O objetivo deste artigo é analisar os usos que Werner Heisenberg fez da filosofia grega em sua obra. Pretende-se relacionar tais usos não apenas com a argumentação interna presente nos textos do físico alemão, mas também com o contexto histórico, conflitos e debates entre as diversas interpretações da teoria dos quanta durante a primeira metade do século XX. Faremos, inicialmente, uma apresentação geral da teoria quântica e da presença da filosofia na obra de Heisenberg e, em seguida, um (...) estudo de caso da apropriação que Heisenberg fez do pensamento de Leucipo, Demócrito, Heráclito, Platão e Aristóteles. (shrink)
O artigo a seguir, “A moral antiga e a moral moderna” (“La morale ancienne et la morale moderne”), foi publicado originalmente na Revue Philosophique, ano XXVI, janeiro de 1901, p. 1-12. Nele, Brochard discute as principais diferenças entre a moral antiga e a moral moderna, destacando a ausência na moral antiga das idéias de dever e obrigação, tão caras à moral moderna a ponto de hoje não a concebermos sem elas. O esclarecimento das razões que levaram os (...) modernos a entender a moral como ciência do dever, é um dos motivos pelos quais esse texto merece ser lido. (shrink)
Nossa seleção de verbetes parte do interesse de cada pesquisador e os dispomos de maneira histórico-cronológica e, ao mesmo tempo, temática. O verbete de Melissa Lane, “Filosofia Política Antiga” vai da abrangência da política entre os gregos até a república e o império, às portas da cristianização. A “Filosofia Política Medieval”, de John Kilcullen e Jonathan Robinson, é o tópico que mais demanda espaço na nossa seleção em virtude das disputas intrínsecas ao período, da recepção de Aristóteles (...) pelo medievo e da tensão entre poder Papal e Civil. No verbete “Liberalismo”, de Gerald Gaus, Shane Courtland e David Schmidtz, vemos as fontes fundantes da Filosofia Política da modernidade. As ideias de liberdade negativa e positiva se coadunam com a Ética Liberal e sua influência sobre a abrangência do valor fundamental da liberdade individual diante das políticas públicas. O texto de Ian Carter, “Liberdade Positiva e Liberdade Negativa”, expõe o paradoxo da liberdade em suas concepções valorativas e neutra, muito úteis para compreender os problemas políticos que enfrentamos hoje. Por fim, Bas Van Der Vossen no texto “Libertarianismo” trata das noções tensas entre Estado e indivíduos. A concepção de “liberdade de si”, genuinamente negativa, ganha destaque justificatório. Jackie Scully, no verbete Bioética Feminista, exemplifica o valor da influência dessas correntes no âmago de todos os contemporâneos. Sua escrita homenageia postumamente Anne Donchin com um apanhado histórico da luta de inserção de políticas feministas na pesquisa acadêmica global. No verbete “Democracia”, os professores brasileiros Gustavo Dalaqua e Alberto Ribeiro Barros acrescentaram tópicos importantes ao tema geral, respectivamente: “Construtivismo Representativo vs. Representação Descritiva” e “Democracia Contestatória de Philip Pettit”. O texto de Thomas Christiano perpassa os principais argumentos de justificação política contra e a favor da democracia ocidental, com foco central nas concepções de liberdade e igualdade. Os verbetes dispostos nessa seleção de textos são tendenciosos na medida que expressam o interesse genuíno de cada pesquisador com os assuntos relevantes em suas pesquisas. Em virtude disso, a escolha “adota um lado” em detrimento de outros – mais especificamente: de outro que poderia ser mais “progressista”. Por si só, o livro já nasce reclamando um segundo volume, que será providenciado. Colocamos de lado qualquer exigência de “imparcialidade”, algo que não existe na Filosofia, muito menos na Filosofia Política. Sobressai, nesse aspecto, o caráter reflexivo que o assunto exige e a importância do assunto, sem o qual não teríamos a modernas concepções de representatividade, as teorias da justiça ou mesmo as ciências sociais. Um outro volume, portanto, se faz imperativo, por conta da abrangência da própria SEP e do respeito a seu projeto inicial, genuinamente um plano plural. (shrink)
A proposta deste trabalho é investigar a contribuição da filosofia de Henri Bergson para as discussões atuais sobre a memória. Atualmente, o debate concentra-se entre as teorias causalistas e as teorias simulacionistas acerca da memória. O primeiro grupo defende que entre a representação atual de uma experiência passada e esta experiência, há uma conexão causal. Por outro lado, o segundo grupo entende que a principal contribuição para as representações atuais a respeito de eventos passados surge das condições do momento (...) presente, dispensando a necessidade de uma relação entre a experiência e a representação atual. Henri Bergson, no final do século XIX, apresentou a memória como uma faculdade prática, cuja função é auxiliar na tomada de decisões a partir das informações adquiridas anteriormente. De modo que são as condições do sujeito no momento presente que indicarão quais lembranças serão evocadas. Os conteúdos destas lembranças não são idênticos aos conteúdos do momento em que foram apreendidos, pois as lembranças, na sua concepção, alteram-se ao longo do tempo conforme novas informações são obtidas. Até este ponto, parece haver uma grande aproximação entre a filosofia bergsoniana acerca da memória e a compreensão simulacionista. Contudo, Bergson também entende que a lembrança retida depende da percepção, ocasionando uma representação, que o sujeito teve no momento da experiência, afirmando a existência de uma relação causal entre a representação no momento passado e a representação no momento em que a lembrança é evocada. Portanto, podemos reconhecer aspectos da memória na concepção bergsoniana tanto no modelo causalista, quanto no modelo simulacionista apresentados no debate contemporâneo. A nossa pretensão é, a partir da verificação sobre quais aspectos a filosofia de Bergson se aproxima e se afasta das teorias atuais, reconhecer a quais objeções ela está exposta, bem como que vantagens tem na pesquisa contemporânea em filosofia da memória. Assim como todo estudo relacionado à mente, o trabalho em torno da memória trouxe diversas descobertas e hipóteses no último século, ou seja, o conhecimento a respeito do tema avançou significativamente desde as considerações realizadas por Bergson. Acreditamos que o resgate histórico é importante para evitar a possibilidade de que elementos inclusos em constatações filosóficas mais antigas, e que podem ser de interesse para a pesquisa atual, não sejam vistos. Dividiremos a apresentação deste trabalho em três seções: na primeira, abordaremos as teorias causalista e simulacionista da memória; na segunda, exporemos a filosofia da memória de Bergson; por fim, relacionaremos a compreensão bergsoniana acerca da memória com o debate atual para detectarmos quais aspectos foram derrotados e quais têm se mantido ao longo de todos estes anos após a publicação de Bergson. (shrink)
Antes de entrar cuidadosamente no estudo de cada filósofo, em suas respectivas ordens cronológicas, é necessário dar um panorama geral sobre eles, permitindo, de relance, a localização deles em tempos históricos e a associação de seus nomes com sua teoria ou tema central. l. OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS - No sétimo século antes de Jesus Cristo, nasce o primeiro filósofo grego: Tales de Mileto2 . Ele e os seguintes filósofos jônicos (Anaximandro: Ἀναξίμανδρος: 3 610-546 a.C.) e Anaxímenes: (Άναξιμένης: 586-524 a.C.) tentaram (...) expressar/elucidar o que é a arché, ou constitutivo fundamental do Universo. 4 Também sobressaem as teorias de Pitágoras (Ὁ Πυθαγόρας: 570 a.C.- 495 a.C.), completas de misticismo e Matemática; a de Heráclito (Ἡράκλειτος ὁ Ἐφέσιος: 540-470 a.C.), o filósofo do devir e o de seu oponente, Parmênides (Παρμενίδης: 530-460 a.C.), que elucida a primeira teoria do ser, e para qual é alcunhado como o iniciador da Metafísica. Anaxágoras (Ἀναξαγόρας: 500 a.C.- 428 a.C.) esboça uma teoria sobre o Nous, o espírito divino. Por outro lado, Demócrito (Δημόκριτος: Grécia: 460-370 a.C.) e Empédocles (Ἐμπεδοκλῆς: 490 a.C.-430 a.C.) insistem no materialismo. Em contrapartida, os sofistas (Parmênides, Cálicles (Καλλικλῆς: personagem platônico cuja existência é duvidosa) e Górgias (Γοργίας: 485 a.C.-380 a.C.)) gozam das suas aptidões à dialética, e colocam o relativismo como uma posição filosófica. Sócrates será o inimigo mais temível dessa posição. Este é o começo do movimento filosófico de Atenas, que culmina nos séculos quinto e quarto, tal qual, posteriormente, veremos. 2. O APOGEU GREGO – Sócrates (Σωκράτης: 469 a.C.-399 a.C.), Platão (Πλάτων: 428/427- 348/347 a.C.) e Aristóteles (Ἀριστοτέλης: 384 a.C.-322 a.C.) formam o triunvirato dos grandes filósofos gregos. O primeiro (Sócrates), com seu método "maiêutico" e sua teoria do conceito; o segundo (Platão), com sua teoria das ideias e seu estilo literário (dialogista); e o terceiro (Aristóteles), com a estruturação dos principais ramos filosóficos, como a Lógica, a Metafísica, a Ética, a Psicologia racional e a Política; todos eles elevaram a Filosofia para um posto de primeira ordem. Doravante, todos os filósofos tornam-se credores das contribuições desses gênios. Em certos autores, é clara a influência de Platão ou de Aristóteles. Sendo que, ambos os filósofos, tiveram influência absoluta de Sócrates, uma vez que Platão fora seu discípulo, e Aristóteles discípulo de Platão. A Idade Média, por exemplo, foi toda ela, em sua gênese e desenvolvimento, alicerçada no pensamento e nas ideias platônicas; tal era histórica é caracterizada pela luta em favor de um ou de outro autor; o platonismo tomou precedência nos primeiros séculos do cristianismo; somente após o décimo século Aristóteles foi redescoberto. 3. A FILOSOFIA CRISTÃ MEDIEVAL - Santo Agostinho (354 a.C.-430 a.C.) se destaca, no quinto século, com sua teoria da iluminação e a aplicação da teoria platônica ao Cristianismo. No século XIII, São Tomás de Aquino (1225-1274), sintetiza Aristóteles com o Cristianismo. Os dois autores formam o núcleo da filosofia cristã em seus respectivos séculos. A escolástica teve seu tempo de decadência. Se mencionam, principalmente, dois autores: João Duns Escoto (1266-1308) e Guilherme de Ockham (1285-1347). O primeiro é o "Doutor Sutil ", e o segundo cai em um fideísmo e um nominalismo, para todos os conceitos criticáveis. Em uma segunda parte, tentaremos explicar os respectivos pensamentos dos autores mencionados, e outros que pertencem ao mesmo tempo, antigos e medievais. Naquela época, a Filosofia era puramente realista, aplicada ao mundo e ao homem. Somente na Idade Moderna, a Filosofia assumirá o problema do conhecimento como a base e o começo de todo filosofar. 4. A FILOSOFIA RACIONALISTA (MODERNA) - Na Idade Moderna, sobressai o racionalismo de Descartes (1596-1650) prolongado, então, com Malebranche (1638-1715) (ocasionalismo), Espinosa (1632 -1677) (panteísmo) e Leibniz (1646-1716) (teoria das mônadas). Estamos nos séculos XVII e XVIII. A atenção será focada nas disputas filosóficas da corrente empirista contra a racionalista. 5. A FILOSOFIA EMPIRISTA – O empirismo é florescido, principalmente, na Inglaterra. Francis Bacon (1561-1626), primeiro, e depois Locke (1632-1704) com sua rejeição de ideias inatas, Berkeley (1685-1753) com postura e ideias paradoxais, também idealistas e Hume (1711-1776), com suas famosas críticas contra o princípio da causalidade e o conceito de substância, são os principais autores. 6. KANT E OS IDEALISTAS ALEMÃES - Como a tentativa de sintetizar o racionalismo e empirismo, está a teoria de Kant (1724-1804), no século XVIII. Para o seu gênio seguido pelos três idealistas alemães mais importantes: Fichte (1762-1814) (idealismo subjetivo), Schelling (1775-1854) (idealismo objetivo) e Hegel (1770-1831) (idealismo absoluto). Esses Autores representam o ápice da especulação filosófica. A análise, a profundidade, a complexidade da expressão e o espírito sistemático são as características do gênio alemão idealista. 7. OS FILÓSOFOS DO SÉCULO XIX - Antes de tudo, é necessário mencionar, no século dezenove, aos dois grandes críticos de Hegel, que são Kierkegaard (1813-1855) (precursor do existencialismo) e Marx (1818-1883) (com seu materialismo dialético). O próximo é outro casal: Nietzsche (1844-1900) (teoria do Super-homem) e Schopenhauer (1788-1860) (com seu absoluto pessimismo). Comte (1798-1857) com sua doutrina positivista, completará o quadro desses filósofos. Numa outra oportunidade, vamos desmembrar sobre o pensamento e principais ideias acerca desses autores. 8. OS FILÓSOFOS DO SÉCULO XX - Antes de tudo, há um autor que iluminou a filosofia do século XX: Edmund Husserl (1859-1938), fundador do método fenomenológico. Em seguida, existem dois fluxos que são derivados diretamente de Husserl, a saber, o existencialismo e a axiologia. Dentro da corrente axiológica, estudaremos Scheler (1874-2928). Por outro lado, o existencialismo tem quatro autores principais; dois são alemães: Heidegger (1889-1976) e Jaspers (1883-1969); e os demais são franceses: Sartre (1905-1980) e Marcel (1889-1973). Heidegger insiste em que seu tema tratado em sua filosofia não é a unicidade do homem, mas o ser em geral. Jaspers é famoso por seu conceito de transcendência (Deus). Sartre é um antiteísta sincero, e seu existencialismo é definido como um pensamento que assume todas as consequências da negação de Deus. Em contraste, Gabriel Marcel é um filósofo Católico, que conseguiu uma análise profunda das situações humanas, que aparecem em íntima concordância com as verdades cristãs. Vamos terminar com Russell (1872-1970), autor básico do positivismo lógico. Cronologia de filósofos e suas escolas até nossos dias ➢ FilosofiaAntiga - Escola naturalista da Jônia: Tales, Anaximandro e Anaxímenes; - Escola matemática da Itália: Pitágoras e os pitagóricos; - Escola idealista de Eléia: Xenófanes (570-475 a.C.), Parmênides, Zenão (490/85-420 a.C.) e Meliso (h.443); - Escola empirista: Heráclito, Empédocles e Anaxágoras; - Escola atomista de Abdera: Leucipo (h.437) e Demócrito; - Escolas de Atenas: - Sofistas: Protágoras (480-410), Górgias (484-375?); Sócrates, Platão e Aristóteles; - Pirronismo: Pirro (h.365-h.275); - Estoicismo: Zenão de Cítio (359/33-262) e Crisipo (281/77-208); - Epicurismo: Epicuro (341-270); - Nova Academia: Arcesilau (315-241) e Carnéades (214-129); Romanos: Sêneca (4 a.C.-65 d.C.), Marco Aurélio (121-180) e Cícero (106-43). - Escola greco-judia: Fílon de Alexandria (25 a.C.-50 d.C.); - Neoplatonismo: Plotino (204/5-270), Porfirio (h.233-304), Jâmblico (h.250-330) e Proclo (h.411-485). ➢ Filosofia patrística - Apologistas: São Justino (100/10-165), Ireneu de Lyon (h.140-h.l 77) e Atenágoras (fines s. II); - Alexandrinos: São Clemente (h.145/50-215) e Orígenes (h.185-255); - Africanos: Tertuliano (h.160-230), Arnóbio (h.260-h.327) e Lactâncio (nascido h. 250); - Gregos: São Basílio (h.330-379), São Gregório de Nazianzo (330-390), São Gregório de Níssa (330-390) e Pseudo-Dionísio (h.500); - Latinos: São Hilário (h.315-367), Santo Ambrósio (333-397) e Santo Agostinho; - Outros: Claudiano (+h.473), Boécio (480-524), São Isidoro (h.560-633) e Beda (672/3-735). ➢ Filosofia Medieval/Escolástica - Judeus: Isaac Israeli (+h.940), Salomão Ibn Gabirol (h.l020-p.l058) e Maimônides (1135- 1204); - Árabes: Alquindi (h. 796-874), Al-Farabi (870-950), Avicena (980-1037), Algazali (1058- 1111) e Averróis (1126-1198); - Escola palatina: Alcuíno de Iorque (730/5-804), Rábano Mauro (h.784-856), Escoto Erígena (h.810-h.870) e Papa Silvestre II (+1003); - Dialéticos: Santo Anselmo (1033/4-1109) e Pedro Abelardo (1079-1142); - Tradutores: Domingo Gundisalvo (meados s. XII), Gerardo de Cremona (h. 1114-1187); - Enciclopedistas: Teodorico de Chartres (+1155), Hugo de São Vitor (+1141) e Vicente de Beauvais (+1264); - Universidades: Guilherme de Auvergne (1180- 1249) e Sigerio de Brabante (+h.l284); - Dominicanos: São Alberto Magno (1206-1280) e Santo Tomás de Aquino; - Franciscanos: Alexandre de Hales (1170/80-1245), São Boaventura (1217-1274), Roger Bacon (h.1210/14-1292), João Duns Escoto, Raimundo Lulio (1235-1315) e Guilherme de Ockham (h.1285-1349). ➢ Filosofia Moderna - Humanistas Renascentistas: Ficino (1433-1499), Erasmo (1467-1536), Maquiavel (1469- 1527), Thomas More (1480-1535), Juan Luis Vives (1492-1540) e Giordano Bruno (1548- 1600); - Racionalismo: Descartes, Malebranche, Espinosa e Leibniz; - Empiristas: Francis Bacon, Thomas Hobbes (1588-1679), Locke, Berkeley e Hume; - Escola escocesa: Thomas Reid (1710-1796); Iluministas: Voltaire (1694-1778), Condillac (1715-1757), Diderot (1713-1784) e J. J. Rousseau (1712-1778). - Idealismo transcendental: Kant; - Idealismo subjetivo: Fichte; - Idealismo objetivo: Schelling; - Idealismo absoluto: Hegel; - Pessimismo: Schopenhauer; - Ecletismo: Cousin (1792-1867); - Positivismo: A. Comte, J. S. Mill (1806-1873) e H. Spencer (1820-1900); - Socialismo: H. Saint-Simon (1760-1825), Ch. Fourier (1772-1837) e K. Marx; - Vitalismo: Nietzsche e W. Dilthey (1833-1912). ➢ Filosofia Contemporânea - Intucionismo: H. Bergson (1859-1941); - Pragmatismo: Ch. S. Peirce (1839-1914), W. James (1842-1910) e J. Dewey (1859-1952); - Fenomenologia: Husserl, Scheler, N. Hartmann (1882-1950) e M. Merleau-Ponty (1908- 1961); - Existencialismo: Jaspers, Heidegger, Marcel e Sartre; - Atomismo lógico: B. Russell (1872-1970) e L. Wittgenstein (1889-1951); - Positivismo lógico: M. Schlick (1882-1936), R. Carnap (1891-1970 ) e A. J. Ayer (1910- 1990). - Filosofia analítica: J. L. Austin (1911-1960), G. Ryle (1900-1976), W.V.O. Quine (1908- 2000), P. F. Strawson (1919-2003) e H. Putnam (1926-); - Hermenêutica: H. G. Gadamer (1900-2002), P. Ricoeur (1913-2007) e J. Habermas (1929-). - Estruturalismo e pós-estruturalismo: F. de Saussure (1857-1913), C. Lévi-Strauss (1908- 2009) e M. Foucault (1926-1984). - Filosofia pós-moderna: J. F. Lyotard (1924-1999), G. Deleuze (1925-1995), J. Derrida (1930- 2004), R. Rorty (1931-2007) e G. Vattimo (1936-). - Comunitaristas: A. Maclntyre (1929-), Ch. Taylor (1931-). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHAUÍ, M. Iniciação à Filosofia. Vol. Único. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2013. 460 p. SANTOS, R. dos. Filosofia: Uma breve introdução. 1ª ed. Pelotas: Dissertativo Incipiens, 2014. 108 p. . Rua do Riachuelo, 303, Centro, Rio de Janeiro, RJ Casa Histórica de Osório CEP: 20230-011 E-mail: [email protected]filosofia..org.br. (shrink)
-/- FILOSOFIA: CRÍTICA À METAFÍSICA -/- PHILOSOPHY: CRITICISM TO METAPHYSICS -/- Por: Emanuel Isaque Cordeiro da Silva - UFRPE Alana Thaís Mayza da Silva - CAP-UFPE RESUMO: A Metafísica (do grego: Μεταφυσική) é uma área inerente à Filosofia, dito isto, é uma esfera que compreende o mundo e os seres humanos sob uma fundamentação suprassensível da realidade, bem como goza de fundamentação ontológica e teológica para explicação dos dilemas do nosso mundo. Logo, não goza da experiência e explicação (...) científica com base na matemática, ciências, observação, análise, etc. e sim da explicação apenas teorética sem a análise empírica. Por fim, filósofos de divergentes escolas e eras da história da filosofia fundamentaram suas críticas quanto a Metafísica; e este breve trabalho tem como objetivo analisar as críticas dos filósofos e trazer uma conclusão clara e objetiva para os leitores, sejam leigos ou não. Palavras-chave: Metafísica. Crítica. Teoria. Suprassensível. Empírico. Experiência. ABSTRACT Metaphysics is an area inherent to philosophy, that is, it is a sphere that comprises the world and human beings under a supersensitive foundation of reality, as well as enjoying ontological and theological foundations for explaining the dilemmas of our world. Therefore, it does not enjoy the scientific experience and explanation based on mathematics, science, observation, analysis, etc., but only the theoretical explanation without empirical analysis. Finally, philosophers from divergent schools and eras in the history of philosophy based their criticism of Metaphysics, and this brief work aims to analyze the criticism of philosophers and bring a clear and objective conclusion to readers, whether lay or not. Keywords: Metaphysics. Criticism. Theory. Supersensitive. Empirical. Experience. INTRODUÇÃO Para uma fundamentação alicerçada na observação, análise e conclusões pragmáticas, é imprescindível aclarar o conceito de Metafísica como esfera inerente da Filosofia, bem como disciplina primordial para o currículo do Filósofo formado nas Universidades globais. Para isso, discorro acerca do conceito de Metafísica desde a alcunha aristotélica de 'Filosofia primeira', passando à análise modernista, em especial à kantiana e seu criticismo (Crítica da Metafísica é a alma desse trabalho), sob análise de autores didáticos e, por fim, sob a elucidação da esfera Metafísica mediante os dicionários de Filosofia de Japiassú e Marcondes, e de Nicola Abbagnano. No conjunto de obras aristotélicas entituladas de Metafísica, Aristóteles buscou elucidar 'o ser enquanto ser', isto é, buscar a objetividade das coisas e do mundo mediante a subjetividade e a realidade suprassensível dessas coisas. Logo, a explicação dos fenômenos que cercavam a Grécia clássica eram explicados além do alicerce das Ciências tradicionais da época (Física, Química, Biologia, etc.). Todavia, para Aristóteles, a Metafísica consiste na 'ciência primeira' no que se refere o fornecimento de um fundamento único para todas as demais ciências, ou seja, dar-lhes o objeto ao qual elas se referem e os princípios dos quais todas elas dependem. Por fim, a Metafísica implica ser uma enciclopédia das ciências um inventário completo e exaustivo de todas as ciências, em suas relações de coordenação e subordinação, nas tarefas e nos limites atribuídos a cada uma, de modo definitivo. Na modernidade, a Metafísica perde a centralidade do mundo da Filosofia, quem é o precursor de tal declínio é Immanuel Kant e seu criticismo. Tal descendência é elucidada e aclarada posteriormente no presente trabalho. A Metafísica moderna ganha uma nova interpretação, sendo alcunhada e levada por analogia à Ontologia, expressada, segundo Kant, como conceito de gnosiologia. Para Kant, Metafísica é a fonte inerente do estudo e explicação das formas alicerçadas na razão, bem como fundamento de toda realidade suprassensível que se deve basear para elucidar e aclarar o mundo moderno. Ainda segundo o filósofo, a Metafísica é a fonte de todos os princípios reais para a explicação da realidade. Sendo ela, por fim um 'sistema filosófico' alicerçado sobre uma perspectiva ontológica, teológica e/ou suprassensível da realidade. No nosso finalismo, a inerência da Metafísica à filosofia transcende a explicação de todo o universo e sua totalidade (matéria e forma como alcunha Aristóteles). Logo, na Filosofia Clássica com Platão e, especialmente em Aristóteles, o Mito passou a ser ciência e essa ciência era determinada de Metafísica. Vale salientar que a alcunha 'Metafísica' foi, primeiramente, usada por Andrônico de Rodes . Por fim, a Metafísica primordial para fundamentar as explicações necessárias para os fenômenos que se decorrera na Grécia antiga, foi perdendo centralidade ao passo da história da filosofia e, na modernidade, com Hume e Kant passa por uma grande crise, discorrida agora no trabalho. -/- DA CRÍTICA À METAFÍSICA Platão criou um sistema metafísico de explicação da realidade e do mundo que influenciou muitos pensadores e religiosos. Boa parte da história da filosofia foi composta de sistemas metafísicos. Mas, se, por um lado, o pensamento metafísico tem uma vida longa e profícua, por outro, é alvo de críticas constantes, principalmente por filósofos modernos e contemporâneos, que questionam a validade das teses metafísicas, seja porque tratam de coisas que não podem ser conhecidas, como alma, Deus e formas inteligíveis, seja porque suas conclusões são consideradas enganosas. ARISTÓTELES E A FILOSOFIA PRIMEIRA As ciências teóricas ou teoréticas são aquelas que produzem um saber universal, válido em qualquer situação, e necessário, isto é, que não pode ser de outro modo. Essas ciências estão voltadas para a contemplação da verdade. O sábio que se dedica a elas encontra um fim em si mesmo, pois o resultado de sua investigação não gera nenhum objeto exterior, como uma construção ou uma escultura, mas beneficia sua própria alma. Elas estão organizadas em Metafísica, Matemática e Física, que inclui a Psicologia ou a ciência da alma. As principais obras teoréticas escritas por Aristóteles são Física, De anima e Metafísica. Filosofia Primeira, que chegou até nós com o nome de Metafísica, também chamada muitas vezes por Aristóteles de Teologia .com a ressalva de que Teologia aqui não tem o sentido que é dado a ela contemporaneamente), é a expressão que designava a mais elevada das ciências teoréticas, diferenciando-se da chamada Filosofia Segunda, ou Física. Aristóteles abre o Livro I da Metafísica com a célebre passagem: Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer das sensações, pois, fora até da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais que todas as outras, as visuais [...l. (ARISTÓTELES, 1969). A busca pelo conhecimento encontra-se na própria natureza humana, desde o nascimento, mesmo que se manifeste em seu grau mais rudimentar. Prova disso é o conhecimento por meio das sensações ou dos sentidos, entre os quais se destaca o da visão. É o chamado conhecimento por empiria ou saber empírico, que não pode ser ensinado porque é adquirido imediata e concretamente quando percebemos as coisas sensíveis. Também há um saber que vem da técnica. O técnico é aquele que tem o conhecimento dos meios para chegar a um fim. Como ensina o historiador da Filosofia, Julián Marias, apesar de o saber técnico ser superior ao saber empírico, ambos são necessários em nossa vida: 1..l Portanto, a tékhne [técnica) é superior à empeiria; mas esta também é necessária, por exemplo, para curar, porque o médico não tem de curar o homem, e sim Sócrates, e o homem apenas de modo mediato. (MARIAS, J. 2015). O conhecimento metafísico é menos necessário em nossa vida cotidiana, mas nenhum outro lhe é superior. A Metafísica é o conhecimento pelas causas e, como vimos, o conhecimento é científico quando ele nos dá os princípios e as causas das coisas. Para Aristóteles, tudo o que existe é efeito de uma causa e ela é a responsável por esse algo ser necessariamente de um jeito e não de outro. De acordo com Aristóteles, conhecer algo é conhecer pela causa. Dessa forma, a explicação de algo ou o seu conhecimento deve sempre dizer por que algo é necessariamente de determinado modo. Sem esse tipo de explicaçào, não pode haver propriamente conhecimento. Daí se constata o caráter rigoroso da explicação científica: ela não apenas sabe que "algo é isto", mas é capaz de explicar por que algo é necessariamente isto. A definição aristotélica de Metafísica Chauí indaga em seu livro Iniciação à Filosofia a questão central do que Aristóteles entende por sua alcunha ou Metafísica. Chauí explana: Embora Aristóteles admita que para cada tipo de Ser e suas essências existe uma ciência teorética própria (física, biologia, psicologia, matemática, astronomia), ele também defende a necessidade de uma ciência geral, mais ampla, mais universal, anterior a todas essas, cujo objeto não seja esse ou aquele tipo de Ser, essa ou aquela modalidade de essência, mas o Ser em geral, a essência em geral. Essa ciência, para Aristóteles, é a Filosofia Primeira ou metafísica, que investiga o que é a essência e aquilo que faz com que haja essências particulares diferenciadas, que estuda o Ser enquanto Ser. (CHAUÍ, 2010). O objeto investigado pela Metafísica também é muito diferente do objeto conhecido pelo saber empírico ou pelo saber técnico. O saber empírico nos faz conhecer as coisas particulares, como Sócrates, o Oráculo de Delfos e a caneta esferográfica; o saber técnico nos faz conhecer as diversas técnicas, como os procedimentos médicos e a engenharia de construir templos. O que o saber metafísico, então, nos permite conhecer? Segundo Aristóteles, a Metafisica estuda o ser enquanto ser. Não considera o ser de modo particular como fazem as demais ciências — por exemplo, ao investigar Sócrates, os procedimentos médicos etc. mas busca o que é universal, o que envolve tanto Sócrates quanto os procedimentos médicos, tanto o Oráculo de Delfos quanto a arte de construir templos. Segundo Aristóteles, a Metafísica trata das causas primeiras, que são as quatro seguintes: • a causa material, que é a matéria de que é feita alguma coisa. Em uma escultura, por exemplo, a causa material pode ser o bronze ou o mármore; • a causa formal, que é a forma ou a essência das coisas. No exemplo da escultura, é a forma ou a aparência que possibilita que a reconheçamos como uma escultura (e não como um poste, por exemplo); • a causa eficiente, que é o agente que produz a coisa. Uma escultura é produzida por um artista; • a causa final, que é a razão ou a finalidade das coisas, A finalidade da escultura é o prazer estético. A Metafísica também se ocupa da substância. A substância responde pelos significados do ser. Mas o que é a substância? Trata-se de uma questão complexa no pensamento aristotélico. Aristóteles recusa-se a entender a substância como sendo a forma platónica. Ela nào é o suprassensível. Seria entao a substância o sensível individual? As coisas são matéria e forma; amatéria é o substrato da coisa (por exemplo, o mármore é a matéria da estátua). Sem sua forma, ela é apenas potencialidade, mas sem a matéria qualquer realidade sensível se desvaneceria. Assim, a matéria pode ser dita substância em sentido impróprio. A forma, por seu turno, é aquilo que determina a matéria, é a sua essência; ela é substancia em sentido próprio. Mas a matéria é também matéria enformada. As coisas sensíveis são, a um só tempo, matéria e forma. E esse composto também pode ser legitimamente chamado de substância. Aristóteles apresenta três gêneros de substâncias: • as substâncias sensíveis, que nascem, morrem e, por isso, passam por todo tipo de mudança; • as substancias sensíveis e incorruptíveis, que não passam por nenhum tipo de mudança, como os planetas e as estrelas; • a substância suprassensível, que é superior às outras duas: o Primeiro Motor Imóvel, o deus aristotélico, causa de todo movimento, mas sendo ele mesmo imóvel. (Ele precisa ser imóvel porque se ele também se movesse precisaria haver uma causa para esse movimento, o que levaria a uma espécie de regressão ao infinito). Assim como o demiurgo de Platão, o deus aristotélico nao é um deus criador. Não criou o Universo nem gerou o movimento dos corpos. Ao contrário, o deus de Aristóteles exerce uma atraçáo sobre o Universo, motivando sua existência, e sobre os corpos, gerando seu movimento, ou seja, atrai tudo para si como objeto de amor. Não é, portanto, causa eficiente do mundo e do movimento do mundo, mas causa final. O deus aristotélico nao cria o mundo do nada por um ato de vontade. Ele nao é causa eficiente do mundo, como indicamos ser o artista causa eficiente de sua escultura. A METAFÍSICA CLÁSSICA OU MODERNA Grandes revoluções no pensamento do século XVII deram estopim à uma grande crise na esfera metafísica. De modo resumido a Metafísica sofreu uma grande transformação e uma nova elaboração, sem a fundamentação embasada no pensamento platônico, aristotélico ou neoplatônico. Sendo assim a nova metafísica é caracterizada por: [...] afirmação da incompatibilidade entre fé e razão, acarretando a separação de ambas, de sorte que a religião e a filosofia possam seguir caminhos próprios, mesmo que a segunda não esteja publicamente autorizada a expor ideias que contradigam as verdades ou dogmas da fé [...] [...] redefinição do conceito de Ser ou substância. Os modernos conservam a definição tradicional da substância como o Ser que existe em si e por si mesmo, que subsiste em si e por si mesmo. Porém, em lugar de considerar que a substância se define por gênero e espécie, havendo tantos tipos de substâncias quantos gêneros e espécies houver, passa-se a definir a substância levando em consideração seus predicados essenciais ou seus atributos essenciais, isto é, aquelas propriedades ou atributos sem os quais uma substância não é o que ela é. Após o supracitado, os cartesianos e Descartes dirão que há somente três substâncias essenciais, divergindo totalmente do pensamento aristotélico, as substâncias cartesianas são a Alma, a matéria dos corpos e Deus. Para empiristas, só se é possível conhecer a substância corpórea, logo não se é possível elaborar uma metafísica, e sim uma geometria ou uma física que se ocupa do estudo dessas matérias corpóreas. Baruch Spinoza (1632-1677) explanou a primordialidade de se elaborar uma definição genérica e universal, comumente aceita por toda a comunidade de filósofos de Aristóteles a modernidade. Podemos reduzir o conceito proposto da seguinte maneira: “substância é aquilo que existe em si e por si e não depende de outros para existir”.Logo, diz Espinosa, que há apenas uma substância no Universo que não depende de outra para existir, tal substância é o próprio Deus ou a natureza. Nessa revolução do pensamento filosófico, em peculiar à metafísica, houve também a redefinição do conceito de causa e causalidade. Em Aristóteles haviam quatro tipos de causas, agora, na modernidade, se propunha apenas dois tipos: a eficiente e a final. Chauí explana que a Causa eficiente é aquela na qual uma ação anterior determina como consequência necessária a produção de um efeito, e que seu alcance é universal na natureza. Causa final é aquela que determina, para os seres pensantes, a escolha da realização ou não realização de uma ação, e que só opera na ação de Deus e nas ações humanas. Houve também, nessa revolução, uma quebra do paradigma metafísico, isto é, a metafísica não se dividia mais entre a teologia, a psicologia racional e a cosmologia racional. Agora, a metafísica ganha um novo rumo, um rumo próprio de estudo embasado em suas próprias fundamentações. Logo, a metafísica se apropria de três e apenas três ideias de substância. A substância infinita, ou o próprio Deus. A substância pensante que é a consciência como faculdade de reflexão e de representação da realidade alicerçada na razão. E, por fim, a substância extensa que é a natureza embasada nos princípios e leis regidas pela matemática e a mecânica. DAVID HUME E A CRISE DA METAFÍSICA O filósofo escocês David Hume (1711-1776) nos ajuda a entender em parte o teor das críticas ao pensamento metafísico. "Se tomarmos em nossas mãos um volume qualquer, de teologia ou metafísica escolástica, por exemplo, façamos a pergunta: contém ele qualquer raciocínio abstrato referente a números e quantidades? Não. Contém qualquer raciocínio experimental referente a questões de fato e de existência? Não. Às chamas com ele, então, pois não pode conter senão sofismas e ilusão." (HUME, 2004) Hume critica a teologia e a metafísica escolástica, que foi a metafísica praticada principalmente nas escolas cristãs durante a Idade Média, porque suas concepções não tratam nem de conceitos matemáticos, que são formais e podem levar a conclusões seguras - por exemplo, "2 + 2 = 4" -, nem de afirmações sobre fatos, que podem ser verificados empiricamente, isto é, pelos órgãos dos sentidos —como "a aceleração de um corpo em queda livre é de 9,8 metros por segundo", Assim, Hume aconselha o leitor a jogar as afirmações metafísicas na fogueira, pois são consideradas ilusões, fantasias ou produto de erros de raciocínio e nada têm a acrescentar ao conhecimento humano. A partir de Hume, a metafísica, tal como existira desde os gregos, tornara-se impossível. O CRITICISMO KANTIANO E O FIM DA METAFÍSICA CLÁSSICA Entre a Dissertação de 1770 e a Crítica da razão pura, mais de dez anos se passaram. Apesar de a obra ser volumosa, a redaçào da Crítica da razão pura não chegou a cinco meses de trabalho. De início, Kant pretendia apenas revisar sua dissertação, mas o trabalho acabou por levá-lo a figurar entre os grandes nomes do pensamento filosófico, como Aristóteles e Descartes. Kant fez um diagnóstico bastante negativo da situação da Filosofia de sua época, em particular da Metafísica, que, embora fosse considerada a Filosofia Primeira, patinava em questões impossíveis de serem resolvidas. Ao mesmo tempo, buscou inserir a Filosofia no rumo seguido pelas Ciências Naturais, pela Lógica e pela Matemática, que já tinham encontrado o caminho da Ciência. Em alguns pontos, o projeto kantiano se aproximou de algumas características do projeto cartesiano. Descartes duvidou de todo o saber conhecido, pois queria encontrar um fundamento seguro que sustentasse a edificação da Filosofia e, mais particularmente, da Ciência. Diferentemente de Descartes, contudo, Kant nào duvidou de todo o conhecimento que havia aprendido. Para ele, bastava estabelecer os limites do conhecimento racional, ou seja, o que a razão podia conhecer e o que era impossível de ser conhecido. No fim do século XVIII, de acordo com a proposta de Wolff, a Metafísica era dividida em duas partes: Metafísica geral e Metafísica especial. A primeira tratava da Ontologia (ciência do ser enquanto ser, como definido por Aristóteles), e a segunda se ocupava do ser humano (Psicologia), do mundo (Cosmologia) e de Deus (Teologia racional), Os principais temas in-vestigados eram a imortalidade da alma, a liberdade a finitude ou infinitude do mundo e a existência de Deus. No entanto, de acordo com Kant, as questões metafísicas clássicas extrapolavam as capacidades de conhecimento do ser humano, pois estavam tão afastadas da experiência que a razão só podia pensá-las, sem conhecê-las realmente. As questões postas pela Metafísica clássica extrapolavam o terreno de qualquer experiência possível e, no entanto, a razão, por sua própria natureza, apresenta questões que não pode evitar, mas que também náo pode responder por não terem nenhuma pedra de toque na experiência. Disso decorre a pergunta fundamental sobre a possibilidade de haver um conhecimento metafísico. Publicada em 1781, a Crítica da razão pura foi uma tentativa de responder a essa pergunta. A obra instituiu um "tribunal da razao" para examinar a própria razão, e não para tomar partido no conflito entre racionalistas, como Descartes e Leibniz, que elaboraram sistemas metafísicos, e empiristas, como Locke e Hume, que basearam o conhecimento unicamente nos sentidos. Criticar a razão é determinar as possibilidades, os limites e o alcance do próprio conhecimento. A transformação foi tao grande para a Filosofia que essa obra nao pôde ser ignorada. A situação da Metafísica No texto a seguir, retirado do célebre prefácio à primeira edição de Crítica da razão pura, podemos ver o diagnóstico de Kant sobre a situaçao da Metafísica no período em que vivia. A razão humana, num determinado dominio dos seus conhecimentos, possui o singular destino de se ver atormentada por questões, que náo pode evitar, pois lhe são impostas pela sua natureza, mas às quais também não pode dar resposta por ultrapassarem completamente as suas possibilidades. Não é por culpa sua que cai nessa perplexidade. Parte de princípios, cujo uso é inevitável no decorrer da experiência e, ao mesmo tempo, suficientemente garantido por esta. Ajudada por estes princípios eleva-se cada vez mais alto (como de resto lho consente a natureza) para condições mais remotas. Porém, logo se apercebe de que, desta maneira, a sua tarefa há de ficar sempre inacabada, porque as questões nunca se esgotam; vê-se obrigada, por conseguinte, a refugiar-se em princípios, que ultrapassam todo o uso possível da experiência e, não obstante, estão ao abrigo de qualquer suspeita, pois o senso comum está de acordo com eles. Assim, a razão humana cai em obscuridades e contradições, que a autorizam a concluir dever ter-se apoiado em erros, ocultos algures, sem contudo os poder descobrir. Na verdade, os princípios de que se serve, uma vez que ultrapassam os limites de toda experiência, já não reconhecem nesta qualquer pedra de toque. O teatro destas disputas infindáveis chama-se Metafísica. (KANT, I. 2010). O fim da Metafísica clássica Podemos agora retomar o questionamento sobre os motivos pelos quais a física newtoniana é possível como ciência e entender também por que a metafísica racionalista tradicional não é conhecimento científico, segundo a teoria kantiana. A física trata de regras e leis dos fenômenos, das representações conformadas pela sensibilidade e pelo entendimento, ou seja, refere-se a objetos do conhecimento humano. A metafísica clássica, por sua vez, trata de coisas que não fazem parte da experiência sensível. Deus e a alma, por exemplo, não são apreendidos pela sensibilidade, não são impressões conformadas ou fenômenos e, portanto, não podem ser conhecidos pelo ser humano. Ideias ou conceitos dessa espécie podem ser pensados pela razão, mas é impossível conhecê-los, pois estão além da capacidade humana de conhecimento. Por esse motivo, a física é possível como ciência e a metafísica tradicional não. Com base nisso, Kant provocou uma revolução na teoria do conhecimento, que ele mesmo designou como "virada copernicana na filosofia", Se Copémico mudou a forma de entender o mundo ao defender a ideia de que o Sol está no centro do sistema solar, Kant mudou a forma de o ser humano compreender o mundo e a si próprio ao estabelecer a ideia de que o ser humano, e não os objetos externos, é o centro do conhecimento, O ser humano não é um agente passivo, que só recebe informações, mas atua decisivamente na constituição do conhecimento e do que se compreende como realidade. Os elementos a priori que determinam essa constituição do conhecimento são o escopo da filosofia kantiana, também conhecida como transcendental. Logo, o pensamento kantiano alterou profundamente a Metafísica. A existência de Deus ou a imortalidade da alma, por exemplo, passaram a ser questões que já não podiam ser respondidas. Se percebemos apenas as coisas que ocorrem em um tempo específico (antes, agora, depois), como seremos capazes de perceber algo que está na eternidade (Deus)? Como afirmar que a alma é imortal se não conseguimos percebê-la com os nossos sentidos? O conhecimento a partir de Kant, então, é sempre conhecimento de objetos, isto é, de conteúdos elaborados e modificados pelo sujeito que conhece. O conhecimento passou a se ocupar, assim, de fenómenos, e não mais da própria coisa, como pretendiam os metafísicos clássicos. Com a crítica kantiana, tornou-se impossível conhecer efetivamente os temas da Metafísica clássica e emitir qualquer opinião segura sobre assuntos que não podem ser assentados na experiência. Podemos pensar sobre Deus, podemos querer que nossa a seja imortal, mas jamais teremos a possibilidade de verificar esses assuntos em nossa experiência ou mesmo ter sobre eles verdadeiro conhecimento. Nada nos impede de acreditar em Deus ou na imortalidade da alma, porém não podemos exigir que a Filosofia se pronuncie a respeito desses temas. Na verdade, a crítica kantiana não diz que Deus existe nem que não existe, mas apenas que não é capaz de saben Deus, não obstante sua importância para a Filosofia do próprio Kant, é uma questão de fé. AUGUSTE COMTE E A METAFÍSICA NO SÉCULO XIX O filósofo francês Auguste Comte (1798-1857), considerado o pai do positivismo, fundamenta sua filosofia também em oposição às concepções metafísicas. Em seu entendimento, a busca por princípios gerais ou essências, entidades que estão além do que podemos observar ou perceber pelos órgãos dos sentidos, é algo infrutífero. Comte explana: "[...] não é supérfluo assinalar agora, de modo direto, a preponderância contínua da observação sobre a imaginação, como o principal caráter lógico da sã filosofia moderna, dirigindo nossas pesquisas, não para causas essenciais, mas para leis efetivas, dos diversos fenômenos naturais. Sem ser doravante imediatamente contestado, permanece este princípio fundamental muitas vezes desconhecido nos trabalhos especiais. Embora as diferentes ordens de especulações concedam, sem dúvida, à imaginação uma alta participação, isto é, constan temente empregada para criar ou aperfeiçoar os meios da vinculação entre os fatos constatados, mas o ponto de partida e a sua direçào não lhe poderiam pertencer em nenhum caso. Ainda quando procedemos verdadeiramente a priori, é claro que as considerações gerais que nos guiam foram inicialmente fundadas, quer na ciência correspondente, quer em outra, na simples observação, única fonte de sua realidade e também de sua fecundidade. Ver para prever: tal é o caráter permanente da verdadeira ciência. Tudo prever sem ter nada visto constitui somente uma absurda utopia metafísica, ainda muito seguida." (COMTE, 1978). A observação é considerada a única fonte de realidade. Abandonando a observação e apoiando-se única e exclusivamente na imaginação, como seria característico das especulaçôes metafísicas, o pensamento pode levar não para o conhecimento das coisas, mas para a fantasia. A ciência, então, deve ter como base as coisas que podem ser observadas. Todas as especulações e as teorias científicas, em última instância, devem ter como fundamento a realidade observável. LUDWIG WITTGENSTEIN E A METAFÍSICA CONTEMPORÂNEA O filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein (1889-1951) também se opõe às afirmações metafísicas por considerar que estas tratam de problemas (ou pseudoproblemas) que não podem ser formulados claramente e, portanto, não podem ser respondidos. “O método correto da filosofia seria o seguinte: só dizer o que pode ser dito, ou seja, as proposições das ciências naturais [...] e depois, quando alguém quisesse dizer algo metafísico, mostrar-lhe que nas suas proposições existem sinais aos quais não foi dada uma denotação.” (WITTGENSTEIN, 1995). Quer dizer, as sentenças ou os termos metafísicos se referem a coisas, objetos ou seres enigmáticos ou misteriosos, que não podem ser tratados com clareza, isto é, não se sabe exatamente o que são, o que impossibilitaria a formulação de problemas e soluções reais. "Deus", "alma" ou "vida após a morte", por exemplo, são termos que se referem especificamente a quê? Os "problemas" metafísicos estariam no campo do mistério e não no da investigação racional. Por isso, como afirma Wittgenstein, "acerca daquilo de que se não pode falar, tem que se ficar em silêncio". CONCLUSÃO (ÕES) Ora, a Metafísica na Grécia antiga foi imprescindível para o entendimento dos mais variados dilemas do mundo antigo, sejam perguntas simples, ou complexas. Iniciada como um sistema filosófico platônico, passando a ser filosofia primeira em Aristóteles, a metafísica incorporou elementos teológicos, psicológicos e cosmológicos durante o mundo antigo, e ainda mais durante o período medieval e a hegemônica Igreja Católica. No mundo moderno e embasado pelo “Luz da razão”, a metafísica começa a ser refutada pelos pensadores da época em questão, dentre eles o célebre cético Hume, e o emblemático Kant, além de Descartes e seus cartesianistas. Kant e seu criticismo incorporaram à Metafísica uma nova interpretação, esta que fez a mesma entrar em declínio e sair da centralidade do mundo filosófico. Kant, graças às indagações e refutações de Hume, pôde acordar do célebre “sono dogmático”. O que fez Kant se importa com a Metafísica. Kant trouxe à luz o fim da Metafísica clássica e deu legado ao início da metafísica contemporânea alcunhada de Ontologia. No decorrer da história da filosofia, a Metafísica teve intensa ascenção e vertiginosos declives, sendo seu maior declive o crítico Kant. Por fim, muitos filósofos se apropriaram de ser heterodoxos e enfrentaram de frente o mundo metafísica e a base do catolicismo sobre a realidade. Posta realidade que hoje, com o legado de Kant, da fenomenologia de Husserl, etc., originaram a nova escola filosófica chamada de Ontologia. -/- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 5ª. ed. Trad. Ivone Castillo Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2007. ARANHA, M. 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São Paulo: Moderna, 2006. WITTGENSTEIN, L. Tratado lógico-filosófico. 2ª. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995. -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva – estudante, pesquisador, professor, agropecuarista, altruísta e defensor dos direitos humanos e dos animais. -/- Alana Thaís Mayza da Silva – estudante, potterhead, pesquisadora, projetista, musicista, filantropa, defensora dos direitos humanos e dos animais, LGBT. (shrink)
O presente artigo trata do pensamento de Epicteto pelo viés do exercício (áskēsis), ou seja, por meio de práticas que conduzem ao aperfeiçoamento de quem elege para si o ofício de filósofo. Para tal, inicialmente esclarecemos o que significam os exercícios na filosofiaantiga, tendo como subsídio as teses de Pierre Hadot. Logo depois, exploramos seis exercícios que consideramos centrais para o filósofo de Nicópolis, contextualizando com os ensinamentos que estão envolvidos e descrevendo as principais características de seu (...) método. Por fim, defendemos que a importância deste artigo está em esclarecer a áskēsis em Epicteto de maneira a evitar possíveis anacronismos. -/- This article deals with Epictetus' thought through the exercise bias (áskēsis), that is, through the perfectioning practices of those who choose the office of philosophy. In order to do so, we first clarified what exercises in ancient philosophy mean, based on the theses of Pierre Hadot. Continuing, we explore six exercises considered central to the philosopher of Nicopolis, contextualizing with the teachings involved and describing the main characteristics of his method. Finally, we argue that the importance of this article lies in clarifying the áskēsis in Epictetus in order to avoid possible anachronisms. (shrink)
Nesse artigo, eu procuro mostrar que a leitura tradicional que atribui um procedimento dialético à abordagem aristotélica da acrasia, em Ética Nicomaquéia VII 1-3 provoca um sério problema interpretativo ao tentar compatibilizar a posição socrática acerca da acrasia e os phanomena. Primeiramente, tento mostrar, baseando-me numa análise de Tópicos I 1-2, que o procedimento metodológico, em EN VII 1 1145b2-7, não se caracteriza como dialético. Em segundo lugar, proponho uma leitura em que Aristóteles, passo a passo refuta a tese socrática (...) que nega a existência da acrasia, uma vez que esse tese não é contada entre os phainomena que se quer preservar. (shrink)
RENÉ DESCARTES: UMA BIOGRAFIA -/- RENÉ DESCARTES: A BIOGRAPHY -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva - CAP-UFPE, IFPE-BJ e UFRPE. E-mails: [email protected] e [email protected] WhatsApp: (82)98143-8399. -/- -/- Nascido em 1596 em Haia, nas fronteiras de Touraine e Poitou, em uma família nobre, René Descartes vem ao mundo ao mesmo ano em que Johannes Kepler (1671-1630), em seu primeiro trabalho publicado (Mysterium cosmographicum), prova a superioridade da astronomia moderna (a de Nicolau Copérnico (1473-1543)) da astronomia antiga (a de Ptolomeu (...) (90-168 d.C.)). Ao mesmo tempo, Galileu Galilei (1564-1642), que detém a cadeira de matemática da Universidade de Pádua, funda o método experimental. As descobertas de Galileu tiveram forte impacto sobre o Colégio Real de La Fleche, realizado pelos jesuítas e onde Descartes recebeu, a partir de 1606, uma forte educação. Ele menciona, no Discurso do Método, seu “desejo extremo” em aprender, seguido, no final de seus estudos, de uma grande decepção: decepção com a filosofia ensinada, cujas controvérsias perpétuas revelam um caráter questionável, e que não pode fornecer um alicerce, em seu estado atual, para outras ciências. Também é proferido um desapontamento, mas esse desapontamento é inverso e diz respeito às matemática, capaz de fornecer esse fundamento que a filosofia não confere, mediante sua certeza e evidências, mas sobre o qual ainda não construímos nada. -/- -/- Numa Europa marcada pelo choque do tradicionalismo católico e do mercantilismo protestante, o lento declínio do poder espanhol e a luta dos Países Baixos pela sua independência, Descartes escolheu, primeiramente, após a graduação, a carreira militar. Engajado no exército do Príncipe Maurício de Nassau, ele é retirado da ociosidade da vida da guarnição pelo encontro, em 1618, de um jovem cientista holandês, Isaac Beeckman (1588-1637), que se tornou seu amigo íntimo por algum tempo. Conhecedor de todas as pesquisas científicas do momento e partidário da nova concepção “mecanicista” da natureza, Beeckman compartilhou com Descartes um entusiasmo que foi acompanhado, segundamente, da ambição de realizar a ciência universal por si mesma, mediante um método único: na noite de 10 de novembro de 1619, ele concebe em três “sonhos”, “os alicerces de uma ciência admirável”. -/- Nos anos seguintes a essa iluminação decisiva, Descartes viajou por toda a Europa, estimando, como Michel de Montaigne (1533-1592), que a demonstração de boas maneiras e costumes diferentes podem gerar muitos preconceitos. Toda sua vida, além disso, esteve vagando, isto é, foi marcada por múltiplas mudanças de residências, e a recusa de estabelecer um vínculo muito de perto com alguém. Foi na Holanda que ele, finalmente, buscará a tranquilidade que não encontrara na França ainda abalada pelas guerras religiosas, antes de ser assim pelas convulsões da Fronda. Todavia, mesmo na Holanda, ele não pôde evitar os ataques de calvinistas e polemicas teológicas que o repugnaram, como evidenciado em suas discussões com a Universidade de Utrecht entre 1643 à 1645 e a Universidade de Leiden em 1647. -/- -/- Além de sua amizade com Beeckman, outro encontro teve uma influência indubitavelmente decisiva sobre o destino de Descartes: o encontro com o cardeal de Bérulle. Fundador da congregação do Oratório (ao qual pertencem Nicolas Malebranche (1638-1715) e Jean-Baptiste Massillon (1663-1742)), o cardeal de Bérulle enxerga na nova física mecanicista, um meio de lutar contra o naturalismo resultante do Renascimento e seu paganismo latente: em uma longa entrevista com Descartes, no outono de 1647, ele fez dessa última uma obrigação de consciência para se dedicar, nesse sentido, à filosofia. -/- Em 1628, Descartes começa a escrever as Regras para a direção do espírito, um tratado inacabado e que não foi publicado durante a vida do autor. Em 1631, desenvolvera a geometria analítica que combina curvas geométricas com equações algébricas. Em 1633 escreveu O Tratado do Homem e preparava-se para publicar O Tratado do Mundo quando a notícia da condenação de Galileu Galilei pelo Santo Ofício (a Inquisição) o deixou receoso e decide, por prudência, não publicar o seu Tratado no qual a tese do movimento da Terra ao redor do Sol é apoiada. Alguns anos depois, foi divulgado em público cultivada de algumas de suas descobertas científicas: além da geometria, a dioptria (a teoria da refração da luz) e meteoros (teoria dos fenômenos atmosféricos luminosos). Esses três tratados aparecem no apêndice do Discurso do Método, e como “ensaios” desse método, em 1637. No século XIX, Victor Cousin (1792-1867) publicou pela primeira vez o Discurso sozinho, sem os ensaios. -/- Então vem a principal obra de Descartes no ramo da metafísica: as seis Meditações, aumentadas pelas objeções dos mais famosos filósofos da época (incluindo Thomas Hobbes (1588-1679), Antoine Arnauld (1612-1694) e Pierre Gassendi (1592-1655)), e as respostas a essas objeções, apareceram em 1641. Ansioso para expor sua filosofia para que pudesse ser ensinada, ele também a caracteriza em forma de manual com os Princípios da Filosofia de 1644. -/- Além dos trabalhos publicados, foi por meio das cartas trocadas com personalidades do mundo erudito que Descartes encontrou a oportunidade de esclarecer vários pontos de sua filosofia. Seus principais correspondentes foram o Prade Marin Mersenne (1588-1648), o Padre Denis Mesland (1615-1672), Pierre Chanut (1601-1662), Claude Clerselier (1614-1684), Christiaan Huygens (1629-1695) e Henry More (1614-1687). A partir de 1643, Descartes sustentou, com a Princesa Isabel da Boêmia (1596-1662), uma correspondência dedicada essencialmente a questões morais, que lhe permitiu a formulação de suas ideias nesse campo: esse esforço conduziu, em 1649, ao tratado das Paixões da alma. -/- Nesse mesmo ano, 1649, a Rainha Cristina da Suécia (1626-1689) o convida para ir a Estocolmo, que ele aceitou após muita hesitação. Recebido com todas as honras, mas forçado a um modo de vida bastantemente distinto daquele que era acostumado, e submetido a um clima do qual não se adequou, ele sucumbiu a pneumonia em fevereiro de 1650. -/- Descartes deixou-nos uma espécie de autobiografia intelectual na primeira parte do Discurso do Método: em seus anos de treinamento, seus entusiasmos e suas decepções. O discurso é, também, o primeiro livro para quem busca compreender o projeto filosófico cartesiano desde sua gênese até sua realização. Existem expostos, o método claro (na segunda parte), mas também a moral (terceira parte), a metafísica (quarta parte) e finalmente a física (quinta e sexta partes). (shrink)
SOCIOLOGIA DO TRABALHO: O CONCEITO DO TRABALHO DA ANTIGUIDADE AO SÉCULO XVI -/- SOCIOLOGY OF WORK: THE CONCEPT OF WORK OF ANTIQUITY FROM TO THE XVI CENTURY -/- RESUMO -/- Ao longo da história da humanidade, o trabalho figurou-se em distintas posições na sociedade. Na Grécia antiga era um assunto pouco, ou quase nada, discutido entre os cidadãos. Pensadores renomados de tal época, como Platão e Aristóteles, deixaram a discussão do trabalho para um último plano. Após várias transformações sociais (...) entre diferentes eras e povos, o trabalho foi ganhando espaço nos debates entre os povos, como os caldeus, hebreus e romanos. O trabalho conferiu-se no escopo da discussão social. Na Idade Média, com Agostinho, Santo Aquino e outros o labor foi concebido como algo benéfico e divino. O que se via como algo “escravo” ao povo, transformou-se em necessidade e benevolência divina. -/- Palavras-chave: Conceito; Trabalho; História; Definição. -/- ABSTRACT -/- Throughout the history of mankind, work has figured itself in different positions in society. In ancient Greece it was a little matter, or almost nothing, discussed among the citizens. Renowned thinkers of such a time, like Plato and Aristotle, left the discussion of the work for a last plan. After several social transformations between different eras and peoples, work was gaining space in the debates among peoples, such as the Chaldeans, Hebrews and Romans. The work has taken place within the scope of social discussion. In the Middle Ages, with Augustine, Saint Aquinas and others the work was conceived as something beneficial and divine. What was seen as something “slave” to the people, became need and divine benevolence. -/- Keywords: Concept; Work; History; Definition. -/- BASES TEMÁTICAS DESSE TRABALHO -/- ➢ O trabalho é um conceito construído socialmente; -/- ➢ A modernidade trouxe consigo mudanças significativas quanto à valorização do trabalho; -/- ➢ A origem dos mercados de trabalho, juntamente com o surgimento do capitalismo, minimizou o trabalho como um mero emprego assalariado; -/- ➢ O trabalho, no entanto, apresenta múltiplas manifestações nas nossas sociedades. -/- 1. A VISÃO GREGA DE TRABALHO -/- Comecemos pelos gregos, uma civilização excitante que, durante muitos séculos antes de Cristo, já começava a elaborar riquíssimas reflexões sobre vários aspectos da vida humana. No entanto, surpreende aqueles de nós que já ler os primeiros filósofos gregos, como entre tantas análises rigorosas e “diálogos”, um elemento tão central na vida social dos povos, como o trabalho havia tido escassa repercussão. A explicação só faz sentido, justamente, ao analisar a valorização que esses grandes pensadores tinham acerca do nosso objeto de estudo que é o trabalho. Embora, como supracitado, os gregos não tivessem uma visão unânime sobre o trabalho, não é menos certo assinalar que para esta civilização o trabalho foi considerado um fato altamente desvalorizado. O trabalho, para eles, dado a sua vinculação com a dimensão de constrangimento e necessidades, limitava a liberdade dos indivíduos, condição indispensável para integrar o mundo da “pólis” na qualidade de cidadão. O homem livre realizava atividades absolutamente desinteressadas: a atividade intelectual (que não era considerada trabalho) fazia parte do ócio e da contemplação. O trabalho, reservado apenas aos escravos, como bem sinala Hopenhayn (1955), significava uma mera função produtiva. Portanto, o escravo passou a ser unicamente uma força de trabalho. Como tal, ele não tem personalidade e pertence ao seu mestre, como uma coisa entre muitas. Como objeto de propriedade, escapa ao pensamento antropológico que domina a filosofia sofista e socrática, porque para o cidadão grego falar de escravo não implica um sujeito pensante, senão uma coisa ou, no máximo, a força. Também escapa ao pensamento platônico, porque, como uma coisa, parece totalmente desvalorizado na construção idealista-dualista da realidade (HOPENHAYN, 1988. p. 23 – Tradução própria). -/- Três termos fundamentais que devemos recordar da tradição grega: -/- 1 – Ponos: penalidade, fadiga; -/- 2 – Banausia: trabalho mecânico, e -/- 3 – Ergon: realização. -/- Vejamos como essa noção de trabalho é construída como algo servil (ponos), ao qual uma visão positiva de lazer e contemplação foram contrastadas como uma atividade puramente humana e libertadora. As raízes do supracitado são encontradas no valor eticamente supremo da autarquia socrática. Segundo essa noção alcunhada por Sócrates (469-399 a.C.), todo aquele que trabalha está submetido tanto à matéria como aos homens para quem trabalha. Nessa medida, sua vida carece de autonomia e, portanto, de valor moral. Naturalmente, não só os escravos, mas também qualquer trabalhador dedicado a todos os tipos de tarefas manuais, foram desprezados por um pensamento helênico indubitavelmente aristocrático. Para Platão (427-347 a.C.), de origem aristocrática, descendente do último rei de Atenas e discípulo de Sócrates, a autarquia continua a ser perpetrada como um valor ético supremo e, em consonância com os interesses da aristocracia fundiária, afirmava que somente a agricultura evocava autêntica autonomia. Dessa forma, o pensamento platônico restringiu a participação política a escravos, comerciantes e artesãos. Todos eles têm em comum a dependência das condições materiais em que produzem e trocam mercadorias. O plano político estará intimamente relacionado ao econômico-trabalhista: somente quem é capaz de governar a si mesmo (e como sabemos, acontece com aqueles que não trabalham ou possuem terras), pode governar os outros. Somente a liberação total da prática mundana do trabalho abre as possibilidades de dedicar-se, como fez Platão, à contemplação (σχολή), à filosofia e às ciências, e por meio disso saber distinguir o bem do mal, o justo do injusto, o verdadeiro do falso. Quem poderia dedicar-se a tais “tarefas nobres”? Evidentemente, aqueles que não precisam fazer parte da população trabalhadora, isto é, a aristocracia. Esse sistema de governo aristocrático foi defendido, obviamente, por Platão. Em sua “A República” sinala que o governo perfeito é o aristocrático, e que a este se sucedem a timocracia (governo dos guerreiros), a oligarquia (dos ricos) e a democracia (“governo daqueles que amam o prazer, a mudança e a liberdade), que perece por seus excessos nas mãos de alguns homem audaz que se coloca à frente do povo para defender a democracia e “do tronco desses protetores do povo nasce o tirano”, dando origem à tirania.(2) Em seu diálogo “Político” podemos ler: Aqueles que possuem a si mesmos através da compra, e aqueles que podem ser chamados sem nenhuma discussão de escravos, não participam da arte real [...] E todos aqueles que são livres, se dedicam espontaneamente a atividades servis como as supracitadas, transportando e trocando produtos da agricultura e de outras artes; que nos mercados, indo de cidade em cidade por mar e terra, trocando dinheiro por outras coisas ou por dinheiro, o que chamamos de banqueiros, comerciantes, marinheiros e revendedores, poderão, por acaso, reivindicar para eles algo da ciência política? [...], mas também aqueles que estão dispostos a prestar serviços a todos por salários ou por subsídios, nunca os encontramos participantes na arte de governar [...] Como os chamaremos? Como você acabou de dizer agora: servidores, mas não governantes dos estados (PLATÃO, 1983. pp. 237-8 – adaptado). Esse estado ideal que Platão projetou em seus ensinamentos estava longe, a propósito, da democracia ateniense defendida por Péricles. De certa forma, Platão só confiava em uma elite no poder constituída por uns poucos (oligarquia) que não deveriam se render às tarefas servis da produção e circulação das riquezas. Para ele, as crianças aristocráticas deveriam ser selecionadas desde a infância, recebendo uma educação suficiente tanto em filosofia quanto nas “artes da guerra”. Aos trinta anos, eles já seriam capazes de passar por um exame donde seriam selecionados os “filósofos-reis” encarregados do governo. De fato, no entanto, suas concepções de governo nunca poderiam ser executadas com pureza; ou pela chamada “contrarrevolução aristocrática”, ou pela invasão estrangeira subsequente. Essa visão do trabalho que estamos a analisar, como bem sinala Henri Arvon (1914- 1992), conduz a uma sociedade basicamente conservadora e estancada no produtivo. (3) A ideia de liberdade, ócio e contemplação como valores superiores, propõe um desprezo pelo trabalho que, como vimos, é uma atividade puramente transformadora. Há aqueles que, mediante tal contestação, arriscam fundamentar que grande parte do subdesenvolvimento tecnológico na Grécia derive justamente a essa cultura tão peculiar em relação ao trabalho. Caso contrário, se houvesse escravos, por que avançar em conhecimentos que facilitaram o trabalho? Não nos surpreende, nesse sentido, que uma civilização capaz de criar conhecimentos espetaculares em áreas particularmente complexas como a geometria (Euclides), por outro lado, não soubesse (ou não gostaria) de avançar em conhecimentos técnicos aplicáveis ao campo econômico-trabalhista. Já vimos como a cidadania era o escopo da de alguns aristocratas da civilização helênica. Hannah Arendt (1906-1975) sinalava que os gregos distinguiam entre os escravos, os inimigos vencidos (dmôes ou douloi) que estavam encarregados do trabalho doméstico, e os demiourgoi, homens livres para se deslocarem do domínio privado para o público. Somente depois do século V, sinala Arendt, a pólis começou a classificar as ocupações de acordo com os esforços que eles exigiam. Nisso, Aristóteles (384-322 a.C.) teve que desempenhar um papel preponderante que colocou aqueles cujo “corpo está mais deformado” na faixa mais baixa. Ele não admitiria, portanto, aos estrangeiros (os escravos), nem tampouco aos banausoi, antes dos demiourgoi, trabalhadores e artesãos que deviam resignar-se ao mundo dos “oikos”. Estes, não só estavam submetidos à necessidade como eram incapazes de ser livres, mas também incapazes de governar a parte “animal” do seu ser (República, 590). Serão eles, não obstante, aqueles que permitem o florescimento da chamada democracia helênica, pois, quem senão os trabalhadores (escravos ou artesãos) poderia manter com seu esforço o ócio e a contemplação dos “homens livres”, cidadãos do mundo? Como foi supracitado, será Aristóteles quem delimitará ainda mais os direitos de cidadania. Sua cidade ideal, como em Platão, diferenciaria os governantes dos governados. O primeiro, constituído pela classe militar, estadistas, magistrados e sacerdócio. O segundo, pelos agricultores, artesãos e os camponeses. Com os comerciantes há uma certa ambivalência: embora ele considerava uma ocupação antinatural, estava disposto a admiti-los até certo ponto em sua cidade ideal, cuja base seguiria sendo a escravidão. Em sua Política, ele explana: A cidade mais perfeita não fará do trabalhador manual (artesão) um cidadão. Caso o admitir como tal, a definição de virtude cívica [...] não alcança todos os cidadãos, nem apenas os homens livres, mas só os que estão isentos de trabalhos indispensáveis à sobrevivência. Destes, os que estão a serviço de um só indivíduo, são escravos; os que servem a comunidade, são trabalhadores manuais (artesãos) ou trabalhadores não qualificados (ARISTÓTELES, 1998. p. 203). Tampouco compreenderá os agricultores como reivindicava Platão: “Tampouco deverão ser agricultores os futuros cidadãos, pois para a formação de sua virtude e para a atividade política, o ócio é necessário”. Essa prolifera discussão ocorreu em uma civilização onde começaram a surgir as primeiras mudanças produtivas derivadas do crescimento econômico feito do descobrimento do ferro, e sua posterior divisão do trabalho, onde florescem os grupos de comerciantes e a aristocracia proprietária de terras começa a dominar. Os pensadores da época, mais aliados a estes últimos, contrariavam os princípios da acumulação comercial. Em sua Política, Aristóteles aconselha os cidadãos a absterem-se de qualquer profissão mecânica e de toda especulação mercantil. O primeiro, porque limita intelectualmente, e o segundo, porque degrada o ético. Somente o ócio (scholé), para esses pensadores, permite a virtuosidade e a capacidade de julgar. A Koinonia politiké (comunidade dos homens livres) era típica daqueles que não precisavam de trabalho, relegando a população trabalhadora ao mero âmbito da reprodução material (chrematistiké), o que só era possível em um contexto de alta divisão do trabalho onde um grupo minoritário (oligarquia) vivia à custa do trabalho da maioria (muitos deles escravos). O termo “ócio” provém de “scholé”, entendido entre os gregos como tempo para si mesmo, para a contemplação (sjolé) e, portanto, para a formação (scholé = escola). Desse ponto de vista, o ócio para os gregos é um fim em si mesmo. Entre os romanos, no entanto, adquire outra conotação. Em latim octium, designa o campo contraposto ao neo-octium (negócio), ou seja, é o tempo de descanso que permite dedicar-se ao negócio. Tal visão sobre o trabalho e o ócio, respectivamente, não foi, no entanto, como supracitado no início, unanimemente desenvolvida em toda a história da civilização helênica. Os textos de Homero(4) (séculos IX e VIII a.C.) são mais reservados a respeito, mas acima de tudo, na Grécia antiga encontramos autores como Hesíodo (século VIII), que postulavam outras teses. Para o autor de “Os trabalhos e os dias”, o trabalho se constituía em um justo e necessário castigo que Zeus impôs aos homens pelo pecado de Prometeu. Note a similitude com a crença bíblica que veremos adiante. Hesíodo explana: Lembre-se sempre do meu conselho e trabalhe [...] os deuses e os homens se indignam com quem ocioso vive, semelhante em caráter aos zangões sem ferrão, que consomem o esforço das abelhas [...] O trabalho não é nenhuma desonra; desonra é não trabalhar (HESÍODO, 2012. p. 93 e 95). Também entre alguns sofistas (aqueles que vendiam sua sabedoria a quem gostaria de comprá-la), como Protágoras (século V a.C.), “o primeiro e o maior deles”(5), coloca o estudo e a arte (técnica) na mesma faixa, e Antifonte (século V a.C.) disse: “[...] e as honras e preços, e toda a espécie de encorajamento que Deus incumbiu aos homens, devem necessariamente resultar de fadiga e suor”. Como conviveu a cultura grega com essas noções tão diferentes? Tenho a ideia, juntamente com Hopenhayn, que o desprezo dos pensadores gregos pelo manual foi causado pela violência dos guerreiros e dos aristocratas de plantão, que impuseram aos seja derrotados o jugo. Do trabalho árduo e difícil. Porque a aristocracia queria trabalhar nessas condições? A própria divisão do trabalho em si possibilitou o crescimento da civilização helênica, estava gerando diferentes classes com visões distintas sobre o trabalho. Por outro lado, surgiram os camponeses pobres, os derrotados e aqueles que tinham que viver do trabalho artesanal. Essas pessoas, na maioria das vezes isoladas do mundo da “polis”, gerariam suas próprias leituras dos acontecimentos, seus próprios espaços para o desenvolvimento cultural, inclusive sua própria religião, distante daquela imposta pela visão aristocrática, olímpica, contemplativa e estética dos “homens livres”. -/- 2. A VISÃO DOS CALDEUS ACERCA DO TRABALHO -/- A leitura de outros povos e civilizações sobre este tema tem sido diferente. Entre os caldeus, por exemplo, a visão pejorativa analisada entre os gregos não é registrada. Nas escrituras sagradas da religião de Zaratustra (o Avesta), lemos: “É um santo aquele que constrói uma casa, na qual mantém o fogo, o gado, sua mulher, seus filhos, os bons párias. Aquele que faz a terra produzir trigo, que cultiva os frutos do campo, cultiva corretamente a pureza” (HOPENHAYN, 1988. p. 35). Para os caldeus, como se pode observar, o trabalho implica, de uma posição diametralmente oposta à helênica, uma contribuição na ordem econômica, mas também na espiritual. Trabalhar não é só “cultivar o trigo” (dimensão das necessidades fisiológicas), mas também “cultivar a pureza”, dimensão esta, relacionada com a satisfação das necessidades espirituais. Por que apreciamos uma diferença tão acentuada entre essas culturas? Provavelmente, os diferentes graus de desenvolvimento dos povos levaram a isso. Enquanto entre os gregos primava uma divisão do trabalho, onde alguns tinham o status de “homens livres” dedicados à contemplação e ao ócio, outros não tinham escolha a não ser trabalhar, em uma situação de domínio em relação às naturezas daqueles que o empregaram. Esse não foi o caso dos caldeus, que possuía um escasso dividido trabalho, em que a todos se correspondia uma atividade laboriosa. -/- 3. A VISÃO DOS HEBREUS SOBRE O TRABALHO -/- No meio do caminho entre os caldeus e os gregos, encontramos a avaliação do trabalho feita pelos hebreus, dessa vez, tingindo de ambivalências. Tal como ponderava Hesíodo entre os gregos, para os hebreus, o trabalho se constituía de um mal necessário; em um meio para expiar os pecados; dessa vez não de Prometeu, mas de Adão e Eva. Vamos ver, no entanto, alguns aspectos mais complexos. A primeira coisa a se notar da perspectiva hebraica (compartilhada com o cristianismo) é o que se resulta da leitura do livro de Gênesis, aquela história poética e cheia de imagens para elucidar facilmente a origem da criação. Lá se estabelece a ideia de um deus criador-trabalhador: “No princípio Deus criou o céu e a terra [...] No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou [...] de toda a obra que realizara na criação”.(7) Esse Deus como primeira causa (São Tomás de Aquino (1225-1274)) denota laboriosidade seu correspondente descanso, um binômio que será fundamental para compreender a evolução do direito do trabalho e do direito ao descanso semanal contemporâneo. Digamos, em segundo lugar, que o Senhor Deus providenciou o trabalho no Éden: “O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivá-lo”.(8) Portanto, não é certa a ideia de que o trabalho é o resultado do pecado: ao contrário, é um trabalho árduo aquele que deriva do pecado segundo a tradição hebraico-cristã. Antes, na ausência do pecado, havia uma espécie de bom trabalho. Foi o pecado original, que levou Deus a condenar Adão e Eva, e por isso a toda a humanidade, a “ganhar o pão com o suor da sua testa”. “Por isso o Senhor Deus o mandou embora do jardim do Éden para cultivar o solo do qual fora tirado”. (9) O Talmude diz: “Se o homem não encontra seu alimento como animais e pássaros, precisa ganhá-los, isso se deve ao pecado”. Essa sentença, de caráter histórico, promove a ideia de trabalho como meio para expiar o pecado original, mas também como meio para produzir; isto é, legitimando a mudança inerente a todo trabalho e, portanto, legitimando também aquela vontade transformadora que caracterizou desde sempre os povos hebreus.(10) Agora, ao contrário dos caldeus, para os hebreus da antiguidade, o trabalho nunca teve um fim ético em si mesmo, mas foi constituído apenas como um meio. Essa visão esteve sempre presente, e caracteriza muito claramente a concepção que muitos integrantes de nossas sociedades contemporâneas possuem sobre o trabalho, além da religião de cada um. -/- 4. OS ROMANOS E O TRABALHO -/- Os romanos, por sua vez, deram uma importante contribuição para o desenvolvimento do conceito de trabalho. Se bem que, a grosso modo, não houvesse grandes diferenças com o pensamento dos gregos, com quem eles tinham em comum, além disso, uma maior divisão do trabalho fruto do desenvolvimento econômico e o uso massivo de mão de obra escrava(11); a maior contribuição do ponto de vista de sua originalidade histórica estava presente na tradição jurídica que inauguraria o Império Romano. O maior impacto por meios jurídicos e não filosóficos é explicado pelo fato de que os romanos, ao contrário dos gregos, não conseguiram “inspirar” a produção de grandes pensadores sociais. Com efeito, para os romanos, como o escravo não era considerado uma pessoa, o viam-no desprovido de personalidade jurídica. Isso conduziu a negação da relação de trabalho entre a pessoa encarregada de um trabalho manual (escravo) e seu dono. Tal relação correspondia, acima de tudo, ao direito de propriedade que os juristas romanos haviam garantido quase sem limites para seus cidadãos. O problema, como aponta Hopenhayn, surgiu quando o proprietário não ocupa seu escravo, mas aluga-o para terceiros. Surge assim a figura do arrendamento de serviços, que deriva do arrendamento das coisas. Porém, como na realidade o que se alugava era a força de trabalho, a qualidade jurídica desloca-se para a atividade realizada pelo escravo. Dessa forma, a atividade do trabalhador, primeiro do escravo, posteriormente do homem livre, começa a ser tratada como uma coisa, e se converte em antecedente do arrendamento de serviços do Direito Civil moderno. Ademais, na tradição romana, o trabalho manual estava desprestigiado. Cícero (106-43 a.C.) em De Officiis, estabeleceu com fria claridade “ipsa merces est auctoramentum servitius”(12) (todo trabalho assalariado é trabalho escravo). A vida era difícil para esses trabalhadores: nos territórios sob domínio romano, Augusto (63-14 a.C.) tinha imposto um tributo à todos os homens que exerciam algum tipo de trabalho manual, além do imposto à residência, às valas e outros mais particulares como o imposto para a detenção de porcos. Certamente, aqueles que levaram a pior parte no tempo da Roma Imperial foram os escravos (servi) sob domínio e propriedade de seus donos (domini). Me seus tempos de auge, a demanda de escravos em Roma era de 500.000 ao ano. Se compararmos com os 60.000 escravos negros trazidos a América nos anos de maior tráfico, teremos uma ideia mais ou menos exata da magnitude desse triste fenômeno. -/- 5. O CRISTIANISMO E O TRABALHO -/- As mensagens do cristianismo primitivo, são inseridas logo, nesse tempo histórico, onde Roma se tornava o centro das maiores mobilizações de rebeldia da antiguidade. Isaías, nesse sentido, proclamaria que o Messias viria: “[...] a pregar boas novas aos abatidos, a vendar aos quebrantados de coração, a publicar liberdade aos cativos, e aos presos a abertura do cárcere”.(13) Jesus, efetivamente, incluiu em sua missão, mensagens de libertação aos pobres e oprimidos. Porém, ao contrário do supracitado, como bem sinala Eric Roll (1907-2005), dos antigos profetas hebreus, não o faria saudando as comunidades tribais com seu espírito de grupo; mas animado por uma mensagem mais universal e permanente, proclamando uma mudança mais completa e integral na conduta do homem em sociedade, onde os valores de justiça e amor se colocariam em um primeiro plano. Evidentemente, a mensagem do cristianismo primitivo, e mais concretamente de Cristo, distava muito dos filósofos gregos. Deixemos que Roll explique: Temos visto que as doutrinas econômicas de Platão e, em certa medida, de Aristóteles, nasciam da aversão aristocrática ao desenvolvimento do comercialismo e da democracia. Seus ataques contra os males que acarreta o afã de acumular as riquezas são reacionárias: olham para trás, e o de Cristo olha para frente, pois exige uma mudança total, mas relações humanas. Aqueles sonhavam com um estado ideal destinado a proporcionar a “boa vida” para os cidadãos livres unicamente e cujas fronteiras eram as da cidade-estado daquele tempo; Cristo pretendeu falar por todos e para todos os homens. Platão e Aristóteles haviam justificado a escravidão; os ensinamentos de Cristo sobre a fraternidade entre todos os homens e o amor universal eram incompatíveis com a ideia da escravidão, apesar das opiniões expostas depois por São Tomás de Aquino. Os filósofos gregos, interessados somente pelos cidadãos, sustentaram opiniões muito rígidas sobre a diferente dignidade das classes de trabalho, e consideravam as ocupações servis, com exceção da agricultura, como próprias apenas para os escravos. Cristo, ao dirigir-se aos trabalhadores de seu tempo, proclamou pela primeira vez a dignidade de todas as classes de trabalho, assim materiais como espirituais (1942. p. 42 – Tradução própria). Não pode escapar desse estudo, o fato de que o próprio Jesus Cristo herdou o ofício de carpinteiro de seu “Pai” José; e que escolheu seus discípulos entre os pescadores e artesãos da região. Essa visão primitiva do cristianismo, no entanto, deve ser analisada no quadro das escrituras sagradas do Antigo Testamento que compartilha com a cultura (e obviamente a religião) hebraica. Nesse sentido, o trabalho não deixa de ser um meio, descartando-se como um fim em si mesmo. Mas, agora atribuindo-lhe um novo valor, sempre em tento um meio para um fim virtuoso: o trabalho será fundamental para permitir a satisfação das necessidades de cada um, mas também seus frutos, deverão ser inseridos em uma dimensão comunitária, onde o “próximo” necessitado esperará a contribuição fraterna e solidária do cristão. O trabalho, nessa perspectiva, não só possibilita o “tomar”, mas também o “dar”. Em relação a dupla perspectiva, é onde podemos entender a crítica do cristianismo a acumulação da riqueza. Como aponta o evangelista Mateus, “acumular o tesouro no céu, onde nem a traça nem a ferrugem os consomem, e onde os ladrões não perfuram nem roubam. Onde está o seu tesouro está seu coração”. (14) Com São Paulo se incorpora um novo componente valioso: a obrigatoriedade moral do trabalho. Em sua carta aos Tessalonicenses dita claramente “ao que não trabalha que não coma”. Diz São Paulo: Vocês sabem em que forma têm que nos imitar: nós trabalhamos enquanto estivemos entre vocês, não pedimos a ninguém um pão que não teríamos ganhado, senão que, de noite e dia, trabalhamos duramente até nos cansarmos, para não ser carga para nenhum de vocês [...] Além disso, quando estávamos com vocês lhes demos está regra: se alguém não quiser trabalhar, não coma. Mas agora ouvimos que há entre vocês alguns que vivem sem nenhuma disciplina e não fazem nada, muito ocupados em meter-se em tudo. A estes lhes mandamos e lhes rogamos, por Cristo Jesus, nosso Senhor, que trabalhem tranquilos para ganhar a vida (II Tes. 3:10). Essa frase, entendida somente no contexto de uma sociedade donde não existia um conceito de desemprego tal como entendemos atualmente, é curiosamente reproduzida pelo modelo soviético em pleno século XX. Com efeito, a Constituição da União Soviética estabeleceu em seu Artigo 12: “O trabalho é, na Rússia, uma questão de dever e de honra para todo cidadão fisicamente capaz. Essa obrigação é baseada no princípio: “quem não trabalha não come”. (15)(16) Para São Paulo, o trabalho deve ser o meio para ganhar a vida. Ele quis ser exemplo e enquanto pregava continuava trabalhando, presumivelmente como tecelão de tendas. A obrigatoriedade moral se aplica na medida em que a pessoa está em condições de o fazer. Para os incapacitados a fazê-lo (idosos, crianças, deficientes, doentes, acidentados etc.) existia a obrigatoriedade do socorro segundo a máxima do amor (ágape) ao próximo. Essas sentenças morais têm hoje em dia uma importante quota de explicação para com as contemporâneas políticas sociais. -/- 6. O TRABALHO NA IDADE MÉDIA -/- A Idade Média, período que ocupa desde o crepúsculo do Império Romano do Ocidente no século V pelos bárbaros, até o século XV, com a queda de Constantinopla, evidentemente mostra um conjunto importante de escolas e pensadores que marcaram pautas importantes para discernir o valor do trabalho nas diferentes culturas. A organização econômica mais visível nestes mil anos, onde operou o trabalho, consistia em extensões grandes de latifúndios errados do Império Romano (o sistema econômico denominado feudalismo), onde (mediante a falta de escravos) recorreu-se à mão de obra camponesa para o trabalho. O sistema, implicava o arrendamento de parte dessas terras a ex-escravos ou homens livres, em troca de uma renda em dinheiro e espécies, além do cultivo das próprias terras senhoriais. Por certo, a figura do servo não distava muito da do escravo se tivermos em conta as condições de funcionamento do contrato de trabalho. O comércio também teve seu lugar no sistema feudal, o mesmo adquiriu grande importância em certas regiões ou lugares, à exemplo de Constantinopla. A atividade econômica seguia seu rumo na história, e depois dos séculos IX e X, o crescimento das forças produtivas deu lugar a uma maior acumulação por parte de componentes e artesãos e, por certo, a uma maior apropriação de excedentes por parte do Senhor feudal. Essa situação foi ativante para a construção dos primeiros Burgos ou cidades, onde o comércio e a indústria artesanal teriam um marco mais adequado para o seu desenvolvimento. Essa é a etapa do nascimento dos primeiros grêmios corporativos (17). Então para o século XII, a estrutura feudal começa a desmoronar porque a produção de determinados bens começa a ser mais eficiente em cidades e não no feudo. O dinheiro, então, passou a ganhar maior peso que a terra, o que obriga os senhores feudais a aumentar seus rendimentos. Isso leva a um empobrecimento lógico dos camponeses, o que não dura muito, porque na primeira metade do século XIV, a maior parte dos servos alcança sua liberdade. Por sua vez, nessa apertada síntese da história econômica da Idade Média, devemos assinalar que pelo século XIV, e depois das Cruzadas e o posterior desenvolvimento do comércio internacional entre os impérios arábico e bizantino, inaugura-se uma etapa pré-capitalista que durará três séculos. É lá que se levanta mais energética a voz de alguns homens da Igreja contra a tendência à exaltação da riqueza já começava a avivar-se na Europa. São Tomás de Aquino, nesse sentido, não considerará ao comércio pré-capitalista bom ou natural. No entanto, ele o julgava inevitável uma vez que era o meio ao qual o comerciante tinha que manter a sua família. Dessa forma, os lucros do comércio não era outra coisa senão o fruto do trabalho. Se tratava, então, de colocar o acento na justiça da mudança efetuada, para o qual Aquino recorre a Aristóteles, cuja análise sobre o valor de mudança é figurado no seu estudo da Justiça. Muitos padres da Igreja, desde então, pretenderam formular um conceito de “preço justo”. Nesse sentido, o Cristianismo apresenta uma evolução do seu pensamento sobre o comércio que partia de uma visão absolutamente contrária ao começo da Idade Média (Santo Agostinho (354-430), São Jerônimo (347-420) etc.), a outra mais transacionável, que acompanhou, sobretudo, o pensamento de Aquino. Algo similar ocorreu com outro dos “preceitos” da Igreja em matéria econômica: a usura. Esta era considerada pela igreja como a melhor forma de obter lucro. O mesmo evangelista Lucas (século I d.C.) foi categórico ao rejeitar essa linha de operações. A lei hebraica também fez isso, e podemos encontrar no livro do Êxodo (22,25) tal proibição a respeito. Mais atrás no tempo, há antecedentes de condenação à usura entre os hindus (Rigveda, cerca de 1500 a.C.) e budistas (século VI d.C.), além do Islã mais próximo do nosso tempo (século VI d.C.). Ao princípio da Idade Média, como testemunha Roll, a proibição somente alcançava a Igreja, já que o escasso desenvolvimento mercantil não merecia outra coisa. No final da Idade Média, no entanto, que a situação é outra; e a prática secular foi orientada no sentido de promover o empréstimo de dinheiro cobrando por isso um juro. Alarmada ante esses fatos, a Igreja condena mais uma vez a usura no Terceiro Concílio de Latrão de 1179. No mesmo escreveu e ensinou São Tomé (século I d.C.) e outros discípulos da Igreja. No entanto, as práticas econômicas foram minando a autoridade eclesial e está terminou, através de sucessivas etapas, por aceitar, em certas condições e sob certas circunstâncias, a cobrança de juros sobre a concessão de um empréstimo. Em tal sentido, um dos autores mais representativos só início da Idade Média foi Santo Agostinho. Foi este um dos pilares, em seu tempo, das noções “anticapitalistas” que foram seguidas e complementadas por homens do tamanho de São João (347-407), São Ambrósio (340-397), São Clemente (150-215), São Cipriano (200-258) entre outros. (18) Santo Agostinho valoriza o trabalho recordando em tal sentido a São Paulo, a que cita com muita frequência em seus textos. Segundo o Bispo de Hipona, todo trabalho manual é bom pelas razões dadas pelo cristianismo primitivo. Concilia, além disso, seu dualismo platônico, ao sustentar que enquanto o homem trabalha tem a alma livre, de modo que é perfeitamente compatível pensar em Deus ao mesmo tempo em que se trabalha. Essa particular sintonia entre o trabalho e a oração foi perfeitamente posta a prova pelos monges beneditinos, cujo lema “Ora Et Labora” (orar e trabalhar) é paradigmático. “Trabalha e não desesperes” dizia seu fundador, São Bento de Núrsia (480-547), de seus monastérios distribuídos em um primeiro momento a Subiaco, no início do século VI. Também corresponde a São Bento uma sentença que perdura até o dia de hoje no imaginário moral sobre o trabalho: “Otiositas inimica est animae” (a ociosidade é inimiga da alma), tal qual diz uma expressão popular castelhana: “el ocio es la madre de todos los vicios” (o ócio é a mãe de todos os vícios). Tomás de Aquino, alguns séculos depois, continua a reflexão sobre o trabalho e estabelece uma hierarquia de profissões, onde localiza o trabalho agrícola e artesanal acima do comercial. Uma quota de originalidade na história do pensamento sobre o trabalho consistiu em considerá-lo como uma obrigação somente se necessário para subsistir; ou dito de outra maneira: quem não tem necessidade de trabalhar não tem que fazê-lo. Isso sim, à falta de trabalho, devia dedicar-se à oração e contemplação divina, atividades por certo mais elevadas para o autor da Suma Teológica. Logo, considerará que Deus é a causa primária, a que tudo deve a sua existência; por derivação, o homem é causa segunda, procurando atreves do trabalho “criar” em suas dimensões humanas. “Entre todas as formas com que a criatura humana tenta realizar a semelhança divina, não há outra de relevo mais destacado que a de trabalhar, isto é, ser em o mundo causa novos efeitos”, disse o Santo. (19) Aquino, além disso, utilizando categorias platônicas, hierarquiza o trabalho, considerando o intelectual acima do manual. Chama “artes servis” a estes últimos, enquanto que o trabalho intelectual corresponde ao conjunto das “artes liberais”, dignas de maior remuneração ao fazer uso da inteligência. Esta distinção própria da Escolástica, dá lugar à divisão clássica entre as 7 artes liberais: o Trívium (gramática, retórica e dialética) e quadrivium (astronomia, geometria, aritmética e música). Outras contribuições de São Aquino têm a ver com sua posição diante do trabalho agrícola ao qual o considera como o melhor meio para assegurar a subsistência de um povo; a maior importância dada à vida contemplativa sobre a ativa, embora considerando a primeira como “laboriosa”; sua posição sobre a escravidão, que não considerava como natural, no entanto, entendê-la “útil”(20); e sua interpretação sobre o contrato de trabalho: neste, o operário não vende a si mesmo, nem seu corpo, nem sua inteligência, nem sequer sua faculdade de trabalho. Isso significa que o Direito Natural proíbe considerar o trabalho como um objeto de mudança. Propõe, em vez disso, considerar o contrato como um arrendamento de serviço. Em termos gerais, a valorização que sobre o trabalho se realiza na Idade Média, rebaixando ao trabalho manual em relação a outras tarefas, fica explícita na divisão tripartida que recorre, entre outros, Adalberão Bispo de Laon (947-1030): “Triplex Dei ergo domus est quae Creditor uma nunca oran, alii pugnat, Aliique laborant” (ternária é a casa do Senhor e não uma: aqui sobre a terra uns oram, outros lutam e outros trabalham). Não gostaria de deixar passar por alto, finalmente, entre os movimentos originados na Idade Média, a contribuição que sobre o tema do trabalho teve a ordem franciscana. Essa, contra o que muitos podem crer, é uma ordem não mendicante no sentido estrito, mas sim trabalhadora e de pobreza. São Francisco de Assis (1181/82-1226), no final do século XII, marcaria como ninguém dentro do cristianismo, uma vida ascética baseada no trabalho e na pobreza. Inclui, além disso, um elemento pela primeira vez descoberto na cultura europeia: o sentido da alegria que acompanha o trabalho. “Essa condição de 'suor de sua testa' com 'a alegria de seu coração' outorga ao trabalho uma condição diferenciada”. Avançando então na história da humanidade, entramos na época moderna, caracterizada por cinco grandes eventos: -/- 1. A decadência do poder moral da Igreja e o enfraquecimento de seu poder econômico frente ao da crescente burguesia; -/- 2. O renascimento intelectual e artístico; -/- 3. As viagens paras as índias e a descoberta da América; -/- 4. A formação e a constituição dos Estados-nação; -/- 5. As reformas religiosas de Lutero (1483-1546) e Calvino (1509-1564). -/- Nesse contexto, os séculos XV e XVI mostraram como o mercantilismo ia avançando apesar dos esforços de alguns pensadores da Igreja que eventualmente perderam o pulso diante do desenrolar dos acontecimentos. Sucessivas encíclicas papais terminaram por legitimar o interesse nos empréstimos e, por meio desta, levou-se a maior acumulação de riquezas por parte dos banqueiros. Esse foi o meio ideal para o desenvolvimento da atividade do mercador, para quem, o trabalho passou a ser considerado um meio para obter sucesso. Ao dinamizar-se a atividade econômica e mercantil, a visão humanista do trabalho começa a perder valor, realçando-se ao mesmo como um simples meio para fins de enriquecimento. Talvez a exceção a essa noção estendida entre os novos atores tenha sido a proporcionada pelo humanismo renascentista. Para Campanella (1568-1639), por exemplo, sua “Cidade solar”, não existe o divórcio entre trabalho manual e intelectual, isso quando o segundo começa a ser supervalorizado por sua ação no plano das invenções e das novas técnicas.(22) Na mesma linha se situa Thomas More (1478-1535), o autor de “Utopia”, outra reação do cristianismo às projeções que estava adquirindo o cada vez mais influente mercantilismo. Embora o trabalho não seja considerado como um mau, pelo contrário, apresenta características humanizadoras, é sugestivo comprovar como em Utopia a jornada do trabalho não supera as seis horas diárias e na Cidade solar não se devia trabalhar mais que quatro horas. Indubitavelmente, essas versões de sociedades ideais terminariam por impactar sobre maneira a constituição das Missões Jesuítas na América do Sul; e as Franciscanas na Baixa Califórnia. É o Renascimento, o lugar propício, além disso, para renovar o conceito da virtuosidade, agora traduzida na figura do empresário ou financista audacioso e empreendedor. Essa linha foi reforçada logo por Calvino, para quem os negócios são um bom serviço a Deus, e a riqueza não é mais que um fruto de uma vida dedicada ao trabalho desde uma perspectiva ética que analisarei com Weber mais tarde, mas que confere ao trabalho a particularidade de ser um caminho para o sucesso. Esse puritanismo impulsionou sobremaneira a versão do “homo economicus” que mais tarde, em pleno auge do capitalismo pós-industrial, ao qual, segundo Daniel Bell (1919-2011), fora substituído pelos valores hedonistas. -/- REFERENCIAL TEÓRICO AGOSTINHO. Cidade de Deus: contra os pagãos. Trad. O. P. Leme. 2ª ed. Bragança Paulista: Editora Universitária, 2008. (Col. Pensamento humano). _____________. O livre-arbítrio. Trad. N. A. Oliveira. 1ª ed. São Paulo: Paulus, 1995. AQUINO, T. de. Suma Teológica. 2ª ed. 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PREMISSA No século XIX, ocorreram transformações impulsionadas pela emergência de novas fontes energéticas (água e petróleo), por novos ramos industriais e pela alteração profunda nos processos produtivos, com a introdução de novas máquinas e equipamentos. Depois de 300 anos de exploração por parte das nações europeias, iniciou -se, principalmente nas colônias latino-americanas, um processo intenso de lutas pela independência. É no século XIX, já com a consolidação do sistema capitalista na Europa, que se encontra a herança intelectual mais próxima da (...) qual surgirá a Sociologia como ciência particular. No início desse século, as ideias do Conde de Saint-Simon (1760-1825), de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), de David Ricardo (1772-1823) e de Charles Darwin (1809-1882), entre outros, foram o elo para que Alexis de Tocqueville (1805-1859), Auguste Comte (1798-1857), Karl Marx (1818 -1883) e Herbert Spencer (1820-1903), entre outros, desenvolvessem reflexões sobre a sociedade de seu tempo. Auguste Comte e Karl Marx foram os pensadores que lançaram as bases do pensamento sociológico e de duas grandes tradições – a positivista e a socialista – que muito influenciaram o desenvolvimento da Sociologia no Brasil. 1 AUGUSTE COMTE E A TRADIÇÃO POSITIVISTA Isidore Auguste Marie François Xavier Comte nasceu em Montpellier, na França, em 19 de janeiro de 1798. Com 16 anos de idade, ingressou na Escola Politécnica de Paris, fato que teria significativa influência na orientação posterior de seu pensamento. De 1817 a 1824, foi secretário do Conde de Saint-Simon. Comte declarou que, com Saint -Simon, aprendeu muitas coisas que jamais encontraria nos livros e que, no pouco tempo em que conviveu com o conde, fez mais progressos do que faria em muitos anos, se estivesse sozinho. Toda a obra de Comte está permeada pelos acontecimentos que ocorreram após a Revolução Francesa de 1789. Ele defendeu parte dos princípios revolucionários e criticou a restauração da monarquia, preocupando-se fundamentalmente em reorganizar a sociedade, que, no seu entender, estava em ebulição e mergulhada no caos. Para Comte, a desordem e a anarquia imperavam em virtude da confusão de princípios (metafísicos e teológicos), que não se adequavam à sociedade industrial em expansão. Era, portanto, necessário superar esse estado de coisas, usando a razão como fundamento da nova sociedade. Propôs, então, a mudança da sociedade por meio da reforma intelectual plena das pessoas. De acordo com o pensador, com a modificação do pensamento humano, por meio do método científico, que ele chamava de “filosofia positiva”, haveria uma reforma das instituições. Com a proposta do estudo da sociedade por meio da análise de seus processos e estruturas, e da reforma prática das instituições, Comte criou uma nova ciência, à qual deu o nome de “física social”, passando a chamá-la posteriormente de Sociologia. A Sociologia representava, para Comte, o coroamento da evolução do conhecimento, mediante o emprego de métodos utilizados por outras ciências, que buscavam conhecer os fenômenos constantes e repetitivos da natureza: a observação, a experimentação, a comparação e a classificação. De acordo com esse pensador, a Sociologia, como as ciências naturais, deve sempre procurar a reconciliação entre os aspectos estáticos e os dinâmicos do mundo natural ou, no caso da sociedade humana, entre a ordem e o progresso. O lema da “filosofia positiva” proposta por Comte era “conhecer para prever, prever para prover”, ou seja, o conhecimento é necessário para fazer previsões e também para solucionar possíveis problemas. A influência de Comte no desenvolvimento da Sociologia foi marcante, sobretudo, na escola francesa, evidenciando-se em Émile Durkheim e seus contemporâneos e seguidores. Seu pensamento esteve presente em muitas das tentativas de criar tipologias para explicar a sociedade. Suas principais obras são: Curso de filosofia positiva (1830-1842), Discurso sobre o espírito positivo (1848), Catecismo positivista (1852) e Sistema de política positiva (1854). Para concluirmos, Comte explanava que para a superação da anarquia reinante na nova sociedade industrial, a filosofia positivista defendia a subordinação do progresso à ordem. O mesmo era contra o retorno de Luís XVIII ao trono: em sua concepção, a sociedade industrial que emergia requeria um governo fundado na razão. 2 A TRADIÇÃO SOCIALISTA: KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS Karl Heinrich Marx nasceu em Tréveris, na antiga Prússia, hoje Alemanha, em 1818 e, em 1830, ingressou no Liceu Friedrich Wilhelm, nessa mesma cidade. Anos depois, foi cursar Direito na Universidade de Bonn, transferindo-se para Berlim em seguida. Pouco a pouco, entretanto, seus interesses migraram para a Filosofia, área na qual defendeu, em 1841, a tese de doutorado A diferença da filosofia da natureza em Demócrito e Epicuro. Sua vida universitária foi marcada pelo debate político e intelectual influenciado pelo pensamento de Ludwig Feuerbach (1804-1872) e, principalmente, pelo de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770- 1831). Friedrich Engels (1820-1895) nasceu em Barmen (Renânia), na antiga Prússia, hoje Alemanha, filho mais velho de um rico industrial do ramo têxtil. Terminou sua formação secundária em 1837 e a partir de então sua formação intelectual foi por conta própria (autodidata), com alguns cursos universitários esparsos e de curta duração. Desde cedo começou a trabalhar nas empresas de seu pai e foi nessa condição que se deslocou para Bremen por três anos e depois foi enviado pelos pais a Manchester, na Inglaterra, onde trabalhou nas fábricas da família. Engels ficou impressionado com a miséria na qual viviam os trabalhadores das fábricas inglesas. Os dois, Marx e Engels, se encontraram em 1842, quando Marx passou a escrever para A Gazeta Renana, jornal da província de Colônia, do qual Engels era colaborador e mais tarde editor-chefe. O jornal, que criticava o poder prussiano, foi fechado em 1843, e Marx se viu desempregado. Ao perder o emprego, mudou-se para Paris, na França. Ali escreveu, em 1844, os Manuscritos econômico-filosóficos (só publicados em 1932) e, junto com F. Engels, o livro A sagrada família. Por sua vez, F. Engels, em 1844, decidiu voltar para a Alemanha, onde publicou, em 1845, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. Entre 1845 e 1847, Marx exilou-se em Bruxelas, na Bélgica, onde escreveu A ideologia alemã (em parceria com Friedrich Engels) e Miséria da filosofia (1847), obra na qual criticou o filósofo Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Em 1848, ainda na Bélgica, a parceria com Engels se solidificou ao escreverem juntos o livreto O Manifesto Comunista. Em 1848, Marx foi expulso da Bélgica e retornou a Colônia, na Alemanha (Prússia), sempre pensando na possibilidade de uma mudança estrutural em sua terra natal. Isso, entretanto, não aconteceu e Marx foi expulso da Alemanha em 1849, ano em que migrou para Londres, na Inglaterra, onde permaneceu até o fim da vida. Lá escreveu O 18 Brumário de Luís Bonaparte (1852), sua mais importante obra de reflexão sobre a vida política europeia do século XIX, desenvolveu pesquisas e concluiu seu maior trabalho: O capital: crítica da economia política. O primeiro volume dessa obra foi publicado em 1867; os outros três, em 1885, 1894 e 1905, após a morte de Marx, revisados por F. Engels. 2.1 O contexto histórico e a obra de Marx e Engels Para situar a obra de Marx e Engels, é necessário conhecer um pouco do que acontecia em meados do século XIX. Com as transformações que ocorriam no mundo ocidental, principalmente na esfera da produção industrial, houve um crescimento expressivo no número de trabalhadores industriais urbanos, com uma consequência evidente: precariedade da vida dos operários nas cidades. As condições de trabalho no interior das fábricas eram péssimas. Os empregados eram superexplorados, alimentavam-se mal e trabalhavam em ambientes insalubres. Para enfrentar essa situação e tentar modificá-la, os trabalhadores passaram a se organizar em associações e sindicatos e a promover movimentos de reivindicação. Desenvolveu-se, então, uma discussão das condições sociais, políticas e econômicas para se definirem as possibilidades de intervenção nessa realidade. Desde o início do século XIX, muitos pensadores discutiram essas questões, nas perspectivas socialista e anarquista. Na Inglaterra podem ser citados, entre outros: William Godwin (1756-1836), Thomas Spence (1750-1814), Thomas Paine (1737-1809), Robert Owen (1771-1858) e Thomas Hodgkin (1787-1866). Na França, destacaram-se Étienne Cabet (1788- 1856), Flora Tristan (1803-1844), Charles Fourier (1772-1837) e Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Marx e Engels levaram em conta esses pensadores, debatendo com alguns contemporâneos e criticando-os. Além disso, incorporaram a tradição da economia clássica inglesa, presente principalmente nas obras de Adam Smith e de David Ricardo. Pode-se dizer, portanto, que Marx e Engels desenvolveram seu trabalho com base na análise crítica da economia política inglesa, do socialismo utópico francês e da filosofia alemã. Esses dois autores não buscavam definir uma ciência específica para estudar a sociedade (como a Sociologia, para Auguste Comte) ou situar seu trabalho em um campo científico particular. Em alguns escritos, Marx afirmou que a História seria a ciência que mais se aproximava de suas preocupações, por abarcar as múltiplas dimensões da sociedade, a qual deveria ser analisada na totalidade, não havendo uma separação rígida entre os aspectos sociais, econômicos, políticos, ideológicos, religiosos, culturais etc. O objetivo de Marx e Engels era estudar criticamente a sociedade capitalista com base em seus princípios constitutivos e em seu desenvolvimento, visando dotar a classe trabalhadora de uma análise política da sociedade de seu tempo. Assim, a tradição socialista nascida da luta dos trabalhadores, muitos anos antes e em situações diferentes, tem como expressão intelectual o pensamento de Karl Marx e Friedrich Engels. Para entender as concepções fundamentais de Marx e Engels é necessário fazer a conexão entre as lutas da classe trabalhadora, suas aspirações e as ideias revolucionárias que estavam presentes no século XIX na Europa. Para eles, o conhecimento científico da realidade só tem sentido quando visa à transformação dessa mesma realidade. A separação entre teoria e prática não é discutida, pois a “verdade histórica” não é algo abstrato e que se define teoricamente; sua verificação está na prática. Apesar de haver algumas diferenças em seus escritos, os elementos essenciais do pensamento de Marx e Engels podem ser assim sintetizados: • historicidade das ações humanas – crítica ao idealismo alemão; • divisão social do trabalho e o surgimento das classes sociais – a luta de classes; • o fetichismo da mercadoria e o processo de alienação; • crítica à economia política e ao capitalismo; • transformação social e revolução; • utopia – sociedade comunista. A obra desses dois autores é muito vasta e não ficou vinculada estritamente aos movimentos sociais dos trabalhadores. Pouco a pouco foi introduzida nas universidades como parte do estudo em diferentes áreas do conhecimento. Estudiosos de Filosofia, Sociologia, Ciência Política, Economia, História e Geografia, entre outras áreas, foram influenciados por ela. Na Sociologia, como afirma Irving M. Zeitlin, no livro Ideología y teoría sociológica, tanto Max Weber quanto Émile Durkheim fizeram, em suas obras, um debate com as ideias de Karl Marx. Pelas análises da sociedade capitalista de seu tempo e a repercussão que tiveram em todo o mundo, principalmente no século XX, nos movimentos sociais e nas universidades, Marx e Engels são considerados autores clássicos da Sociologia. No campo dessa disciplina, porém, o pensamento deles ficou um pouco restrito, pois perdeu aquela relação entre teoria e prática (práxis), ou seja, entre a análise crítica e a prática revolucionária. Essa relação esteve presente, por exemplo, na vida e na obra dos russos Vladimir Ilitch Ulianov, conhecido como Lênin (1870-1924), e Leon D. Bronstein, conhecido como Trotsky (1879-1940), da alemã Rosa Luxemburgo (1871-1919) e do italiano Antonio Gramsci (1891- 1937), que tiveram significativa influência no movimento operário do século XX. Com base no trabalho de Marx e Engels, muitos autores desenvolveram estudos acadêmicos em vários campos do conhecimento. Podemos citar, por exemplo, Georg Lukács (1885-1971), Theodor Adorno (1903-1969), Walter Benjamin (1892-1940), Henri Lefebvre (1901-1991), Lucien Goldmanm (1913 -1970), Louis Althusser (1918 -1990), Nikos Poulantzas (1936-1979), Edward P. Thompson (1924-1993) e Eric Hobsbawm (1917 -2012). O pensamento de Marx e Engels continua, assim, presente em todo o mundo, com múltiplas tendências e variações, sempre gerando controvérsias. REFERENCIAL TEÓRICO GEMKOW, H.; PSUA, I. M. L. Marx e Engels: Vida e Obra. São Paulo: Alfa e Ômega, 1984. 232 pp. GIANOTTI, J. A. Comte. São Paulo: Abril Cultural, 1978. 318 pp. (Col. Os Pensadores) KONDER, L. Marx: vida e obra. 7ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007. 154 pp. (Col. Vida e Obra). (shrink)
Ciência Política: Introdução à Sófocles*1 -/- Science Politics: Introduction to Sophocles -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva*2 -/- Sófocles (496/4-406 a.C.) -/- 1 CONTEXTO HISTÓRICO: TEATRO E POLÍTICA -/- Na Grécia antiga, o teatro fazia parte das celebrações religiosas, especialmente nos rituais e representações dos festivais em homenagem ao deus Dionísio. A tragédia nasceu de tais circunstâncias, culminando seu apogeu no século V a.C., com as peças de Ésquilo*3 (525-456a.C.), SÓFOCLES*4 (496/4-406 a.C.) e Eurípedes*5 (480-406 a.C.). Pode-se dizer que, (...) contrário ao que ocorre normalmente, a arte não se deixou preceder pela filosofia, pois os poetas eram filósofos, pensando com sua própria mente e constituindo-se na vanguarda intelectual do seu tempo. -/- SÓFOCLES, em 468 a.C., ganhou do já consagrado Ésquilo, seu primeiro prêmio de tragédia, quando tinha vinte e sete anos. Ele nasceu em Colono, nas imediações de Atenas, filho de fabricante de espadas, que, com as guerras da Pérsia e do Peloponeso, aumentou seus serviços consideravelmente, enriquecendo a família. Não obstante, os demais atenienses empobreceram miseravelmente. SÓFOCLES era considerado bonito, inclusive sua estátua, que o representa na velhice, indica-lhe como um vigoroso homem. Era muito habilidoso em tudo o que fazia, tanto nas tragédias, como nas guerras e nos esportes. -/- Foi contemporâneo e amigo de Péricles*6 (495-429 a.C.), grande líder de Atenas, que lhe 6 ajudou a ocupar altos cargos, como o de tesoureiro e general, em 443 a.C. Em 440 a.C., encontrava-se entre os generais e comandantes das forças atenienses contra Pomos. Foi, ainda, membro do Comitê de Segurança Pública, votando a favor da Constituição oligárquica, em 411 a.C. Exerceu, também, funções de sacerdote. Era um homem alegre e amante dos prazeres, emanando encanto e simpatia, que lhes faziam perdoar os erros, envolvido com rapazes e cortesãs, inclusive teve um filho da célebre hetera Têoris.*7 Foi também contemporâneo de Eurípedes, ainda que nascido bem antes deste, mas ambos morreram no mesmo ano, em 406 a.C. -/- SÓFOCLES escreveu cento e treze peças, das quais só nos chegaram sete, nesta ordem de procedência, Ajax (c. 445 a.C.) As Traquínias (c. 445 a.C.), Antígona (c. 442), Édipo Rei (c. 425), Electra (c. 415), Filoteuto (409) e Édipo em Colono (401). Ganhou o primeiro prêmio de teatro, por dezenove vezes, tendo vinte e sete anos na primeira, e oitenta e cinco, na última. Governou o teatro ateniense por mais de trinta anos, da mesma maneira que seu amigo Péricles governava Atenas. -/- Escreveu uma trilogia não intencional, com as tragédias Édipo Rei (425 a.C.), Édipo em Colono (401 a.C.) e Antígona (442 a.C.). A primeira foi o mais famoso dos dramas gregos, tendo uma abertura impressionante, com a população diante do palácio real de Tebas. Havia uma peste que assolava a cidade, e isso os oráculos identificaram como decorrência de um grande crime. A clássica narrativa tratava de um filho, Édipo, que inadvertidamente matara o pai, Laio, e se casara com a mãe, Jocasta, com a qual teve quatro filhos: Antígona, Polinice, Etéocles e Ismênia. Quando tudo fora descoberto, Jocasta se enforcara e Édipo, enlouquecido, arrancara os próprios olhos e abandonara Tebas, partindo para o exílio em companhia apenas de Antígona. Já em Édipo em Colonos, este estava envelhecido a mendigar em Colono, perto de Atenas, apoiado apenas pela filha. -/- Antígona foi a última peça da trilogia, ainda que tenha sido a primeira a ser escrita. Ao tomar conhecimento de que seus irmãos Polinice e Etéocles estavam em guerra pelo trono de Tebas, regressou apressada para tentar apaziguá-los. Não obstante, eles lutaram até a morte. Creonte aliado de Etéocles, tomou o reino e puniu a rebeldia de Polinice, proibindo que fosse sepultado. Antígona, evocando a crença de que o espírito de um morto só se livrava das torturas da morte depois do corpo ser enterrado, violou o decreto de Creonte e sepultou seu irmão Polinice. Houve, então, o conflito entre as leis dos homens com as leis dos deuses, optando ela por esta, como esperavam as pessoas dignas de se comportarem. Antígona foi condenada pelo tio a ser enterrada viva, colocada em uma catacumba. Seu noivo, Hêmam, filho de Creonte, que desaparecera quando ela desobedecera o decreto real, voltou e encontrou sua prometida morta, suicidando-se em seguida.*8 O drama era denso em todos os seus elementos, mas se elevava quando discutia o comportamento que o cidadão devia ter frente às leis opressivas. -/- 2 DESOBEDIÊNCIA CIVIL: RECUSA DE ANTÍGONA -/- Antígona e sua irmã Ismênia representavam, respectivamente, os símbolos de resistência à tirania e de obediência à razão, colocando a lei de Creonte frente à lei da justiça. Diante do édito que impedia Antígona de sepultar Polinice, considerava a existência do direito natural de enterrá-lo, sendo este o seu drama político. Devia obedecer às leis da polis ou da consciência e dos princípios religiosos? Este drama é representado pelo magnífico texto de SÓFOCLES, quando Creonte perguntou se Antígona tripudiava sobre suas leis. Antígona lhe respondeu que: -/- “Essas leis não foram promulgadas por Zeus, nem mesmo a Justiça, que convive com os deuses do inferno, foi a que estabeleceu tais princípios para os homens. Ele ainda afirmou que os anúncios das leis de Creonte não tinham o poder que eles imaginavam que o tinha, e que um simples mortal pudesse suplantar os preceitos, não escritos e imutáveis dos deuses. Antígona ainda afirma que tais preceitos não foram de hora, como também não fora de ontem, mas que sempre vigoraram no mundo sensível, e que ninguém sabia ao certo de sua existência. Antígona afronta Creonte dizendo que por causa das leis do mesmo, não queria ser ela castigada perante os deuses por ter, de alguma forma, medo da ira e afronta de um reles mortal. Ainda diz que sua morte é algo inevitável, uma vez que é a única certeza dos homens, e que ela há de vir em um tempo, pois isso não se pode ignorar, todavia se sua morte não a tivesse sido anunciada antes, e que com isso morrera antes do tempo, o tomaria como vantagem, uma vez que, submetido as mais variadas intempéries da vida, como não iria considerar sua morte um benefício? E com isso, essa dor de nada vale no tocante de seu destino. Antígona continua dizendo que em nada o afeta ao ver o cadáver do filho morto de sua mãe na condição de insepulto, uma vez que isso não lhe causa dor . O mesmo conclui dizendo que se achara que ele cometera um ato de loucura após a proclamação de sua resposta, talvez o achasse louco aquele que viera a condená-lo.”*9 -/- O conflito entre a lei positiva, enunciava o drama grego, e a lei natural, significava que esta identificava-se com a Justiça dos deuses, que era superior à lei da terra.*10 Para Antígona, aquela deveria sempre prevalecer, mas a sua morte representou o triunfo, mesmo que trágico, da lei da polis.*11 SÓFOCLES foi quem primeiro falou do direito de resistência, inclusive com a possibilidade de se sofrer uma grave sanção, como ocorreu com Antígona, e ainda assim sabendo suportar a dor.*12 A teoria não logrou desenvolvimento na Grécia antiga, nem na teoria política antiga. Deixou, porém, uma indagação que só no século XVIII começou a ser respondida, pela forma clássica do direito de resistência. -/- NOTAS: *1: In. COSTA, N. N. Ciência Política. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 61-67. *2: Tecnólogo em agropecuária pelo Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim. Normalista pela Escola Frei Cassiano Comacchio. Pesquisador assíduo de assuntos de cunho filosófico, com ênfase em política. *3: “Ésquilo, poeta grego (Elêusis, c. 525 – Gela, Sicília, 456 a.C.). Suas obras, As Suplicantes (c. 490), Os Persas (472), Os Sete contra Tebas (467), Prometeu Acorrentado (depois de 467) e a trilogia da Oréstia(Agamênom, Os Coéforos, As Eumênides) (458), fazem dele o verdadeiro criador da tragédia grega” (KOOGAN/HOUAISS. Enciclopédia e Dicionário Ilustrado, op. cit., p. 622). *4: “Sofócles, o poeta trágico grego (Colono, perto de Atenas, entre 496 e 494 a.C., Atenas 406 a.C.). Amigo de Péricles e Heródoto, cidadão completo, obteve, durante sua carreira excepcional, mais de 20 vitórias em concursos dramáticos. De sua obra, apenas sete tragédias, entre as mais de uma centena, e um drama satírico, do qual só restam longos fragmentos, Os Cães de Caça, chegaram até nós: Ajax (c. 445 a.C.), Trachiniani (c. 445?), Antígona(442), Édipo rei (c. 425), Electra (c. 415), Filotecto (409), Édipo em Colono (401). Deu à tragédia sua configuração definitiva: elevando de 12 para 15 o número de integrantes do coro,acrescentou um terceiro ator e substituiu atrilogia unida pela trilogia livre, onde cada drama forma um todo. Em Sófocles, a ação da tragédia é levada a termo pela vontade e pelas paixões do herói, indivíduo excepcional que, em luta contra um destino que o oprime, continua livre” (Grande Enciclopédia Larousse Cultural, op. cit., vol. 22, p. 5.441). *5: “Eurípedes, poeta trágico grego (Salamina, 480 – Macedônia, 406,a.C.), cujas obras mais célebres são: Alcestes (438), Medeia (431), Hipólito (428), Andrômaca (c. 426), Hécuba (c. 424), Íon (c. 418), Ifigênia em Áulida, As Bacantes. Eurípedes introduziu várias inovações na tragédia: ênfase na análise psicológica, preocupações científica e filosóficas, coros independentes da ação, introdução de personagens do povo” (KOOGAN/HOUAISS. Enciclopédia e Dicionário Ilustrado, op. cit., p. 642). *6: Vide nota 7 do capítulo II, Herôdotos. *7: “Más-línguas afirmam que Sófocles consumou sua velhice com a hetera Têoris, tendo um filho. Seu filho legítimo Iófas, talvez temendo que o poeta legasse ao filho de Têoris, levantou contra ele uma ação judicial,acusando-o de servil e incapaz da administração dos bens, Sófocles, para provar sua lucidez, fez perante os juízes a leitura de certos trechos da peça que na ocasião estava escrevendo, e que se julgou ser Édipo em Colono, ao término da leitura, os juízes não só o absolveram como o acompanharam até sua casa” (DURANT, Will. História da Civilização Mundial: nossa herança clássica, op. cit., vol. II, p. 314). *8: SÓFOCLES. Antígona. Brasília: Universidade de Brasília, 1997, p. 45. *9: Idem, op. cit., pp. 41-2. *10: “Aquela (Antígona), porém, prefere ficar com as ordens mais altas dos deuses, inacessíveis à maldade humana” (MACHADO PAUPÉRIO, A. O Direito Político de Resistência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 38). *11: “Antígona, entretanto, rebelou-se contra o edital de Creonte, considerando o sepultamento um dever mais forte que as leis dos homens, principalmente em se tratando de parentes, e cumpriu, embora sumariamente, os ritos fúnebres de Polinice” (KURY, Mário da Gama. Dicionário de Mitologia Grega e Romana. Rio de Janeiro: Jorge Sales, 1990, p. 35). *12: “No século V a.C., os grandes trágicos gregos, Ésquilo, Sófocles e Eurípedes, empregavam os mitos antigos para explorar os mais profundos temas da condição humana” (TARNAS, Richard. A Epopeia do Pensamento Ocidental: para compreender as ideias que molduram nossa visão de mundo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000, p. 33). -/- . (shrink)
Monografia apresentada à banca examinadora da Escola Municipal Manuel Teodoro de Arruda, anexa do Colégio Frei Cassiano de Comacchio em Belo Jardim, para a obtenção do título de concluinte do curso de Normal Médio, oferecido pela instituição. A natureza do trabalho, em suma, consiste em apresentar perspectivas de trans formação social para a comunidade de jovens e adultos, o principal programa cunho do trabalho é a Educação de Jovens e Adultos a EJA, e como esse programa intervém na sociabilidade e (...) na mudança do meio social do educando, além de tratar a educação como a principal fonte e meio de mudança de vida dessas pessoas que voltam às escolas. Orientador(a): professora Maria Angelita Pinheiro BELO JARDIM 2017 DEDICATÓRIA Dedicamos este trabalho primeiramente a todos que acreditaram em sua realização, em especial à professora de práticas pedagógicas e também orientadora, Maria Angelita Pinheiro, pelo incentivo e esforço à nossa preparação ao dia de hoje. Bem como, dedicamos este à Alana Thais da Silva, que em todo o desenvolvimento deste, esteve ao nosso lado. AGRADECIMENTOS Agradecemos primeiramente a Deus, que pôde nos proporcionar saúde e sabedoria para a conclusão deste. Agradecemos também à todos que acreditaram na realização deste trabalho, como fruto da realização de um sonho, que é tornarmos normalistas. A nossos colegas de classe que puderam nos proporcionar alegria para continuarmos. Agradecemos em especial mesmo, à Alana Thais da Silva e a Dawson de Barros Monteiro, ambos por oferecer amor e carinho quando o cansaço chegava, e também pela colaboração nas pesquisas que adentravam noites e dias. Enfim, agradecemos a todos que puderam plantar uma semente nesse nosso terreno, para que no futuro pudéssemos colher bons frutos nessa etapa decisiva em nossas vidas. À todos nosso muito obrigado. EPÍGRAFE “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo.” Paulo Freire RESUMO Este trabalho teve por objetivo abordar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como transformação social na vida daquelas pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar ou, por motivo maior, tiveram que abandonar os estudos na idade própria. Muitos vão à procura dos estudos por motivo de conquistar um emprego melhor, outros por motivos de se sociabilizar melhor, e por vários outros motivos. Também é possível afirmar que o retorno para a escola na terceira idade é possível, e que para os jovens, os estudos abrirão as portas para o mundo do trabalho, mostrando que o indivíduo alfabetizado tem valor na sociedade, e que a escola, como um ambiente de aprendizagem, tem o poder de transformar o indivíduo e torná-lo um cidadão crítico, democrático e participativo. Palavras Chaves: Educação de Jovens e Adultos. Aprendizagem. Transformação Social. ABSTRACT The purpose of this study was to approach the education of young people and adults (EJA) as a social transformation in the lives of people who did not have the opportunity to study or, for greater reason, had to drop out of school at their own age. Many go in search of their studies for the sake of gaining a better job, others for the sake of socializing better, and for many other reasons. It is also possible to state that the return to school in the third age is possible, and that for the youngest, studies will open the door to the world of work, showing that the literate individual has value in society and that the school as a learning environment, has the power to transform the individual and make him / her a critical, democratic and participatory citizen. Keywords: Education for Youth and Adults. Learning. Social transformation LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA 1 – Gráfico sobre o percentual do Analfabetismo..............................................................27 FIGURA 2 – Gráfico sobre o Analfabetismo por região do Brasil....................................................28 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................... ..................................... 10 CAPÍTULO 1 – CONTRIBUIÇÕES DA TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL E PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO........................................................................ 13 1.1 Históricos da Educação de Jovens e Adultos em seu Contexto Inicial............................ 13 1.1.1 Do Brasil Colônia ao Varguismo: Jesuítas, Pombal, Corte Imperial e Governo Vargas.............................................................................................. ................................. 13 1.2 A Educação de Jovens e Adultos Pós-Varguismo............................................................ 15 1.3 Acerca do Movimento Brasileiro de Alfabetização(Mobral)............................................ 15 1.3.1 Metodologia de Ensino no Mobral: Uma Abordagem Superficial.......................... 16 1.4 A Evolução da Educação de Jovens e Adultos: do Regime Militar ao seu Contexto Atual............................................................................................... .................................................. 17 CAPÍTULO 2 – REFLEXÕES ACERCA DA ALFABETIZAÇÃO............................................... 20 2.1 Análises Histórico-Antropológica Acerca da Escrita e a Alfabetização........................... 20 2.2 Alfabetização e Pragmatismo: Conceitos Acerca da Leitura e Escrita no Âmbito Educacional......................................................................................... ............................................. 21 2.3 O Analfabetismo como Antagonia ao Alfabetismo........................................................... 25 CAPÍTULO 3 – REFLEXÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS............................................................................................. .......................................... 29 3.1 Pensamentos de Paulo Freire Sobre a Educação Popular................................................. 29 3.2 Acerca do Método Freiriano........................................................................................... .. 31 3.2.1 Etapas do Método.............................................................................................. ...... 31 3.2.2 O Método.............................................................................................. ................... 31 3.2.3 As Fases de Aplicação do Método........................................................................... 32 3.2.4 História............................................................................................ ........................ 33 3.3 O Perfil do Professor Alfabetizador.................................................................................. 33 3.4 Perfil do Estudante da Educação de Jovens e Adultos e os Motivos de Evasão............... 35 3.5 Pensando em Métodos............................................................................................. ......... 37 CONCLUSÃO........................................................................................... ...................................... 41 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................... ...... 43 10 INTODUÇÃO Este trabalho tem por objetivo abordar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como modelo, espelho ou meio de uma transformação social, na vida daquelas pessoas que não tiveram oportunidade de estudar, ou por motivos maiores, tiveram que abandonar os estudos na idade ideal, essa visão é explicada pelos motivos da evasão escolar. Foram pesquisados os motivos que levaram essas pessoas a desistirem de estudar e porque retornaram as salas de aula muito tempo depois, destacando principalmente como cunho primordial, os alunos das turmas da EJA (Educação de Jovens e Adultos), que, em suma, pode-se concluir que o principal motivo de evasão na idade adequada era as baixas condições que eram submetidos, e por isso, abandonavam a escola para trabalhar, por isso que a maioria dos estudantes da EJA, são trabalhadores e pessoas que já carregam e possuem uma experiência de vida. Educação de jovens e adultos (EJA) é uma modalidade da qual participam aqueles que não frequentaram a escola durante a infância ou na idade ideal. Os motivos apresentados pelos quais não conseguiram estudar são, na maioria das vezes, alheios a vontade de cada um, a exemplo foi-se citado: o fato de se ter que trabalhar para sobreviver, não ter acesso a escola no local onde mora e até mesmo a evasão escolar. Por isso é comum ainda haver escolas que alfabetizam jovens e adultos. Alfabetizar jovens e adultos é uma ocupação antiga que não se limita a uma tarefa meramente escolar, está intimamente ligada a sonhos, expectativas e a anseios de mudança. E com isso, a escolha do tema deste trabalho se deu com o convívio com jovens e adultos durante o estágio supervisionado na EJA. Geralmente, é depois da adolescência que o indivíduo reconhece que necessita do conhecimento escolar e passa a buscá-lo. Pois, é muito gratificante para uma pessoa leiga poder aprender a ler e a escrever, consciente da necessidade e importância de tal ato para sua vida, um mundo novo se abre, e o indivíduo é posto num contexto “como se fosse cega e de repente abrisse os olhos e enxergasse coisas que até então não via” . Alfabetizar tais pessoas é proporcionar para elas grandes mudanças, uma nova visão de mundo, a chance de ter uma vida melhor, pelo menos com mais oportunidades. Por isso remete-se, então, para além de uma alfabetização e sim de uma transformação social destes indivíduos. A EJA é um direito assegurado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN)2, é assegurado gratuitamente aos que não tiveram acesso a escola na idade própria e segundo a LDBEN o poder público deverá estimular o acesso e permanência do jovem e do adulto na escola. Porém, esse estímulo é a cada dia deixado de lado, como afirma o professor doutor em filosofia e educação do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro. “[...] as atuais políticas públicas educacionais, mostram um exemplo de problemas, pois aqui na perspectiva contemporânea, é deveras nítida a deficiência da incentivação pública a estes indivíduos.” (Monteiro 2016, PROEJA p. 185). Abordando acerca dos objetivos, destacamos a abordagem do surgimento da EJA ante o alto índice de pessoas analfabetas no Estado, que por inúmeros motivos tiveram que abandonar os estudos por um longo período de tempo, ou para muitos, que nunca sequer tinham ido à escola. É necessário também dar luz e enaltecer a primordialidade da socialização dos que ingressam em uma escola mesmo depois da idade certa; nessa linha de raciocínio é necessário abordar e enaltecer as concepções ideológicas da transformação social no espaço da EJA, bem como compreender a importância desta para a atual sociedade. Por fim, abordar, entender e compreender as questões antropológicas dos motivos de evasão escolar; enxergar a EJA e a transformação social como utopia do indivíduo que retorna ao espaço educacional. E com isso, vislumbrar que em toda a sociedade a questão do Analfabetismo é um problema público educacional e social. 12 1. CONTRIBUIÇÕES DA TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL E PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO A educação de Jovens e Adultos antecede até mesmo as datas documentadas: de forma indireta, adultos interessavam-se em aprender as primeiras letras do alfabeto, sendo considerado o alicerce para a aprendizagem, ou seja, codificar cada símbolo daquele para formular palavras; ou ao menos também, interessar-se à escrever o próprio nome. Este Capítulo abordará a trajetória da Educação de Jovens e Adultos EJA, no Brasil, e sua contribuição para a população brasileira e ao mesmo tempo os processos de alfabetização que são contribuições para que esta aconteça de maneira eficaz. 1.1 HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM SEU CONTEXTO INICIAL 1.1.1 DO BRASIL COLÔNIA AO VARGUISMO: JESUÍTAS, POMBAL, CORTE IMPERIAL E GOVERNO VARGAS Alfabetizar jovens e adultos não é um ato de ensino-aprendizagem, é a construção de uma perspectiva de mudança: no início, época da colonização do Brasil, as poucas escolas existentes era para o privilégio das classes média e a burguesia da colônia, nessas famílias os filhos possuíam acompanhamento escolar na infância; não havia a necessidade de uma alfabetização pra jovens e adultos, esse bloco etário não tinha acesso a uma instrução escolar e quando a recebiam era de forma indireta, de acordo com Ghiraldelli Jr. a educação brasileira teve seu início com o fim dos regimes das capitanias hereditárias, ele cita que: “[...] A educação escolar no período colonial, ou seja, a educação regular e mais ou menos institucional de tal época, teve três fases: a do predomínio dos jesuítas; a das reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da expulsão dos jesuítas do Brasil e de Portugal em 1759; e a do período em que Dom João VI, então rei de Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808-1821)”. (Ghiraldelli Jr. 2008, p. 24). O ensino dos jesuítas tinha como fim não apenas a transmissão de conhecimento científico escolar, mas a propagação da fé cristã. A história da EJA no Brasil no período colonial deu-se de forma assistemática, nesta época não se constatou iniciativas governamentais significativas. Os métodos jesuíticos permaneceram até o período pombalino com a expulsão dos jesuítas, neste período, Pombal organizava as escolas de acordo com os interesses do Estado, com a chegada da coroa portuguesa na colônia, a educação perdeu o seu foco que já não era amplo. Após a proclamação da Independência do Brasil foi outorgada a primeira constituição brasileira, e no artigo 179 dela constava que a “instrução primária era gratuita para todos os cidadãos”; mesmo a instrução sendo gratuita não favorecia as classes pobres, pois estes não tinham acesso à escola, ou seja, a escola era para todos, porém inacessível a quase todos. No decorrer dos séculos houve várias reformas, Soares cita que: “[...] No Brasil, o discurso em favor da Educação popular é antigo: precedeu mesmo a proclamação da República. Já em 1882, Ruy Barbosa, baseado em exaustivo diagnóstico da realidade brasileira da época, denunciava a vergonhosa precariedade do ensino para o povo do Brasil e apresentava propostas de multiplicação de escolas e de melhoria qualitativa do ensino” (SOARES, 2002, p. 8). A constituição de 1934, no governo ditatorial de Getúlio Vargas não teve êxito, sendo assim criase uma nova constituição escrita por Francisco Campos. Para a constituição de 1937 que Ghiraldelli Jr. Cita que: “[...] A constituição de 1937, fez o Estado abrir mão da responsabilidade para com a educação publica, uma vez que ela afirmava que o Estado desempenharia um papel de subsidiário, e não central, em relação ao ensino”. O ordenamento democrático alcançado em 1934, quando a letra da lei determinou a educação como direito de todos, e obrigação dos poderes públicos, foi substituído por um texto que desobrigou o Estado de manter e expandir o ensino” (GHIRALDELLI Jr., 2008, p. 78). Nessa perspectiva, o Estado passou a não ter mais o papel de bancar os educadores para levar o conhecimento para toda a nação, num plano ideológico mundial, vemos que a educação é um princípio fundamental para o crescimento do país e deixar esta ferramenta de lado, acarreta num colapso conhecido como “grande taxa de Analfabetismo”. A constituição de 1937, foi criada no intuito de estabelecer o favorecimento do Estado pois o mesmo tira sua responsabilidade; “gera nesse contexto histórico-social uma população sem educação, ou a educação para poucos, uma sociedade frágil e suscetível a aceitar tudo que lhe é imposto pelo poder coercitivo” afirma o professor doutor em filosofia do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro: logo se entende que esta constituição não tinha o interesse que o conhecimento crítico se propagasse, mas buscava favorecer o ensino profissionalizante, pois dentro do contexto histórico o Brasil precisava mais capacitar os jovens e adultos para o trabalho nas indústrias. 1.2 A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS PÓS-VARGUISMO Segundo Cunha (1999), o fim do Estado Novo trouxe ao país um processo de redemocratização e a necessidade de aumento da quantidade de eleitores. Nesse sentido, o primeiro projeto lançado pelo governo foi uma campanha que previa a alfabetização do educando em três meses, além da conclusão do curso primário num prazo bem menor que o convencional. A educação era considerada unilateral e tinha o professor como transmissor de conhecimento. O educador, que era voluntário ou mal remunerado, seria o único sujeito deste processo. A campanha extinta em 1963, não rendeu bons resultados, mas ajudou a ideia preconceituosa de que o adulto não precisaria mais aprender a ler e que já havia encontrado seu lugar no mundo. Esse desprezo pela classe trabalhadora, o proletariado, ainda persistiu na década de 1990, quando o então ministro da Educação do governo Collor de Mello, o professor, físico e político José Goldemberg, afirmou que a tentativa de alfabetização de adultos não diminuiria o índice de analfabetos; ao contrário, perturbaria a ordem social. Com os resultados insatisfatórios dessa campanha, surgiram críticas a esse projeto: seria necessária a qualificação dos professores e a adequação do programa, do material didático e dos métodos de ensino à clientela atendida. No final dos anos 1950, Paulo Freire propunha uma nova pedagogia, posteriormente trabalhada neste trabalho. Apesar de ser encarregado de desenvolver o Programa Nacional de Alfabetização de Adultos, com o golpe militar de 1964, Paulo Freire foi exilado e um programa assistencialista e conservador foi criado: o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral). 1.3 ACERCA DO MOVIMENTO BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO (Mobral) Na época do regime militar (1964-1985), surge um movimento de alfabetização de jovens e adultos, na tentativa de erradicar o analfabetismo, pelo menos é o que se tinha em teoria; chamado MOBRAL, esse método tinha como foco o ato de ler e escrever, essa metodologia assemelha-se a de Paulo Freire com codificações, cartazes com famílias silábicas, quadros, fichas e etc., porém, não utilizava o diálogo como ideologia educacional de Freire e não se preocupava com a formação crítica dos educandos. A principal ideologia objetiva do Mobral era apenas a alfabetização funcional que em seu conceito é o ensino alicerce da compreensão de textos simples, capacitando os educandos a decodificação mínima de letras para a interpretação de textos, sem a apropriação da leitura e da escrita de pessoas entre 15 e 30 anos. A respeito do Mobral Bello cita que: “[...] O projeto Mobral permite compreender bem esta fase ditatorial por que passou o Brasil. A proposta de educação era toda baseada em aos interesses políticos vigentes na época. Por ter de repassar o sentimento de bom comportamento para o povo e justificar os atos da ditadura, esta instituição estendeu seus braços a uma boa parte das populações carentes, através de seus diversos programas.” (BELLO, 1993, p. 56). 1.3.1 METODOLOGIA DE ENSINO NO MOBRAL: UMA ABORDAGEM SUPERFICIAL A metodologia utilizada pelo Programa de Alfabetização Funcional baseava-se em seis objetivos: 1. Desenvolver nos alunos as habilidades de leitura, escrita e contagem 2. Desenvolver um vocabulário que permita o enriquecimento de seus alunos; 3. Desenvolver o raciocínio, visando facilitar a resolução de seus problemas e os de sua comunidade; 4. Formar hábitos e atitudes positivas, em relação ao trabalho; 5. Desenvolver a criatividade, a fim de melhorar as condições de vida, aproveitando os recursos disponíveis; 6. Levar os alunos: • A conhecerem seus direitos e deveres e as melhores formas de participação comunitária; • A se empenharem na conservação da saúde e melhoria das condições de higiene pessoal, familiar e da comunidade; • A se certificarem da responsabilidade de cada um, na manutenção e melhoria dos serviços públicos de sua comunidade e na conservação dos bens e instituições; • A participarem do desenvolvimento da comunidade, tendo em vista o bem-estar das pessoas. Os técnicos do MOBRAL defendiam que o método utilizado baseava-se no aproveitamento das experiências significativas dos alunos. Desta forma, embora divergisse ideologicamente do método de Paulo Freire utilizava-se, semelhantemente a este, de palavras geradoras e de uma série de procedimentos para o processo de alfabetização: 1. Apresentação e exploração do cartaz gerador; 2. Estudo da palavra geradora, depreendida do cartaz; 3. Decomposição silábica da palavra geradora; 4. Estudo das famílias silábicas, com base nas palavras geradoras; 5. Formação e estudos de palavras novas; 6. Formação e estudos de frases e textos A principal e essencial diferença na utilização destes procedimentos em relação ao método Paulo Freire era o fato de no Mobral haver uma uniformização do material utilizado em todo o território nacional, não traduzindo assim a linguagem e as necessidades do povo de cada região, principal característica da metodologia freiriana. 1.4 A EVOLUÇÃO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: DO REGIME MILITAR AO SEU CONTEXTO ATUAL Em 1974, foi implantado o CES (Centro de Estudos Supletivos), que dava a oportunidade de uma certificação rápida, mas superficial, com um ensino tecnicista e auto instrucional. Esse ensino supletivo foi implantado em acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDBE 5592/71. Nesta lei um capítulo foi dedicado especificamente a Educação de Jovens e Adultos. Em 1974 o MEC lança o CES. A década de 1980 foi marcada pelo desenvolvimento de projetos e pesquisas na área da alfabetização de adultos. Em 1985, o Mobral foi cessado, dando lugar a Fundação EDUCAR que apoiava tecnicamente e financeiramente as iniciativas de alfabetização existentes. Nos anos 80, difundiram-se várias pesquisas acerca da língua escrita que de certa forma refletiam na EJA. Com a promulgação da constituição de 1988 o Estado passou a ampliar o seu dever ante a Educação de Jovens e Adultos. De acordo com o artigo 208 da constituição brasileira de 1988: “O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de: I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurado inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria.” A importância da Educação de Jovens e Adultos passou a ser reconhecida internacionalmente mediante as conferências organizadas pela UNESCO nos anos 1990. A partir de então, surgiu no Brasil uma mobilização nacional no sentido de diagnosticar metas e ações da EJA. A LDBE de 1996 garante igualdade de acesso e permanência na escola e ensino de qualidade, além da valorização experiência extraescolar. Ainda nos anos 1990, emergiram iniciativas em favor da EJA, onde o governo incumbiu também a municípios a engajarem-se nesta política, ocorrem parcerias com ONG’s, municípios, universidades, grupos informais, populares, fóruns estaduais e nacionais e através de fóruns a história da EJA passou a ser registrada no intitulado “Boletim da Ação Educativa”. O antigo ensino supletivo passou a se chamar Educação de Jovens e Adultos, e ganhou um sentido mais amplo: preparar e inserir ou reinserir o estudante no mercado de trabalho. Os objetivos da educação no país são revistos, cabendo agora à escola a responsabilidade de formar o adulto trabalhador. Recentemente, novas iniciativas como a EJA e o Proeja, têm surgido a fim de garantir metodologias adequadas a discentes com esse perfil. Em 2000, o Conselho Nacional de Educação estabeleceu, no parecer nº 11, (das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos), as funções e as bases legais da EJA fundamentadas na LDBE, nos Parâmetros Curriculares Nacionais e nas Diretrizes Curriculares Nacionais O decreto nº 5478/05, institui o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional à Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – Proeja, abrangendo a formação inicial e continuada de trabalhadores e a Educação Profissional Técnica de nível médio. Eventos onde são gerados debates e trocadas experiências, como os fóruns EJA, têm sido importantes e primordiais na estruturação da EJA e de seus objetivos. É notório que nesta fase da história da Educação brasileira, a EJA possui foco amplo. Para haver uma sociedade igualitária e uma Educação eficaz é necessário que todas as áreas da Educação sejam focadas e valorizadas, não é possível desvencilhar uma da outra. 2. REFLEXÕES ACERCA DA ALFABETIZAÇÃO A alfabetização é definida como o processo de aprendizagem onde se desenvolve a habilidade de ler e escrever de maneira adequada e a utilizar esta habilidade como um código de comunicação com o seu meio. É o processo onde os educadores procuram dar mais atenção durante o período de educação inicial escolar, através do desenvolvimento das atividades da alfabetização, que envolvem o aprendizado do alfabeto e dos números, a coordenação motora e a formação de palavras, sílabas e pequenas frases. Através destas tarefas, o indivíduo consegue adquirir a habilidade de leitura, de compreensão de textos e da linguagem de maneira geral, incluindo a operação de números, que são competências necessárias para avançar aos níveis escolares seguintes. A alfabetização consegue desenvolver também a capacidade de socialização do indivíduo, uma vez que possibilita novas trocas simbólicas com a sociedade, além de possibilitar o acesso a bens culturais e outras facilidades das instituições sociais. A incapacidade de adquirir a habilidade da leitura e da escrita é chamada de analfabetismo ou iliteracia. 2.1 ANÁLISE HISTÓRICO-ANTROPOLÓGICA ACERCA DA ESCRITA E A ALFABETIZAÇÃO A comunicação oral antecede a comunicação escrita. É oralmente que se expressam a maioria das pessoas desde os tempos mais remotos. A história nos mostra que até mesmo os povos humanos da pré-história utilizavam símbolos gráficos para fazer registros em cavernas, em grutas, em rochas e etc., ou seja, já havia a necessidade de expressão gráfica. Bajard diz que: “[...] A escrita surgiu na mesopotâmia por volta do ano 4000 a.C., entre os Sumérios. Era uma escrita representada por desenhos, figuras rupestres e etc. que indicavam ações cotidianas e corriqueiras desses povos como a caça ou a pesca; essa fase ficou conhecida como pictográfica, após ela veio a fase ideográfica, onde os símbolos já representavam também alguma ideia, tornou-se fonética, depois alfabética e a partir daí a escrita foi evoluindo-se, alfabetos foram surgindo de acordo com as particularidades de cada língua.”(BAJARD, 2001, p. 15). A fase alfabética determinou a necessidade da transformação de códigos alfabéticos escritos, dando início ao que hoje chamamos de alfabetização. Ferreiro cita que: “[...] A invenção da escrita foi um processo histórico de construção de um sistema de representação, não um processo de codificação. Uma vez construído, poder-se-ia pensar que o sistema de representação é aprendido pelos novos usuários, como um sistema de codificação. Entretanto, não é assim, no caso dos dois sistemas envolvidos no início da escolarização (o sistema de codificação seria dos números e o sistema de representação seria da linguagem). As dificuldades que as crianças enfrentam são dificuldades conceituais semelhantes as da construção do sistema, e por isso pode-se dizer em ambos os casos que a criança reinventa esses sistemas, no caso da Educação para Jovens e Adultos, esse processo também poderá acontecer mediante a participação ativa do estudante e o empenho do mestre que para ele leciona. Bem entendido, não se trata de que as crianças reinventem as letras nem os números, mas que para poderem se servir desses elementos como elementos de um sistema, deve compreender seu processo de construção e suas regras de produção, o que coloca o problema epistemológico fundamental: Qual é a natureza da relação entre o real e a sua representação?” (FERREIRO, 2001, p. 12). A alfabetização não é uma ação prioritária para a fase infantil da vida. Ferreiro cita que: “[...] é recente a tomada de consciência sobre a importância da alfabetização inicial como a única solução real para o problema da alfabetização remediativa (de adolescentes e adultos)”. (FERREIRO, 2001, p. 09). 2.2 ALFABETIZAÇÃO E PRAGMATISMO: CONCEITOS ACERCA DA LEITURA E ESCRITA NO ÂMBITO EDUCACIONAL Alfabetizar é um tema que está ligado ao ensino da leitura e da escrita de códigos alfabéticos, existem inúmeros significados para essa problemática atual. Larousse limita o significado de alfabetizar a ensinar a ler. “[...] Vários conceitos definem alfabetizar como o ato de ensinar a ler, aos poucos esses conceitos vem mudando, ainda que livros e dicionários definam-no assim. Hoje muitos educadores e alfabetizadores utilizam o termo “letramento”, letrar vai além de alfabetizar, se trata da compreensão da leitura e escrita, a criança, o jovem ou o adulto estão alfabetizados ao saberem ler e escrever e letrados ao compreenderem o que leram e escreveram, estão letrados quando dominam a leitura e a escrita e fazem o uso social de ambos.” (LAROUSSE, 2003, p. 21). Soares, acerca do assunto, cita ao ser questionada sobre tal definição: “Letramento é de certa forma o contrário de analfabetismo, aliás, houve um momento em que as palavras letramento e alfabetismo se alteravam para nomear o mesmo conceito. Ainda hoje há quem prefira a palavra letramento, eu mesmo acho a palavra alfabetismo mais vernácula que letramento, que é uma tentativa da palavra inglesa literary, mas curvo-me ao poder das tendências linguísticas, que estão dando preferência a letramento. Analfabetismo é definido como o estado de quem não sabe ler e escrever, seu contrário, alfabetismo ou letramento, é o estado de quem sabe ler e escrever, ou seja, letramento é o estado em que vive o indivíduo que não só sabe ler e escrever, mas que poderá exercer as práticas sociais de leitura e escrita que circulam na sociedade em que vivem.” (SOARES, 2007). . Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) da Língua Portuguesa (Brasil, 2001, p. 21) fala explicitamente sobre este termo, mas a sua proposta vai de encontro as propostas do letramento, isso é perceptível ao observar o que é citado nos PCN’s a respeito de pesquisas e investigações referentes a alfabetização nas séries escolares. A alfabetização é um processo contínuo, inicia-se desde os primeiros anos de vida, com a linguagem e a partir daí tudo que a pessoa aprende serve como base para uma aprendizagem eficaz. A alfabetização, como a educação em geral, é um direito de todos, infelizmente para muitos ela não pode acontecer na infância, a preocupação de como fazê-la com qualidade e êxito impulsiona investigações de como alfabetizar para compreender a leitura e a escrita. Ferreiro cita que: “[...] É difícil falar de alfabetização evitando as posturas dominantes neste campo, por um lado, o discurso oficial e, por outro, o discurso meramente ideologizante, que chamarei “discurso da denúncia”. O discurso oficial centra-se nas estatísticas, o outro despreza essas cifras tratando de desvelar “a face oculta” da alfabetização, onde o discurso oficial fala de quantidade de escolas inauguradas, o discurso da denúncia enfatiza a má qualidade dessas construções ou desses locais improvisados que carecem do indispensável para a realização de ações propriamente educativas.” (FERREIRO, 2005, p. 09). A Alfabetização de Jovens e Adultos não é uma ação recente, teve início desde a colonização apesar de ter sido reconhecida oficialmente somente após o ano de 1945, muitos motivos interferem o processo de alfabetização na infância de alguns jovens e adultos, outros nem sequer iniciam esse processo, logo nesta fase e ao longo dos anos sentem a necessidade de alfabetizar-se. Segundo Moll: “[...] Nesse sentido, quando falamos “em adultos em processo de alfabetização” no contexto social brasileiro, nos referimos a homens e mulheres marcados por experiências de infância na qual não puderam permanecer na escola pela necessidade de trabalhar, por concepções que as afastavam da escola como de que “mulher não precisa aprender” ou “saber os rudimentos da escrita já é suficiente”, ou ainda, pela seletividade construída internamente na rede escolar que produz ainda hoje itinerários descontínuos de aprendizagens formais. Referimo-nos a homens e mulheres que viveram e vivem situações limite nas quais os tempos de infância foi, via de regra, tempo de trabalho e de sustento das famílias.” (MOLL, 2004, p. 11). Ler e escrever são uma arte, principalmente para muitos que não aprenderam a ler e escrever na infância e consequentemente na vida adulta sentem falta desses atos, nas últimas décadas a oferta de ensino aumentou bastante, porém o acesso ainda é limitado para muitos, nem todos os brasileiros tiveram ou tem a oportunidade de alfabetizar-se na infância diversos fatores contribuem ou contribuíram para isso, como a necessidade de trabalhar nessa fase da vida, a falta de acesso a escola, ou até mesmo a falta de interesse, ao chegar na juventude ou na fase adulta a pessoa percebe o quanto a educação básica lhe faz falta e começa a persistir em busca do conhecimento. No decorrer da história da educação a alfabetização de jovens e adultos teve diferentes focos e contou com significantes projetos de alfabetização como o MOBRAL e Método Paulo Freire que será visto neste trabalho. O processo de aquisição da leitura e da escrita não é uma preocupação apenas de professores e alfabetizadores, a alfabetização é a base para uma educação eficaz, portanto para o aluno estar bem nas séries posteriores ele precisa de uma alfabetização sólida. Vivemos atualmente na sociedade do conhecimento, não só do conhecimento do senso comum como sempre foi, mas do conhecimento científico que facilita aos indivíduos uma vivência social de acordo com as imposições do meio e para tal o conhecimento transferido no ambiente escolar é fundamental. Atualmente a EJA tem objetivos maiores além da alfabetização por parte dos alunos, da necessidade de estar capacitado para o mercado de trabalho, ser atuante na sociedade e também o interesse político de reduzir o máximo a estatística de analfabetismo no país, este fator favorecerá com a pretensão de um dia o Brasil se tornar uma grande potência mundial. As primeiras formas de alcançar melhores condições de trabalho e ampliar conhecimento é que faz com que muitos jovens e adultos que não se alfabetizaram na infância ingressem em uma turma de EJA oferecida pelas escolas ou por grupos comunitários que desenvolvem projetos de alfabetização, ser alfabetizado nestas fases da vida depende de muita motivação e força de vontade, não basta apenas querer, a alfabetização de jovens e adultos ocorre de maneira intencional e consciente, segundo Pinto: “Os conceitos de “necessitar saber” vem da origem do interior do ser, considerado em sua plena realidade, enquanto o de “saber” e “não saber” (como fatos empíricos) coloca-se na superfície do ser humano, é um acidente social, além de ser impossível definir com rigor absoluto os limites entre o “saber e o não saber” (daí que não há uma fronteira exata entre o alfabetizado e o analfabeto). Porque o “necessitar” é uma coisa que ou é satisfeita (se é exigência interior) ou, se não é, não permite ao indivíduo subsistir como tal entre (por exemplo: as necessidades biológicas). O “necessitar” ao qual se referem a leitura e a escrita é de caráter social (uma vez que tem por fundamento o trabalho).” (PINTO, 2007, p. 92). É válido ressaltar que o direito a educação de Jovens e Adultos é assegurado por lei e as instituições de ensino devem realizá-la de maneira que atenda tal clientela sem ignorar suas limitações. Alfabetizar jovens e adultos é muito mais que transferir-lhes noções de leitura e escrita, o jovem ou adulto ao ingressar em uma escola ele tem um objetivo delimitado e compreende a escola como um meio para alcançar tal objetivo, o professor alfabetizador se torna então um mediador entre o aluno e o conhecimento, por isso ele precisa estar bem informado, motivado e querendo realizar um trabalho de construção. Há algumas décadas era comum grupos de pessoas adultas se reunirem para aprender escrever o nome e conhecer as letras do alfabeto, tais pessoas ficavam extremamente maravilhadas, pois dentro do contexto delas tal aprendizado era suficientemente satisfatório. Atualmente grupos ainda se reúnem, mas as expectativas são outras, só o aprendizado do próprio nome não é suficiente, o mercado de trabalho exige mais, até mesmo o simples fato de precisar identificar o itinerário do ônibus requer leitura. Segundo Libâneo: “A escola de hoje precisa não apenas conviver com outras modalidades de educação não formal, informal e profissional, mas também articular-se e integrar-se a elas, a fim de formar cidadãos mais preparados e qualificados para um novo tempo”. (LIBÂNEO, 2003, p. 53). Para isso o ensino escolar deve contribuir para: • Formar indivíduos capazes de pensar e de aprender permanentemente; • Prover formação global para atender à necessidade de maior e melhor qualificação profissional; • Desenvolver conhecimentos, capacidades e qualidades para o exercício consciente da cidadania; • Formar cidadãos éticos e solidários. A motivação é a chave para o sucesso da educação de jovens e adultos, desmotivados eles não conseguirão enfrentar as barreiras cotidianas, tudo se tornará mais difícil, cabe aos professores e a escola em geral incentivá-los para que não desistam. 2.3 O ANALFABETISMO COMO ANTAGONIA AO ALFABETISMO O analfabetismo é a qualidade de analfabeto, uma palavra de origem latina (analphabētus) que se refere àquelas pessoas que não sabem ler nem escrever. Porém, o termo costuma ter um uso mais extenso e é usado para fazer alusão aos indivíduos que são ignorantes ou que carecem de instrução elementar em alguma disciplina. O analfabetismo surge perante a falta de aprendizagem. Por isso, nos países que contam com programas de escolarização obrigatória, o analfabetismo é minoritário, mesmo para além do facto de que a compreensão de leitura das pessoas possa ser deficiente. Analfabeto é a pessoa que não sabe ler nem escrever. Segundo definição da UNESCO, “uma pessoa funcionalmente analfabeta é aquela que não pode participar de todas as atividades nas quais a alfabetização é requerida para uma atuação eficaz em seu grupo e comunidade, e que lhe permitem, também, continuar usando a leitura, a escrita e o cálculo a serviço do seu próprio desenvolvimento e do desenvolvimento de sua comunidade”. O analfabetismo no país ainda continua sendo um obstáculo para o progresso e desenvolvimento da humanidade. O importante é ressaltar que não estamos falando de ignorância. Analfabeto Funcional: sabe ler e escrever textos e frases curtas, mas não consegue interpretá-los, também não sabem realizar operações de matemática. Existem três níveis de Analfabetismo funcional: Existem três níveis distintos de alfabetização funcional, a saber: • Nível 1 - também conhecido como alfabetização rudimentar, compreende aqueles que apenas conseguem ler e compreender títulos de textos e frases curtas; e apesar de saber contar, têm dificuldades com a compreensão de números grandes e em fazer as operações aritméticas básicas; • Nível 2 - também conhecido como alfabetização básica, compreende aqueles que conseguem ler textos curtos, mas só conseguem extrair informações espessas no texto e não conseguem tirar uma conclusão a respeito do mesmo; e também conseguem entender números grandes, conseguem realizar as operações aritméticas básicas, entretanto sentem dificuldades quando é exigida uma maior quantidade de cálculos, ou em operações matemáticas mais complexas. • Nível 3 - também conhecido como alfabetização plena, compreende aqueles que detêm pleno domínio da leitura, escrita, dos números e das operações matemáticas (das mais básicas às mais complexas). Pode-se afirmar que, nos dias de hoje, a sociedade está experimentando uma nova forma de analfabetismo, chamado de analfabetismo digital. Este tipo de carência está relacionado com a falta de conhecimento necessário para utilizar computadores pessoais, celulares e agendas eletrônicas e dominar os sistemas que operam estas máquinas como, por exemplo, navegar na rede mundial de computadores. O grave problema do analfabetismo no mundo continua sendo um dos grandes temas prioritários a solucionar desde que se realizou a Conferência Mundial da Educação para Todos, ocorrida em 1990, em Jomtiem, Tailândia. Esta conferência foi assistida por representantes do mundo todo e chegou-se à conclusão de que a alfabetização é um dos fatores chave para resolver um dos problemas mais urgentes da sociedade, que a realização plena do ser humano só se dá através da educação e promovê-la é fundamental para o desenvolvimento das nações. Assim sendo, a educação é uma ferramenta extremamente útil para combater a pobreza e a desigualdade, elevar os níveis de saúde e bem estar social, criar as bases para um desenvolvimento econômico sustentável e a manutenção de uma democracia duradoura. Por este motivo a educação foi incluída na lista dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas, que fixou para o ano de 2015 a data limite para alcançar 100% de educação primária para todas as crianças do planeta. Para o plano ideológico da história da Educação de Jovens e Adultos, pode-se afirmar que tais medidas, no Estado brasileiro, refletiram na queda da taxa de analfabetismo ao longo dos anos. Segundo o professor doutor em filosofia do Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim, Dawson de Barros Monteiro, o modelo teórico das iniciativas de alfabetização de jovens e adultos, mesmo tendo um cunho mais político no processo, este pôde remeter-se na queda do índice de habitantes analfabetos no Brasil, desde o Estado Novo ao governo Lula, esta ideologia teórica levou à pratica, uma nova visão de Brasil, uma perspectiva de habitantes mais preocupados com sua educação, ao menos ter o alicerce de poder gozar pelo menos do próprio saber a ler e a escrever, mesmo em um plano inicial. Mostra-se aí que as políticas educacionais mesmo sem o principal intuito de alfabetizar a população geraram programas que foram fomentados e mastigados pela população, que estes puderam ao menos voltar às salas de aula, a quem desistira quando jovem; ou mesmo entrar no âmbito educacional e conhecer de perto o ensino e a escola para aqueles que não puderam nem entrar nesta. A seguir o gráfico mostra como o índice de analfabetos decaiu a partir dos programas para a erradicação do analfabetismo primordialmente com a Educação de Jovens e Adultos. Figura 1. Gráfico com a queda da taxa de analfabetismo no Brasil no período de 1940 e 2010 É observado que a partir dos anos 1940, no governo Getúlio Vargas e o Estado Novo, o índice era de que em cada 100 pessoas quase 56 encontravam-se vítimas do analfabetismo no Brasil, número que ao passar dos anos vai declinando, chegando em 2010 com um índice em torno que, em cada 100 pessoas quase 10 encontravam-se analfabetas, isso é uma conquista tanto para o Estado que cresce no plano internacional, para a educação nacional que remete a ideia que os programas funcionam de forma ótima, e para o estudante que ingressa em uma sala da EJA. O próximo gráfico traz o índice por regiões brasileiras entre um plano de uma década, 2000 a 2010. Trazendo luz a queda no índice da taxa percentual. Figura 2. Gráfico com a taxa de analfabetismo por regiões do Brasil entre 2000 e 2010 Por fim, concluísse que com os programas educacionais de Educação de Jovens e Adultos, pôsse à erradicação e diminuição brusca do índice de percentual de analfabetos no país, uma vez que esses tendem ao cunho da erradicação dessas taxas que fazem com que a perspectiva do Brasil seja favorável ou desfavorável no plano internacional, já que a educação na contemporaneidade é fundamental para o crescimento do país. 3. REFEXÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Ao abordar a Educação de Jovens e Adultos como tema é fundamental conhecer e destacar o pensamento de alguns autores e educadores como Paulo Freire e outros que ao longo da vida profissional dedicaram-se a alfabetizar e que contribuem para a formação docente continuada. Este capítulo aborda tais reflexões e as particularidades do tema. 3.1 PENSAMENTO DE PAULO FREIRE SOBRE A EDUCAÇÃO POPULAR Educação popular é uma educação comprometida e participativa orientada pela perspectiva de realização de todos os direitos do povo. Quando se pensa em educação popular nos remetemos à imagem de Paulo Freire que foi o grande mentor, é uma educação que visa à formação do indivíduo com valores, conhecimento e consciência de cidadania, busca utilizar o que a pessoa já tem de conhecimento popular para transformar na matéria-prima do ensino. Esta educação popular é muito utilizada em assentamentos rurais, favelas, aldeias indígenas, pequenas comunidades, ONG’s dentre outras; por se tratar de uma educação que atende as necessidades em comum de um povo, uma educação em que tem os mesmos interesses em ampliar os seus conhecimentos e tornar cidadãos conscientes do seu papel na sociedade. Paulo Freire, o mais célebre educador brasileiro, tinha o pensamento de que a escola tinha que ensinar o aluno a “ler o mundo” para obter transformações, tendo em vista que se o aluno não saber a realidade do mundo em que vive não é possível lutar em busca de melhorias; para que haja transformação é essencial a conscientização, por isso Paulo Freire criou o seu método de ensino, pois não acreditava que uma pessoa adulta dor nordeste por exemplo que não conhecia “uva” pudesse aprender a ler e escrever apenas utilizando cartilhas com frases: EVA VIU UVA, pensou em aproximar os alunos a sua própria realidade, à sua rotina do dia a dia com as palavras geradoras. De acordo com a revista Nova Escola “Grandes Pensadores”: Freire dizia que ninguém ensina nada a ninguém, mas as pessoas também não aprendem sozinhas, os homens se educam entre si mediados pelo mundo. O pensamento de Paulo Freire é que o professor não é detentor do conhecimento e que não domina todas as áreas do conhecimento e é de fundamental importância a troca de experiências entre professor e aluno, o conhecimento de um completa o outro, todos nós somos dotados de inteligências e exercemos inteligências, porém nem todos a desenvolvem para a mesma área, muitas vezes um professor é excelente na sua profissão e não tem habilidades como pedreiro e o pedreiro constrói lindas casas e edifícios, mas não é alfabetizado e quando esse professor encontra este pedreiro podem trocar experiências distintas e ambos aprendem entre si. Para Freire um professor dedicado para a educação popular tem que acreditar em mudanças, não pode ensinar apenas a ler e escrever, é preciso haver uma mudança de paradigma, e transmitir esperanças, fazer com que o aluno se transforme em sujeito pensante, crítico e consciente do que lhe envolve no dia a dia, o professor tem que ter prazer, alegria e transmitir aos alunos. Paulo Freire diz que: “Há uma relação entre a alegria necessária à atividade educativa e a esperança. A esperança de que professor e alunos juntos podemos aprender, ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos à nossa alegria. Na verdade, do ponto de vista da natureza humana a esperança não é algo que a ela se justaponha. A esperança faz parte da natureza humana.” (FREIRE, 2002, p. 80). Para Freire é importante que o professor tenha esperança, uma vez que os jovens e adultos se espelham nos professores, e com esperança pode se acreditar em uma mudança de direção para a vida e para o mundo, para a sociedade, cita uma história popular que um passarinho viu um incêndio na floresta e correu para chamar os amigos para apagar o fogo, mas ninguém quis ir, então resolveu ir sozinho apagar o fogo, viu um rio e foi pegando água e jogando no fogo, certamente esse pássaro sabia que sozinho não poderia apagar toso o fogo, mas teve esperança que tomando a iniciativa talvez os outros pudessem acreditar que também seria capaz. Podemos comparar Paulo Freire a este passarinho, pois ele apenas deu início a essa educação e a cada dia pessoas se juntam a suas ideologias a fim de transformar a educação no nosso país e começam a mudar este paradigma. 3.2 ACERCA DO MÉTODO FREIRIANO O Método Paulo Freire consiste numa proposta para a alfabetização de adultos desenvolvidos pelo educador Paulo Freire, que em sua implementação concorreu com programas como o de Frank Laubach. Freire afirmou ter desenvolvido o método enquanto era diretor do Departamento de Extensões Culturais da Universidade do Recife, quando formou um grupo para testar o método na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. 3.2.1 ETAPAS DO MÉTODO 1. Etapa de investigação: busca conjunta entre professor e aluno das palavras e temas mais significativos da vida do aluno, dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive. 2. Etapa de tematização: momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados sociais dos temas e palavras. 3. Etapa de problematização: etapa em que o professor desafia e inspira o aluno a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada. 3.2.2 O MÉTODO • As palavras geradoras: o processo proposto por Paulo Freire inicia-se pelo levantamento do universo vocabular dos alunos. Através de conversas informais, o educador observa os vocábulos mais usados pelos alunos e a comunidade e, assim, seleciona as palavras que servirão de base para as lições. A quantidade de palavras geradoras pode variar entre 18 a 23 palavras, aproximadamente. Depois de composto o universo das palavras geradoras, elas são apresentadas em cartazes com imagens. Então, nos círculos de cultura, inicia-se uma discussão para dar-lhes significado dentro da realidade daquela turma. • A silabação: uma vez identificadas, cada palavra geradora passa a ser estudada através da divisão silábica, semelhantemente ao método tradicional. Cada sílaba se desdobra em sua respectiva família silábica, com a mudança da vogal. Por exemplo: BA-BE-BI-BO-BU. • As palavras novas: o passo seguinte é a formação de palavras novas. Usando as famílias silábicas agora conhecidas, o grupo forma palavras novas. • A conscientização: um ponto fundamental do método é a discussão sobre os diversos temas surgidos a partir das palavras geradoras. Para Paulo Freire, alfabetizar não pode se restringir aos processos de codificação e decodificação. Dessa forma, o objetivo da alfabetização de adultos é promover a conscientização acerca dos problemas cotidianos, a compreensão do mundo e o conhecimento da realidade social. 3.2.3 AS FASES DE APLICAÇÃO DO MÉTODO Freire propõe a aplicação de seu método nas cinco fases seguintes: • 1ª fase: levantamento do universo vocabular do grupo. Nessa fase, ocorrem as interações de aproximação e conhecimento mútuo, bem como a anotação das palavras da linguagem dos membros do grupo, respeitando seu linguajar típico. • 2ª fase: escolha das palavras selecionadas, seguindo os critérios de riqueza fonética, dificuldades fonéticas - numa sequência gradativa das mais simples para as mais complexas, do comprometimento pragmático da palavra na realidade social, cultural, política do grupo e/ou sua comunidade. • 3ª fase: criação de situações existenciais características do grupo. Trata-se de situações inseridas na realidade local, que devem ser discutidas com o intuito de abrir perspectivas para a análise crítica consciente de problemas locais, regionais e nacionais. • 4ª fase: criação das fichas-roteiro neles havia indicações de possíveis subtemas ligadas as palavras geradoras e sugestões de encaminhamentos para análise dos temas selecionados que funcionam como roteiro para os debates, as quais fossem apenas sugestões esses roteiros eram de grande valia, principalmente no inicio do trabalho quando a alfabetizador era também iniciante. • 5ª fase: criação de fichas de palavras para a decomposição das famílias fonéticas correspondentes às palavras geradoras. 3.2.4 HISTÓRIA Freire aplicou publicamente seu método pela primeira vez no Centro de Cultura Dona Olegarinha, um círculo de cultura do Movimento de Cultura Popular no Recife. Foi aplicado inicialmente a cinco alunos, dos quais três aprenderam a ler e escrever em 30 horas e outros dois desistiram antes de concluir. Baseado na experiência de Angicos, em janeiro de 1963, onde em 45 dias, alfabetizaram-se 300 trabalhadores, João Goulart, presidente do Brasil na época, chamou Paulo Freire para organizar o Plano Nacional de Alfabetização. Este plano, iniciado em janeiro de 1964, tinha como objetivo alfabetizar 2 milhões de pessoas em 20 000 círculos de cultura, e já contava com a participação da comunidade - só no estado da Guanabara, se inscreveram 6 000 pessoas. Mas, com o Golpe de Estado no Brasil em 1964, em abril, toda essa mobilização social foi reprimida e Paulo Freire foi considerado subversivo, sendo preso e, depois, exilado. Assim, esse projeto foi abortado. Em seu lugar, surgiu o Movimento Brasileiro de Alfabetização, igualmente uma iniciativa para a alfabetização, porém distinta do método freiriano. 3.3 O PERFIL DO PROFESSOR ALFABETIZADOR Alfabetizar jovens e adultos é uma ação peculiar e nem sempre se dá da mesma forma com se alfabetiza uma criança na infância o professor alfabetizador deve partir dor princípios de açãoreflexão-ação e deve estar aliado à formação continuada. A formação continuada permite refletir suas ações e repensar a sua prática, elaborando planos e/ou projetos que possam aprimorar a sua prática educativa. Alfabetizar na EJA envolve também a afetividade, o gosto e a responsabilidade. É fundamental que o professor da EJA tenha a consciência da valorização do outro, é importante valorizar o conhecimento que este aluno possui, pois durante toda a vida o aluno adquire um vasto conhecimento do senso comum e valorize também as suas experiências de vida, entretanto o diálogo tem que estar presente nas aulas, o professor tem que usar uma linguagem simples e acessível. O professor é um incentivador um meio para alcançar a motivação dos alunos e nesta fase da vida motivação é um aspecto fundamental. A prática da ação-reflexão-ação permite ao professor lançar estratégias para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem. Ao observar turmas da EJA é comum observar que os professores regentes em tais turmas são geralmente professores experientes que despertam a confiança em seus alunos e que acreditam na educação como foco de mudança. Segundo Leal: “O conhecimento na ação, ou o conhecimento tácito, seria aquele constituído na prática cotidiana do exercício profissional. Concebemos que esse é um saber que se constrói com base nos conhecimentos prévios de formação inicial, articulado com os saberes gerados na prática cotidiana, de forma assistemática e muitas vezes sem tomada de consciência acerca dos modos de construção. Para um projeto de formação numa base reflexiva, torna-se fundamental conhecer e valorizar esses conhecimentos que são constituídos pelos professores, seja através de uma reflexão teórica, seja através desses processos eminentemente assistemáticos.” (LEAL, 2005, p. 114). A aprendizagem não pode ser simplesmente transmitida, ela é um processo de construção onde professora busca oferecer meios que favoreçam tal construção, a do conhecimento: tudo o que já foi vivido pelo aluno serve como base, o professor deve utilizar também a vivência e o conhecimento prévio do aluno para ajudá-lo na construção do saber. Aquilo que é oferecido ao alfabetizando deve fazer sentido para ele, se o professor partir de um ponto desconhecido que foge à realidade do aluno ele poderá não alcançar a compreensão necessária ao letramento. A principal função do professor na EJA é mediar, interagir o aluno com o meio, usar metodologias que favoreçam o processo de construção de ensino-aprendizagem, o aluno da atualidade espera muito mais que aprender a assinar o nome, portanto exercício de mera memorização, atividades mecânicas não permitem o êxito na EJA. A interdisciplinaridade deve fazer parte também desse processo os temas transversais como, ética, valores e cidadania são temas que norteiam a construção do conhecimento nesta fase. A educação de Jovens e Adultos traz muitos desafios tanto para professores quanto para alunos e são esses desafios que constroem práticas eficazes de alfabetização. Kelly Camargo Pulice in Moll esclarece muito bem o papel do educador na EJA, ao citar: “O papel do educador é pensar formas de intervir e transformar a realidade, problematizando-a, dialogando com o educando. Em sala de aula o importante não é “depositar” conteúdos, mas despertar uma nova forma de relação com a experiência vivida. Portanto, antes de qualquer coisa, é preciso conhecer o aluno: conhecê-lo como indivíduo num contexto social, com seus problemas, seus medos, suas necessidades, valorizando seu saber, sua cultura, sua oralidade, seus desejos, seus sonhos, isto possibilita uma aprendizagem integradora, abrangente, não compartimentalizada, não fragmentada.” (MOLL, 2004, p. 11). 3.4 PERFIL DO ESTUDANTE DA EJA E OS MOTIVOS DE EVASÃO Os alunos da EJA são geralmente pessoas vindas de famílias de baixa renda, sendo que muitas vezes os pais também não são alfabetizados, isso faz com que muitas vezes se sentem discriminados pela sociedade; vivemos em uma sociedade que para toda a nossa rotina é necessário a leitura,para se tomar um ônibus é necessário conseguir identificá-lo, para fazer compras tem que conhecer os números, contudo esse aluno da EJA pode se sentir excluído da sociedade, quando pensamos em exclusão nos remetemos a pessoas com deficiência, mas a exclusão não se limita a deficiência intelectuais e mentais, para esses alunos que por alguns motivos não estudaram nos primeiros anos de vida este termo também cabe. O autor Bieler fala sobre a importância da inclusão. “[...] A perspectiva da educação inclusiva vai além da deficiência. Esta é apenas uma das áreas que seriam beneficiadas com ela (educação inclusiva) A qualidade da educação é que está em debate porque hoje não se considera (nos sistemas educacionais ) a diversidade dos alunos, os níveis de necessidade e as características individuais. A proposta da educação inclusiva melhoraria a qualidade do ensino para todos. Não se trata só de incluir deficientes nas sala de aula.” (BIELER, 2004, p. 11). O aluno da EJA possui necessidade educacional especial independente de ter ou não deficiência física. Uma vez que estes alunos vão para a escola após um longo dia de serviço, sua mente já está cansada, ao contrario de uma criança que não trabalha e nem tem preocupações com a família, como os adultos. A maioria destes alunos da EJA tem a necessidade de voltar a escola para se sentir incluído na sociedade, procuram melhores condições de vida , almeja um melhor cargo no trabalho, muitos buscam a leitura com o objetivo de ser mais participativos e críticos na sociedade e até por motivos religiosos como o sonho de aprender ler para conseguir ler a bíblia, entretanto boa parte destes alunos busca uma realização pessoal, principalmente os mais idosos que as vezes são motivos de chacotas por estarem estudando nesta fase da vida. Os alunos da EJA por se tratarem de adolescentes acima de 14 anos e adultos, já tem suas experiências de vida, muitas vezes até traumas podem ter sido criados por não ter conseguido estudar anteriormente por vários motivos, desta forma os alunos criam um bloqueio, por isto o professor deve estar seguro para tentar quebrar estes bloqueios. Às vezes estes alunos podem estar com sua autoestima muito baixa, aí entra o papel do professor para traçar práticas adequadas para incentivá-los a motivação. A autoestima é fundamental para este processo de alfabetização, pois quando há esperanças se tem forças para vencer os desafios na busca de um objetivo. As turmas da EJA funcionam geralmente a noite que é o horário disponível para pessoas que trabalham diariamente, deve haver muita força de vontade e incentivo para jovens e adultos concluírem o curso. O número de evasão na EJA é muito grande, os alunos se sentem desmotivados e cansados; a grande maioria trabalha o dia inteiro, pegam ônibus lotado, muitas mulheres não trabalham fora, porém trabalham em casa. É fundamental que os professores da EJA sejam dinâmicos, aproximem o conteúdo à realidade do aluno, procurem sempre inovar e não criem barreiras para afastar esses alunos. O professor da EJA tem que estar motivado para conseguir motivar os alunos, todavia que os alunos são reflexos dos professores. Quando se pensa em evasão na EJA é de suma importância conhecer o perfil destes alunos, para tentar entender por que se dá esta evasão. As causas evasão na EJA são muitas, podemos destacar o cansaço após um dia de serviço, a distância entre casa/escola que aumenta as possibilidades de assaltos, entre outros fatores que se dá por conta da violência urbana. Outro fator é o apoio da família que nem sempre existe, o apoio do governo, da escola, direção, professores muitas vezes não estimulam os alunos; e também o desinteresse interfere sobre esta questão. É notório que existem fatores que contribuem direta ou indiretamente na evasão escolar, isso é uma preocupação de muitos, tais como escola, gestão escolar, governo, entre outras instituições. O fracasso escolar também é uma das causas de evasão, na Proposta Curricular para o 1º segmento do ensino fundamental (1997) consta que: “No público que efetivamente frequenta os programas de educação de jovens e adultos, é cada vez mais reduzido o número daqueles que não tiveram nenhuma passagem anterior pela escola. É também cada vez mais dominante a presença de adolescentes e jovens recém saídos do ensino regular, por onde tiveram passagens acidentadas.” É fundamental que aluno e professor compreendam que erros podem ser transformados em aprendizagem, é possível aprender com eles, os erros não podem ser contribuintes para causar evasão. De acordo com Cortella (1999, p. 112): “[...] O erro não ocupa um lugar externo ao processo de conhecer, investigar é bem diferente de receber uma revelação límpida, transparente e perfeita. O erro é parte integrante do conhecer não porque “errar é humano”, mas porque nosso conhecimento sobre o mundo dá-se em uma relação viva e cambiante (sem o. (shrink)
INTRODUÇÃO A FORMAÇÃO DO ESTADO E DA POLÍTICA -/- Não existe a fixação exata de quando se formou a primeira organização política, entendida esta como uma relação assimétrica, em que um, ou alguns, governam e a grande maioria é governada. Pode ter sido em Jericó, na Palestina, onde se encontrou uma velha muralha de pedra, de dez mil anos atrás, supondo-se ter abrigado de dois a três mil habitantes. A diferença possível de se fixar era de que, antes, havia apenas (...) aldeias cujas organizações eram tribais ou de clãs, onde as relações eram simétricas, cujo chefe apenas representava o grupo enquanto expressasse a vontade do mesmo. Existe, então, uma grande diferença, entre uma organização política, ainda que representando apenas o povo de uma cidade, e as organizações não políticas, pois na primeira existe um governo, responsável pelo destino de todos, enquanto nessas outras o chefe trata-se apenas da exteriorização da vontade do grupo. -/- Da primeira cidade palestina, a outras que se formaram, principalmente na Suméria, surgiram as primeiras organizações políticas. Das cidades independentes da região, ao Egito antigo e aos impérios da Ásia Menor, cada vez mais o poder político exteriorizava uma diferenciação social profunda, em que a grande maioria produzia para alguns poucos e a produção era organizada pelo poder estatal. De forma análoga, houve os regimes políticos no -/- subcontinente indiano, na China e na Mesoamérica. -/- Depois, ocorreu o alvorecer das polis gregas, inicialmente governadas por monarquias, em seguida por aristocracias, até que algumas chegaram às democracias antigas, como o caso de Atenas. A função política aí era vista como um dever da cidadania e, não, como um privilégio, tanto que diversos cargos eram atribuídos por meio de sorteios e a instância máxima era uma assembleia, dos cidadãos, excluindo mulheres, estrangeiros e escravos. A sofisticação cultural e política grega permitiu que houvesse diversos pensadores incumbidos de entender o enigma da política. -/- O Império romano, também, teve alto grau de sofisticação, especialmente quanto às funções públicas. Houve, inicialmente, uma realeza, depois um sistema aristocrático até que se chegou muito perto das democracias representativas, no chamado governo misto, em que existiam dois cônsules, para representar a monarquia, o senado dos patrícios, relativo à aristocracia, e a assembleia da plebe, tido como o elemento democrático. O modelo acima criou diversas influências, principalmente para o Mundo Ocidental, em instituições como o Município. -/- O Völkerwanderugen, as invasões bárbaras nas áreas do Império romano, destruíram as instituições tradicionais, mas conservaram algumas, como o commendatio, o beneficium e o immunitas, que colaboraram com o perfil das organizações feudais. Por outro lado, o mundo germânico, ainda baseado num sistema de clã e, não, na forma estatal, contribuiu com o gefolgschaft, ou séquito, um vínculo pessoal de lealdade e afeição entre um líder guerreiro e sua comitiva de colaboradores. O mundo feudal nasceu desses institutos, em que cada castelo converteu-se em um centro de governo independente do poder central. -/- O sistema acima confluiu para o ständestaat, entendida como uma comunidade política de estados, significando estes como ordem ou classe social representada nas antigas assembleias -/- ou cortes. O ingresso de cidades independentes do castelo feudal, muitas vezes comprando ou lutando pela liberdade, mudou o cenário político, com aquelas se voltando para o poder central, contra o poder fracionado que lhes ameaçavam mais. -/- Houve, então, um fortalecimento do governo central e absorção de territórios menores e mais fracos pelos maiores e mais fortes, chegando à formação de um número pequeno de Estados independentes entre si, cada um se afirmando como soberano. O poder político, então, aí pode ser entendido como uma relação simétrica entre os Estados soberanos e uma relação assimétrica entre o Estado e os súditos. Houve, com isso, a formação dos Estados absolutistas, cuja “autoridade assentava agora exclusivamente no monarca, que tinha reunido em si todas as prerrogativas públicas de governo efetivo”. A própria denominação Estado nasceu, na Itália, a partir da palavra status, que indicava a situação pessoal do dirigente que formara em torno de si uma organização política territorial. O Estado moderno, o absolutista, ou nacional, em que todas expressões que significam um novo tipo de organização, jamais visto antes, tinha o poder político como em decorrência de uma decisão racional da sociedade, para melhor se defender dos perigos da anarquia e da violência. -/- Do sistema absolutista, houve um processo de aquisição de cidadania, entendida esta como uma situação concernente aos membros integrais de uma comunidade, com iguais direitos obrigações. A cidadania civil, inicialmente, concedia direitos necessários à liberdade individual, começando a ser atribuída nos séculos XVII a XVIII, a partir da Revolução Inglesa, em 1688, da Revolução Americana, em 1776, e da Revolução Francesa, em 1789. Foi a época em que o discurso político esteve voltado para a ideia do contrato social, com suas diversas matizes, mas caracterizado pelo processo de constitucionalização do Estado. -/- Depois, veio a chamada cidadania política, com o poder de escolher e ser escolhido representante no governo ou no parlamento e, também, de se manifestar sobre o comportamento das instituições, inicialmente no século XVIII, mas que se consolidou no século XIX até o século XX, quando finalmente as mulheres passaram a ter direito ao voto. A forma de democratizar o Estado foi, então, se atribuir a cidadania política a cada vez maior número de pessoas, sendo esta a principal preocupação do pensamento liberal, contestado pelo pensamento marxista, visto como insuficiente para a igualdade social. -/- Por fim, veio a cidadania social, entendida como o direito ao bem-estar econômico, com direito a remunerações compatíveis com a dignidade humana, bem como os benefícios do sistema educacional e de saúde e dos serviços sociais, direitos pleiteados no século XIX, mas só reconhecidos devidamente no século XX. Não foi um processo simples, mas complexo, que assistiu a consolidação em textos constitucionais como a Constituição mexicana, em 1917, a Declaração do Povo Oprimido e Trabalhador da Rússia, em 1918, e, finalmente, a Constituição de Weimar, em 1919. Todas as lutas pela cidadania acabaram mudando o aspecto do Estado e, em consequência, do poder político. Já agora, no século XXI, existe uma preocupação com a forma pela qual o poder é exercido. Em primeiro lugar, aparece a racionalização técnica como a forma de discurso e de comunicação, cuja informática e a Internet são sua exteriorização mais evidente. Em segundo lugar, as fusões das grandes instituições econômicas fazem com que elas superem em poder econômico a grande maioria dos Estados independentes. Em terceiro lugar, ocorre o processo de massacre da individualidade, em nome da chamada globalização. Em quarto, surge a ameaça física à espécie humana, em razão da poluição e da violação dos ecossistemas, gerando uma nova pressão de cidadania pelos direitos de última geração. Por fim, existe a visível mudança das organizações políticas, através de macroestruturas, inicialmente de conteúdo econômico, mas que mudam para novas formas políticas, como a União Europeia e, talvez, o Unasul, na América do Sul. -/- Emanuel Isaque Cordeiro da Silva - Técnico em Agropecuária pelo Instituto Federal de Pernambuco campus Belo Jardim. Normalista pela Escola Frei Cassiano Comacchio. (shrink)
Parece um fato bastante trivial que quando uma teoria científica se torna obsoleta, por ter sido substituída por outra, isto não tem nenhuma consequência para os objetos técnicos compatíveis com a teoria antiga. Pretendo, neste ensaio, responder à questão bem menos óbvia de por que isto se dá. Como subproduto, apresento uma defesa da teoria da ciência de Thomas Kuhn. Para tanto, inicio mostrando como a teoria de Kuhn foi motivada por considerações sobre a história da ciência. Em seguida, (...) defendo um pressuposto sobre como se dá a relação entre ciência e tecnologia. Continuo, apresentando uma distinção entre conteúdo factual e conceitual na ciência. E. (shrink)
"Tentarei, neste texto, apresentar argumentos não só para recomendar os estudos da Antiguidade em educação, mas para deixar claro o quanto esses estudos são fundamentais para a formação do professor. Meus argumentos serão de dois tipos: em primeiro lugar, apresentarei a Antiguidade — e por esse nome eu me refiro à literatura dos antigos gregos e romanos — como uma herança que está à nossa disposição. Depois, quero apontar, sumariamente, a conexão necessária entre a presença dessa literatura e o vocabulário (...) que constituiu – junto de uma gramática e de uma semântica também recebidas – a linguagem com que lidamos ainda hoje com os problemas fundamentais da educação.". (shrink)
Na História da Biologia, as classificações efetuadas por Platão e Aristóteles aos seres vivos são consideradas marcos metodológicos. Objetivando compreender em que medida essas classificações poderiam ser consideradas métodos construídos pelos filósofos gregos para o estudo dos seres vivos, conforme lhes denomina historicamente a literatura biológica, foram consultadas as obras platônicas, Timeu e O Político, e as aristotélicas, Partes dos Animais e História dos Animais. Buscou-se demarcar nestas obras como e para que empregaram a classificação no que diz respeito aos (...) seres vivos. Ao final, trazemos argumentos para explicar porque as classificações gregas não devem ser consideradas métodos na Biologia. (shrink)
Resumen: Este trabajo tiene como principal objetivo el de lograr una comprensión de la la filosofía en cuanto fundamento insoslayable para la teología. Sostiene, en primer lugar, la necesidad de desarrollar una teología más autocosciente en el sentido racional del σὺν λόγω, es decir, desde el programa plenamente actual de la fides quarens intellectum. Defiende, en segundo lugar, que la filosofía solo puede entenderse partiendo de la pretensión que la ha animado desde el comienzo de su andadura: la búsqueda de (...) la verdad de las cosas (veritas rerum). Y para este fin tendrá necesariamente que dotarse de densidad metafísica suficiente y apostar por las tesis de un sano realismo cognoscitivo. Este estudio concluye con una reflexión, en tercer lugar, sobre el uso teológico de la filosofía. La tesis que se defiende es que sin el fundamento filosófico, la fe y la teología pierden lo más nuclear de su misión, la posibilidad misma de presentarse todavía con algún rastro de significatividad para el hombre de hoy. Palabras clave Filosofía, Teología, Universidad, Facultad Eclesiástica, Fe, Razón Summary: This work has as principal objective the achievement of an understanding of philosophy in such as it forms an inescapable foundation for theology. It sustains, in the first place, the need to develop a more self-aware theology in the rational sense of the σὺν λόγω, that is to say, from the fully current program of the fides quarens intellectum. It defends, in the second place, that philosophy can only be understood parting from the pretension that has animated it from its outset: a search for the truth of things (veritas rerum). And to this end, it must necessarily equip itself with the sufficient metaphysical density and wager upon the thesis . (shrink)
Estas reflexões visam aproximar os conceitos linguístico-filosóficos vistos a partir da filosofia da linguagem nos diferentes períodos da história da civilização ocidental. A intenção é mostrar o modo como foram compreendidos os conceitos mais importantes da filosofia no campo da linguagem. Evidentemente, uma história repleta de detalhes, conceitos e circunstanciada por vários e complexos elementos culturais não poderia ser exposta de forma completa em poucas páginas. Assim, a nossa finalidade é antes mostrar os conceitos linguísticos considerados a partir (...) de uma perspectiva filosófica, de sorte que procuraremos enfatizar a maneira pela qual a linguagem foi vista e estudada através da tradição linguística, filosófica e cultural. (shrink)
Despre necesitatea şi utilitatea dezvoltării unei filosofii specifice tehnologiei blockchain, accentuând pe aspectele ontologice. După o Introducere în care evidenţiez principalele direcţii filosofice pentru această tehnologie emergentă, în Tehnologia blockchain explicitez modul de funcţionare al blockchain, punând în discuţie direcţiile ontologice de dezvoltare în Proiectarea şi Modelarea acestei tehnologii. Următoarea secţiune este dedicată principalei aplicaţii a tehnologiei blockchain, Bitcoin, cu implicaţiile sociale ale acestei criptovalute. Urmează o secţiune de Filosofie în care identific tehnologia blockchain cu conceptul de heterotopie dezvoltat de (...) Michel Foucault şi o interpretez în lumina tehnologiei notaţionale dezvoltată de Nelson Goodman ca sistem notaţional. În secţiunea Ontologii dezvolt două direcţii de dezvoltare considerate de mine ca importante: Ontologia narativă, bazată pe ideea de ordine şi structură a istoriei transmise prin naraţia istoriei a lui Paul Ricoeur, şi un sistem ontologic bazat pe Ontologiile de intreprindere, bazat pe conceptele şi modelele de intreprindere specifice webului semantic, şi pe care eu îl consider cel mai bine dezvoltat şi cel care va deveni, probabil, sistemul ontologic formal, cel puţin în ceea ce priveşte aspectele economice şi juridice ale tehnologiei blockchain. În Concluzii vorbesc despre direcţiile viitoare de dezvoltare a filosofiei tehnologiei blockchain în general ca o teorie explicativă şi robustă din punct de vedere fenomenologic, consistentă şi care să permită testabilitatea, şi a ontologiilor în special, argumentând pentru necesitatea unei adopţii globale a unui sistem ontologic pentru a dezvolta soluţii transversale şi a rentabiliza tehnologia. -/- Cuvinte cheie: filosofie, blockchain, ontologie, bitcoin, proiectare, modele -/- CUPRINS -/- Abstract Introducere Tehnologia blockchain - - - Proiectare - - - Modele Bitcoin Filosofia Ontologii - - - Ontologii narative - - - Ontologii de intreprindere Concluzii Note Bibliografie -/- DOI: 10.13140/RG.2.2.25492.35204. (shrink)
En estas notas críticas presento y analizo el libro de Javier Vilanova Arias, Filosofía de sentido común, poniendo especial énfasis en la legitimidad con la que se utiliza el término «sentido común». Para ello, expongo la tesis de Vilanova y planteo la problemática de defender o no un uso reiterado del mismo, entendiendo este como una acomodación recursiva que puede entrar en conflicto con la pluralidad semántica del lenguaje.
Este artigo propõe a adoção do método da análise de conceitos conforme apresentada por John Wilson, como metodologia pedagógica e principal conteúdo para a disciplina de filosofia no ensino médio.
En este artículo presentamos las principales corrientes de la Filosofía Experimental y atendemos a una de las críticas más severas a la que se ha sometido este reciente programa de renovación metodológica. Según Antti Kauppinen la Filosofía Experimental está condenada al fracaso porque no puede obtener mediante sus métodos el tipo de intuiciones que interesan a los filósofos –las intuiciones robustas del hablante competente. Aun aceptando parte de las críticas de Kauppinen, en este artículo sostenemos, en primer lugar, que la (...) supuesta incapacidad de la Filosofía Experimental para acceder a las intuiciones robustas de los hablantes tiene que ver en gran medida con los métodos experimentales empleados hasta ahora por los filósofos experimentales. En segundo lugar, defendemos que el proyecto de reforma llevado a cabo desde la Filosofía Experimental resultará viable solo si se adoptan una serie de consejos metodológicos procedentes de la economía experimental. Únicamente entonces podrán los experimentalistas responder con éxito a la objeción de Kauppinen. (shrink)
O texto fornece distinções conceituais engendradas desde uma perspectiva para o ensino de filosofia que contempla, em seu horizonte, o projeto a construção de uma didática mínima da lógica para o ensino médio. Após a apresentação de alguns aspectos positivos da referida perspectiva são indicadas duas maneiras usuais de compreender e praticar o ensino de lógica. O objetivo central do texto é mostrar como, desde a perspectiva inicialmente esboçada, os esclarecimentos conceituais propostos podem sugerir caminhos interdisciplinares para a didática (...) da lógica sem perda da especificidade da disciplina. The text provides some conceptual distinctions generated from a perspective on teaching philosophy according to which the project of a "didactica minima" for logic in high schools is contemplated. After a brief presentation of some positive aspects of the perspective from which the distinctions are proposed, two common ways of teaching logic are considered. The aim of the paper is to show how the perspective proposed can clarify some topics on the issue of teaching logic in an interdisciplinary way, without losing the specifics of the discipline. (shrink)
A filosofia da natureza de Aristóteles muitas vezes é apresentada como um capítulo inteiramente ultrapassado na história do pensamento: um “finalismo antiquado”, antropocêntrico, avesso à mensuração exata das condições materiais subjacentes aos fenômenos. Essa perspectiva, no entanto, é inadequada: não atenta para o papel relevante que Aristóteles atribui à matéria na explicação dos fenômenos naturais, assim como não atina com o real significado da teleologia aristotélica. Na contra-mão dessa perspectiva apressada, procuramos mostrar que, no cerne da filosofia aristotélica (...) da natureza, entendida como uma teleologia, encontra-se a idéia de que os seres naturais definem-se por uma tendência intrínseca à auto-preservação. É por essa tendência que a forma de cada ser natural governa teleologicamente sua matéria. (shrink)
Erik Olof Burman (1845–1929) was professor of practical philosophy at the University of Uppsala, Sweden, between 1896 and 1910. In 1879 he published a long essay entitled ”Om den nyare italienska filosofien” (”On recent Italian philosophy”). About half the essay is devoted to the philosophical system of Antonio Rosmini (1797–1855), the second half to that of Vincenzo Gioberti (1801–1852). The text is mainly descriptive, apparently aiming at informing Swedish colleagues about the situation in Italy. However, there are also passages revealing (...) the rationalist-idealist subjectivism of Burman himself as well as his considering Rosmini’s ontology too objectivistic and Gioberti’s idealism insufficiently coherent. A preliminary translation of Burman’s essay into Italian is presented. -/- Erik Olof Burman (1845–1929) fu professore di Filosofia Pratica all’Università di Uppsala negli anni 1896–1910. New 1879 publicò un saggio intitolato ”Om den nyare italienska filosofien” (“Sulla filosofia italiana recente”). Quasi metà di questo lavoro si concentra sul sistema di Antonio Rosmini (1797–1855); la seconda parte verte anzitutto invece su quello di Vincenzo Gioberti (1801–1852). Il testo è principalmente descrittivo, ovviamente mirante a informare filosofi svedesi sulle posizioni attuali in Italia. Vi si trovano anche però commenti sparsi indicanti il razialismo-idealismo soggetivo di Burman stesso e considerazioni riguardo a come egli consideri l’ontologia di Rosmini troppo oggettiva e l’idealismo di Gioberti insufficientemente coerente. Riflettendo l’immagine della filosofia italiana del IX secolo in uno specchio straniero, il lavoro potrebbe essere di un certo valore informativo per moderni filosofi e storici italiani. Per questa ragione una traduzione preliminare del saggio di Burman è presentata. (shrink)
Este trabajo retoma las categorías que trabaja Kant en función de la emisión de juicios con respecto al gusto y la estética. Para ello, es necesario que se considere el método que se configura a partir de la sistematización de las cosas y los fenómenos que intervienen para obtener su constitución. Asimismo, todo ello está orientado a precisar el concepto de estética, para que después se comprendan los tipos de juicios que se derivan de las facultades cognitivas, como los juicios (...) analíticos y sintéticos, los juicios a priori y a posteriori, los juicios determinantes y reflexionantes, los juicios estéticos en el Arte y los juicios teleológicos. (shrink)
Filosofia lui Platon se înscrie pe linia presocraticilor, a sofiștilor și a tradițiilor artistice care stau la baza educației grecești, într-un cadru nou, definit de dialectică și teoria ideilor. Cunoașterea este pentru Platon o activitate a sufletului, afectată de obiectele sensibile, și de procesele interne. Platonismul își are originea în filosofia lui Platon, deși nu se confundă cu aceasta. Conform platonismului există obiecte abstracte (noțiune diferită de cea a filosofiei moderne care există într-un al tărâm distinct atât de (...) lumea sensibilă externă, cât și de lumea internă a conștiinței, și este opusul nominalismului). O distincție esențială pentru Platon în filosofia sa este teoria Formelor, distincție dintre realitatea perceptibilă dar neinteligibilă (știința) și realitatea imperceptibilă dar inteligibilă (matematica). Geometria a fost principala motivație a lui Platon, iar aceasta arată și influența lui Pitagora. Formele sunt arhetipuri perfecte ale căror obiecte reale sunt copii imperfecte. -/- DOI: 10.13140/RG.2.2.33183.43687. (shrink)
The search for an agreement between Aristotle’s and Descartes’ philosophy was aimed at making Cartesian physics acceptable in the Dutch universities by showing its consistency with Aristotelian thought. Their agreement is defended by Johannes De Raey in the Clavis philosophiae naturalis (1654), where he interprets the Corpus Aristotelicum from a Cartesian standpoint. Those Aristotelian positions which are inconsistent with Descartes’ are treated as erroneous. The Scholastic positions, moreover, are considered as distant from the true Aristotelian philosophy rediscovered by Descartes.
La filosofía de la educación ocupa un lugar paradójico en el campo de los saberes. Diversas producciones teóricas - de filósofos y pedagogos - convergen en señalar este carácter problemático. Siendo un área temática propia de la filosofía, resulta un espacio en general poco disputado entre los filósofos, como si la educación no estuviera entre las grandes preocupaciones filosóficas de nuestro tiempo. Por el contrario, suelen ser pedagogos quienes llevan a cabo investigaciones y publicaciones en el área y, más aún, (...) quienes ofrecen la disciplina en universidades e institutos de formación. Por lo menos en la inmensa mayoría de las universidades de América Latina, filosofía de la educación, como disciplina, ya no pertenece a los Departamentos o Facultades de Filosofía sino a los de Ciencias de la Educación o Pedagogía. En filosofía de la educación, el “de” ha pasado de indicar materia y tema, aplicación de la filosofía, a señalar pertenencia a la educación. En los Congresos de Filosofía no suele siquiera conformarse un área de la materia. Con reticencias, algunas veces los filósofos admiten discutir cuestiones de didáctica de la filosofía. (shrink)
El presente trabajo de Alex Ibarra Peña recoge los resultados de una investigación cuyo tema es la constitución de un campo de estudios ligado a la filosofía analítica en Chile. El autor se propone una tarea informativa y crítica en la que cifra la novedad de su propuesta. En otros términos, la suya es una labor de rescate, de algunos filósofos y corrientes de pensamiento relegados en las narraciones hegemónicas de la institucionalización de la filosofía en Chile y una tarea (...) que busca corregir el papel asignado a Chile en las visiones panorámicas de mayor circulación sobre la emergencia de la filosofía analítica en nuestro continente. En el cruce de estos dos vectores radica la novedad de la empresa de Ibarra Peña: proponer una visión más ajustada de la recepción de los filósofos analíticos en Chile. En nuestra reseña comentamos los núcleos centrales del trabajo y proponemos algunas hiótesis sobre los conflictos internos al campo cultural que subyacen a las opciones realizadas por el autor. Para finalizar indicamos lo que nos parece ser una falencia del trabajo: un estudio de la constitución de la filosofía analística como campo de estudios no debería dejar de tener en cuenta que el énfasis en la delimitación de la cientificidad por la filosofía analítica tenía en los años 60 y 70 adversarios concretos en el marxismo y el psicoanálisis. (shrink)
Este trabajo tiene como objetivo principal examinar y determinar las consecuencias de las metáforas contenidas en las obras de Diego Domínguez Caballero, fundador de la filosofía académica panameña. Tales metáforas se volvieron fundamentales para el desarrollo discursivo de la filosofía panameña y también para las ciencias sociales en el país, como la historia y la sociología. Con este fin, recurriremos a la teoría de las metáforas conceptuales desarrollada por Lakoff y otros como una herramienta de ayuda para analizar las que (...) Domínguez emplea. Del mismo modo, intentamos dar cuenta de la larga incidencia discursiva de dichas metáforas a la luz de los resultados de la investigación psicológica sobre el esencialismo. -/- The main objective of this work is to examine and determine the consequences of the metaphors contained in the works of Diego Domínguez Caballero, founder of Panamanian academic philosophy. Such metaphors became fundamental for the discursive development of Panamanian philosophy and also for the social sciences in this country, as history and sociology. To this end, we will turn to the theory of conceptual metaphors developed by Lakoff and others as a helpful tool in analyzing the ones used by Domínguez. In the same way, we try to account for the long discursive incidence of these metaphors in the light of the results of psychological research on essentialism. (shrink)
(CONTENIDO: LA FILOSOFÍA DE ALTHUSSER A 50 AÑOS DE LIRE LE CAPITAL Pedro Karczmarczyk, 3; DISCURSO Y DECRETO: SPINOZA ALTHUSSER Y PÊCHEUX Warren Montag 11; ALTHUSSER LECTOR DE GRAMSCI Vittorio Morfino 43 LAS ABSTRACCIONES, ENTRE LA IDEOLOGÍA Y LA CIENCIA João Quartim de Moraes 67 ELOGIO DEL TEORICISMO. PRÁCTICA TEÓRICA E INCONSCIENTE FILOSÓFICO EN LA PROBLEMÁTICA ALTHUSSERIANA, Natalia Romé 85 MARXISMO Y FEMINISMO: EL RECOMIENZO DE UNA PROBLEMÁTICA1 115 Luisina Bolla* / Pedro Karczmarczyk* 115 RRESEÑAS El materialismo de Althusser. Más (...) allá del telos y del Eschaton de Vittorio Morfino, por Valentín Huarte 153; El sujeto en cuestión, Pedro Karczmarczyk (ed.) por Constanza Storani; 159 La posición materialista. El pensamiento de L. Althusser entre la práctica teórica y la práctica política, de Natalia Romé, por Ingrid Sarchman y Carolina Collazo 164. (shrink)
El tema de la importancia de la filosofía puede ser abordado desde muy diversas plataformas teóricas. Nos interesa en este ensayo, sobre todo, tratar el tema de la relación entre vida y filosofía. La idea básica que deseamos desarrollar acá es que la filosofía forma parte inalienable de la vida humana misma. Partimos de la idea de que a la filosofía la necesitamos porque nos es vitalmente necesaria, es decir, porque es necesaria para la vida.
O presente artigo apresentou a interpretação de Paul Guyer acerca da filosofia jurídica de Kant, delimitando seu objeto no oitavo capítulo da obra “Kant”. Procurou-se, por estratégia argumentativa, fixar-se no texto de Guyer, apresentado claramente o problema envolvido, a sua hipótese a e análise das variáveis. Concomitantemente procurou-se inserir uma breve apreciação crítica na forma de notas numéricas. Buscou-se, dessa forma, privilegiar o texto do autor, focando especificamente nos problemas por ele apresentado, sem, contudo, deixar de apresentar uma crítica (...) aos pontos mais cruciais do artigo. Guyer sistematizou a filosofia jurídica de Kant, requerendo à interpretação uma visão mais abrangente da obra do filósofo prussiano, isto é, Guyer procurou correlacionar o conceito de direito kantiano com a filosofia prática, fornecendo, assim, uma ótica em que direito apresenta-se como uma autorização e uma obrigação da razão prática. Nessa sequência, o direito de propriedade, os direitos de família, direitos contratuais, direito público e direito internacional segue uma fundamentação sistemática da obra kantiana. (shrink)
Se examina la defensa que de la filosofía en cuanto episteme, elaboró el aristotélico renacentista Cesare Cremonini (1550-1 631), al introducir el curso de lecciones sobre la Física de Aristóteles, según la redacci6n todavía inédita del Ms.200-2 de la Biblioteca Universitaria de Padua. Mediante un topos ya clásico, y actual, los temas en discusión son además de la falta de certitudo y la inconsistencia veritativa que afectan las conclusiones de la filosofía de la naturaleza, la inutilidad e incluso la peligrosidad (...) que, desde el punto de vista ético- político, parecen descalificar la labor del filósofo ociosamente levantar sospechas y alarma. La interpretación de la réplica cremoniniana intenta establecer conexiones entre el perfil conceptual de los argumentos esgrimidos, y algunos episodios de la biografía intelectual y académica de Crernonini sin dejar de tomar en cuenca las implicaciones políticas que pueden derivarse, en perspectiva histórica, del amplio debate que caracterizó la vida académica y cultural del estudio de Padua y de la república veneciana, durante la segunda mitad del siglo XVI.The defence of philosophy as episteme is examined, as elaborated by Renaissance Aristotelian philosopher Cesare Cremonini (1550 - 1 631) in his as yet unpublished manuscript numbered 200-2 by t he University of Padua. Which purported to be an introduction for a course on Aristotle's Physics. Following a topos both classic and contemporary, the issues arc, in addition to the lack of certitudet and the inconsistency of truth concerning the philosophy of nature. The uselessness and even the ethical-political danger arising from the work of the idle philosopher devoted to the contemplation of truth, whose presence in society may stir suspicion and unrest. The analysis of Cremonini’s arguments intends to establish the connections between the philosopher's views and his own academic and intellectual circumstances. Also the political implications are taken into account that resulted from the wide-range debate typical of academic and cultural life in the Studio of Padua and the Republic of Venice during the second half of the 16th Century. (shrink)
“Dalla filosofia dell’azione alla filosofia della mente” è stato il percorso di alcuni filosofi di nazionalità varia degli anni 1980 – come Paul Churchland negli Stati Uniti o Ansgar Beckermann in Germania – che prima si sono interessati agli aspetti più teorici nella filosofia dell’azione, come il modo di funzionamento delle azioni e la loro spiegazione scientifica, e che poi, con l’arrivo e la diffusione dei personal computers e delle scienze cognitive, hanno ampliato e approfondito questo interesse (...) di ricerca e si sono dedicati alla filosofia della mente più in generale e in particolare alla spiegazione scientifica e filosofica del mentale. Sandro Nannini faceva parte di questo movimento ed è stato uno tra gli inizialmente pochi filosofi italiani che si sono occupati di questi argomenti; successivamente ne è diventato uno dei maggiori specialisti in Italia, proponendo una sua particolare versione di naturalizzazione del mentale. Subordinata agli interessi teorici è stata la sua iniziativa accademica di fondare e promuovere il primo dottorato italiano di ricerca in Scienze Cognitive. Il presente volume tratta dell’opera di Sandro Nannini in contributi che sono riflessioni più o meno specifiche sulle differenti tappe del suo percorso, affrontando temi come l’analisi dell'azione, il libero arbitrio, la discussione di Nannini di vari classici della filosofia, la tendenza del naturalismo a dissolvere la filosofia in un enciclopedismo empirico e la sfida dei qualia e della fenomenologia all’approccio naturalistico alla mente. Il volume contiene inoltre un saggio dello stesso Sandro Nannini, nel quale espone l’ultimo sviluppo della sua filosofia della mente nonché le risposte agli interventi degli altri autori: Mario De Caro, Sara Dellantonio, Rosaria Egidi, Roberta Lanfredini, Christoph Lumer, Paolo Parrini, Pietro Perconti, Claudio Pizzi, Emanuela Scribano e Giuseppe Varnier. (shrink)
A filosofia da linguagem dedica-se ao estudo da linguagem natural. Não se dedica ao estudo de línguas particulares, tal como o português, o castelhano ou o inglês, mas sim ao estudo filosófico de características gerais da linguagem e da nossa capacidade e proficiência linguística enquanto seres humanos. A investigação do desenvolvimento da linguagem é uma tarefa a ser desenvolvida pela ciência – a paleontologia, a neurologia, etc. Mas a ciência ocupa-se de algo de que temos um conhecimento intuitivo prévio (...) – a linguagem natural. Ora, a filosofia da linguagem dedica-se em parte a tornar explícito o nosso conhecimento implícito da linguagem. Como tal, a filosofia da linguagem é uma disciplina central na filosofia. Este capítulo é uma introdução selectiva à filosofia da linguagem. A alternativa que se nos deparava era fazer uma breve apresentação de teorias do significado, da referência e da verdade, e ainda de alguns tópicos de pragmática, ou escolher um tópico em particular que é, tradicionalmente, o elegido nos cursos introdutórios à filosofia da linguagem. Este capítulo oferece assim uma introdução a alguns dos temas centrais e clássicos da filosofia da linguagem contemporânea. A maior parte do capítulo dedicar-se-á a teorias da referência, a de Frege e de Russell, e à sua crítica subsequente por filósofos como Saul Kripke. Isto poderia levar-nos a pensar que a filosofia da linguagem contemporânea continua, como era tradicional, focada simplificada da relação entre linguagem, mente e mundo. Nada podia estar mais longe da verdade, como se tornará claro. A grande alteração na perspectiva sobre o estudo da linguagem, que se deve a pessoas como Frege ou Russell, é que graças ao seu trabalho os filósofos passaram a reflectir sobre a contribuição semântica sistematicamente feita por diferentes categorias sintácticas nas diferentes construções frásicas em que possam ocorrer, por exemplo a de termos referenciais como os nomes próprios. A relação linguagem-mente-mundo continua a ser uma preocupação dos filósofos contemporâneos, mas de uma forma muito mais sofisticada, rigorosa e sistemática. Os filósofos preocupam-se agora, por exemplo, com as condições de verdade correctas de usos particulares de frases, com os estados de coisas reais ou possíveis que confeririam verdade ou falsidade às frases usadas, e com o valor cognitivo de distintos tipos de frases. Como indicaremos na última secção do capítulo, outros desenvolvimentos da filosofia da linguagem contemporânea dizem respeito àquilo que nós, enquanto seres humanos, conseguimos fazer por meio da linguagem, aos diferentes actos de fala possíveis, e aos diferentes níveis de significado que podemos comunicar por meio do uso de frases com um significado convencionalmente estabelecido. (shrink)
Este documento analiza las siguientes cuestiones: 1) La metodología de la economía y su actual institucionalización. 2) La definición de Economía. 3) Las perspectivas de los economistas acerca de la Economía, sus métodos y justificación. 4) Comprobación y progreso: Popper y Lakatos.5) Los modelos y sus supuestos. 6) Persuasión retórica y verdad. 7) La Economía como un recurso para la Filosofía de la Ciencia. 8) Expansionismo explicativo y relaciones interdisciplinares.
Las narraciones que presentan la filosofía moderna como un periodo particular de la historia de la filosofía, al igual que las narraciones sobre otros periodos de la historia de la filosofía, son deudoras tanto de determinadas concepciones de la filosofía como de ciertas concepciones de su historia y de la historia. La mirada hacia el pasado filosófico se sitúa en un presente que, implícitamente o no, delimita el campo de lo que es considerado como filosofía y de lo propiamente filosófico, (...) delimitación que implica una selección de las manifestaciones que caracterizan la filosofía, como, por ejemplo, sus autores, sus problemas, sus escenarios y sus formas discursivas. Dicho de otra manera, al narrar una historia de la filosofía se determinan de alguna manera quiénes son filósofes, qué temas son filosóficos, dónde se hace filosofía y cómo se escribe filosofía, entre otras cosas. A su vez, la narración histórica de las expresiones de ese pasado asume ciertas posiciones acerca de la historicidad de lo filosófico, de sus relaciones con los diferentes ámbitos de su emergencia, de sus métodos de investigación y de las modalidades discursivas deseables para esta narración. (shrink)
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