we believe to be a logically and biologically coherent framework for the representation of such entities and of the relations between them. We defend a view of disease as involving in every case some physical basis within the organism that bears a disposition toward the execution of pathological processes. We present our view in the (...) form of a list of terms and definitions designed to provide a consistent starting point for the representation of both disease and diagnosis in information systems in the future. (shrink)
What role does the wild duck play in Ibsen 's famous drama? I argue that, besides mirroring the fate of the human cast members, the duck is acting as animal subject in a quasi-experiment, conducted in a private setting. Analysed from this perspective, the play allows us to discern the epistemological and ethical dimensions of the new scientific animal practice emerging precesely at that time. Ibsen 's play stages the clash between a scientific and a romantic understanding of animals that (...) still constitutes the backdrop of most contemporary debates over animals in research. Whereas the scientific understanding reduces the animal 's behaviour, as well as its environment, to discrete and modifiable elements, the romantic view regards animals as being at one with their natural surroundings. (shrink)
Presence as ordinarily understood requires spatio-temporal proximity. If however Christ’s presence in the Eucharist is understood in this way it would take a miracle to secure multiple location and an additional miracle to cover it up so that the presence of Christ where the Eucharist was celebrated made no empirical difference. And, while multiple location is logically possible, such metaphysical miracles—miracles of distinction without difference, which have no empirical import—are problematic. I propose an account of Eucharist according to which Christ (...) is indeed really and objectively present in the religiously required sense, without benefit of metaphysical miracles. According to the proposed account, which draws upon Searle’s discussion of “social ontology” in The Construction of Social Reality and The Making of the Social World, the presence of Christ in the Eucharist is an institutional fact. I argue that such an account satisfies the requirements for a real presence doctrine. (shrink)
Many philosophers are impressed by the progress achieved by physical sciences. This has had an especially deep effect on their ontological views: it has made many of them physicalists. Physicalists believe that everything is physical: more precisely, that all entities, properties, relations, and facts are those which are studied by physics or other physical sciences. They may not all agree with the spirit of Rutherford's quoted remark that 'there is physics; and there is stamp-collecting',' but they all grant physical science (...) a unique ontological authority: the authority to tell us what there is. Physicalism is now almost orthodox in much philosophy, notably in much recent philosophy of mind. But although often invoked, it is rarely explicitly defined. It should be. The claim that everything is physical is not as clear as it seems. In this paper, we examine a number of proposed definitions of physicalism and reasons for being a physicalist. We will argue both that physicalism lacks a clear and credible definition, and that in no non-vacuous interpretation is it true. We are concerned here only with physicalism as a doctrine about the empirical world. In particular, it should not be confused with nominalism, the doctrine that there are no universals.2 Nominalism and physicalism are quite independent doctrines. Believers in universals may as consistently assert as deny that the only properties and relations are those studied by physical science. And nominalists may with equal consistency assert or deny that physical science could provide enough predicates to describe the world. That is the question which concerns physicalists, not whether physical predicates name real universals. (We will for brevity write as if they do, but we do not need that assumption.). (shrink)
In response to Fred Adams and Charlotte Shreve’s (2016) paper entitled “What Can Synesthesia Teach Us about Higher Order Theories of Consciousness?”, previously published in Symposion, I argue that H.O.T. theory does have the resources to account for synesthesia and the specific worries that they advance in their paper, such as the relationship between concepts and experience and the ability to handle instances of ‘pop-out’ experiences.
The doctrine that Christ is really present in the Eucharist appears to entail that Christ's body is not only multiply located but present in different ways at different locations. Moreover, the doctrine poses an even more difficult meta-question: what makes a theological explanation of the Eucharist a ‘real presence’ account? Aquinas's defence of transubstantiation, perhaps the paradigmatic account, invokes Aristotelian metaphysics and the machinery of Scholastic philosophy. My aim is not to produce a ‘rational reconstruction’ of his analysis but rather (...) to suggest a metaphysically innocent alternative that will ‘save the phenomena’ of religious belief and practice.Send article to KindleTo send this article to your Kindle, first ensure no-reply@cambridge.org is added to your Approved Personal Document E-mail List under your Personal Document Settings on the Manage Your Content and Devices page of your Amazon account. Then enter the ‘name’ part of your Kindle email address below. Find out more about sending to your Kindle. Find out more about sending to your Kindle. Note you can select to send to either the @free.kindle.com or @kindle.com variations. ‘@free.kindle.com’ emails are free but can only be sent to your device when it is connected to wi-fi. ‘@kindle.com’ emails can be delivered even when you are not connected to wi-fi, but note that service fees apply. Find out more about the Kindle Personal Document Service.The real presenceVolume 49, Issue 1H. E. BABER DOI: https://doi.org/10.1017/S0034412512000121Your Kindle email address Please provide your Kindle email.@free.kindle.com@kindle.com Available formats PDF Please select a format to send. By using this service, you agree that you will only keep articles for personal use, and will not openly distribute them via Dropbox, Google Drive or other file sharing services. Please confirm that you accept the terms of use. Cancel Send ×Send article to Dropbox To send this article to your Dropbox account, please select one or more formats and confirm that you agree to abide by our usage policies. If this is the first time you use this feature, you will be asked to authorise Cambridge Core to connect with your account. Find out more about sending content to Dropbox. The real presenceVolume 49, Issue 1H. E. BABER DOI: https://doi.org/10.1017/S0034412512000121Available formats PDF Please select a format to send. By using this service, you agree that you will only keep articles for personal use, and will not openly distribute them via Dropbox, Google Drive or other file sharing services. Please confirm that you accept the terms of use. Cancel Send ×Send article to Google Drive To send this article to your Google Drive account, please select one or more formats and confirm that you agree to abide by our usage policies. If this is the first time you use this feature, you will be asked to authorise Cambridge Core to connect with your account. Find out more about sending content to Google Drive. The real presenceVolume 49, Issue 1H. E. BABER DOI: https://doi.org/10.1017/S0034412512000121Available formats PDF Please select a format to send. By using this service, you agree that you will only keep articles for personal use, and will not openly distribute them via Dropbox, Google Drive or other file sharing services. Please confirm that you accept the terms of use. Cancel Send ×Export citation Request permission. (shrink)
This paper examines the metaphysically modest view that attributionsof normative reasons can be made true in the absence of a responseindependent normative reality. The paper despairs in finding asatisfactory account of normative reasons in metaphysically modestterms.
A brief account of karma and transmigration is followed by an introduction to Indian ways of assessing arguments. The body of the work canvasses the systems of Nyaya Vaisesika, Buddhism, Jainism, Samkhya and Advaita Vedanta.
Some time ago, Joel Katzav and Brian Ellis debated the compatibility of dispositional essentialism with the principle of least action. Surprisingly, very little has been said on the matter since, even by the most naturalistically inclined metaphysicians. Here, we revisit the Katzav–Ellis arguments of 2004–05. We outline the two problems for the dispositionalist identified Katzav in his 2004 , and claim they are not as problematic for the dispositional essentialist at it first seems – but not for the reasons espoused (...) by Ellis. (shrink)
We introduce here evoText, a new tool for automated analysis of the literature in the biological sciences. evoText contains a database of hundreds of thousands of journal articles and an array of analysis tools for generating quantitative data on the nature and history of life science, especially ecology and evolutionary biology. This article describes the features of evoText, presents a variety of examples of the kinds of analyses that evoText can run, and offers a brief tutorial describing how to use (...) it. (shrink)
A number of influential biologists are currently pursuing efforts to restore previously extinct species. But for decades, philosophers of biology have regarded “de-extinction” as conceptually incoherent. Once a species is gone, it is gone forever. We argue that a range of metaphysical, biological, and ethical grounds for opposing de-extinction are at best inconclusive and that a pragmatic stance that allows for its possibility is more appealing.
Patients should not always receive hard data about the risks and benefits of a medical intervention. That information should always be available to patients who expressly ask for it, but it should be part of standard disclosure only sometimes, and only for some patients. And even then, we need to think about how to offer it.
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